Embora goste muito de poesia, devo confessar
minha imensa ignorância sobre o assunto. Por exemplo, quase nada sei (mas é
nada mesmo) sobre Manoel Bandeira. Apesar disso, a reverência hoje é para ele. E
poema escolhido é “Profundamente”.
Foi só quando comecei a ler “Baú de Ossos”, de Pedro Nava, é que tomei conhecimento dessa poesia, que serve como preâmbulo, como mote para esse incrível livro. Como o assunto “memória” mexe muito comigo, bastou ler para virar fã eterno dos dois escritores. E se o Manoel Bandeira tivesse escrito apenas esse poema, já teria direito de entrar em qualquer antologia que se fizesse. Olha só que beleza:
Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas
luzes de Bengala
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras
acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem
risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras
acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Quando eu tinha seis
anos
Não pude ver o fim da
festa de São João
Porque adormeci
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
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