Gilgamesh chorou amargamente por seu amigo
Enkidu. Ele errou pelas matas como um caçador e vagueou pelas planícies. Em sua
tristeza ele gritou: "Como posso descansar, como posso ficar em paz? O desespero
se instalou em meu coração. Isso que meu irmão é agora, o mesmo serei eu quando
morrer. Por medo da morte farei o possível para encontrar Utnapishtim, a quem
chamam o Longínquo, pois ele se juntou à assembléia dos deuses." Gilgamesh
então correu o mundo selvagem; vagou pelos campos e pastos numa longa jornada
em busca de Utnapishtim, a quem os deuses acolheram após o dilúvio e instalaram
na terra de Dilmum, no jardim do sol; e somente a ele, entre todos os homens,
os deuses concederam a vida eterna.
A noite, chegando ao desfiladeiro da
montanha, Gilgamesh rezou: "Neste desfiladeiro, há muito tempo atrás,
encontrei leões. Tive medo e elevei meu olhar para a lua. Eu rezei e os deuses
escutaram minha prece; por isso agora, oh, Sin, deus da lua, protegei-me."
Após a oração, ele se deitou para dormir, até ser acordado de um sonho. Ele se viu
rodeado de leões que se regozijavam de estarem vivos; tomou então o machado nas
mãos, sacou a espada de seu cinturão e se lançou sobre eles como uma flecha
disparada por um arco. Ele golpeou as feras, matou-as e dispersou-as.
Finalmente Gilgamesh chegou a Mashu, as
grandes montanhas que guardam o nascer e o pôr do sol e sobre as quais ele
havia ouvido muitas histórias. Seus picos são gêmeos e da altura das muralhas
do céu; suas encostas descem até o mundo inferior. Os Escorpiões vigiam sua entrada.
Eles são metade homem e metade dragão; sua fama inspira terror, seu olhar é
mortal aos homens e o brilho tremeluzente que deles emana varre as montanhas
que guardam o nascer do sol. Ao vê-los, Gilgamesh protegeu os olhos, mas apenas
por alguns momentos; ele então tomou coragem e se aproximou. Vendo-o com um ar
tão impávido, o Homem-Escorpião gritou para seu
companheiro: "Este que ora se aproxima tem a carne dos deuses." Seu
companheiro respondeu: "Ele é dois terços deus, mas um terço homem."
Ele então gritou para o homem Gilgamesh, ele
gritou para o filho dos deuses: "Por que fizeste tão longa jornada? Por
que viajaste de tão longe, cruzando os perigosos mares? Dize-me a razão de tua
vinda." Gilgamesh respondeu: "Por Enkidu, a quem muito amava. Juntos enfrentamos
todos os tipos de dificuldade. Por causa dele eu vim, pois caiu vítima do destino
que assola os homens. Chorei por ele noite e dia e me recusava a entregar seu
corpo para o funeral. Pensei que meu pranto fosse trazê-lo de volta. Desde sua
partida minha vida deixou de ter sentido; por isso viajei até aqui em busca de
Utnapishtim, meu pai; pois diz-se que ele se juntou aos deuses e que encontrou
a vida eterna. Desejo fazer-lhe algumas perguntas com relação aos vivos e os
mortos." O Homem-Escorpião abriu a boca e disse, falando a Gilgamesh: "Nenhum
homem nascido de mulher fez o que tu pedes, nenhum mortal jamais entrou na
montanha. Ela se estende por doze léguas de escuridão; não há luz em seu
interior e o coração se sente oprimido pelas trevas. Do nascer ao pôr do sol,
não há nada além de escuridão." Gilgamesh disse: "Embora seja para
mim um caminho de tristeza e dor, de gemidos e lágrimas, ainda assim devo
tomá-lo. Abri o portão da montanha." E o Homem-Escorpião disse: "Vai,
Gilgamesh. Permitirei que atravesses a montanha de Mashu e as elevadas
cordilheiras; que teus pés te levem ao destino em segurança. O portão da
montanha está aberto."
