Algum tempo atrás, quando ainda trabalhava,
recebi um e-mail que continha no final, depois da identificação do remetente, uma
frase dramática que era mais ou menos assim: “nós somos o resultado de nossas escolhas”. Lembro-me de que fiquei
muito impressionado e até procurei memorizá-la. O único defeito é que só vim a conhecê-la
já perto de me aposentar. Mas, se você pensar um pouco, verá que ela é
verdadeira.
Ao longo da vida, sempre fazemos escolhas,
lógico. A maioria é de pouca importância ou influência. Algumas, entretanto,
são tão fundamentais que mudam a direção de toda uma vida, mais ou menos como o efeito produzido em um feixe de luz, que se encurva ao passar próximo de um corpo celeste de grande
massa (essa comparação foi feita só para impressionar e encher o saco).
Quando são boas, ótimo; o problema surge quando são idiotas, ou melhor, quando somos idiotas demais. Essa xaropada foi só para introduzir um caso, uma lembrança de um fato rigorosamente verídico que aconteceu comigo, relacionado à escolha de minha profissão.
Quando são boas, ótimo; o problema surge quando são idiotas, ou melhor, quando somos idiotas demais. Essa xaropada foi só para introduzir um caso, uma lembrança de um fato rigorosamente verídico que aconteceu comigo, relacionado à escolha de minha profissão.
A história é a seguinte: quando chegou a
época de prestar vestibular, matriculei-me em um cursinho que era muito, muito
bom. A minha intenção era fazer engenharia, pois meu irmão e dois primos já
estavam fazendo esse curso. Além disso, existia ainda um tio que era engenheiro
civil. Por conta dessa influência, o maria-vai-com-as-outras aqui começou a se
preparar para o exame que aconteceria só no final do ano. E tome física,
química, geometria descritiva, plana e espacial, álgebra, desenho geométrico e
sei lá mais o quê.
Ao voltar das férias de julho, fomos
surpreendidos com a notícia da unificação do vestibular, feita pela UFMG. Isso
significava que todo mundo faria as provas no mesmo dia e que todos fariam
prova de todas as matérias do ensino médio; ou seja, além das matérias já
mencionadas, teríamos que estudar português, biologia, história, geografia e inglês
ou francês. Em compensação, foram excluídas as provas de desenho geométrico e a
temida prova oral. Beleza. Sinceramente, as aulas ficaram bem mais divertidas
com a mudança. Gostei principalmente de biologia e português. Então, como prova
de minha antiguidade, fica claro que prestei o primeiro vestibular unificado da
história da UFMG, com oito provas (uma por dia) realizadas no Mineirão.
O problema surgiu quando se iniciou o período
de inscrição. Os candidatos eram obrigados a ir à reitoria, localizada no
campus da UFMG (longe pra caramba), para pegar uma ficha de inscrição, pagar
taxas e depois voltar com a ficha já preenchida. Até aí tudo normal. A questão
é que essa ficha precisava ser preenchida à mão, com letra de forma, ou
datilografada.
Antes de continuar, preciso voltar a um momento
anterior ao período das inscrições. Como o vestibular havia sido unificado e
poderia optar por qualquer um dos cursos oferecidos, fiquei indeciso na hora de
escolher aquele que pretendia fazer. Minha mãe sugeriu que eu fizesse medicina
(talvez devesse tê-la escutado), mas recusei no ato. As opções pré-selecionadas por mim foram engenharia, arquitetura, economia, administração de empresas e
psicologia. Qual dessas cinco opções seria a mais indicada?
Foi aí que o bicho pegou e a roda do destino
começou a se movimentar. De cara, descartei arquitetura, pois sentia não ter a
criatividade necessária para ser um bom profissional. Essa foi a única escolha baseada
apenas no bom senso. Depois, foi a vez de riscar psicologia, pois (olha a merda
começando a acontecer) como já estava com a cabeça meio dançada acreditei que
talvez não fosse uma boa mexer ainda mais com meu cérebro (sem comentários).
