quarta-feira, 30 de novembro de 2022

NA PONTA DO LÁPIS - NATHÁLIA MOLINA

 
No início deste ano li na internet um artigo sobre como o ato de escrever pode ajudar no autoconhecimento e na cura de traumas(!). Achei interessante, copiei, arquivei e esqueci. 

Hoje, procurando encontrar outro arquivo, reencontrei o texto, transcrito a seguir. Acredito que interessará aos blogueiros que (ainda) acessam o velho Blogson e, claro, às/aos intelingentíssimas/os leitoras/es deste blog da solidão ampliada (ultimamente tem ampliado muito!) Som na caixa!
 

Exercício de botar para fora pensamentos e emoções abre a possibilidade de perceber características pessoais e refletir sobre si mesmo, dizem especialistas
 
Fernanda Rena tem 45 anos e escreve diários desde os nove. Volta e meia, relê alguns trechos e se dá conta do quanto mudou desde então e do que continua igual. "Faz parte da minha rotina olhar diários antigos. Fazendo isso sei, por exemplo, que a minha vida inteira eu me preocupei com determinadas coisas. Sempre fui muito perfeccionista, me cobrava. No colégio, era a prova. No trabalho, achava que não ia dar conta", diz a jornalista, editora do jornal do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Segundo Fernanda, o hábito de fazer diários permite ir aprendendo a dimensionar a importância que ela dá aos acontecimentos da vida. "Quando leio, eu me pergunto 'como fiquei tão nervosa por causa de tal coisa?'."
 
Escrever pode ajudar a se conhecer, dizem os especialistas. O exercício de botar para fora pensamentos e emoções abre a possibilidade de perceber características pessoais e de se fazer uma reflexão sobre si mesmo e sobre o mundo ao redor.
 
A escritora Ana Holanda viu isso ocorrer com os alunos nos seus cursos de escrita criativa e afetuosa, como ela chama seu método. "A grande questão é que eu achei que fosse interessar para quem trabalhasse de fato com isso, quem é jornalista ou no máximo profissional de marketing", conta. "Mas, com o tempo, cada vez mais apareciam pessoas no meu curso dizendo 'Eu vim na verdade porque minha psicóloga pediu, tenho questões que preciso conseguir escrever sobre'. As pessoas começaram a vir por motivos pessoais. Às vezes não contavam na apresentação, mas falavam comigo depois."
 
Autora do livro Como se Encontrar na Escrita (Editora Rocco), Ana trabalha o tema também no Instagram @anaholandaoficial e no clube de escrita que lançou há um ano. "Meu curso é para quem já se sente íntimo da palavra ou para aqueles que paralisam em frente da folha em branco; para quem quer escrever para si, para o outro, para um livro, um projeto digital ou profissional. O curso é para todos." Atualmente, ela própria escreve Pequeno Manual da Escrita Afetuosa, com publicação prevista para o segundo semestre deste ano.
 
Temas e objetivos
"Tenho quase 30 anos de escrita. Comecei como jornalista e passei a estudar que elementos um texto carrega", lembra Ana, que de lá para cá já criou programas também com objetivos específicos. "Tenho um curso só sobre escrever diários e outro para momentos de dor, como luto, separação ou um filho que saiu de casa."
 
Ana explica que não se debruça sobre questões técnicas com os alunos, e sim na transformação do abstrato (os sentimentos) em algo concreto (as palavras). "A escrita é um reflexo de quem a gente é. Nem todos os dias vão ser bons. Tem de saber o que puxar", diz a escritora. "Eu não tenho uma formação terapêutica, mas eu conduzo a pessoa para que ela consiga escrever. Vou até aí, em como ela chega na escrita."
 
Pode até não ser a finalidade, mas pôr um pouco ou muito de si no papel ou num arquivo de computador pode, de quebra, auxiliar na melhora do português e no ganho de segurança pessoal. Os especialistas reforçam, no entanto, que regras gramaticais, acentuação e concordância não devem estar entre as preocupações de quem pretende usar essa prática em busca de autoconhecimento.
 
Primeiro passo
Para Mary Yoko Okamoto, professora de Psicologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) no câmpus de Assis, no caso de processos mais profundos, escrever não significa que aquela questão vai se resolver, mas é um primeiro passo. "A escrita, sim, pode ajudar. Num primeiro momento, como uma fonte de reflexão para perceber algumas questões. A pessoa geralmente faz uma imersão nela mesma e isso vem à tona. Ela pode escrever e depois, relendo o material, se dar conta de algumas coisas que estão lá no conteúdo. Outra coisa é que tipo de modificação vem a partir daí."
 
Recentemente, a escritora Ana usou as páginas do diário como apoio para atravessar uma fase árdua durante a pandemia. "Eu me separei no meio de 2020, e foi uma coisa muito difícil para mim, com muita mágoa, coisas não ditas. Passei por todo esse processo e hoje estou apaixonada de novo. Quando releio os textos mais antigos, olho como eu estava. Essa é a beleza do diário. Ele é um retrato de você."
 
Fernanda também desfruta desse processo e do que tira dele ao longo dos muitos anos escrevendo diários. "Tem coisas que já consegui mudar, superar. A maturidade me ajudou, e a terapia também. Mas tem algumas coisas que leio, especialmente sobre amores do passado, em que escrevi: 'Daqui a 20 anos, eu não vou nem ligar para isso', só que eu vejo que ainda estou ligando", conta, rindo da situação.
 
Projeto Escreva-se usa palavra escrita para lidar com traumas
A escrita é usada como recurso em terapias, por exemplo, para o tratamento de traumas. Na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), o Projeto Escreva-se é inspirado numa técnica de Yale, universidade americana. "Lá, eles desenvolveram um protocolo para a população LGBT+, do ponto de vista da saúde mental, para ser usado em Estados americanos muito pobres e preconceituosos. São estratégias de intervenção autoguiada, sem mediação, com tarefas de escrita", explica o professor da PUC-RS Angelo Brandelli Costa.
 
Ele ressalta que os participantes precisam seguir o modelo proposto pelo método. "Não é pegar um diário e escrever. Embora não tenha um profissional de saúde acompanhando, é parecido com a psicoterapia", afirma Costa. Na primeira semana, a pessoa escreve três vezes, durante 20 minutos cada, sobre a situação de discriminação que sofreu. Na seguinte, imagina que está se dirigindo a uma pessoa parecida com ela mesma e escreve para ela tentar ajudá-la.
 
"Não importa se vai ser uma frase ou cinco páginas. Independentemente do volume de texto, existem evidências de que esse processo melhora a saúde mental, apenas com o fato de a pessoa tentar botar de uma forma organizada a sit0 uação traumática, endereçado a alguém ou a si mesma", diz. Quem quiser se candidatar para ser voluntário pode mandar e-mail para angelo.costa@pucrs.br.
 
