As músicas italianas e as músicas francesas
fizeram muito sucesso por aqui na década de 1960. Tocavam no rádio, fizeram
surgir covers (o Jerry Adriani foi um que começou cantando só música italiana), etc.
Minha
mulher ama essas melodias. A que ela mais gosta é "Hier Encore",
composta e gravada em 1964 ("tinha eu quatorze anos de idade...") pelo francês de origem armênia Charles
Aznavour (conhecido nas rodas de samba por Shahnour Varinag Aznavourian).
A letra melancólica
e depressiva talvez fosse super indicada para a seção "Que fossa, heim,..." do
blog "A Marreta do Azarão". Essa música fez tanto sucesso que
acabou ganhando uma versão em inglês gravada pelo próprio
Aznavour, com o título "Yesterday
when I was young".
Alguém poderia se
perguntar por que um cara (ainda) beatlemaníaco se interessaria em postar a
letra e o link de uma música tão antiga, da época de sua adolescência. Ainda por cima, francesa e nada parecida com um rock. A resposta é
simples: no enterro de um conhecido nosso, alguém fez um comentário sobre
imortalidade e a percepção da finitude da vida, alguma coisa assim. Até já falei sobre isso em outros posts.
Hoje, por acaso, encontrei um arquivo
contendo a tradução das versões francesa e inglesa dessa música. Pela sintonia
com meu estágio atual, pensei que seria legal lembrar o amigo falecido (que tinha a mesma idade que eu) e homenagear esse francês com sua
música cheia de dramaticidade e desalento. Não tenho hoje a melancolia contida na letra, mas às vezes brinco com pessoas mais jovens que eu (99% do total) ao dizer que também já tive vinte anos. E parece que foi ontem!
(A tradução foi extraída da internet e, para mim, traz várias distorções de imagens e do sentido que o autor deu ao original. Paciência. Depois da letra estão os links da gravação original e da versão em inglês. Vê aí)
(A tradução foi extraída da internet e, para mim, traz várias distorções de imagens e do sentido que o autor deu ao original. Paciência. Depois da letra estão os links da gravação original e da versão em inglês. Vê aí)
Hier encore, j'avais vingt ans
|
Ontem ainda , eu tinha vinte anos
|
Je caressais le temps et jouais de la vie
|
Acariciava o tempo e brincava de viver
|
Comme on joue de l'amour
|
Como se brinca de namorar
|
Et je vivais la nuit
|
E vivia a noite
|
Sans compter sur mes jours qui fuyaient
dans le temps
|
Sem considerar meus dias que escorriam no tempo
|
J'ai fait tant de projets qui sont restés en l'air
|
Fiz tantos projetos que ficaram no ar
|
J'ai fondé tant d'espoirs qui se sont envolés
|
Alimentei tantas esperanças que se foram,
|
Que je reste perdu ne sachant où aller
|
Que permaneço perdido sem saber aonde ir
|
Les yeux cherchant le ciel mais le coeur mis
en terre
|
Os olhos procurando o Céu, mas o coração posto na Terra
|
Hier encore j'avais vingt ans
|
Ontem ainda eu tinha vinte anos
|
Je gaspillais le temps en croyant l'arrêter
|
Desperdiçava o tempo acreditando que o faria parar
|
et pour le retenir, même le devancer
|
E para retê-lo, e até ultrapassá-lo,
|
Je n'ai fait que courir et me suis essouflé
|
Só fiz correr e me esfalfar
|
Ignorant le passé, conjuguant au futur
|
Ignorando o passado que conduz ao futuro
|
Je précédais de moi toute conversation
|
Eu precedia de mim qualquer conversação
|
et donnais mon avis que je voulais le bon
|
E opinava que eu queria o melhor
|
Pour critiquer le monde avec désinvolture
|
Por criticar o mundo com desenvoltura
|
Hier encore j'avais vingt ans
|
Ontem ainda eu tinha vinte anos
|
Mais j'ai perdu mon temps à faire des folies
|
Mas perdi meu tempo a cometer loucuras
|
Qui ne me laissent au fond rien de vraiment précis
|
O que não me deixa, no fundo, nada realmente concreto
|
Que quelques rides au front et la peur de l'ennui
|
Além de algumas rugas na fronte e o medo do tédio
|
Car mes amours sont mortes avant que
d'exister
|
Porque meus amores morreram antes de existir
|
Mes amis sont partis et ne reviendront pas
|
Meus amigos partiram e não mais retornarão
|
Par ma faute j'ai fait le vide autour de moi
|
Por minha culpa eu criei o vazio em torno de mim
|
Et j'ai gaché ma vie et mes jeunes années
|
E gastei minha vida e meus anos de juventude
|
Du meilleur et du pire en jettant le meilleur
|
Do melhor e do pior, descartando o melhor
|
J'ai figé mes sourires et j'ai glacé mes peurs
|
Imobilizei meus sorrisos e congelei meus choros
|
Ou sont-ils à present, à present mes vingts ans?
