sábado, 28 de novembro de 2020

SANTINHO II

Com o segundo turno das eleições municipais fungando no cangote de quem vai votar, resolvi desovar um refugo que estive rascunhando sem muita inspiração, tal como costumam fazer com as sobras de santinhos de candidatos nos dias de eleição, descartadas despreocupada e esperançosamente nas proximidades das seções eleitorais.
 
 
URNA ELETRÔNICA
Foi divulgado pela mídia que o ataque hacker aos computadores do STE teria sido orquestrado por bolsonaristas ultrarradicais com o objetivo de desestabilizar o sistema eleitoral brasileiro” e desqualificar a utilização da urna eletrônica. Só isso aí já me faria sapatear de ódio. Agora, pior mesmo é ver que o rebanho bolsonarista ecoa a visão míope e retrógrada do presidente e de seus filhos, que defendem a volta do “voto de papel”.
 
Aparentemente utilizam viseiras (antolhos) para não enxergar a zona que as recentes eleições americanas exibiram. Uma de minhas amigas bolsonaristas em sua defesa do voto de papel comentou que “gostaria de saber em quem votou”. Acontece que ela é quase tão velha quanto eu e certamente utilizou a cédula de papel, tão ou mais sujeita a fraudes que a urna eletrônica. Tive vontade de lhe perguntar se na época em que se podia escrever qualquer merda naquele pedaço de papel (e escreviam) era fornecida a ela uma cópia do voto depositado na urna, mas preferi lembrar as “eleições” do Macaco Tião e do rinoceronte Cacareco. Macaco Tião era um chimpanzé que teve sua candidatura lançada em 1986 pela turma do Casseta e Planeta. Recebeu 400.000 votos e ganhou estátua depois que morreu. Cacareco era uma rinoceronte que recebeu 100.000 votos em 1959. Não foi diplomada como vereadora, mas ganhou marchinha de carnaval ("Ca ca ca careco...").
 
Um dos méritos da urna eletrônica foi acabar com essa esculhambação. Além disso, por não estar conectada à internet e ser auditada antes e depois da votação tem infinitamente mais segurança que o voto de papel. Mas os bolsonaristas só mudarão suas convicções se antes o presidente mudar as dele. Brinquei com outro amigo bolsonarista que as urnas eletrônicas são mesmo uma merda, pois sempre confirmam as pesquisas eleitorais. Resposta do jumento: - “É claro, por isso eles começam antes a adulterar as pesquisas eleitorais”.  Depois disso, desisti de contra-argumentar, pois não tinha nem um pouco de capim para oferecer a ele!
 
 
VOTO ÚTIL
Um amigo de facebook que conheço há centenas de anos me criticou por “torcer para bandidos”. Como diria o personagem Seu Peru, eu já estava com ele “porraqui”. E essa foi a gota d’água para cancelar nossa “amizade” na rede social. Antes do gesto definitivo, fiz uma profissão de fé na moderação e no equilíbrio.
 
Não torço, nunca torci para bandidos. Pelo menos não conscientemente. Sempre votei pensando qual candidato seria menos pior, menos danoso para a população. Por isso meu voto oscilou de um lado para outro, pois em cada momento eu ACREDITAVA que o candidato em quem votei era o menos pior.
 
Votei no Collor contra o Lula, no FHC contra o Lula, no Lula contra o Serra, no Aécio contra a Dilma e, mais recentemente, no Bolsonaro. No segundo turno, por odiar o PT, nunca poderia votar no Haddad. Como nunca anulei voto nem nunca votei em branco, sobrava o Bolsonaro. Votei nele. Mas hoje tenho tantas restrições às coisas que ele diz e faz que não consigo deixar de comentar o que seus apoiadores convictos postam no Facebook. Quer saber? Eu adoraria que ele mudasse um pouco, que deixasse de escutar seus filhos, o Olavo e outros radicais. Que amansasse um pouco o "Cavalão" que demonstra ser (na verdade, está mais para jumento), que deixasse de ser preconceituoso, que deixasse de só pensar e agir com vistas à sua reeleição. Eu continuo torcendo para que faça um bom governo, mas não tenho mais muitas esperanças. Na verdade, não tenho nenhuma”.
 
 
... E OBRIGATÓRIO
Sou totalmente a favor do voto obrigatório (assim como da vacinação obrigatória) e o motivo é simples: desde há muito tempo, percebi que se o voto não for obrigatório qualquer grupo minimamente organizado poderá fazer seu candidato ser eleito justamente pelo desinteresse em votar manifestado pelas pessoas que não se ligam em grupos e propostas ideológicas definidas. Isso vale tanto para os bolsonaristas quanto para os petistas ou evangélicos, por exemplo. O voto obrigatório dilui essa possibilidade.
 
