Como foi dito anteriormente, este post é uma seleção dos artigos do Código de Hamurabi. O que chama atenção no texto "original" são as "credenciais" apresentadas por Hamurabi, um currículo quase tão extenso quanto as leis que estava promulgando. O mesmo se dá no final, com mais auto-elogios.
Sinto hoje uma certa ironia melancólica ao ler como se refere à sua amada Babilônia: "ele (Marduk) a fez famosa no mundo e nela estabeleceu um duradouro reino cujos alicerces tinham a firmeza do céu e da terra". Ah, meu caro Hamurabi, como você poderia imaginar que sua querida Babilônia seria no futuro apenas um monte de cacos de tijolos, tal como meu cunhado a viu quando trabalhou no Iraque?
Para o post não ficar maçante demais, o prólogo e epílogo foram também resumidos. Além disso, a divisão em capítulos parece ser obra de algum advogado dos tempos atuais. Se alguém desejar ter uma visão mais ampla e completa dos artigos e da auto-rasgação de seda do velho e bom Hamu, siga o link que está no final. O defeito é estar em inglês.
PRÓLOGO _ "Quando o alto Anu, Rei de Anunaki e Bel, Senhor da Terra e dos Céus, determinador dos destinos do mundo, entregou o governo de toda humanidade a Marduk... quando foi pronunciado o alto nome da Babilônia; quando ele a fez famosa no mundo e nela estabeleceu um duradouro reino cujos alicerces tinham a firmeza do céu e da terra - por esse tempo de Anu e Bel me chamaram, a mim, Hamurabi, o excelso príncipe, o adorador dos deuses, para implantar a justiça na terra, para destruir os maus e o mal, para prevenir a opressão do fraco pelo forte... para iluminar o mundo e propiciar o bem-estar do povo. Hamurabi, governador escolhido por Bel, sou eu, eu o que trouxe a abundância à terra; o que fez obra completa para Nippur e Durilu; o que deu vida à cidade de Uruk; o que supriu água com abundância aos seus habitantes;... o que tornou bela a cidade de Borsippa;... o que enceleirou grãos para a poderosa Urash;... o que ajudou o povo em tempo de necessidade; o que estabeleceu a segurança na Babilônia; o governador do povo, o servo cujos feitos são agradáveis a Anunit".
I - SORTILÉGIOS, JUÍZO DE DEUS, FALSO TESTEMUNHO, PREVARICAÇÃO DE JUÍZES
5º - Se um juiz dirige um processo e profere uma decisão e redige por
escrito a sentença, se mais tarde o seu processo se demonstra errado e aquele
juiz, no processo que dirigiu, é convencido de ser causa do erro, ele deverá
então pagar doze vezes a pena que era estabelecida naquele processo, e se
deverá publicamente expulsá-lo de sua cadeira de juiz. Nem deverá ele voltar a
funcionar de novo como juiz em um processo.
II - CRIMES DE FURTO E DE ROUBO, REIVINDICAÇÃO DE MÓVEIS
6º - Se alguém furta bens do Deus ou da Corte deverá ser morto; e mais
quem recebeu dele a coisa furtada também deverá ser morto.
7º - Se alguém, sem testemunhas ou contrato, compra ou recebe em
depósito ouro ou prata ou um escravo ou uma escrava, ou um boi ou uma ovelha,
ou um asno, ou outra coisa de um filho alheio ou de um escravo, é considerado
como um ladrão e morto.
14º - Se alguém rouba o filho impúbere de outro, ele é morto.
22º - Se alguém comete roubo e é preso, ele é morto.
III - DIREITOS E DEVERES DOS OFICIAIS, DOS GREGÁRIOS E DOS VASSALOS EM
GERAL, ORGANIZAÇÃO DO BENEFÍCIO
33º - Se um oficial superior foge ao serviço e coloca um mercenário em
seu lugar no serviço do rei e ele parte, aquele oficial deverá ser morto.
34º - Se um oficial superior furta a propriedade de um oficial inferior,
prejudica o oficial, dá o oficial a trabalhar por soldada, entrega o oficial em
um processo a um poderoso, furta o presente que o rei deu ao oficial, aquele
deverá ser morto.
IV - LOCAÇÕES E REGIMEN GERAL DOS FUNDOS RÚSTICOS, MÚTUO, LOCAÇÃO DE CASAS,
DAÇÃO EM PAGAMENTO
V - RELAÇÕES ENTRE COMERCIANTES E COMISSIONÁRIOS
VI - REGULAMENTO DAS TABERNAS (TABERNEIROS PREPOSTOS, POLÍCIA, PENAS E TARIFAS)
109º - Se na casa de uma taberneira se reúnem conjurados e esses
conjurados não são detidos e levados à Corte, a taberneira deverá ser morta.
110º - Se uma irmã de Deus, que não habita com as crianças (mulher
consagrada que não se pode casar) abre uma taberna ou entra em uma taberna para
beber, esta mulher deverá ser queimada.