Etapas
No geral, são três as etapas previstas para o desenvolvimento do Escreva-se: coleta de dados dos voluntários na plataforma projetoescrevase.edu.br (que entrará no ar em breve) para a validação do projeto; curso de formação para tornar a ferramenta disponível no Sistema Único de Saúde no Rio Grande do Sul; possível extensão para o SUS no restante do País.
 
No Brasil, ele acredita que esse método pode vir a se tornar uma alternativa para tratar a saúde mental no SUS, sem um alto investimento financeiro. "Certamente essa intervenção pode ser adaptada e pode funcionar e ser testada", afirma. "As políticas de saúde mental nunca tiveram investimento. A lógica é baseada na internação e não na prevenção."
 
A escrita tem uma função instrumental em terapias tradicionais, explica Costa. "Na psicanálise, há várias técnicas projetivas. Quando Freud analisa os sonhos, está analisando as narrativas", explica Costa. Um diário também pode servir para a pessoa lembrar do que acontecia com ela no momento em que se sentiu de determinada maneira. "Algumas pessoas conseguem se expressar muito bem com a fala. Outras desenham, outras escrevem."
 
Como usar a escrita para se conhecer melhor
Confira dicas de Mary Yoko Okamoto (professora de Psicologia da Universidade Estadual Paulista/Assis) e de Ana Holanda (jornalista, escritora e criadora de cursos de escrita), para escrever exercitando o autoconhecimento.
 
- Momento de reflexão: Ao escrever com frequência, você consegue se dar conta se perspectivas e projetos se realizaram ou não. Caso não tenham se concretizado, vale analisar o por quê. Algo impediu? O plano que você fez era factível ou superdimensionado? "É importante avaliar a situação como um todo e não só focar no sucesso ou no insucesso", diz a professora.
 
- Olhar para si mesmo: "Em situações que envolvem os outros, muitas vezes a pessoa foca no que os outros fizeram ou deixaram de fazer. Mas também deve perceber ela mesma naquela situação: o que impactou, o que mobilizou e o que paralisou?", recomenda Mary Yoko.
 
- Proximidade: Segundo Ana, é muito comum nos seus cursos de escrita ver alunos que não se aproximam daquilo que estão escrevendo sobre, especialmente em casos de trauma. "Escreva sobre a sua dor. Não se coloque num lugar imenso. Você pode começar pelas beiradas", ensina. "Por exemplo, se você está usando uma blusa com a cor que era a preferida da pessoa que você perdeu, escreva sobre essa blusa, sobre a cor."
 
- Respeito: Não se force a escrever quando não tiver vontade. É preciso respeitar seu tempo. Mas, de acordo com Mary Yoko, também pode ser bom tentar entender o que levou à pausa.
 
- Forma de expressão: A professora pontua que escrever não é para todo mundo. "Tem gente que tem essa maneira de expressão. Para outras pessoas, pode ser mais acessível a música, a pintura ou a fotografia. São as formas de linguagem de cada um."
 

terça-feira, 29 de novembro de 2022

PRECISO CONFESSAR

 
Acordei hoje com a sensação de que preciso confessar. Mas não há pecado novo que mereça isso; e os velhos já foram todos confessados. Minha confissão na verdade nem é uma “confissããão”, é mais um reconhecimento. Algum leitor ou leitora mais impaciente já deve estar com vontade de perguntar “que reconhecimento é esse? Fala logo, porra!”
 
E eu digo agora: eu sou chato, muito chato, chato pra caralho! Aqui cabe uma observação: se fosse no início do blog eu jamais escreveria “pra caralho”; talvez escrevesse “pra caramba” “tremendamente” ou “pra kawaka” (genial criação de algum publicitário inspirado), mas “pra caralho” não. E se escrevesse ficaria bege, ocre, cor de doce de leite de vergonha, nunca vermelho, porque eu não sou de esquerda, sou de centro. Mas acho que me perdi no meio de tantas explicações, parênteses, aspas e vírgulas (são meus vícios de linguagem, entende?)
 
Como estava dizendo, reconheço que sou chato pra kawaka, pois sou do contra. Você fala “A” e eu digo que o certo é “B”. E nesse beabá acaba indo um dicionário inteiro, uma chatura de dar (des)gosto. Falando em dicionário, qual é a palavra correta para me definir? “Chatura” ou “chatice”? Na dúvida, vamos ficar com “mala sem alça”.
 
Porque por ter a desagradável mania de pensar por conta própria (seguindo o ensinamento do Millôr Fernandes, de que “livre pensar é só pensar”) eu acabo sendo uma espécie de “advogado do diabo”. Que foi, minha senhora? Não, eu não sou advogado nem acredito que “ele” exista. Aliás, há tantas coisas que não existem e que foram inventadas ou manipuladas só como instrumento de controle dos ingênuos!
 
“Comunismo”, por exemplo. Até onde me lembro, desde os governos do Collor, do Itamar, do FHC, do Lula I, Lula II, Dilma e Temer raramente se ouvia falar nessa palavra. Mas bastou alguém de extrema, extrema direita ser eleito para que essa palavra voltasse à toda para o vocabulário das redes sociais. E o motivo eu vou contar para a senhora, só para a senhora:
 
O que muitos pais fazem para controlar crianças pequenas? Colocam medo nelas! Falam de bruxas, fantasmas, assombrações, etc. E os menininhos e menininhas (especialmente aqueles que não abandonaram o uso de fralda) cagam de medo e ficam quietinhos, paralisados. O comunismo é uma espécie de Freddy Krueger ideológico, ou um daqueles espantalhos que aparecem em desenhos animados, só para espantar as aves que querem comer as espigas de milho
 
Ah, a senhora não acredita no que estou dizendo, né? OK. Mas desconfio de que compartilha tudo que recebe pelo whatsapp com suas amigas e filhos. A senhora não tem filhos? Mas é casada, talvez. Separada? Huum, eu sempre desconfiei da indissolubilidade do matrimônio!
 
Aliás, essa coisa de família é um troço complicado. Como diz uma conhecida, “família só é bom em retrato na parede”. Mas ela é um pouco chata; chata e barraqueira, pois às vezes briga até com a sombra. Eu sou chato, reafirmo isso, mas não sou barraqueiro. Como sou um pobre elitista, não gosto de fazer barracos: o que eu curto mesmo são mansões, resorts, suítes master e afins. A senhora também gosta? Claro, todo mundo gosta. E se houver um companheiro ou companheira na jogada, melhor ainda.
 