 
ANDRÉ DO RAP
Em minha opinião de ignorante, a soltura do criminoso barra pesada André do Rap por conta de uma filigrana jurídica foi um lamentável equívoco do ministro Marco Aurélio, decisão criticada também por um porrilhão de juristas. Já tinha esquecido esse assunto quando vi a crítica à prisão do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio (muito prazer, nunca tinha ouvido falar dele antes). Mas foi justamente a soltura do traficante autorizada pelo "STF” a defesa usada pela gangue bolsonarista para condenar a prisão do blogueiro. Procedimento que ilustra bem o raciocínio equivocado ou de má fé (prefiro esta hipótese) utilizado pelos seguidores do Messias. Meu fígado talhado exigiu que eu respondesse ao amigo que tinha divulgado essa idiotice:
 
“Dizem os sábios que dois erros não fazem um acerto. A soltura do traficante foi erro de UM ministro do STF, não de todo o STF. Quanto ao Oswaldo Eustáquio, mesmo que ele seja apenas um blogueiro incendiário a favor de um presidente incendiário, o que ele fez foi desprezar as restrições legais a que estava imposto. Essa ideia de que tudo o que é a favor do presidente está certo e de que tudo o que ele critica está errado é insuportavelmente parcial e equivocada. Relembrando: No primeiro caso UM juiz autorizou a libertação de um criminoso. No segundo caso foi o próprio condenado que decidiu por si só o que deveria fazer. No primeiro caso um equívoco de UM juiz; no segundo caso, um sujeito que resolveu ser juiz de si próprio. Não dá para aceitar nenhum dos dois, concorda?”
 
 
OLHA A VACINA AÍ, GENTE!
Desde o início da pandemia é óbvio dizer que todas as pessoas desejaram que algum medicamento já existente funcionasse e fosse eficaz no tratamento e prevenção da Covid-19 - pelo menos até a disponibilização das vacinas em estudo. Agora, algumas vacinas já estão nas bicas de ser liberadas para vacinação em massa. Mas, aparentemente há pessoas torcendo contra, mais uma vez ecoando o pensamento do presidente sobre o assunto. O que me incomoda nessa história toda é que um assunto eminentemente técnico esteja sendo discutido e questionado por pessoas que não têm nenhuma formação para isso.
 
Entre ouvir um médico especialista nessa área, um farmacêutico com PHD e um capitão reformado cheio de preconceitos e ideias ultrapassadas e que se elegeu presidente, prefiro muito mais os profissionais que estudaram pra caramba antes de emitir opinião. Entre dois errados prefiro o erro do especialista. Basta lembrar a quantidade de posts e tuites que já circularam defendendo o uso da cloroquina (a menina dos olhos do presidente). Em contrapartida, a mesma quantidade de posts refugou a vacina chinesa com as justificativas mais estapafúrdias.
 
O desprezo ou falta de crença na Ciência e o pensamento (equivocado, na minha opinião) de que a vacinação não deve ser obrigatória talvez esteja condenando o Brasil a conviver novamente com a poliomielite e outras doenças para as quais há muito tempo já existe vacina comprovada.
 
 
ONDA, ONDA, OLHA A ONDA!
Agora, com a ameaça de uma segunda onda de contaminação ascendente da Covid, nosso presidente manifestou sua preocupação com os destinos da população e da economia, dizendo: "E agora tem a conversinha de segunda onda. Tem que enfrentar se tiver (segunda onda). Se quebrar de vez a economia, seremos um País de miseráveis. Só isso". Desconsiderando a "conversinha", eu penso sinceramente que essa é uma preocupação justa e plausível. Mas aí eu penso também: por que o filhadaputa teima em detonar, questionar e atropelar a liberação de vacinas só porque veio daqui ou dali, desse ou daquele país? Nessas horas é que o “daltonismo” dele deveria se manifestar, pois o vermelho pode muito bem ser verde, ou seja, quando uma vacina chinesa for injetada em alguém trará apenas imunidade à Covid, não transformará ninguém em comunista.


CAITITU
Justamente pela associação tóxica entre ideologia, ignorância e negacionismo é que entendo ser necessário fazer este alerta final: ainda não existe (e talvez nunca venha a existir) vacina injetável (nem mesmo de fabricação chinesa) contra radicalismo, ignorância, visão distorcida da realidade e preconceito. Por isso, cuidado para não se contaminar, pois, como dizia meu pai, “só bobos e caititus andam em bando”.

2 comentários:

  1. Pois esse é o maior pecado da controversa urna eletrônica : acabou com a esculhambação! A esculhambação é a maior liberdade de expressão que o ser humano pode ter.

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    1. Pior é que eu também acho! Ao ser pressionada a tecla de anular deveriam aparecer na tela alguns emojis, tipo carinha vomitando, bunda peidando, forca, cutelo e coisas assim para fazer a crítica. Provavelmente o número de votos válidos cairia bastante.

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