quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

SONHEI QUE TINHA GENTE LÁ FORA

 
Depois de acordar para aplicar insulina em minha mulher, estava eu pronto para deitar novamente e dormir o sono dos injustos e ter os pesadelos dos desgraçados. Entretanto, por hábito ou por vício resolvi dar uma espiada no blog de um amigo virtual, pois tive a má ideia de fazer um comentário irônico sobre um post ali publicado. Má ideia por não resistir a comentar o que me incomoda e pior ideia por não conseguir usar toda a ironia e sarcasmo que gostaria de ser capaz de usar.
 
E tudo começou por ter chamado de “escória” os idiotas acampados em frente aos quartéis, sempre pedindo, sempre esperando uma reação dos militares a uma situação que consideram injusta e, mais ainda, cheia de "ilegalidades". Ainda bem que esse amigo virtual não é um dos desocupados acampados, pois eu ficaria extremamente decepcionado se fizesse isso!
 
Eu conheço algumas pessoas (não muitas, graças a Deus!) que se dispuseram a exibir sua falta total de bom senso, sua intolerância e desprezo pelas leis e pela legalidade. Uma senhora que conheço – viúva, de voz estridente e desagradável (não só a voz) – gasta uma grana todo santo dia (ela é muito piedosa) para cumprir seu plantão da insensatez: chama um uber pela manhã, chama outro para voltar à tarde para casa. Não sei o que come nem aonde. Sei apenas que não tem filhos (o que é uma sorte para as crianças que não gerou) e que talvez ache que prestar-se a esse ridículo diário é a missão de sua vida - ou do tempo que lhe resta.
 
Eu sei que boa parte das pessoas que se reúne nesses lugares é composta de idosos (que não têm blog, pois se tivessem não estariam perdendo tempo à espera de um milagre), gente bem estabelecida, abonada, com a vida ganha (ou perdida, segundo as más línguas), pessoas religiosas, piedosas, que nunca falam mal da vida de ninguém que não conheçam e que não se importam com regimes autoritários – desde que mantenham o país livre do bicho papão do comunismo ateu, desejo esse que deve ter permanecido em suas mentes desde as últimas lavagens cerebrais promovidas principalmente nas décadas de 1960 e1970.
 
Sim, eu sei que chamar de “escória” foi uma reação irrefletida, pois “Escória é um termo pejorativo usado para se referir a camada socialmente desfavorecida da sociedade. Em suma, consiste nas pessoas consideradas desprezíveis, inferiores e irrelevantes dentro de um grupo social”, pois tudo o que nunca aconteceu a essa gente foi pertencer às camadas socialmente desfavorecidas da sociedade.
 
Talvez fosse mais razoável ter usado a palavra “súcia”, que o dicionário define como “reunião de indivíduos de má índole ou de má fama”. Acreditar que possuem má índole aqueles que desejam e pregam o desrespeito a todo um processo realizado dentro da legalidade é bastante razoável, mas é injusto considerá-los de “má fama”. Seria o mesmo que chamá-los de “choldra”, que o sempre inconveniente dicionário define como um “Bando de pessoas consideradas desprezíveis ou de mau caráter”.
 
Por não conhecê-los (graças a Deus!), não posso alardear seu mau caráter, mas uma coisa eu posso fazer, pois é uma opinião minha: por eu ser contra todo tipo de radicalismo e extremismo (especialmente se for costurado com religião) eu considero desprezível esse grupo (escolar) de gente infantilizada, como desprezíveis são seus participantes, pois eu rejeito, desprezo e condeno seu apreço por um improvável golpe e por sua recusa em aceitar a Realidade.
 
Quando um sujeito de centro resolve criticar a extrema esquerda ou a extrema direita, ele corre o risco de ser considerado um alienado. E por eu ser assim, de centro e obviamente alienado, preciso dar um jeito de fechar o Blogson, parar de brincar de blogueiro, evitar fazer comentários em blogs alheios, pois não o fazendo tenho certeza de que já estaria dormindo serena e alienadamente a uma hora dessas.
 

Um comentário:

  1. Você tem razão, Fabiano. Apesar de ser o rei da delicadeza no mundo físico, às vezes escrevo de forma mais áspera, talvez para compensar essa delicadeza a que me obrigo no contato físico diário. E por ser meio infantilizado, o que eu gosto mesmo é de rir, de contar piadas, ver filmes de humor, ler Chiclete com Banana, Charlie Brown, livros de e sobre humor. Talvez isso neutralize o amargo da Vida.
    Mas tenho uma qualidade que prezo muito: por já ter sido vítima em todas as épocas de todas as formas de bullying, jamais ironizo ou desqualifico CPFs (pessoa física), meu negócio é um grupo, um país, uma corrente ideológica ou religiosa. Abro exceção para os homens públicos a quem cito nominalmente, mas tendo o cuidado de medir as palavras para não correr o risco de processo (apesar da importância e visibilidade microscópicas do blog).
    A título de exemplo, ainda no Facebook, depois de ler uma gigantesca idiotice bolsonarista (acho que usei um pleonasmo agora), chamei de idiotas as pessoas que acreditavam naquela maluquice. Um sujeito que conheci ainda adolescente reagiu e perguntou se eu o estava chamando de idiota. Respondi que não, que jamais faria uma coisa dessas (embora a carapuça tenha entrado mais justa que camisinha em pau com ereção).
    Apesar disso, cancelou minha amizade (o que considerei uma benção). Entretanto, na primeira vez em que o encontrei, cumprimentei efusivamente como sempre tinha feito. Vi seu riso amarelo de surpresa e até de contrariedade. Para mim, tá boa, pois se existe uma coisa em que esbanjo no mundo real é cinismo, falta de vergonha na cara. Já disse a título de brincadeira que sou um invertebrado moral, pois sou capaz (e já fiz isso) de abraçar a pessoa a quem mais odeio.
    Mas isso vai acabar, pois como disse o Belchior, sinto “vir vindo no vento o cheiro de nova estação”. E essa estação é o fim definitivo, irrevogável do blog. Só não aconteceu ainda por estar me acostumando com a ideia. Aí não incomodarei mais ninguém. Abraços.

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