Sou fã da Lya Luft. Para quem não sabe, Lya
Luft é escritora e tem 77 anos. Uma escritora já senhora, pode-se dizer. Mas,
acima de tudo, uma senhora escritora, autora de mais de vinte livros (que nunca
li, para ser sincero) e tradutora de mais de cem livros. Além disso, é cronista
da revista VEJA, onde descobri seus textos elegantes, sóbrios e reflexivos.
Pois bem, minha reverência hoje é para ela e
para sua crônica mais recente publicada em VEJA. Seus textos (as crônicas, pelo
menos) nunca trazem palavras chulas ou vulgares, pois ela parece não precisar se apoiar nesse tipo de recurso. Como disse, seus
textos sempre são elegantes e sóbrios – e de leitura agradabilíssima. Uma lady.
Por isso, achei curioso ela dizer que tem “escolhido muito
cuidadosamente” suas palavras “nas
tantas dezenas, já centenas, de artigos” publicados em VEJA. Mais adiante,
comenta que “aos poucos as palavras
começam a fugir dos arreios que a prudência lhes tem imposto, e reclamam, e se
agitam, e se queixam, exigindo que as deixe brotar naturalmente”. E fiquei
pensando quais palavras estariam “fugindo
dos arreios”. Seria a palavra “trouxa”,
usada no texto como gíria?
Talvez seja isso,
pois seus textos são sempre tão limpos, claros e não apelativos que não consigo
imaginar suas palavras “fugindo dos
arreios”. Talvez por isso eu tenha desejado compartilhar essa crônica tão
bem escrita, pois meus textos são sempre mancos, estropiados, mal arreados e com andadura
claudicante.
Que mais eu posso falar?
Só dizer, à moda dos fãs quando veem seus ídolos: “Lya Luft, eu te amo! Lya Luft, eu te amo!
Tenho escolhido muito cuidadosamente minhas
palavras nas tantas dezenas, já centenas, de artigos aqui publicados, para não
ser diretamente ofensiva e jamais incorrer em alguma injustiça que poderia ter
sido prevenida, pois pobre de quem quiser ser juiz do outro. Mas aos poucos as palavras
começam a fugir dos arreios que a prudência lhes tem imposto, e reclamam, e se
agitam, e se queixam, exigindo que as deixe brotar naturalmente. Por isso tenho
me perguntado, e a algumas pessoas mais chegadas, diante dos absurdos que
acontecem: somos mesmo um país de trouxas, para nos tratarem assim? Que falta
de noção, de ridículo, que falta de respeito, tanta empulhação feita e dita com
cara séria e até frases de retórica, como se fôssemos uma manada de imbecis.
Por exemplo, a cantilena cansativa e já patética de que as confusões e
desgraceiras no país ocorrem "porque a oposição não aceita ter perdido as
eleições" lá nos idos de 2014!
Ou dar a entender que um ex-mandatário brasileiro,
embora vivendo com luxo, nada possui de seu, é um pobre, mora, vive, diverte-se
"de favor". Amigos cuidam dele e de sua família, até pagando fortunas
para armazenar contêineres com ditos presentes que teria recebido em seus
importantíssimos mandatos. Momentinho! Nenhuma pessoa em cargo público pode
aceitar presentes no valor de mais de 100 reais, e se aceitar terá de deixar
TUDO, ao sair, em lugares públicos, como benefício para o público, pois a ele
não pertencem, e sim ao cargo ocupado.
Mandantes do mais alto posto desprezam a Justiça,
censuram ações legais como se neste país tão esfacelado a Justiça não fosse
mais importante do que o mais importante cargo. Nada contra pessoas, partidos,
seitas, seja o que for. Sou, sim, contrária à injustiça, à exploração que
submete, à hipocrisia que mente e destrói, ao cinismo que abusa da credulidade
dos bons e esforçados.
(...)
Não é possível que nós, o povo brasileiro – que,
repito, não é constituído só dos operários, sindicalistas, despossuídos,
explorados, mas de cada, um dos que, como eu, trabalham para pagar suas contas
e seus impostos, labutam, se desgastam, correm, criam sua família, cuidam de
seus amigos, e à noite perdem o sono pensando no que será de nós –, aceitemos o
que está ocorrendo.
Todos, velhos, doentes, mulheres grávidas, garis,
professores, enfermeiras, bancários, empregados do comércio ou indústria,
agricultores, estudantes, não somos trouxas: cada um de nós é uma peça do povo
brasileiro, e todos (a não ser os idiotizados pela neurose de uma crendice ou
ideologia cega) veem, sentem, sofrem o que nos acontece e podem, devem, clamar
e reclamar: "Assim não dá mais. Assim não quero mais". (...)