segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

NEM SEI QUE TÍTULO DAR A ISSO

Entre 2008 e 2011(!), fizemos uma mega reforma aqui em casa. Minha mulher sempre diz que eu falo demais, explico demais. Talvez ela tenha razão; mas, para contar um diálogo idiota que às vezes eu mantinha com os operários aqui em casa, eu preciso explicar o que me motivava, qual a utilidade dessas conversas.

Nessa reforma, trocamos o diabo a quatro, quebramos pisos, paredes e um zilhão de coisas (inclusive e, principalmente, as finanças dos proprietários), desmanchamos metade da casa (isso é real) sem nos mudarmos para outro imóvel (atitude zen, digna de monge budista). Durante a reforma, 21 caçambas foram cheias com material de demolição (não é nada, não é nada, isso representa 100 m³ de entulho!).

Falei disso para dar uma ideia da trabalheira e dos inevitáveis aborrecimentos com pedreiros, ajudantes, encanadores, e outros, pouco acostumados a dispensar aos detalhes o cuidado que nós, portadores de TOC, esperávamos. E foram várias as trocas de pedreiro que fizemos, até encontrarmos um que atendeu 99% dos nossos pedidos e aporrinhações. Esse sujeito demonstrava ter prazer no que fazia, na qualidade espantosa que alcançava. Trabalhando tão bem, honrou sem saber a memória dos primeiros operários utilizados na construção de Belo Horizonte, no final do século XIX e início do século XX.

Até onde sei, a mão de obra utilizada na construção dos magníficos prédios públicos e casario desse período era constituída de imigrantes espanhóis e portugueses altamente capacitados. Era a época dos “mestres de obra” e dos “oficiais” – designação utilizada para os operários especializados (pedreiros, marceneiros, canteiros, etc.). Imagino que esse pessoal tinha muito orgulho do que construía, tal a beleza e qualidade que se observa nessas edificações e em seus inúmeros detalhes – frisos, cornijas, frontões e todo tipo de acabamento rebuscado, com seus nomes sonoros e de significado esquecido (ou desconhecido).

Pois bem, esse apuro na execução, essa experiência trazida pelos imigrantes foi pouco a pouco sendo esquecida ou abandonada, empurrada pela pressa e desejo de reduzir custos. Inventaram até um “reboco paulista” (seria uma técnica inventada por lá ou uma referência à correria em que vive a paulistada?): em lugar do revestimento feito em duas etapas com argamassa de cal e areia (ou cimento, cal e areia), que proporcionava um acabamento esmerado e sem trincas, começou-se a utilizar o “reboco paulista”, à base de cimento e areia, executado em uma única etapa e que sempre trinca (é, acabei fazendo quase uma dissertação sobre construção de edifícios. É difícil). 

Pois bem, voltando à reforma, para conseguir que fizessem um ótimo acabamento, eu tentava sensibilizar os operários contando esses casos (na prática, o que eu fazia era pagar para que eles ficassem coçando saco enquanto me ouviam). E como muitos eram evangélicos (nada contra!), eu apelava para um belo sofisma, assim reproduzido:

-   Deus é perfeito, não é?

-   Claro!

-   Blá, blá, blá, você concorda comigo em que a perfeição está nos arremates bem feitos, nos detalhes?

-   Ahã... (olhar meio desconfiado)

-   Então, pensa bem, Deus está nos detalhes, você não acha?

-   É... (sorriso sem graça e vontade provável de me mandar à merda).

Quem leu até aqui deve ter intimamente concordado com os operários. Pode ser, mas é fato que encontramos questões metafísicas sofisticadas em coisas aparentemente sem importância. Por exemplo, a pergunta “cachorro que late n’água, late em terra?” nunca foi satisfatoriamente respondida. 

E já que a questão proposta acima nos remete à dicotomia existente entre água e terra, pode-se afirmar que, mesmo que fale mais que pobre na chuva, Jotabê no seco anda

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