sábado, 14 de novembro de 2020

ESTROBOSCÓPIO


Com as eleições municipais já batendo à porta, preciso dizer que deixarei de votar pela primeira vez na vida. Nunca anulei voto, nunca votei em branco, nunca precisei justificar minha ausência. Sempre tentei votar no menos pior, sempre votei pensando no que poderia ser melhor, não para mim, mas para o povo da minha cidade, do meu estado ou do Brasil (sempre fui um romântico). Por isso mesmo, votei no FHC, no Lula, no Aécio e no Bolsonaro. Só não me arrependi de ter votado no FHC. Mas não votarei nas eleições municipais deste ano. E o motivo atende pelo nome de Covid. Talvez eu seja apenas mais um dos velhos de um "país de maricas", como relinchou o primeiro mandatário. Não me incomodo que ele pense assim, pois diz o ditado popular que "chumbo trocado não dói". E eu penso muito mal dele! Por isso, com as eleições na cabeça, tive uma ideia de jerico (ou seria de maricas?), uma experimentação estética, apenas um passatempo que passarei a detalhar.

Não me lembro mais se estava no primeiro ou segundo grau quando um professor de física nos deu como trabalho prático a fabricação ou execução de um estroboscópio. Tratava-se de um disco com fendas radiais e um furo excêntrico com diâmetro suficiente para nele se enfiar o dedo indicador. Esse disco era pregado em uma madeira e girado para se obter o efeito “congelado” de alguma coisa em movimento giratório ou coisa parecida.
 
Lembrei-me desse experimento ao ouvir a música “Criola”, de Jorge Ben(jor). Um dos versos diz que “a negra é a soma de todas as cores”. Indiscutivelmente uma ótima frase, atribuída pelo Benjor ao Gilberto Gil (“E como já dizia o poeta Gil...”). Tenho a impressão de que muitos dos meus pensamentos surgem primeiro como imagens. Talvez por isso, enquanto ouvia a música, fui assaltado por uma ideia meio bizarra (melhor ser assaltado por uma ideia infantil que ouvir alguém dizer “Perdeu, perdeu!”, concorda?).
 
Fiquei pensando em utilizar uma variante do velho e bom disco de Newton para fazer uma avaliação puramente estética da “cor do Brasil”. Só que em lugar da divisão homogênea do disco nas tonalidades básicas, seriam utilizadas algumas cores que representassem macro situações do país (o que a ociosidade não faz!). Poderia, por exemplo, ser utilizada para definir a “cor religiosa do Brasil”. Mas, para ser sincero, estimulado pelas manifestações inflamadas dos bolsonaristas-raiz, pensei mesmo foi tentar encontrar a “cor ideológica” do Brasil. E a “receita” seria esta:
 
- utilizar os resultados eleitorais para presidente obtidos no primeiro turno das eleições de 2018;
- dividir em cinco as nuances ideológicas observadas. Sem me preocupar muito com o rigor científico (afinal, essa experiência é apenas diversão, não uma tese de mestrado), os votos seriam identificados como direita ou esquerda entusiasmada, direita ou esquerda civilizada e centro (não confundir com “Centrão”);
- os resultados do segundo turno poderiam ser utilizados apenas para aferição da “grande direita" e da “grande esquerda";
- as ausências e votos brancos ou nulos seriam contabilizados como “centro”, pois nenhum dos dois candidatos que passaram ao segundo turno teria atraído o interesse desse grupo;
- seriam adotadas as cores vermelho Ferrari (um pouco de elitismo não faz mal!), vermelho suco de melancia (esmaecido), verde oliva, verde bandeira, e, para o centro, poderiam ser usadas cores neutras tipo “amarelo constrangido”, “creme indiferente”, “cinza distraído”, “rosa e rosinha” e por aí. Entretanto, para dar um pouco de qualidade a essa ideia de jegue, sugiro a adoção da cor “flicts” (cor inventada pelo Ziraldo para identificar a cor da Lua) para o povo do centro;
- os percentuais apurados seriam lançados em um gráfico tipo pizza e o disco assim obtido seria submetido a uma rotação uniforme. Et voilà!, visualiza-se a cor resultante que poderia ser chamada de “a cor do Brasil”. Que tal?
 
Como no país não se vota em partidos nem em ideias, a identificação seria feita apenas pelo perfil provável de cada candidato que concorreu. A única exceção seria no caso do PT, pois em vez de classificar o “poste” Haddad, pensei na Gleisi Hoffman e em outros dirigentes tão ou mais radicais que ela. Se essa brincadeira interessou a alguém, os percentuais a que cheguei são estes:
 
Esquerda entusiasmada (vermelho Ferrari) 22%
Esquerda civilizada (vermelho desbotado) 10%
Centro (flicts) 32%
Direita civilizada (verde bandeira) 2%
Direita exaltada (verde oliva) 34%
 
Essa mistura de cores pode ser feita em aplicativos de celular, mas não tenho essa manha nem meu celular tem capacidade para isso, pois ainda é movido a carvão. E nem penso em fazer “trabalhinho escolar”, pois não tenho mais idade nem saco para isso. Alguém aí se habilita? Pensando bem, melhor não, pois correrá o risco de ser considerado mariquinhas por algum filhadaputa à solta.

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