A VACA VOADORA
Essa história é muito, muito inverossímil,
embora ele jurasse que aconteceu mesmo. Mas é uma das melhores contadas por
aquele velho maluco.
O Digão trabalhou em obras durante muitos
anos, a maior parte do tempo fora das capitais. Uma dessas obras foi a
construção de um trecho de estrada no norte do Brasil, bem no meio da selva,
ligando, se não me engano, Porto Velho a Rio Branco.
Segundo ele, o acesso inicial ao local era
feito de barco. Os equipamentos pesados, provavelmente transportados por balsa,
abriram uma clareira na floresta, que logo deu lugar a uma pista de pouso. A
empresa tinha um avião DC-3 ou Constelation, adaptado para o transporte de
carga. Assim, a porta se abria para dentro do avião, sabe lá Deus por qual
motivo. O piloto, meio aloprado, havia sido demitido de uma das companhias da
época (Panair, Real ou outra qualquer).
A obra transcorria dentro da normalidade,
exceto por um detalhe: a carne servida aos operários era necessariamente
salgada, charque. Depois de um tempo, começaram as reclamações, pois ninguém
mais aguentava comer todo dia essa carne.
A primeira solução encontrada foi contratar
um caçador que, apesar de estarem na selva, só conseguia trazer macacos,
cobras, coisas assim. Segundo o Digão, um macaco limpo (sem os pelos, sei lá),
lembra muito uma criança recém nascida. Já viu que devia ser uma maravilha de
se preparar ou comer, não é?
O fato é que o abastecimento de carne era um
problema real. Surgiu então a ideia de comprar algumas cabeças de gado,
deixadas em Rio Branco ou Porto Velho. Na medida da necessidade, os
bois eram abatidos e a carne levada para a obra no DC-3. Entretanto, devido a
algum problema, às vezes o voo atrasava. Assim, quando a carne chegava ao local
da obra era jogada fora, pois já estava esverdeada e cheirando mal,
provavelmente devido ao calor e falta de refrigeração.
Aí, surgiu a solução definitiva: levar o boi
vivo para a obra. Para isso, o boi era colocado em um cercado improvisado,
feito com uma espécie de rede usada para prender a carga dentro do avião.
Chegando à obra, o boi era abatido, esquartejado, desossado e tudo o mais que é
necessário para um cristão poder comer carne fresca.
Pela paixão que tinha por aviões, quase todas
as vezes que havia voo para buscar alguma coisa, o Digão ia junto. Segundo ele,
foi assim, nessas viagens e graças ao piloto aloprado, que aprendeu a pilotar o
DC-3, sem, no entanto, decolar ou aterrissar.
Em uma dessas aconteceu o caso da vaca. A
viagem transcorria normalmente, com a vaca presa na rede, até que apareceu um “CB”,
um cumulus nimbus, que é uma
nuvem com intensa turbulência interna segundo meu amigo.
O piloto ainda tentou contornar a nuvem, mas
o avião começou a balançar muito. Com isso, a vaca começou a ficar agitada e
tentando se desvencilhar da rede que a prendia. O piloto começou a dar ordens:
– Acalma
essa vaca!
E o avião chacoalhando e a vaca cada vez mais
agitada. E o piloto ainda mais agitado:
– Acalma
essa vaca aí, pô!!
Os poucos passageiros tentavam acalmar o
animal, mas a situação estava realmente preta, com grande risco para todos.
Decidiram que a vaca deveria ser jogada para fora do avião.
O fato é que utilizaram a tal rede para fazer
um corredor até a porta do avião (que abria para dentro, como já dito antes).
Uns puxavam, outros empurravam e a vaca foi chegando perto da porta. E o
piloto, já possesso:
– Joga
essa vaca pra fora!!!
E eles lá, tentando:
– Vai,
neguinha, vai!!!
Mas a vaca empacou perto da porta,
provavelmente assustada com o barulho do vento e do avião. Tentaram empurrar,
mas nada. E o piloto, já histérico:
– JOGA
ESSA VACA PRA FOORA!!!!!!!
Aí, alguém teve a ideia salvadora: tirou um
punhal ou peixeira e espetou na bunda da vaca que, mugindo de dor, saltou,
melhor dizendo, voou pela porta afora. Nesse ponto, enquanto literalmente
chorávamos de rir com a história, o Digão emendou, a título de gozação:
– Não
sei se é verdade, mas dizem que até hoje tem lá uma tribo que adora uma vaca
que caiu do céu.
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