Gilgamesh escutou o que o Homem-Escorpião lhe
disse e seguiu, através da montanha, pela estrada do sol até o lugar de seu
nascente. Depois de caminhar por uma légua, a escuridão se intensificou ao seu redor,
pois não havia mais luz; ele não conseguia enxergar nada, nem o que estava à
frente nem o que estava atrás. Depois de duas léguas a escuridão era intensa e
não havia luz; ele não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o
que estava atrás. Depois de três léguas a escuridão era intensa e não havia
luz; ele não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o que
estava atrás. Depois de quatro léguas a escuridão era intensa e não havia luz;
ele não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o que estava
atrás. Ao final de cinco léguas a escuridão era intensa e não havia luz; ele
não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o que estava atrás.
Ao final de seis léguas a escuridão era intensa e não havia luz; ele não
conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o que estava atrás.
Depois de percorrer sete léguas a escuridão era intensa e não havia luz; ele
não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o que estava atrás.
Depois de percorrer oito léguas, ele soltou um grande grito, pois a escuridão
era intensa e ele não conseguia enxergar nada, nem o que estava à frente nem o
que estava atrás. Depois de nove léguas, ele sentiu o vento norte em seu rosto,
mas a escuridão era intensa e não havia luz; ele não conseguia enxergar nada,
nem o que estava à frente nem o que estava atrás. Depois de dez léguas, o final
estava próximo. Depois de onze léguas apareceram os primeiros raios da
alvorada. Ao final de doze léguas a luz do sol enfim refulgiu.
Lá estava o jardim dos deuses; por todos os
lados cresciam arbustos carregados de pedras preciosas. Ao vê-los, ele
imediatamente se aproximou, pois havia frutas de cornalina pendendo de uma
parreira, lindas de ver; folhas de lápis-lazúli cresciam em profusão por entre
as frutas e eram doces ao olhar. No lugar dos espinhos e dos cardos encontravam-se
as hematitas e as pedras raras, e mais a ágata e pérolas do mar. Shamash viu
Gilgamesh caminhando pelo jardim à beira do mar, e ele viu que o herói estava
vestido com peles de animais e que se alimentava de sua carne. Isto o
aborreceu, e falando ele disse: "Nenhum mortal jamais tomou este caminho
antes, nem tomará, enquanto os ventos soprarem por sobre os mares." E
virando-se para Gilgamesh ele falou: "Jamais encontrarás a vida que
procuras." Gilgamesh respondeu ao glorioso Shamash: "Então, depois de
errar e me esfalfar pela vastidão selvagem, terei ainda de dormir e deixar que
a terra cubra para sempre a minha cabeça? Que meus olhos fitem o sol até seu
brilho ofuscá-los. Embora não seja melhor que um homem morto, ainda assim
deixai-me contemplar a luz do sol." Ao lado do mar ela vive, a mulher do
vinhedo, a fabricante de vinho. Siduri fica sentada no jardim à beira do mar,
com a tigela e os tonéis de ouro que os deuses lhe deram. Ela está coberta por
um véu e, de onde se encontra, vê Gilgamesh se aproximar, vestindo peles, com a
carne dos deuses no corpo, mas com o desespero no coração. Seu rosto era como o
de alguém que chegou de uma longa jornada. Ela
olhou e, observando com atenção o que se passava a distância, disse para si
mesma: "Trata-se sem dúvida de um criminoso; aonde estará indo?" E
ela fechou o portão com a tranca e passou-lhe o ferrolho. Mas Gilgamesh, ao
ouvir o barulho do ferrolho, lançou a cabeça para a frente e deteve a porta com
o pé. Ele gritou para Siduri: "Jovem fabricante de vinho, por que trancas
tua porta? O que viste que te fez trancar teu portão? Quebrarei tua porta e
arrebentarei teu portão, pois sou Gilgamesh, que capturou e matou o Touro do
Céu. Eu matei o sentinela da floresta de cedro, derrubei Humbaba que vivia na
floresta e matei os leões no desfiladeiro da montanha."
Siduri então disse a ele: "Se és o
Gilgamesh que capturou e matou o Touro do Céu, que matou o sentinela da floresta
de cedro, que derrubou Humbaba que vivia na floresta e matou os leões no desfiladeiro
da montanha, por que tens as faces tão encovadas e o rosto tão abatido? Por que
trazes o desespero em teu coração, e por que teu rosto lembra o de alguém que
chega de uma longa jornada? Sim, por que tua face está queimada pelo calor e
pelo frio, e por que chegas aqui vagando pelos pastos à procura do vento?"