VII - OBRIGAÇÕES (CONTRATOS DE TRANSPORTE, MÚTUO), PROCESSO EXECUTIVO E
SERVIDÃO POR DÍVIDAS
VIII - CONTRATOS DE DEPÓSITO
IX - INJÚRIA E DIFAMAÇÃO
127º - Se alguém difama uma mulher consagrada ou a mulher de um homem
livre e não pode provar se deverá arrastar esse homem perante o juiz e
tosquiar-lhe a fronte.
X - MATRIMÔNIO E FAMÍLIA, DELITOS CONTRA A ORDEM DA FAMÍLIA. CONTRIBUIÇÕES E
DOAÇÕES NUPCIAIS, SUCESSÃO
128º - Se alguém toma uma mulher, mas não conclui um contrato com ela,
esta mulher não é esposa.
129º - Se a esposa de alguém é encontrada em contato sexual com um
outro, se deverá amarrá-los e lança-los nágua, salvo se o marido perdoar à sua
mulher e o rei a seu escravo.
130º - Se alguém viola a mulher que ainda não conheceu homem e vive na
casa paterna e tem contato com ela e é surpreendido, este homem deverá ser
morto, a mulher irá livre.
137º - Se alguém se propõe a repudiar uma concubina que lhe deu filhos
ou uma mulher que lhe deu filhos, ele deverá restituir àquela mulher o seu
donativo e dar-lhe uma quota em usufruto no campo, horto e seus bens, para que
ela crie os filhos. Se ela criou os seus filhos, lhe deverá ser dado, sobre
todos os bens que seus filhos recebam, uma quota igual a de um dos filhos. Ela
pode esposar o homem do seu coração.
141º - Se a mulher de alguém, que habita na casa do marido, se propõe a
abandoná-la e se conduz com leviandade, dissipa sua casa, descura do marido e é
convencida em juízo, se o marido pronuncia o seu repúdio, ele a mandará embora,
nem deverá dar-lhe nada como donativo de repúdio. Se o marido não quer
repudiá-la e toma outra mulher, aquela deverá ficar como serva na casa de seu
marido.
142º - Se uma mulher discute com o marido e declara: "tu não tens
comércio comigo", deverão ser produzidas as provas do seu prejuízo, se ela
é inocente e não há defeito de sua parte e o marido se ausenta e a descura
muito, essa mulher não está em culpa, ela deverá tomar o seu donativo e voltar
à casa de seu pai.
143º - Se ela não é inocente, se ausenta, dissipa sua casa, descura seu
marido, dever-se-á lançar essa mulher nágua.
145º - Se alguém toma uma mulher e essa não lhe dá filhos e ele pensa em
tomar uma concubina, se ele toma uma concubina e a leva para sua casa, esta
concubina não deverá ser igual à esposa.
146º - Se alguém toma uma esposa e essa esposa dá ao marido uma serva
por mulher e essa lhe dá filhos, mas, depois, essa serva rivaliza com a sua
senhora, porque ela produziu filhos, não deverá sua senhora vendê-la por
dinheiro, ela deverá reduzi-la à escravidão e enumerá-la ente as servas.
148º - Se alguém toma uma mulher e esta é colhida pela moléstia, se ele
então pensa em tomar uma segunda, não deverá repudiar a mulher que foi presa da
moléstia, mas deverá conservá-la na casa que ele construiu e sustentá-la
enquanto viver.
151º - Se uma mulher que vive na casa de um homem, empenhou seu marido a
não permitir a execução de um credor contra ela, e se fez lavrar um ato; se
aquele homem antes de tomar mulher tinha um débito, o credor não se pode
dirigir contra a mulher. Mas, se a mulher, antes de entrar na casa do marido,
tinha um débito, o credor não pode fazer atos executivos contra o marido.
152º - Se depois que a mulher entra na casa do marido, ambos têm um
débito, deverão ambos pagar ao negociante.
153º - Se a mulher de um homem livre tem feito matar seu marido por
coisa de um outro, se deverá cravá-la em uma estaca.
154º - Se alguém conhece a própria filha, deverá ser expulso da terra.
155º - Se alguém promete uma menina a seu filho e seu filho tem comércio
com ela, mas aquele depois tem contato com ela e é colhido, deverá ser amarrado
e lançado na água.
157º - Se alguém, na ausência de seu pai, tem contato com sua
progenitora, dever-se-á queimá-la ambos.
158º - Se alguém, na ausência de seu pai, é surpreendido com a sua
mulher principal, a qual produziu filhos, deverá ser expulso da casa de seu
pai.
167º - Se alguém toma uma mulher e esta lhe dá filhos, se esta mulher
morre e ele depois dela toma uma segunda mulher e esta dá filhos, se depois o
pai morre, os filhos não deverão dividir segundo as mães; eles deverão tomar o
donativo de suas mães mas dividir os bens paternos ente si.
