Eu acho uma breguice genuína tirar retrato
3x4 meio de perfil, em diagonal em relação à câmera. Apesar disso, pouco antes de me formar na faculdade, tirei
um assim. Recebi da comissão de formatura a orientação de procurarmos
determinado estúdio fotográfico para que fosse tirado o retrato que seria
exposto no quadro de formandos de engenharia daquele ano.
Esse era um costume chique pra caramba, pois as principais faculdades faziam esses quadros de formatura e os painéis eram colocados nas vitrines de lojas conceituadas da Afonso Pena,
a principal avenida de Belo Horizonte. Quando essas fotos eram expostas, os
transeuntes paravam para olhar a cara do povo. Os pais dos formandos,
emocionados, admiravam seus pimpolhos. As meninas examinavam os exemplares masculinos e os
marmanjos tentavam encontrar alguma tchutchuca no painel.
Entre os formandos de engenharia isso era
particularmente difícil, não só pela predominância masculina como pelo fato de
as poucas engenheiras (na época, pelo menos) serem em sua maioria coleguinhas
de São Jorge (dragões mesmo).
Pois bem, lá fui eu. O fotógrafo entregou-me
um paletó de smoking provavelmente feito para anão com obesidade extra-mórbida,
pois a manga terminava quase no meu cotovelo e a largura daria para colocar
dois de mim dentro da “fatiota” (eu era magrelão. Talvez hoje até ficasse
certinho. Na barriga, pelo menos...).
Foi aí que o Mal se manifestou. Para que o paletó ficasse com aparência de ter
sido feito sob medida para mim, o sujeito juntou nas costas todo o excesso de pano e pediu-me
que segurasse com uma das mãos. Em seguida, posicionou-me em uma diagonal
imaginária (talvez para disfarçar o braço nas costas), fez as recomendações de
praxe de não me mexer, etc. e mandou bala. O resultado até que não ficou tão
ruim: fiquei com cara de quem estava enxergando um brilhante futuro (ou
pensando por que tinha vagabundado tanto durante o curso). Além disso, talvez
devido aos retoques, a foto ficou meio enfumaçada, meio etérea, combinando bem
com meu bigode a la Woodstock.
Em outra ocasião, precisando de retrato para
nova carteira de identidade, dirigi-me ao Foto Zatz. Como sempre,
encomendei seis cópias. Sentei-me na cadeira para tirar a foto. O fotógrafo
veio, ajustou meus ombros e deu uma entortadinha na minha cabeça para a
direita. Caminhou para a câmera e eu corrigi a posição da cabeça. Volta ele e
me entorta novamente. Corrijo de novo. Aí ele vem para reposicionar meu rosto e
pede para que eu fique assim, sem me mexer (deve ter achado que eu sofria de
Parkinson ou coisa parecida). Foi aí que eu tive a grande sacada, o insight:
- Por acaso você nivela (verticaliza)
a foto com base na posição das orelhas?
- Isso!
- Então, por favor, tome meus olhos
por referência, porque minhas orelhas são desniveladas.
- Rapaz, é mesmo!
Eu tinha acabado de descobrir por que em alguns retratos anteriores eu apareço com a cabeça ligeiramente inclinada. É óbvio que essa descoberta não se aplica indistintamente a todo mundo. Com o Sloth, dos Goonies, por exemplo, não dá para usar os olhos para nivelar o retrato. Fora outros mais...
Para finalizar essas lembranças, só mais um
caso: por conta da hiperinflação ocorrida no Brasil, a correção dos salários
pegou um ritmo super acelerado. Depois de algum tempo, o espaço próprio da
carteira profissional reservado a esse fim já tinha acabado. As páginas
destinadas para registro de alguma observação começaram a ser também usadas.
Como tinha passado em um concurso, resolvi tirar outra carteira. E lá fui eu
ao Foto Zatz. Em lugar de foto colorida, pedi para tirar em preto e
branco, por dois motivos: a maior parte da minha galeria está
nesse padrão. O outro motivo é que a foto em preto e branco permite retoque
para corrigir alguma imperfeição ou defeito durante o processo de revelação, ao
contrário da colorida. Quando peguei as seis cópias, verifiquei que o retoque
fora feito de forma tão “entusiasmada” que as bolsas das pálpebras inferiores -
cada vez mais acentuadas com o passar do tempo - tinham simplesmente
desaparecido. Mas lá fui eu providenciar o novo documento. Ao pegar os retratos
que lhe entreguei e depois de olhar para mim, a senhora que me atendia comentou:
- Esses aqui não valem, eu preciso de
retratos recentes.
Achei graça da recusa e mostrei que tinha
acabado de tirá-los. A resposta foi divertidíssima e fulminante:
- Nossa! Retocaram tanto a foto que
quase apagaram essa pinta que o senhor tem no rosto!
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