Eu sou casado com a mulher da minha vida há mais de 45 anos. Pois é, dá muito trabalho, mas vale a pena (principalmente se a alma não é pequena, como disse o poeta). Tem gente como eu que se casa com o amor de sua vida e, pasme, continua casada ainda que seu ou sua companheira seja do mesmo sexo que ele ou ela.
 
A senhora acha isso uma pouca vergonha? Não, não é. Conheço um casal de mulheres, que estão juntas há mais de 30 anos. Mas, permita-me perguntar: a senhora não acha que pouca vergonha mesmo é um bando de idiotas pedindo intervenção militar pelo simples fato de não concordar com o resultado das eleições?
 
Lá vem a senhora de novo com “comunismo”! Não, eu não sou comunista. Para dizer a verdade, eu de-tes-to o comunismo! Mas também detesto qualquer governo ou regime autoritário, pouco importando se ele é de direita ou de esquerda. Se a senhora se lembrar das aulas de história geral talvez entenda meu ponto de vista: lembrando a Grécia antiga, eu sempre admirei mais a democrática Atenas e sempre olhei com desconfiança sua militarizada rival Esparta. Entendeu? Não? Ok, deixa pra lá.
 
 
Engraçado, eu estava falando da minha chatice e me empolguei com um diálogo imaginário. Acho que falar sozinho, para as paredes, é uma característica dos chatos. Quando não estou falando sozinho eu tento sugerir para que as pessoas utilizem os dois olhos, não apenas o olho direito ou o olho esquerdo. Mas eu sou chato mesmo. Se fosse uma empresa, até criaria um zero oitocentos para receber as reclamações por minha chatura. Um bom número seria 0800 foda-se.

TRADUZ AÍ! - A REVANCHE

 
Que me perdoem os religiosos fundamentalistas, mas graças a eles o Brasil está ficando um país muito engraçado. Aliás, talvez o país nem seja alegre, mas triste. Engraçadas mesmo são as pessoas, algumas pessoas.
 
Li na internet uma notícia que me deixou cabreiro, pela dificuldade de execução nela implícita. Saca só: no dia 23 de novembro a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que proíbe “alterações, edições ou adições no texto da Bíblia”. Segundo a notícia, “a matéria tramitou em regime de urgência e agora segue para o Senado”.
 
Confesso que fiquei surpreso, pois o Brasil (graças a Deus!) é um país laico. Por isso, ficar legislando a propósito de textos sagrados de uma das várias religiões existentes no país parece-me uma coisa sem propósito, sem sentido.
 
De acordo com a notícia, a autoria do PL 4606/2019 é do deputado Pastor Sargento Isidório (Avante/BA). Segundo ele, “não se pode permitir possibilidades para que nunca esse livro sagrado seja tocado em nenhum momento da nossa existência” (não é minha culpa, é assim que estava escrito).
 
E aí é que está a graça da notícia. Sou um católico meia boca, meio católico, meio ateu e já tentei ler toda a Bíblia, mas desisti. Li os Evangelhos de São Mateus e São Marcos, o Gênesis e parte do Levítico (que foi o causador da desistência). Mas já fui um praticante entusiasmado e fiel, daqueles de ir à missa e comungar todos os domingos - e se angustiar pela perda progressiva da fé.
 
Por isso, sei de orelhada que existem várias versões e traduções da Bíblia. Sem detalhar nada (porque este post não é um curso intensivo de teologia), poderia (de acordo com o Google) citar a existência das versões católica, evangélica, ortodoxa e hebraica, fora as sutilezas decorrentes dessa ou daquela tradução, tipo Vulgata, de Jerusalem, Septuaginta, King James, “Nova Versão Internacional”, “Nova Versão Transformadora”, “ACF - Almeida Corrigida Fiel”, etc.
 
E aqui fica a pergunta (cuja resposta estou pouco me lixando em conhecer):
 
Deputado, a integridade de qual dessas versões Vossa Excelência quer preservar? Respostas para a Redação (e-mail fodase@orkut.com.br)

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

SONS DO PARAÍSO

 
Creio que esta é a coisa mais perto do céu, do paraíso que eu consigo imaginar. Melodia maravilhosa, versos magníficos, a "voz de Deus" e uma interpretação para se ouvir na penumbra, deitado em um sofá ou rede, enquanto a mente entra em um DeLorean e faz um passeio "por aí".



GEMININIÑAS 13

 
Como muitos pais e tios sabem, as crianças muito pequenas são como que esponjas, pois absorvem muito do que os adultos falam. Se tiverem a sorte de ter pais civilizados e com um mínimo de cultura não demoram muito a encantar os parentes, ao fazer comentários surpreendentes, hilariantes e usar palavras inimagináveis para sua idade.
 
À medida que vão crescendo, perdem um pouco da espontaneidade e deixam de surpreender os adultos. Mas, até que essa fase chegue dizem e fazem coisas que ameaçam o bom funcionamento do coração dos avós. E esse é o motivo de me dedicar a registrar as micro-historinhas protagonizadas por minhas netas, contadas por seus pais: para que um dia elas possam ler as tchutchuquices que foram capazes de fazer ou dizer quando eram bem pequenas.
 
Com a Copa do Mundo do Qatar mobilizando toda a população brasileira (toda, não; os “patriotários” recusam-se a sair de sua própria “concentração”), a mãe da Bia e da Cacá comprou umas roupinhas de uniforme da seleção para as meninas, para que possam ir assim vestidas para a escolinha em dia de jogo do Brasil
 
As menininhas estavam deitadas na cama quando a mãe as vestiu com a blusa da seleção. Quando a Cacá levantou e se olhou no espelho, fez até uma pose com mão na cintura e disse:
 
- Nossa! Como eu tô bonitinha!
 
Por precaução, ao ouvir essas historinhas o avô já fica com um comprimido de Aradois por perto, bem à mão. Vai que precisa...

domingo, 27 de novembro de 2022

DIAVERSÁRIO

 
Ultimamente tenho estado tão carente de afeto e com tanta necessidade de ser aplaudido que estou até pensando em reservar uma parte do orçamento doméstico só para comprar um bolo de aniversário todo dia.
 
Assim, poderei convidar parentes e amigos para cantar parabéns pra você para mim em comemoração ao meu diaversário. Só preciso resolver algumas questões. E a primeira é encontrar quem queira bater palmas para mim todo santo dia.
 
A vantagem é que no terceiro ou quarto dia ninguém mais aguentará cantar “Aha,uhu, Jotabê, eu vou comer seu bolo!”, pois todo mundo (uma ou duas pessoas) ficará bolado rapidinho.

sábado, 26 de novembro de 2022

FATHER AND SON - YUSUF (CAT STEVENS)

 
Eu já fui jovem um dia, na mesma época em que o Cat Stevens gravou Father and Son, lindíssima e reflexiva música. Eu acreditava ser ele o autor, mas não é. Eu envelheci, ele também, converteu-se ao islamismo e hoje é Yusuf.