Gilgamesh respondeu-lhe: "E por que meu
rosto não haveria de estar encovado e abatido? Trago o desespero em meu coração;
meu rosto lembra o de alguém que chega de uma longa jornada e foi queimado pelo
calor e pelo frio. Por que não haveria de vagar pelos pastos à procura do
vento? Meu amigo, meu irmão mais novo, que caçava o asno selvagem e a pantera
das campinas, meu amigo, meu irmão mais novo, que capturou e matou o Touro do
Céu e derrubou Humbaba na floresta de cedro, meu amigo, alguém que me era caríssimo
e que enfrentou muitos perigos ao meu lado, Enkidu, meu irmão, a quem tanto
amava, a morte o alcançou. Chorei por ele durante sete dias e sete noites, até
os vermes tomarem-lhe o corpo. Por causa do meu irmão, tenho medo da morte; por
causa do meu irmão, vagueio pelas matas e pelos campos e não consigo descansar.
Mas agora, oh, jovem que prepara o vinho, já que vi tua face, não permita que
eu veja a face da morte a quem tanto temo."
Ela respondeu: "Gilgamesh, onde vais com
tanta pressa? Jamais encontrarás a vida que procuras. Quando os deuses criaram
o homem, eles lhe destinaram a morte, mas a vida eles mantiveram em seu próprio
poder. Quanto a ti, Gilgamesh, enche tua barriga de iguarias; dia e noite,
noite e dia, dança e sê feliz, aproveita e deleita-te. Veste sempre roupas
novas, banha-te em água, trata com carinho a criança que te tomar as mãos e
faze tua mulher feliz com teu abraço; pois isto também é o destino do
homem."
Mas Gilgamesh disse a Siduri, a jovem:
"Como posso ficar calado, como posso descansar, quando Enkidu, a quem amo,
tornou-se pó, e quando também por mim a morte e a terra esperam? Vives à beira
do oceano e vês o seu interior; dize-me, oh, jovem, como chegar a Utnapishtim, o
filho de Ubara-Tutu. O que preciso saber para chegar até ele? Instruí-me, dize
o que tenho de fazer. Atravessarei o Oceano se isto for possível; se não for,
vagarei por regiões ainda mais desoladas." A fabricante de vinho lhe
disse: "Gilgamesh, não há como atravessar o Oceano; todos os que aqui
vieram, desde os dias de outrora, não conseguiram viajar pelo mar. O Sol em sua
glória atravessa o Oceano, mas quem além de Shamash jamais logrou tal feito? O
lugar é perigoso e a passagem difícil; as águas da morte que por ali correm são
profundas. Gilgamesh, como vais atravessar o Oceano? Quando chegares às águas
da morte, o que farás? Mas, Gilgamesh, no meio da floresta encontrarás Urshanabi,
o barqueiro de Utnapishtim; com ele estão os objetos sagrados, os objetos de
pedra. Ele está talhando a proa do barco em forma de serpente. Observa-o bem.
Se for possível, talvez consigas atravessar as águas do Oceano com ele; se não,
terás de voltar."
Ao ouvir isso, Gilgamesh ficou furioso. Ele
tomou o machado em uma das mãos e sacou o punhal de seu cinturão. Gilgamesh
avançou furtivamente e se atirou como um dardo em cima dos apetrechos do barco.
Então voltou para dentro da floresta e sentou-se. Urshanabi viu o brilho da
faca e escutou o machado, e ficou perplexo, pois Gilgamesh, em sua fúria, havia
destroçado o equipamento da embarcação. Urshanabi disse a ele: "Dize-me,
qual é o teu nome? Sou Urshanabi, o barqueiro de Utnapishtim, o
Longínquo." Ele lhe respondeu: "Gilgamesh é meu nome. Sou de Uruk, da
casa de Anu." Urshanabi perguntou-lhe então: "Por que tens as faces
tão encovadas e o rosto tão abatido? Por que trazes o desespero em teu coração,
e por que teu rosto lembra o de alguém que chega de uma longa jornada? Sim, por
que tua face está queimada pelo calor e pelo frio, e por
que chegas aqui vagando pelos pastos à procura do vento?"