Restavam três opções e a próxima a ser detonada foi administração. A explicação é patética e digna de pena, mas verdadeira: eu acreditava que o administrador deveria necessariamente ser dono de empresa ou filho do dono de uma!!!!!!! (Eu não era muito ignorante, eu era mais que isso, eu era retardado mental para pensar uma idiotice dessas!)
Sobravam, portanto, engenharia e economia. E
foi aí que chegou o momento de preencher a ficha. Meu pai tinha uma máquina de
escrever e o boçal aqui, para não escrever com letra de forma, colocou a ficha
na máquina. Comecei a “catar milho”, datilografando com um dedo apenas. Estava
indo tudo bem até chegar ao campo onde precisava indicar o curso pretendido.
Comecei lentamente a digitar “ENG”... e parei. Fiquei puto com essa
escolha, uma escolha que já havia feito na infância graças à influência de meu
tio. Eu queria ser igual a ele e “projetar” casas (engenheiro não
projeta casas, pois isso é atribuição de arquiteto). Naquele instante, resolvi
que queria mesmo era estudar economia (que eu nem sabia exatamente o que era). Peguei uma
daquelas borrachas de duas cores e tentei apagar as letras “NG”, mas o papel,
que era uma espécie de cartolina, começou a levantar aquela “penugem” de folha
rasurada. Mas no modelo estava impressa essa advertência: “esta ficha não pode ser rasurada”.
Fiquei alguns instantes olhando a filha da puta daquela ficha – que ficaria rasurada se eu teimasse em continuar a atacá-la com a borracha. Se isso acontecesse, eu precisaria voltar à reitoria para pegar outra ficha. Mas, sabe como é, a reitoria era longe, eu precisaria pegar dois ônibus, gastaria muito tempo, ficaria de saco cheio, etc., etc. Então tomei uma das grandes decisões da minha vida, uma escolha que determinaria meu futuro profissional e boa parte da minha vida como um todo: – "quer saber de uma coisa? Foda-se, fica engenharia mesmo!”
Com o bom senso que eu demonstrei ter, se tivesse cursado economia poderia até, quem sabe, ter virado um ministro da fazenda de viés heterodoxo de algum governo populista (duh!), mas acabei só engenheiro mesmo.
Essa história apenas comprova que existem escolhas tão decisivas para o futuro de uma pessoa, que precisam ser muito bem refletidas, calmamente estudadas, pesados todos os prós e os contras antes da decisão final. Mais ou menos assim como eu fiz...
Fiquei alguns instantes olhando a filha da puta daquela ficha – que ficaria rasurada se eu teimasse em continuar a atacá-la com a borracha. Se isso acontecesse, eu precisaria voltar à reitoria para pegar outra ficha. Mas, sabe como é, a reitoria era longe, eu precisaria pegar dois ônibus, gastaria muito tempo, ficaria de saco cheio, etc., etc. Então tomei uma das grandes decisões da minha vida, uma escolha que determinaria meu futuro profissional e boa parte da minha vida como um todo: – "quer saber de uma coisa? Foda-se, fica engenharia mesmo!”
Com o bom senso que eu demonstrei ter, se tivesse cursado economia poderia até, quem sabe, ter virado um ministro da fazenda de viés heterodoxo de algum governo populista (duh!), mas acabei só engenheiro mesmo.
Essa história apenas comprova que existem escolhas tão decisivas para o futuro de uma pessoa, que precisam ser muito bem refletidas, calmamente estudadas, pesados todos os prós e os contras antes da decisão final. Mais ou menos assim como eu fiz...
(19/01/2015)
Entre fazer economia e entrar pro PT ou fazer engenharia, eu acho que a sua escolha foi muito boa. Até porque, modéstia à parte, é o curso que escolhi também.
ResponderExcluirEu nunca quis entrar pro PT (minha insensatez nunca chegou a esse nível)!
ExcluirO que eu quis dizer foi que pela minha irresponsabilidade eu bem que poderia ser um ministro da Fazenda de governo petista (mais especificamente, do governo anterior).