|
Onde estão agora, meus vinte anos?
|
Perfeito, JB. Perfeito.
ResponderExcluir"J"
Que fossa, meu chapa, que fossa...
ResponderExcluirMas música francesa por música francesa,eu sou mais a Je T'aime.
Procevê!
ExcluirJé T'aime não é exatamente o que se pode chamar de música, a comparação foi muito infeliz. Hier Encore é uma canção filosófica com base na dialética. É um sentimento de mudanças e perdas irrecuperáveis. É a própria melancolia descrita por pelo filósofo Walter Benjamin.
ResponderExcluirObrigado pelo comentário enriquecedor! Como disse no texto de apresentação, "Não tenho hoje a melancolia contida na letra, mas às vezes brinco com pessoas mais jovens que eu (99% do total) ao dizer que também já tive vinte anos. E parece que foi ontem!" é uma letra extremamente reflexiva e que só é plenamente vivenciada e entendida por quem (como eu) já foi atropelado pela passagem do tempo. Hoje tenho 69 anos e isso não dói tanto (mas já doeu).
ExcluirEssa música só pode ser interpretada por quem viveu a vida, tem lembranças vividas,estórias para contar.
ResponderExcluirExistir é uma coisa, viver é outra. Quem nem sabe o que é viver e saborear os seus mistérios,tem mais que ouvir rock ou funk e não imaginar que seja fossa. Não é uma música para aprendizes da vida.
Fantástico e irrepreensível comentário!É uma pena que a experiência só possa ser narrada, nunca transmitida integralmente, que só consigamos avaliar sentimentos e vivências depois de tê-los vivido e sentido. Obrigado pela visita e pelo comentário!
ExcluirPara mim existem duas grandes letras musicadas. Hier encore é uma reflexão do que fui alem da melodia um explendor a outra é A Lista do grande Oswaldo Montenegro me leva a pessoas até mesmo as quais não conheço.
ResponderExcluirUma das desvantagens da espécie humana ter conquistado um cérebro grande e a capacidade de pensar e refletir (que nem todos utilizam, para dizer a verdade) é que saber que à medida que a mente fica melhor, mais analítica, mais afiada (claro, até que algum tipo de demência se instale), o corpo decai. O ideal seria que o corpo melhorasse com a mente, mas isso é só um filme do Brad Pitt. De repente, quando você se dá conta, o tempo passou, a ladeira fica cada vez mais inclinada e a descida cada vez mais vertiginosa.
ExcluirQuanto ao Oswalldo Montenegro, acho-que é um injustiçado, pois merecia ter mais fama e visibilidade. Grande poeta!
Finalmente, obrigado pela visita e comentário. Apareça mais!
Acho que essa música tem a ver com aquele momento que ouvimos somente nossa voz interna, não vejo melancolia, mas sim uma dúvida para onde realmente temos que ir, isso nunca vamos saber. O que sobram são as lembranças de tudo que vivemos até ali e a certeza que não importa o quanto mas tudo um dia vai ficar para trás.
ResponderExcluirVou te dizer uma coisa, minha cara ou meu caro, esta música vai adquirindo mais significado à medida que envelhecemos. Creio que foi o Chico Anísio que disse não sentir medo de morrer, o que sentia era pena. Às vezes a vida nos esmaga tanto que surge o sentimento que a letra tão bem registrou: "Ontem ainda eu tinha vinte anos mas perdi meu tempo a cometer loucuras". Estou com um texto pronto (spoiler) que fala de perdas, depressão e melancolia, mas ainda não me animei a publicar. Como disse o Vinicius, "a vida não é brincadeira". Para finalizar, obrigado pelo comentário, fez muito bem para estado de espírito atual.
Excluir