Gilgamesh disse-lhe: "E por que meu
rosto não haveria de estar encovado e abatido? Trago o desespero em meu coração;
meu rosto lembra o de alguém que chega de uma longa jornada e foi queimado pelo
calor e pelo frio. Por que não haveria de vagar pelos pastos à procura do
vento? Meu amigo, meu irmão mais novo, que capturou e matou o Touro do Céu e
derrubou Humbaba na floresta de cedro, meu amigo, alguém que me era caríssimo e
que enfrentou muitos perigos ao meu lado, Enkidu, meu irmão, a quem tanto
amava, a morte o alcançou. Chorei por ele durante sete dias e sete noites, até
os vermes tomarem-lhe o corpo. Por causa do meu irmão, tenho medo da morte; por
causa do meu irmão, vagueio pelas matas e pelos campos. Seu destino pesa sobre
mim. Como posso descansar, como posso ficar em paz? Ele virou pó e também eu
vou morrer e ser enterrado para sempre. Tenho medo da morte; por isso,
Urshanabi, mostre-me o caminho para chegar até Utnapishtim. Se for possível,
atravessarei as águas da morte, se não for, vagarei por regiões ainda mais
desoladas."
Urshanabi disse a ele: "Gilgamesh, foram
tuas próprias mãos que tornaram impossível tua travessia do Oceano; ao
destruíres o equipamento do barco, destruíste também sua segurança." Os
dois então discutiram o assunto e Gilgamesh disse: "Por que estás tão zangado
comigo, Urshanabi? Pois tu mesmo atravessas o mar dia e noite; em qualquer estação
tu o atravessas." "Gilgamesh, estes objetos que destruíste tinham a
propriedade de levar-me por sobre as águas da morte, impedindo-as de tocarem em
mim. Era por esta razão que eu os preservava, mas tu os destruíste, e com eles
liquidaste também as serpentes urnu. Mas vai agora à floresta, Gilgamesh, corta
com teu machado cento e vinte toras de sessenta côvados de cumprimento, pinta-as
com betume, reforça-as com virolas e traze-as de volta para mim."
Ao ouvir isso, ele foi à floresta, cortou
cento e vinte toras de sessenta côvados de cumprimento, pintou-as com betume,
reforçou-as com virolas e trouxe-as de volta para Urshanabi. Eles então subiram
no barco, Gilgamesh e Urshanabi, e o lançaram sobre as ondas do Oceano. Durante
três dias eles singraram o mar com velocidade, percorrendo o equivalente a uma
jornada de um mês e quinze dias. Urshanabi por fim levou o barco às águas da
morte. Ele então disse para Gilgamesh: "Vai em frente, pega uma das toras
e empurra-a para dentro do mar, mas não encostes tua mão na água. Gilgamesh,
pega uma segunda tora, uma terceira, uma quarta. Agora, Gilgamesh, pega uma
quinta, uma sexta e uma sétima tora. Gilgamesh, pega uma oitava, uma nona e uma
décima tora. Gilgamesh, pega uma décima primeira; pega uma décima segunda tora."
Depois de empurrar para dentro d'água cento e vinte toras, Gilgamesh ficou sem
nenhuma. Ele então tirou a roupa e elevou seus braços para cima para servir de mastro,
e usou suas vestimentas como vela. Assim Urshanabi, o barqueiro, trouxe
Gilgamesh até Utnapishtim, a quem chamam o Longínquo e que vive em Dilmun, a
leste da Montanha, no lugar por onde transita o sol. Somente a ele, entre todos
os homens, os deuses concederam a vida eterna.
Enquanto isso, Utnapishtim, confortavelmente
instalado, observava tudo a distância e, dentro de seu coração, meditava:
"Por que o barco navega por aqui sem seu mastro e sem equipamento? Por que
foram destruídas as pedras sagradas, e por que o barco não é conduzido por seu
capitão? Aquele homem que chega não é um dos meus; vejo um homem coberto com
pele de animais. Quem é este que vem pela praia atrás de Urshanabi, pois
certamente que não é um dos meus homens?" Utnapishtim então olhou para ele
e disse: "Qual é o teu nome, tu que chegas vestido de pele de animais, com
as bochechas famintas e o rosto abatido? Aonde vais com pressa? Por que razão fizeste
uma jornada tão longa, atravessando mares cuja passagem é tão difícil? Dize-me
a razão de tua vinda."