Quantas vezes fizemos coisas de que nos arrependemos depois? Quantas vezes faremos coisas de que nos arrependeremos? Só Deus sabe. Talvez nem Ele mesmo saiba. À medida que vivemos, as escolhas que precisamos fazer vão surgindo e se multiplicando, assim como os galhos e ramos que brotam e se espalham à medida que uma árvore cresce.
 
Quando eu era jovem, dava mais razão para o pai. Hoje, que sou velho,dou mais razão para o filho, porque não há vacas sagradas nem bezerros de ouro para adorar. Há apenas vacas e bezerros.

Por que estou dizendo essas banalidades? Porque hoje é sábado, estou fechado dentro de uma casa trancada, com a sensação de que a vida acabou há muito tempo. E que não tenho mais certeza de nada.
 
A letra da música em tradução livre está transcrita a seguir. E se quiser (re)ouvir a música, o vídeo original está logo abaixo.
 
(idoso)
Não é hora de fazer mudanças, relaxe, vá com calma
Você ainda é jovem, esse é o problema
Há muita coisa que você precisa saber
Encontre uma garota, acalme-se
Se você quiser, pode se casar
Olhe para mim, estou velho, mas sou feliz
Eu já fui como você é agora e eu sei que não é fácil ficar calmo quando você percebe que algo está acontecendo
Mas vá com calma, pense bastante
E pense em tudo que você tem, pois você ainda estará aqui amanhã, mas seus sonhos talvez não estejam
 
(jovem)
Como posso tentar explicar?
Porque quando eu tento, ele dá as costas novamente
É sempre, sempre a mesma velha história 
Desde o momento em que eu pude falar fui obrigado a ouvir
Agora há um caminho, e eu sei que eu tenho que ir embora
Eu sei que tenho que ir
 
(idoso)
Não é hora de fazer uma mudança
Apenas sente-se, vá devagar
Você ainda é jovem, esse é o problema
Há muita coisa ainda que você tem que enfrentar
Encontre uma garota, acalme-se
Se quiser, você pode se casar
Olhe para mim, estou velho, mas sou feliz
 
(jovem)
Todas as vezes que eu chorei, mantive todas as coisas que eu sabia aqui dentro
É difícil, mas é mais difícil ignorá-las
Se eles estivessem certos, eu concordaria, mas eles conhecem a si mesmos, não a mim
Agora há um caminho e eu sei que tenho que ir embora
Eu sei que tenho que ir.
 


 

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

FABIANO CALDEIRA: ESSE É O CARA!

Graças a meu fornecedor de novos contatos e leitores, o atacadista Marreta do Azarão, ganhei meu décimo quinto amigo virtual, ou melhor, décimo quarto, pois um dos primeiros amigos resolveu que era apenas seguidor e optou por parar de seguir o velho Blogson. Sem stress!

Mas o décimo quinto ou décimo quarto surgiu com uma força tão surpreendente que eu tenho dificuldade até de avaliar. Fabiano Caldeira, esse é o cara. Tem cinco livros publicados (que inveja!) e desenha uma enormidade.

Pois bem, creio ter gostado de um “diálogo de spamtar” que publiquei recentemente e, por isso, resolveu fazer uma HQ. Mas nada parecido com os dezénhos meia boca que eu teimo em fazer. O traço dele é de profissional, coisa de quem entende do riscado (e até do rabiscado).

Se alguém quiser ver o texto que inspirou esta magnífica HQ, o link é este:  https://blogsoncrusoe.blogspot.com/2022/11/pesadelos-na-madrugada.html

Essa associação entre um diálogo criado por mim e o belíssimo traço do Fabiano me fez lembrar de uma dupla da época do Pasquim. Jaguar, o criador do Sigmund – ou Sig, mascote do Pasquim - era ou é um cartunista com um traço feio pra cacete e, por isso mesmo, sensacional. Em algum momento parece ter perdido a inspiração para fazer as tirinhas do Sig. Quem supriu essa deficiência foi Ivan Lessa, um jornalista que morava em Londres. O Lessa fazia o roteiro e o Jaguar ilustrava. O Pessoal do Pasquim ironizava dizendo que o Ivan Lessa era o ghost writer do Jaguar.

Mas estou falando demais e peço desculpa por isso, pois estou mais excitado que bolsonarista acampado na porta de quartel. Por isso, delicie-se com o desenho do master Fabiano Caldeira.  Como diriam os mineiros, vai desenhar bem assim lá longe, trem!







quinta-feira, 24 de novembro de 2022

O JOGO DOS INSULTOS

 

- Que que você tá fazendo?

- Nada.

- Estava pensando em criar um jogo de salão para a noite de Natal

- Nossa! Não sabia que você era assim tão família!

- Você não conhece a minha família!

- E como seria esse jogo?

- O nome é “O jogo dos insultos”

- Não entendi.

- Não tem limite de participantes. As pessoas vão se ofendendo até alguém ser declarado vencedor. Só não pode usar palavrão.

- Pô, que clima bom deve ficar depois!...

- Quer experimentar?

- Tá bom, mas você começa.

- Babaca!

- Isso é palavrão!

- Né não. Depois de ter sido falado na televisão até freira é capaz de usar.

- Ok. Bunda mole!

- Jumento!

- Ladrão!

- Cachorro morto!

- Sutil! Canalha!

- Corrupto!

- Comunista!

- Caprichou nessa, heim?

- Eu só jogo para ganhar, mané. Mensaleiro!

- Litigante de má fé!

- Valdemar!

- Pô, aí é sacanagem, Agora você ofendeu mesmo! Se fosse na noite de Natal já teria levado um prato com lombo ao molho madeira, maionese e arroz com passas na cara!

- Como diria de mim o Galvão Bueno, "É campeão! É campeão!"

 

DO BALACOBACO!

 
A senadora Soraya Thronicke está me saindo melhor que a encomenda (e o bom é que ela é de direita)!
 
Primeiro, durante os debates do primeiro turno, chamou o “padre” Kelmon de “padre de festa junina”. Rolei de rir!
 
Agora, depois do PL, partido do mensaleiro e “recruta” Valdemar (porque obedece as ordens de uma patente superior) tomar uma multa de 22,9 milhões por “litigância de má fé”, a senadora voltou a carga com a ironia que me faz pensar em votar nela se for candidata a presidente nas próximas eleições.
 
Em seu perfil no Twitter mandou esses comentários:
 
O parágrafo 2º do art. 17 da Res. 23.604 do TSE proíbe o uso do fundo partidário para pagamento de multa.
 
A aventura antidemocrática fica cada dia mais cara e perigosa.
 
Já começaram a pedir PIX para o pagamento dos 22,9 milhões?
 
