Já aviso que este é um texto longo, mas você PRECISA lê-lo! São trechos de uma entrevista (a reportagem é de Ingrid Fagundez) que a BBC Brasil fez em 2017 com o sujeito que foi duas vezes eleito “Publicitário do Século” e que, de alguma forma, ao contratar o Jorge Bem(jor) para se apresentar na festa de fim de ano de sua agência W/Brasil, foi um dos inspiradores da música “W/Brasil (Chama o Síndico)”.
Sou e sempre fui fã da
criatividade e inteligência que alguns publicitários possuem, qualidades que
utilizam para criar campanhas publicitárias e propagandas engraçadíssimas ou emocionantes, mas sempre surprendentes. E Washington
Olivetto é um deus nessa área. Lêaí.
Washington Olivetto - A publicidade, seja quando começou, seja hoje, tem uma característica fundamental: a presença de uma grande ideia. É a ideia que provoca aquele efeito de 'como não pensei nisso antes', e ela é pertinente. É algo que tem a ver com o produto e com seu consumidor. Não é uma grande ideia algo que seja simplesmente sensacionalista ou oportunista.
Ciclicamente, mesmo antes desses movimentos que acontecem hoje, a melhor publicidade sempre foi aquela que soube perceber isso.
Quando fiz o Garoto Bombril, em 1978, tinha detectado que as mulheres estavam cansadas de serem tratadas como idiotas pela propaganda dos produtos de limpeza. E que a presença de um homem seria surpreendente. Se ele fosse doce e delicado, melhor ainda.
BBC Brasil - Como o Woody Allen? Em outras entrevistas, você disse que o estilo dele estava em alta na época.
Olivetto - As mulheres estavam achando mais interessante a inteligência do Woody Allen do que os músculos do John Wayne.
No meio disso, tem um negócio que batizei de politicamente saudável, que são ideias que tenham irreverência, senso de humor, mas respeitem a inteligência das pessoas.
A publicidade no Brasil, por exemplo, durante um grande tempo desconheceu a presença do negro - temos tantos negros no país e poucos na publicidade. Nos últimos tempos, uma pressão dos movimentos sociais fez com que a publicidade participasse de determinadas causas. Isso pode ser feito de maneira oportuna ou oportunista, essa é a grande questão.
Tivemos uma experiência interessante no ano passado, que lutei para que não ficasse oportunista e acabou muito oportuna. Minha diretora de arte do Rio de Janeiro, que atende a L'Oréal, descobriu uma transgênera, fez um comercial dela com sua primeira carteira de identidade no dia internacional da mulher. Falei 'Não pode acabar nisso. Não pode ser um comercial que ganhe um prêmio, tem que virar uma coisa grande'. Ela virou a primeira porta-voz mundial transgênera da L'Oréal, virou capa da Vogue francesa, enfim, se tornou um fato verdadeiro.
BBC Brasil - Hoje é mais oportunista do que oportuno?
Olivetto - Sempre será assim. Em causas sociais, a maior parte delas contém um componente de oportunismo, infelizmente.
Olivetto - Sim, porque principalmente o pessoal mais verdinho não cogita que tem o politicamente saudável no meio, então elimina qualquer ideia que tenha uma conotação de irreverência.
Era só uma adorável brincadeira. Mas se a gente fosse pensar 'ah, mas os gordos do Brasil vão ficar chateados, vamos fazer com um magro', ia ficar sem graça.
Hoje essa capacidade da publicidade de aderir a causas está vivendo um momento modal. Está na moda, depois tem outra.
Hoje, muitas editoras têm um personagem chamado leitor sensível. Sabe o que é isso? É um cara para ler os livros e detectar se tem algum trecho que vai dar problema com uma minoria. O leitor sensível é um censor disfarçado.
BBC Brasil - Você acha que a publicidade perde ou ganha com a maior interação do público pelas redes sociais?
Olivetto - A relação sempre foi de monólogo e nesses anos virou mais de diálogo, mas evidentemente alguém tem que liderar essa parada. Até porque eu, como publicidade, sou intromissão. Você não comprou jornal para ver meu anúncio, você quer a notícia. O mínimo que o intrometido tem que fazer é ser bem-educado. Isso é sedutor.
Publicidade não vende, cria predisposição de compra. Quem vende é o dono da marca. Para criar predisposição você tem que ser sedutor.
BBC Brasil - Não mudou o conteúdo, mas a forma como ele é apresentado? A abordagem da publicidade precisa ser mais sutil?
Olivetto - Não, acho que cada vez mais a honestidade é uma ferramenta de venda fabulosa. Cada vez mais a sedução é eficiente. E não mudou a coisa de que você precisa ter uma grande ideia.
As pessoas ciclicamente saem repetindo essas loucuras. Eu brinco aqui, "se alguém falar em quebrar paradigma, vou jogar pela janela. Deixa o coitado do paradigma lá".
BBC Brasil - O empoderamento feminino seria o clichê mais recente?
