Prezado amigo Agostinho, eu continuo aqui mesmo. Não, isso é música do Gilberto Gil e
não é sobre isso que eu quero falar.
Você sugeriu que eu registrasse os casos de
sua família, tarefa dificílima, pois, mesmo que já tenha ouvido algumas
histórias, a família não é minha. O máximo que posso fazer é sugerir que você
mesmo faça isso. Considerando os comentários elogiosos que ouvi de sua prima sobre
sua forma de escrever, a sugestão que te faço é essa: procure criar um grande
painel sobre sua família, sobre seus tios e avós, esse pessoal de sangue quente
e coração generoso que tive o privilégio de conhecer. Um painel composto de
casos (normalmente saborosos), lembranças e fotos.
Como fazer isso é problema seu, mas sugiro
conversas gravadas com cada um de seus primos e tias ainda vivas (claro). Pedir
que cada um escreva suas lembranças é querer demais, pois nem todo mundo
sente-se confortável diante de um editor de texto ou de uma folha branca. A
partir daí, vira trabalho braçal, embora extremamente prazeroso. Por isso, arregace as mangas e comece. Vale a pena.
Eu já escrevi um monte de coisas tendo meus
filhos como público-alvo preferencial. Muitos desses textos derivaram de
reflexões e inquietações surgidas após fazer cinquenta anos. Dentre esses
textos estão justamente os casos das famílias de meu pai e minha mãe. Para
isso, contei com a minha memória (uma merda) e da minha irmã. Descolei também
fotos de meus tios, meus avós e bisavós (!) e mandei para eles.
Para contar sobre meus tios, avós e bisavós,
optei por não tentar fazer uma biografia de cada um, tarefa quase impossível e
de leitura certamente enfadonha. Outra coisa que tive o cuidado de evitar é a
narrativa “chapa branca”, aquela em que só se encontram qualidades e elogios.
Como essas pessoas tinham, simultaneamente, qualidades e defeitos, a melhor
forma de lembrá-las seria contar os casos lembrados, por mais picantes e
constrangedores que fossem. Afinal, o que eu pretendia era criar um retrato
mental para somar à imagem fotográfica de cada um, para que meus filhos, se
assim o quisessem, pudessem ver um conjunto mais palpável de seus antepassados.
A ideia por trás disso tudo era a preservação
da memória de gente comum (mas nem por isso menos importante para mim), gente
que nunca entrou nem entrará em livros de história, essas coisas. Ou seja,
pessoas que o sopro do Tempo logo dispersa e apaga. Isso era o que eu pensava
quando comecei. Mas vou te contar um segredo: hoje eu sei, tenho certeza, de
que minha intenção – mesmo que inconsciente – era incorporar-me às narrativas e
também ser lembrado por quem as lesse, permanecer “vivo” um pouco mais. O que
não invalida a proposta original.
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