XI - ADOÇÃO, OFENSAS AOS PAIS, SUBSTITUIÇÃO DE CRIANÇA
185º - Se alguém dá seu nome a uma criança e a cria como filho, este
adotado não poderá mais ser reclamado.
187º - O filho de um dissoluto a serviço da Corte ou de uma meretriz não
pode ser reclamado.
188º - Se o membro de uma corporação operária, (operário) toma para
criar um menino e lhe ensina o seu ofício, este não pode mais ser reclamado.
192º - Se o filho de um dissoluto ou de uma meretriz diz a seu pai
adotivo ou a sua mãe adotiva: "tu não és meu pai ou minha mãe",
dever-se-á cortar-lhe a língua.
195º - Se um filho espanca seu pai se lhe deverão decepar as mãos.
XII - DELITOS E PENAS (LESÕES CORPORAIS, TALIÃO, INDENIZAÇÃO E COMPOSIÇÃO)
196º - Se alguém arranca o olho a um outro, se lhe deverá arrancar o
olho.
197º - Se ele quebra o osso a um outro, se lhe deverá quebrar o osso.
200º - Se alguém parte os dentes de um outro, de igual condição, deverá
ter partidos os seus dentes.
XIII - MÉDICOS E VETERINÁRIOS; ARQUITETOS E BATELEIROS (SALÁRIOS, HONORÁRIOS E
RESPONSABILIDADE), CHOQUE DE EMBARCAÇÕES
218º - Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de
bronze e o mata ou lhe abre uma incisão com a lanceta de bronze e o olho fica
perdido, se lhe deverão cortar as mãos.
226º - Se o tosquiador, sem ciência do senhor de um escravo, lhe imprime
a marca de escravo inalienável, dever-se-á cortar as mãos desse tosquiador.
227º - Se alguém engana um tosquiador e o faz imprimir a marca de um
escravo inalienável, se deverá matá-lo e sepultá-lo em sua casa. O tosquiador
deverá jurar : "eu não o assinalei de propósito", e irá livre.
229º - Se um arquiteto constrói para alguém e não o faz solidamente e a
casa que ele construiu cai e fere de morte o proprietário, esse arquiteto
deverá ser morto.
230º - Se fere de morte o filho do proprietário, deverá ser morto o
filho do arquiteto.
232º - Se destrói bens, deverá indenizar tudo que destruiu e porque não
executou solidamente a casa por ele construída, assim que essa é abatida, ele
deverá refazer à sua custa a casa abatida.
233º - Se um arquiteto constrói para alguém uma casa e não a leva ao
fim, se as paredes são viciosas, o arquiteto deverá à sua custa consolidar as
paredes.
235º - Se um bateleiro constrói para alguém um barco e não o faz
solidamente, se no mesmo ano o barco é expedido e sofre avaria, o bateleiro
deverá desfazer o barco e refazê-lo solidamente à sua custa; o barco sólido ele
deverá dá-lo ao proprietário.
236º - Se alguém freta o seu barco a um bateleiro e este e negligente,
mete a pique ou faz que se perca o barco, o bateleiro deverá ao proprietário
barco por barco.
XIV - SEQUESTRO, LOCAÇÕES DE ANIMAIS, LAVRADORES DE CAMPO, PASTORES, OPERÁRIOS.
DANOS, FURTOS DE ARNEZES, DÁGUA, DE ESCRAVOS (AÇÃO REDIBITÓRIA, RESPONSABILIDADE
POR EVICÇÃO, DISCIPLINA)
245º - Se alguém aluga um boi e o faz morrer por maus tratamentos ou
pancadas, deverá indenizar ao proprietário boi por boi.
246º - Se alguém aluga um boi e lhe quebra uma perna, lhe corta a pele
cervical, deverá indenizar ao proprietário boi por boi.
253º - Se alguém aluga um outro para cuidar do seu campo, lhe fornece a
semente, lhe confia os bois, o obriga a cultivar o campo, se esse rouba e tira
para si trigo ou plantas, se lhe deverão cortar aos mãos.
282º - Se um escravo diz ao seu senhor : "tu não és meu
senhor", será convencido disso e o senhor lhe cortará a orelha.
EPÍLOGO
"As justas leis que Hamurabi, o sábio rei, estabeleceu e (com as
quais) deu base estável ao governo ... Eu sou o governador guardião ... Em meu
seio trago o povo das terras de Sumer e Acad; ... em minha sabedoria eu os
refreio, para que o forte não oprima o fraco e para que seja feita justiça à
viúva e ao órfão ... Que cada homem oprimido compareça diante de mim, como rei
que sou da justiça. Deixai-o ler a inscrição do meu monumento. Deixai-o atentar
nas minhas ponderadas palavras. E possa o meu monumento iluminá-lo quanto à
causa que traz, e possa ele compreender o seu caso. Possa ele folgar o coração
(exclamando) "Hamurabi é na verdade como um pai para o seu povo; ...
estabeleceu a prosperidade para sempre e deu um governo puro à terra. (...)
https://avalon.law.yale.edu/ancient/hamframe.asp
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