terça-feira, 27 de setembro de 2022

A SAGA DO MARQUETEIRO DOIDO

 
“Este é o samba do crioulo doido. A história de um compositor que durante muitos anos obedeceu ao regulamento e só fez samba sobre a História do Brasil. E tome de Inconfidência, Abolição, Proclamação, Chica da Silva e o coitado do crioulo tendo que aprender tudo isto para o enredo da escola. Até que, no ano passado, escolheram um tema complicado: a atual conjuntura. Aí o crioulo endoidou de vez e saiu este samba:”
 
Assim começava, na voz de barítono do próprio compositor, a gravação do “Samba do Crioulo Doido” feita pelo Quarteto em Cy em 1967. O jornalista Stanislaw Ponte Preta compôs essa música como crítica bem humorada à obrigatoriedade imposta pelo Departamento de Turismo do antigo estado da Guanabara aos compositores, para só abordar temas da História do Brasil nos sambas-enredo dos desfiles de carnaval. Apesar de bizarra uma ordem dessas, precisamos lembrar que ainda estávamos no longínquo e censurado ano de 1967, onde se podia usar despreocupadamente a palavra “crioulo”, mas falar mal do governo dava até cadeia.
 
Sérgio Porto era o seríssimo jornalista por trás do pseudônimo Stanislaw Ponte Preta, criado para dar vazão à veia satírica do autor e às críticas hilárias feitas por ele a todo tipo de idiotice que surgia no Brasil. E a “matéria prima” era tanta que levou o jornalista a lançar dois ou três livros divertidíssimos, a que deu o nome de “FEBEAPÁ: O Festival de Besteiras que Assola o País” (nós temos o primeiro e o segundo volume).
 
Encontrei na internet uma sinopse precisa do conteúdo desses livros:
 
“O fato é que nossos políticos capricham. Inventam leis estapafúrdias, castigam o idioma, têm mão leve, adoram um agradinho e são loucos por um esquema. E não é de hoje. Há mais de cinquenta anos, Stanislaw Ponte Preta fustigava os despautérios cometidos pelos donos do poder em textos brilhantes e devastadores que eram lidos no jornal por todos os brasileiros. Febeapá, o “Festival de besteiras que assola o país”, reúne hilariantes textos em que generais, capitães, deputados, prefeitos e outras figuras da cena política são pulverizados pela verve satírica do autor. Não sobra nada. Foram poucos os escritores brasileiros que tiveram coragem de “peitar” a Ditadura com tanta corrosão e petulância”.
 
O workaholic Sérgio Porto morreu em 1968, mas se ainda estivesse vivo já teria escrito uns cem volumes do Febeapá. Lembrei-me dele e do Samba do Crioulo Doido ao ouvir no rádio do carro uma propaganda eleitoral de político mineiro (que infelizmente não consegui identificar), que me deixou totalmente chapado pelo non sense do texto.
 
A maluquice ouvida é mais ou menos assim: dois caipiras conversam sobre as próximas eleições e um deles argumenta que não votará em fulano, pois “está sempre em cima do muro”. E é “laranja, que é quase vermelho”.
 
Pensem bem, “laranja” é a cor adotada pelo Partido Novo, quase tão de direita quanto o Bolsonaro. Dizer que “laranja é quase vermelho” é uma insanidade tão grande que me fez sentir pena de quem criou essa “Saga do Marqueteiro Doido”.

Mas, pensando melhor, essa propaganda só reflete o comportamento "os fins justificam os meios" que tenho criticado ultimamente, pois candidatos e marqueteiros parecem estar seguindo fielmente o conselho do Tim Maia: “Vale tudo, Vale o que vier, Vale o que quiser...”

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