Olivetto - O empoderamento feminino está participando de qualquer reunião. Empoderamento feminino se pratica, não se prega. Ele já existia na (campanha) Valisere Primeiro Sutiã. Existia no Garoto Bombril.
Olivetto - Exatamente. É que as pessoas não têm a cultura disso. As meninas que falam sobre empoderamento feminino precisariam saber uma história curiosa. No ano em que comecei a trabalhar, existia nos Estados Unidos um cigarro chamado Eve, um cigarro para mulheres. Foi um sucesso.
Fui trabalhar na agência e tivemos que mudar a campanha. Ficou: "no Brasil, toda mulher tem Charm, só deixa de fumar se você gostar muito dele", e botamos um homem junto. Salvamos o Charm. Depois pusemos "o importante é ter Charm", que era genérico.
Tem que ter bom senso. Acho que a vida, cada vez mais, é um gesto atrelado ao bom senso.
BBC Brasil - Mas estamos vivendo um momento de extremos, de polarização. Falta bom senso?
Olivetto - Vai ter cada vez mais (extremismos), desde que não haja lideranças em cada uma das áreas. O consumidor pode e deve dar palpite, mas a principal função dele é consumir. Quero saber da opinião dele? Claro! Mas se a opinião dele for estapafúrdia e mais cinco estapafúrdios quiserem (o mesmo), não vou abrir mão das convicções da boa persuasão.
Olivetto - São fenômenos individuais. Nunca fiz nenhuma campanha política por atitude, mas acho que se fizesse faria mal, porque sou treinado para tomar decisões profissionais. E as decisões na política são políticas, não me daria bem.
BBC Brasil - Mas a estrutura partidária ainda é a mesma, não?
Olivetto - É, mas (o que acontece) é uma mistura da ansiedade da população com uma necessidade do partido. A questão da política é complicada, a capacidade de fazer acordos. Não me encanto com essa ideia das pessoas estarem se xingando e dois anos depois estarem se beijando.
Olivetto - Ética elástica é muito bom....
Nessa palestra, contei uma história que preparei (para a ocasião), dizendo que tudo poderia estar na comunicação se tivesse vida inteligente, se fosse feito de forma inteligente.
É uma história aparentemente machista e que, no entanto, poderia ser feita, seria eficiente, encantaria os homens, que seria o público, e não desagradaria as mulheres. É a ideia de um monólogo do 'Por que Porsche é melhor do que mulher que, diga-se de passagem, é excelente'.
O target do Porsche é 100% dos homens. Mas por que Porsche 'é melhor do que mulher que, diga-se de passagem, é excelente'? É como um teorema, há uma comprovação.
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A primeira prova é que, se você tem um Porsche, que é muito bom, e você tem dinheiro para comprar mais um, você compra, e o Porsche que você já tem não fica aborrecido. Já (se) você tem uma mulher que, diga-se de passagem é excelente, e fica com vontade de ter mais uma mulher, você vai ter um problema. É a primeira prova da superioridade do Porsche.
A segunda prova é mais dramática. O sujeito tem um Porsche e resolve que não quer mais ter aquele Porsche. Ele vende o Porsche e ganha o dinheiro. Já (se) ele tem uma mulher que, diga-se de passagem é excelente, e resolve que não quer mais ter mais aquela mulher, ele perde o dinheiro.
A terceira prova é a mais dramática de todas. Quantos homens você conhece que têm um Porsche? Pouquíssimos. Quantos você conhece que têm mulher? Um monte. No entanto, todos os que têm Porsche têm mulher e nem todos os que têm mulher têm Porsche.
A história é essa e claro que as pessoas riem. Só que uma história dessa você teria que complementar no público feminino. Você faz o quê? Você contou isso nos cinemas, que seria o público do Porsche, e nas revistas femininas você faz o anúncio do Porsche conversível, com uma linda mulher de cabelos esvoaçantes e o título "um homem realmente interessante te dá de presente um secador de cabelos como esse".
BBC Brasil - Pensando no que as mulheres querem hoje, e falando também como mulher, essa ideia não pode ser vista como ultrapassada?
Olivetto - Isso está calcado num target muito fechado. Você controla isso com a mídia onde você veicula. Porque o Porsche é um produto totalmente segmentado. Você não põe o Porsche na novela das oito. Os consumidores de Porsche você sabe exatamente onde estão.
Olivetto - Mas aí você tem que cancelar a vida. Se partir desses princípios, você cria um mundo totalmente antisséptico. Vai chegar à conclusão dos caras do Fahrenheit 451 (romance de Ray Bradbury), que vale a pena queimar os livros.
Jotabê,
ResponderExcluirVou deixar um comentário
para depois ler seu texto aqui
publicado.
Eu amo o personagem de seu escrito
e adorei ler "Os Piores Textos De Washington Oliveto".
Ja leu?
Bom fim de
semana para Você e sua Família.
CatiahoAlc.
Desejo o mesmo para você. Não li e vou procurar. Obrigado pela dica!
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