Como diria o pessoal do Pasquim, essa moça é do balacobaco!

PESADELOS NA MADRUGADA

 
Acordei esta madrugada com uma piada idiota sobre os acampamentos na porta dos quartéis. Ainda sonolento, fiquei tentando dar sequência a esse pesadelo, um pesadelo literal. Pensei em fazer uma HQ com figuras geométricas, mas desisti. Contudo, resolvi guardar a essência da história, que começa com alguém esgoelando pateticamente na porta de um quartel, tal como ouvi em vídeo tik tok de uma amiga bolsonarista de minha mulher.
 
- General, general!
- General, ô generaaaallll! Ajuda nóis!
 
Próximo à entrada, duas pessoas fardadas conversam:
 
- Não aguento mais essa baderna aqui na entrada!
- Falou tudo, isso aqui é caserna, não baderna.
- Esses idiotas estão acampados há uns 30 dias, pelo menos.
- Será que não tem família, emprego ou outra coisa melhor pra fazer?
- Pois é, dá vontade de ir lá fora e perguntar se eles são do MST. Ou do MSC.
- Ficou louco? Eles são o oposto disso!
- É só uma zoeira para encher o saco deles.
- Mas qual é a graça disso?
- O significado de MST seria “Malucos Spulsos do Trabalho”. De MSC seria “Maridos Spulsos de Casa”
- Porra, “Spulsos” foi foda!
- Zoeira é a única coisa que merece quem pede “intervenção militar”.
 
Nesse ponto, depois beber água e de uma providencial mijada, o cérebro se acalmou e eu voltei a dormir.

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

RECRUTA BIRUTA

 Recebi de meu filho e resolvi compartilhar com aqueles que acessam o blog. Serve para rir um pouco (pois meu fígado está talhado).




Pois é... (acho que o sargento subiu de patente)






ESTE MÊS NÃO ACABA NÃO?

 

Gal Costa

Paulinho Jobim

Erasmo Carlos

Rolando Boldrim

Este mês de Finados

Parece mesmo

Não querer ter um fim

Pois até "cachorro morto"

Pensa em voltar a "latir"

terça-feira, 22 de novembro de 2022

MAIS UM NA MULTIDÃO - ERASMO CARLOS (PART. MARISA MONTE)

 Este post é minha homenagem a esse artista que um dia eu vi bem de perto, ainda no final da minha adolescência. Eu sempre achei a Jovem Guarda uma coisa brega, pois apesar de pobre, muito pobre, eu era um pobre elitista. E beatlemaníaco. Estava sem grana e fiquei na porta da sede social do Cruzeiro Esporte Clube, onde estava acontecendo uma daquelas "horas dançantes" tradicionais. 

Foi quando chegou o Erasmo Carlos, para fazer um show dublado, na base do playback. Um conhecido, de sacanagem, gritou para ele: "Oi, primo!" O Erasmo olhou de relance e entrou no clube. E nós continuamos do lado de fora.

Depois disso, eu beatlemaníaco fundamentalista, passei a gostar de algumas músicas compostas por ele  e pelo caretíssimo Roberto Carlos. Esta é uma de que gosto muito. E já não sou um beatlemaníaco fundamentalista (mesmo continuando a ser elitista). Requiescat in pace, Erasmo.




TEMPO DE FAXINA

 
Já faz um tempão que eu venho me sentindo angustiado e puto com todas as manifestações saídas dessa caixa de Pandora aberta pela extrema direita (não vou citar nomes!). E o cardápio é extenso: negacionismo, radicalismo, intolerância, nacionalismo extremado, truculência, ignorância, má fé, selvageria, falta de educação, violência, fundamentalismo religioso, moralismo, desprezo pelas leis vigentes e todo tipo de sentimentos e atitudes que tornaram este país um octógono de disputas verbais e até mesmo de full contact.
 
Resumindo: este país está uma merda. E isso tem me atingido como na letra do Belchior – Tenho sofrido demais, tenho chorado pra cachorro” (eu sei que a palavra correta é “sangrado” e eu não tenho chorado nem uma gota). Esse abafamento e essa tristeza que tenho sentido quase o tempo todo contaminaram os textos que tenho escrito. Para ser sincero, acho uma necessidade idiota registrar minha revolta, indignação ou desilusão, pois cada vez mais imagino o moderado Blogson como uma ilha cercada de conservadorismo por todos os lados.
 
Por isso, para tornar mais amistoso este blog desimportante e com vocação para porra louca, resolvi fazer nele uma faxina daquelas de tirar bicho. Em outras palavras quero deixá-lo mais friendly user.
 
Aqui cabe um parêntese: adoraria ver a cara de puto dos nacionalistas e puristas radicais ao ler esta simpática expressão em inglês. Em minha defesa direi apenas que é melhor usar expressões da língua do Obama que da língua do Maduro ou do Fidel Castro. Porque eu sou totalmente a favor da mistureba de línguas e influências culturais, do uso de gírias, de palavras chulas (para quem curte) e até de emojis (os hieróglifos modernos). E sempre contra a caretice e fundamentalismo de qualquer espécie. Fim do parêntese.
 
Por isso, para tornar mais puro e oxigenado o ar que se respira no blog, resolvi ter um trabalhão do caralho ao identificar todos os posts autorais relacionados a política e políticos (aí incluído até o Tiririca) e trocar seus marcadores, jogando tudo na “seção “Politicalha”, uma espécie de caixa de gordura ou esgoto primário do blog. As únicas exceções serão os dezénhos e as piadas sem graça que amo fazer. Falou em seriedade? Politicalha; falou em FHC, Temer, Lula, Bozo et caterva? Politicalha!
 
Acredito que essa mudança será benéfica para mim, pois como já ensinavam os algarismos romanos há mais de milânus, “Mens sana in blog sano”.
 
Mas que ninguém espere que o Blogson receba inserções de imagens de florzinhas lindinhas nem de coelhinhos peludos (menos ainda de coelhinhas peladas), pois este é um blog que se dá ao respeito.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

PASSANDO RIDÍCULO NO DÉBITO E NO CRÉDITO

Alguém de sobrenome Marx já disse que “a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Não se foi o Karl, o Groucho ou até mesmo a Patrícia – e não estou nem aí, porque a história que vou contar aconteceu duas vezes, mas revestida do mais absoluto ridículo e sentimento de vergonha. E vou ter de explicar isso.
 
Centenas de anos atrás, quando eu ainda era criança, conheci uma senhora idosa, rica e solteirona, que se apegou ao filho de uma antiga empregada, a quem tratava como filho. Não sei o que aconteceu com esse jovem, mas foi alguma coisa que mereceu que fizesse uma pequena aparição na TV Itacolomi para falar de sua estadia na Febem ou instituição semelhante.
 