Ele respondeu: "Gilgamesh é meu nome.
Sou de Uruk, da casa de Anu." Utnapishtim então disse a ele: "Se és
Gilgamesh, por que tens as faces tão encovadas e o rosto tão abatido? Por que
trazes o desespero em teu coração, e por que teu rosto lembra o de alguém que
chega de uma longa jornada? Sim, por que tua face está queimada pelo calor e
pelo frio, e por que chegas aqui vagando pelos pastos à procura do vento?"
Gilgamesh disse-lhe: "E por que meu
rosto não haveria de estar encovado e abatido? Trago o desespero em meu
coração; meu rosto lembra o de alguém que chega de uma longa jornada e foi
queimado pelo calor e pelo frio. Por que não haveria de vagar pelos pastos à procura
do vento? Meu amigo, meu irmão mais novo, que capturou e matou o Touro do Céu e
derrubou Humbaba na floresta de cedro, meu amigo, alguém que me era caríssimo e
que enfrentou muitos perigos ao meu lado, Enkidu, meu irmão, a quem tanto
amava, a morte o alcançou. Chorei por ele durante sete dias e sete noites, até
os vermes tomarem-lhe o corpo. Por causa do meu irmão, tenho medo da morte; por
causa do meu irmão, vagueio pelas matas e pelos campos. Seu destino pesa sobre
mim. Como posso descansar, como posso ficar em paz? Ele virou pó e também eu
vou morrer e ser enterrado para sempre." Gilgamesh tornou a dizer, falando
a Utnapishtim: "Foi para ver Utnapishtim, a quem chamamos o Longínquo,
que fiz esta jornada. Por isso vagueei pelo mundo, atravessei tantas
cordilheiras perigosas, cruzei os mares e me esfalfei viajando; minhas juntas
doem e há muito que já não sei o que é uma doce noite de sono. Minhas roupas se
esfarraparam antes de chegar à casa de Siduri. Matei o urso e a hiena, o leão e
a pantera, o veado e o cabrito montes, o tigre e todos os tipos de caça, e também as pequenas criaturas dos
pastos. Comi sua carne e vesti suas peles; e foi assim que cheguei ao portão da
jovem fabricante de vinho, que fechou contra mim seu portão de piche e betume.
Mas recebi dela instruções sobre a jornada e cheguei então até Urshanabi, o
barqueiro, com quem atravessei as águas da morte. Oh, pai Utnapishtim, tu que
te juntas à assembléia dos deuses, desejo fazer-te algumas perguntas sobre
os vivos e os mortos: como encontrar a vida que estou buscando?"
Utnapishtim disse: "Não existe
permanência. Acaso construímos uma casa para que fique de pé para sempre, ou
selamos um contrato para que valha por toda a eternidade? Acaso os irmãos que
dividem uma herança esperam mantê-la eternamente, ou o período de cheia do rio
dura para sempre? Somente a ninfa da libélula despe-se da larva e vê o sol em
toda a sua glória. Desde os dias antigos, não existe permanência. Como são
parecidos os adormecidos e os mortos, eles são como um retrato da morte. O que
existe entre o servo e o senhor depois de ambos terem cumprido seus destinos?
Quando os Anunnaki, os juízes do mundo inferior se reúnem com Mammetum,
a mãe dos destinos, juntos eles decidem a sorte dos homens. Eles distribuem a
vida e a morte, mas o dia da morte eles não revelam."
Gilgamesh então disse a Utnapishtim, o
Longínquo: "Olho para ti, Utnapishtim, e vejo que és igual a mim; não há
nada estranho em tuas feições. Pensei que fosse encontrar um herói preparado
para a batalha, mas aqui estás, confortavelmente refestelado. Conta-me a
verdade, como foi que vieste a te juntar aos deuses e ganhaste a vida
eterna?" Utnapishtim disse a Gilgamesh: "Eu te revelarei um mistério;
eu te contarei um segredo dos deuses."