quinta-feira, 14 de setembro de 2023

AO MESTRE, COM CINISMO

 
Mesmo não sendo minha intenção, serei um pouco cínico ao comentar seu pertinentíssimo artigo publicado no blog "A Marreta do Azarão". Porque eu vejo o seguinte cenário (se quiser pode trocar por quadro negro ou telão com data show):

Quando ainda solteiro, meu filho mais velho tinha um papel pregado em um quadro de avisos sobre sua cama, com a seguinte frase: “trate bem o nerd de sua sala pois um dia ele será o seu patrão”. Acho que a coisa começa por aí.
 
Infelizmente a proporção de alunos interessados em aprender alguma coisa em sala de aula é infinitamente menor que a parcela dos que apenas “cumprem tabela”. A diferença entre o que dizem acontecer nas salas de aula e o que eu vivi e testemunhei é apenas um mínimo de respeito pela figura do professor que existia no meu tempo de escola.
 
A choldra, a escória, a patuleia, os insensatos, os ignorantes e todo tipo de gente mal informada que se forma ontem, hoje e provavelmente sempre abastecerá as pontofrios da vida, as agências de automóveis usados, os carrinhos de pipoca nas praças públicas, os trailers de sanduiche, as cozinhas dos restaurantes, as equipes de limpeza dos vestiários das escolas onde eventualmente estudaram, os artistas de rua com seus malabares nos semáforos, os desocupados, os cachaceiros, os vendedores de drogas e todo tipo de atividade humana em que o conhecimento adquirido nos bancos escolares não seja necessário ou exigido – esse povo nunca se preocupou nem se preocupará em aprender nada, pois não consegue ver utilidade no que os professores tentam ensinar.
 
Por isso, eu tenho três sugestões:
- Como dizia um sujeito com quem trabalhei, “está na hora de chamar o cabo corneteiro e mandar tocar o toque de foda-se”. Ou, usando a letra de uma música chatinha, Don't worry, be happy" OU
 
- Tente arrumar emprego em escolas particulares de elite (onde, aparentemente, conviverá com pessoas mais interessadas em aprender) OU
 
- Adote em suas salas o critério da escola Summerhill da Inglaterra. Lá os alunos decidem o que querem aprender. Essa experiência pedagógica foi narrada no livro publicado na década de 1970 “Liberdade sem medo”. Lembro-me de ter lido algumas partes e me encantado com o método que era utilizado (eu sou um sonhador).
 
Creio que foi o Glauber Rocha quem disse que cinema se faz com “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. Ele nunca imaginou como estava sendo presciente ao fazer esta afirmação!
 
Porque, venhamos e convenhamos, em um mundo onde um ou uma “influencer” com um smartphone na mão ganha rios de dinheiro proporcionalmente aos seguidores que consegue atrair dizendo ou exibindo banalidades, alguém está preocupado em aprender sobre fotossíntese ou a resolver uma equação de segundo grau? Não mesmo! O que todo mundo quer é grana. E se você convencê-los de  que é isso que terão condições de obter, o trabalho estará feito.

7 comentários:

  1. Não entendi a primeira parte do seu comentário. Para mim ele guarda uma coerência muito grande entre os textos que pensa e escreve, mas só leio o que me interessa (creio que todo mundo é assim).

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  2. Que estranho! Isso nunca aconteceu comigo.

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  3. Caro Marreta, não sei se leu o texto acima, inspirado em seu post-desabafo, mas deixo claro que me compadeço de você viver nesse ambiente trágico, tóxico. A questão que se coloca é se vale a pena gastar energia com uma situação que você não controla. As soluções que propus acima são cínicas mas bem intencionadas. Concordo também com o Fabiano quando diz para deixar de se preocupar com a esquerda, pois o que há, seja certa ou errada é uma proposta pedagógica. Se está errada, a ruína da educação mais cedo ou mais tarde acontecerá (ou já aconteceu). Lembre-se que uma ótima forma de controle é manter um grupo incapaz de discernir e criticar o que vê de errado. Arrisco-me a dizer que o desmonte da educação começou na triste época dos generais, pois o que teve de censura, perseguição, prisão e exílio de professores, alunos e intelectuais "reclamões" não estava no gibi. Claro que isso se traduzia em uma proposta também "peidagógica".
    Por mim, o ensino básico deveria ser focado apenas nas ciências exatas, biológicas e estudo de línguas. Obviamente o pessoal de humanas pode até zurrar ao ouvir este comentário sincero, mas vejo como complemento a experiência de Summerhill ("que você deseja estudar?"). Assim, história, geografia, filosofia, artes e matérias do gênero deveriam ser deixadas para o aluno escolher se quer ou não (olha eu com uma proposta peidagógica particular!). Porque a evolução dos costumes aconteceu e acontecerá sempre com ou sem a interferência de uma ideologia. E essa maior liberdade ou licensiosidade se refletirá dentro da sala de aula. Você acabará tendo um infarto se não conseguir se equilibrar nessa corda bamba. Eu fui aluno (você também, claro) e sei que a maioria está pouco se lixando para o que os professores tentam ensinar. Eu sempre fui o aluno que você talvez adorasse ter, eu me desligava totalmente quando a matéria não me interessava. Agia mecanicamente, era um zumbi silencioso dentro da sala de aula. Na faculdade, ao descobrir que poderia sair de sala sem maiores problemas, eu atingi o ponto de NUNCA ter assistido a uma aula de "Portos, Canais e Vias Navegáveis". e foi a única matéria em que passei com a nota máxima (obrigado, colegas!). Não dê murro em ponta de faca! Ou tente se candidatar a vereador ou deputado para denunciar o que vê de ruim nas práticas educacionais adotadas hoje. Este complemento foi colocado como comentário em seu blog. Abraços.

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    1. Essas experiências como a de Summerhill, ou a Escola da Ponte, em Portugal, são grandes furadas, e logo os próprios países a tentarem veem o fiasco e voltam ao tradicional; vide mais recentemente a Suiça dizendo que a adoção de material digital está criando uma geração de alunos semianalfabetos e retornando ao bom e velho livro de papel.
      Uma vez, nas páginas amarelas da Veja, isso lá na década de 1980 (eu nem imaginava que um dia eu seria professor), um educador israelense disse algo de que me lembro até hoje : a escola não tem que dar o que o aluno quer, tem que dar o que o aluno precisa. Primeiro, ele tem que aprender o básico. Como ele vai dizer que algo não lhe servirá de nada na vida se ainda nem o aprendeu? Além do mais, conhecimento não ocupa espaço.
      Isso do aluno estudar o que ele quiser requer uma maturidade que nem mesmo a maioria dos adultos possuem, que dirá um adolescente. O adolescente tem que ser guiado, direcionado; salvo, claro, raríssimas exceções.
      Ligar o foda-se? Seria fácil. Mas acontece que somos cobrados a dar o conteúdo pela coordenação. Se eu pudesse entrar numa sala que não quer porra nenhuma e coçar o saco, eu faria com grande prazer, mas somos vigiados e cobrados, ainda mais agora que nossos registros de aula não são mais naqueles diários de papel e sim numa plataforma digital. Somos monitorados a cada minuto em que estamos em sala de aula.
      Escolas particulares? Com a grande profusão delas nas últimas duas décadas, tem escola particular pagando menos que o que eu ganho no Estado hoje, depois de 25 anos de carreira, e ainda temos que dar bom-dia e sorrir pro diretor, ir aos sábados, fazer graça pra pai de aluno. Tô fora.

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  4. Aí ficou difícil mesmo. Você está em um cativeiro digital com feras verdadeiras te rondando.

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