No dia e horário em que ele iria surgir na tela de um dos poucos aparelhos existentes então, essa senhora já naturalmente tímida, não se aguentou de tanta vergonha que estava sentindo: deixando apenas os olhos à mostra, escondeu-se atrás da cortina só para ver o sujeito falar. Impossível imaginar situação mais ridícula, concordam? Errado!
 
Ontem minha mulher soltou um “Ai, meu Deus, que coisa ridícula!” e me chamou para ver um vídeo tik tok gravado por uma nossa conhecida, onde aparece de blusa e bandana verde-amarelas, em frente a uma unidade do exército, convidando/convocando amigos e amigas para juntar-se a ela e a outros idiotas que continuam a pedir intervenção militar. Morri de pena dela e vergonha de mim mesmo. Logo ela, uma pessoa que conhecemos há mais de 40 anos, normalmente bem humorada, risonha e que gostava de tocar violão e cantar em festas de família!
 
Nascido e criado em uma família conservadora, religiosa e moralista (apesar das inúmeras traições e corneamentos perpetrados por meu avô materno, filhos e genros), nunca senti vergonha por ser de direita (uma direita bastante moderada, mas sempre direita). Isso agora mudou.
 
Já faz um bom tempo que eu venho dizendo aqui no blog e para quem me escuta "ao vivo e a cores" que defendo as bandeiras econômicas da Direita e as bandeiras sociais da Esquerda. E, sinceramente, nunca vi incoerência nisso. Na prática, eu sempre me vi, sempre me considerei de direita; direita moderadíssima, mas direita. Para ser sincero, também já me apresentei aqui no blog como alguém de centro, às vezes centro-esquerda, às vezes centro-direita.
 
Mas, desde o início do período eleitoral eu tenho sentido vergonha e receio de ser confundido com a matilha da extrema direita. É tanta escória, são tantas as pessoas detestáveis e desprezíveis que se agruparam em torno do Bozo que fica difícil não sentir vergonha de me declarar de direita. E nem preciso dizer os nomes dessa malta, dessa súcia. E tem "de um tudo", desde padre que se recusa a celebrar missa para petistas até ex-cantor de antiga "boy band" e fabricante de fake news. Sem falar nos financiadores dos bloqueios de caminhoneiros. É sério, dá muita vergonha dizer que sou de direita! 
 
Na verdade, diante das recentes notícias divulgadas pela mídia (enforcamento e quase assassinato de criança de sete anos que disse “Lula lá", assassinato de eleitor do Lula, estradas e avenidas bloqueadas por débeis mentais, invasão com direito a agressão de ônibus de estudantes, etc.) o que eu mais tenho sentido é medo mesmo, medo dos jagunços de "terno e gravata" e donos de carrões que ameaçam ou agridem fisicamente quem manifesta apoio ou alegria pela eleição do Lula (ou pela não reeleição do Bolsonaro). Poderia dizer que agem como se fossem capachos ou capangas do Bozo, mas, como têm muitos velhos e velhas no meio, talvez estejam mais para capengas.
 
E me espanta que os inconformados mais radicais continuem a fazer manifestações com pedidos descabidos e de apoio a um sujeito que "o Tribunal Militar definiu, em 1988, como homem que 'revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe'."
 
Então é isso. Depois de ver minha amiga defender risonhamente o retorno do que viveu durante os governos militares, fico tentado a pensar que ela teve seu cérebro lavado e e muito bem enxaguado. E o sabão utilizado seria da marca Brilhante Ustra, aquele que não deixa nenhum sinal de sujeira. Só pode!

 

 

 

 

 

 

 

domingo, 20 de novembro de 2022

MESTRE AURÉLIO ENTRE AS PALAVRAS - RUBEM BRAGA


Como estão cansados de saber aqueles que acessam com mais frequência este blog oportunista e picareta, encontrei uma vez em um site alemão (!) um arquivo com a íntegra do delicioso livro “Duzentas Crônicas Escolhidas” do mestre Rubem Braga. Ele só tinha um defeito: por ter sido escaneado em OCR, a troca de letras ou até de palavras dificultava o envio para os amigos de algumas crônicas que me fizeram até babar de alegria quando as li.
 
Recentemente resolvi encarar o trabalho insano de corrigir todo esse arquivo. Aproveitei também para formatar os textos e monitorar os parágrafos para que ficassem exatamente iguais aos do livro de papel que tenho aqui em casa. Bom, essa missão aproxima-se lentamente do final, pois faltam “apenas” 62 páginas para corrigir, de um total de 231.
 
Pois bem, uma das crônicas recentemente revisadas mostra que dá para fazer humor de qualidade até com palavras do dicionário. E foi isso que me motivou a publicá-la aqui no blog, pois meu recente amigo virtual EcT comentou estar passando a admirar também o Rubem Braga”. Então, Conde, este post é dedicado a você.
 
Mas antes da crônica, preciso contar um caso rápido: às vezes, quando estávamos coçando saco no trabalho, eu e meu falecido colega e amigo Pintão começávamos a fazer comentários idiotas sobre palavras desconhecidas que íamos lendo no Aurélio. Foi assim que eu descobri a palavra “trebelhar”, que significa “brincar, fazer traquinagens”, divertir-se. Disse então a ele (em mais um jogo de palavras jotabélico) que quando não estávamos trabalhando, ficávamos trebelhando. E agora, a crônica:
 
 
 
Ora, resolvi enriquecer o meu vocabulário e adquiri o livro Enriqueça o seu Vocabulário que o sábio Professor Aurélio Buarque de Holanda Ferreira fez, reunindo o material usado em sua página de Seleções.
Afinal de contas nós, da imprensa, vivemos de palavras; elas são nossa matéria–prima e nossa ferramenta; pode até acontecer (pensei eu) que, usando muitas palavras novas e bonitas em minhas crônicas, elas sejam mais bem pagas. Confesso que não li o livro em ordem alfabética; fui catando aqui e ali o que achava mais bonito, e tomando nota. Aprendi, por exemplo, que a calhandra grinfa ou trissa, o pato gracita, o cisne arensa, o camelo blatera, a raposa regouga, o pavão pupila, a rola turturina e a cegonha glotera.
Tive algumas desilusões, confesso; sempre pensei que trintanário fosse um sujeito muito importante, talvez da corte papal, e mestre Aurélio afirma que é apenas o criado que vai ao lado do cocheiro na boléia do carro, e que abre a portinhola, faz recados, etc. Enfim, o que nos tempos modernos, em Pernambuco, se chama "calunga de caminhão”. E sicofanta, que eu julgava um alto sacerdote é apenas um velhaco. Cuidado, portanto, com os trintanários sicofantas!
Aprendi, ainda que Anchieta era um mistagogo e não um arúspice, que os pelos de dentro do nariz são vibrissas, e que diuturno não é o contrário do noturno nem o mesmo que diário ou diurno, é o que dura ou vive muito. Latíbulo, gigajoga, julavento, drogomano, algeroz... tudo são palavras excelentes que alguns de meus leitores, talvez não conheçam, e cujo sentido eu poderia lhes explicar, agora que li o livro; mas vejo que assim acabo roubando a freguesia de mestre Aurélio, que poderia revidar com zagalotes, ablegando-me de sua estima e bolçando-me contumélias pela minha alicantina de insipiente. Até outro dia, minhas flores.
Fevereiro, 1966

 

 

sábado, 19 de novembro de 2022

ENRREDADO NAS REDES SOCIAIS

 
Eu sou de um tempo em que redes sociais poderiam ser consideradas aquele momento em que os pescadores vindos do mar começavam a puxar suas redes de pesca e todo mundo que estivesse por perto na praia podia ajudar, só por diversão. Por isso, tenho muita dificuldade para entender e assimilar a tecnologia digital que se espalhou cada vez mais rapidamente pelo mundo.
 
Graças a essas redes sociais descobri, por exemplo, que a terra pode ser plana. Claro, desde que sejam utilizados moto-escavo-transportadores, equipamentos de construção pesada também conhecidos por motoscrapers. A terra fica planinha, planinha!
 
Outra coisa que descobri é que as vacinas são um perigo, especialmente se desenvolvidas em tempo recorde graças à altíssima tecnologia de ponta utilizada. Muito melhor é tomar chazinhos e esperar que o organismo reaja dignamente.
 
Graças a essa minha ignorância otávica (um de meus antepassados homens do sexo masculino chamava-se Otávio), fiquei sem reação ao descobrir que Elon Almíscar tinha comprado o Twitter, um negócio aparentemente mal cheiroso e desagradável, provocando medo de demissão nos funcionários demitidos e insegurança em seus usuários.
 
Para ser sincero, eu não faço a mínima ideia para que serve o Twitter. Fico pensando que só mesmo para divulgar fake news e mentirinhas inocentes, porque mentira tem perna curta, característica que combina muito bem com os anêmicos 280 caracteres disponíveis.
 
Mas uma coisa ficou patente (devidamente registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial): com receio de mudanças radicais nesse aplicativo provocadas pelo novo dono, muitos usuários medrosos correram a se cadastrar e criar perfis no Koo, genérico de origem indiana do Twitter, porque, como todo mundo sabe, quem tem Koo tem medo.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

BLUES EN LA BARCA

 
Meu amigo virtual Marreta "ressentiu-se" de um comentário que fiz ironizando seu gosto musical "duvidoso" e mesmo eu não sendo da PRF e seu nome seja Ricardo e não Roberto, jogou duas granadas de efeito imoral na minha direção. Confesso ter sido atingido por dois estilhaços, mas, em vez do sangue jorrar o que caiu foi baba de alegria, pois os "estilhaços" são duas supimpíssimas sugestões musicais, executadas por dois grupos totalmente desconhecidos para mim e com estilos totalmente opostos: um grupo provavelmente latino-americano (e que tem até "sonfona") cantando boleros e um power trio (de BH?) mandando um blues pra lá de bom, com aquele baixão de respeito dando apoio a uma guitarra frenética. Aí não deu outra, os links dos dois grupos estão à disposição dos interessados. Apenas chamo a atenção para o bolero "La Barca", o mais lindo já composto até hoje e também para a habilidade das bailarinas, provando que dançar de rosto colado é uma das coisas mais gostosas que existem. E põe gostosas nisso!
 



MAIS DO MESMO

 
Como há muito tempo eu não conto algum caso, resolvi espremer o cérebro para desovar mais um, mesmo com receio de já tê-lo escrito aqui. Mas é tão bizarro e ridículo que vale a pena correr o risco da eventual repetição. O caso é o seguinte:
 
Já disse que quando comecei a namorar minha mulher havia na rua da casa de seus pais uma gangue de adolescentes e pré-adolescentes aloprados e engraçadíssimos, com idade variando entre onze e dezesseis anos. Era um bando de pelo menos vinte delinquentes do bem.  Como acontece com grupos numerosos, alguns se deram bem na vida, a maioria ficou na faixa “remediada” e pouquíssimos ficaram na merda mais absoluta. E a história de hoje é com um desses “born losers”, daquele tipo que "um chato de um querubim deteminou que estava predestinado a ser errado assim". Dito de forma menos poética e mais vulgar, um sujeito cagado de nascença.
 
Creio que foi na década de 1990 que fiquei conhecendo sua tia. Era uma senhora sarcástica, amarga, que talvez tivesse tido uma vida boa, mas, quando a conheci era praticamente uma inválida, pois tinha algum problema circulatório nas pernas super inchadas, talvez consequência de diabetes ou outra coisa qualquer. Ela parecia gostar de mim e da atenção que dava a ela (como já disse algumas vezes, eu era o rei dos velhinhos e da velhinhas, pois todos me elogiavam e gostavam do meu perfil de “filho atencioso” – mesmo que eu não fosse nada disso).
 
E foi através dela que fiquei sabendo da vida de privações e tropeços de seu sobrinho. Era filho de pai solteiro, um pai irresponsável com quem vivia em uma casa velha e mal cuidada, localizada na mesma rua onde morava minha namorada. Esse jovem tinha um olhar tristonho, uma permanente aparência de subnutrido e andava como quem está sempre bêbado (mesmo que não estivesse).
 
Pela falta de instrução e de alguém para orientá-lo ou dar suporte, resolveu empresariar e ganhar dinheiro sem fazer muito esforço. A ideia foi abrir uma representação de peças automotivas. Aliás, uma só não, várias. Parece que à medida que ia tendo problemas financeiros abria nova empresa, provavelmente pegava novos empréstimos e ia criando uma bola de neve de dívidas e inadimplência crescente.
 
A tia provavelmente aconselhava, “puxava sua orelha” (de abano), mas talvez sem nenhum sucesso. Até o dia miraculoso em que ele disse não ter mais nenhuma dívida em seu nome. A tia, entre espantada e feliz perguntou o que tinha feito para conseguir essa proeza. O diálogo a seguir é como me lembro de ter ouvido dessa senhora:
 
- Eu mudei de nome.
- O quê?
- É, eu fui ao Espírito Santo e tirei nova documentação com outro nome. Agora eu não me chamo mais “Eusébio” (nome fictício).
- Seu filho da puta!!!!! Já não bastou sujar seu nome? Tinha de enlamear sua família nessa loucura? Você vai agora mesmo corrigir essa semvergonhice!
- Mas, tia...
- Tia nada, seu desgraçado! Você vai corrigir essa loucura ou nunca mais ponha os pés nesta casa, que é de gente pobre mas honesta!
 
E por que eu me lembrei desse caso? Pelas mudanças que acontecem no mundo político. Outro dia estava tentando me atualizar e descobri que vários partidos mudaram de nome. Mas fica a dúvida: para que mudar de nome se a essência continua a mesma? Seria para confundir os eleitores? Talvez a solução para esse meu conhecido fosse se filiar a um desses partidos, em vez de abrir e fechar empresas. Poderia até ajudar na escolha de outros nomes, porque experiência em mudanças do tipo mais do mesmo ele tem!

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

SOCIALIZANDO

 
Eu descobri o blog “A Marreta do Azarão” ainda na primeira infância deste meu blog mambembe e desconjuntado. E o que me atraiu nele foi o sarcasmo refinado e a ironia de ótima qualidade dos textos publicados. Por isso e só por isso passei a acessá-lo diária ou quase diariamente. Já publiquei vários textos escritos por ele (ele é um ótimo poeta), mas passo rapidinho pelas fotos de jovens de seios gigantescos ou casais homoafetivos do sexo feminino. Nada contra ele publicar o que quiser, pois o blog é dele e ninguém tem nada com isso, apenas não me sinto atraído por essas imagens.
 
Por outro lado, ele também gostou das tranqueiras que publiquei no Blogson, chegando até a postar alguma coisa no “Marreta”. O que sei é que ele acabou sendo uma espécie de atacadista do blog, um fornecedor de novos leitores, pois treze dos atuais quatorze seguidores – que prefiro identificar como amigos virtuais (pois “seguidor” é uma expressão muito pedante e antipática) – aterrisaram no blog direta ou indiretamente por sua influência e pela visibilidade que proporcionou a este blog da solidão ampliada.
 
Você deve estar se perguntando “o que eu tenho com isso?” e está certo em perguntar. Por isso, vou direto ao ponto: eu não me limito a ler o que o Marreta escreve, eu também leio o que comentam seus leitores. E foi por isso que você caiu no meu radar, ao dizer que tinha gostado de um comentário que eu fiz. Comecei a perceber pelos longos comentários que faz que deve ser um cara do bem, um sujeito bom para conversar, trocar ideias, falar besteiras. Mas não sabia como manter contato até alguém perguntar se você possuía um blog, pergunta respondida pelo Marreta, ao dizer que tem dois. Por isso, resolvi incluir um deles na lista de blogs do Blogson Crusoe. E um dos motivos (acredite se quiser!) é para equilibrar as opiniões sobre política e comportamento, pois o Marreta e o Ozymandias são nitidamente conservadores, enquanto o Ex-Estranho e o seu  Socializando parecem estar (essa é a impressão) no outro prato da balança.
 
Você é jovem, eu sou velho (72 anos); você é gay (assim entendi), eu sou hetero; você tem livros publicados, eu morro de vontade de publicar pelo menos um; você deve ter muitos sonhos, eu já tive os meus; você tem 34 seguidores, eu tenho 14 amigos virtuais; eu defendo as bandeiras sociais da Esquerda e as bandeiras econômicas da Direita, você defende o que quiser.
 
A inclusão do “Socializando” na minha lista de blogs provavelmente não trará nenhum benefício ou ganho para você, mas traz uma expectativa positiva para mim, pois quero ver a balança se mexendo. Por isso é que eu resolvi escrever este texto, como uma espécie de convite para – obviamente se quiser – comentar alguma coisa que leu aqui. Mas se desejar manter distância deste blog é só falar.

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

EXTRA, EXTRA!

 
Recentemente li esta manchete no portal do jornal Estado de Minas: “Bolsonaristas enfrentam tempestade em Brasília e pedem ajuda a Deus”
 
Segundo a reportagem, um grupo de idiotas acampados em frente ao quartel general do exército foi surpreendido por um temporal que causou o maior cu de gato no acampamento, derrubando barracas, etc. Os inconformados com o resultado das eleições começaram então a orar para que Deus os protegesse. Essa é a síntese da notícia.
 
Na minha opinião de teólogo amador com curso feito por correspondência, talvez tenha sido o próprio Deus quem promoveu a zorra toda, só para desarmar os espíritos e lavar o ódio do coração e da cabeça dos encharcados (faltou xampu). Outra explicação talvez esteja naquele ditado popular que diz:
 
"Conversa de puta Deus não escuta”.
 

SOBRE O AMOR, DESAMOR... – RUBEM BRAGA

 
Chega a notícia de que um casal de estrangeiros, nosso amigo, está separando. Mais um! É tanta separação que um conhecido meu, que foi outro dia a um casamento grã-fino, me disse que, na hora de cumprimentar noiva, teve a vontade idiota de lhe desejar felicidades “pelo seu primeiro casamento”.
E essas notícias de separação muito antes de sair nos jornais correm com uma velocidade espantosa. Alguém nos conta sob segredo de morte, e em três ou quatro dias percebemos que toda a cidade já sabe - e ninguém morre por causa disso. Uns acham graça em um detalhe ou outro. Mas o que fica, no fim, é um ressaibo amargo – a ideia das aflições e melancolias desses casos.
***
Ah, os casais de antigamente! Como eram plácidos e sábios e felizes e serenos... (Principalmente vistos de longe. E as angústias e renúncias, e as longas humilhações caladas? Conheci um casal de velhos bem velhinhos, que era doce ver – os dois sempre juntos, quietos, delicados. Ele a desprezava. Ela o odiava.)
***
Sim, direis, mas há os casos lindos de amor para toda a vida, a paixão que vira ternura é amizade. Acaso não acreditais nisso, detestável Braga, pessimista barato? E eu vos direi que sim. Já me contaram, já vi. É bonito. Apenas não entendo bem por que sempre falamos de um caso assim com uma ponta de pena. ("Eles são tão unidos, coitados.") De qualquer modo, é mesmo muito bonito; consola ver. Mas, como certos quadros, a gente deve olhar de uma certa distância.
“Eles se separaram" pode ser uma frase triste, e às vezes nem isso. “Estão se separando” é que é triste mesmo.
***
Adultério devia ser considerado palavra feia, já não digo pelo que exprime, mas porque é uma palavra feia. Concubina também. Concubinagem devia ser simplesmente riscada do dicionário; é horrível.
Mas do lado legal está a pior palavra: cônjuge. No dia em que uma mulher descobre que o homem, pelo simples fato de ser seu marido, é seu cônjuge, coitado dele.
***
Mas no meio de tudo isso, fora disso, através disso, apesar disso - há o amor. Ele é como a lua, resiste a todos os sonetos e abençoa todos os pântanos.
Setembro, 1957


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