terça-feira, 20 de agosto de 2024

PARADO NO SINAL

 
Em Belo Horizonte, os semáforos com tempo mais prolongado sempre foram o ponto preferido para a venda de saquinhos plásticos contendo balas e bombons. Jovens de aparência humilde colocam os saquinhos nos retrovisores dos carros parados, voltando rapidamente para recolher aqueles que não despertaram o interesse dos motoristas.
 
De uns tempos para cá, esses espaços começaram a ser divididos com dois novos tipos de “agentes comerciais”: os “venezuelanos” pedindo donativos para compra de alimentos, usando chapas de isopor onde descrevem sua nacionalidade e necessidades básicas. O terceiro tipo, justamente o que mais me causa estranheza, são jovens vestindo roupas coloridas, com ou sem pintura corporal, exibindo suas habilidades com malabares, facões sem corte, sombrinhas coloridas, bolas, bambolês, monociclos e todo tipo de objetos e artefatos utilizados em apresentações circenses.
 
Sempre me pergunto de que vivem esses jovens, muitos deles com aparência ou sotaque de latino-americanos. Parecem felizes em demonstrar suas habilidades enquanto os semáforos não mudam de cor. Mas o que pensam da vida? Que sonhos acalentam? Apresentar-se no “Cirque du Soleil” ou contentam-se com uma vida errante nos circos mambembes instalados nas periferias da cidade grande?
 
Creio que já se passaram mais de quarenta anos desde a última vez em que fui a um circo, provavelmente ainda na época em que se exibiam animais selvagens (minha atração predileta).
 
Comecei a revisitar essas lembranças enquanto esperava o sinal abrir, pois tinha acabado de ler um texto muito simpático atribuído à atriz Katharine Hepburn (assim espero!), e que alguém publicou no Facebook. E é esse texto que resolvi compartilhar aqui no blog, não pelas lembranças dos circos da minha infância, mas pela identificação com a vida de privações da família descrita no texto. Lêaí.
 
Certa vez, quando eu era adolescente, meu pai e eu estávamos na fila para comprar ingressos para o circo. Finalmente, havia apenas uma família entre nós e o guichê de ingressos. Essa família me impressionou profundamente.
Eram oito crianças, todas provavelmente com menos de 12 anos. Pelo modo como se vestiam, era evidente que não tinham muito dinheiro, mas suas roupas estavam limpas e bem cuidadas. As crianças estavam bem-comportadas, todas em fila, duas a duas, atrás dos pais, de mãos dadas. Elas conversavam animadamente sobre os palhaços, os animais e os números que veriam naquela noite. Pela excitação delas, dava para sentir que nunca tinham ido ao circo antes. Aquela seria a grande noite de suas vidas.
Os pais estavam à frente do grupo, tão orgulhosos quanto podiam estar. A mãe segurava a mão do marido, olhando para ele como se dissesse: "Você é meu cavaleiro de armadura brilhante." Ele sorria, contente em ver sua família feliz.
O bilheteiro perguntou ao homem quantos ingressos ele queria. Ele respondeu orgulhosamente: "Gostaria de comprar oito ingressos para crianças e dois para adultos, para que eu possa levar minha família ao circo." A bilheteira indicou o preço. A esposa soltou a mão do marido, sua cabeça caiu, os lábios do homem começaram a tremer. Então ele se inclinou um pouco mais e perguntou: "Quanto você disse mesmo?" A atendente repetiu o preço. O homem não tinha dinheiro suficiente. Como ele poderia virar para seus oito filhos e dizer que não tinha dinheiro suficiente para levá-los ao circo?
Vendo o que estava acontecendo, meu pai enfiou a mão no bolso, tirou uma nota de 20 dólares e a jogou no chão. (Nós não éramos ricos de forma alguma!) Ele se abaixou, pegou a nota, deu um tapinha no ombro do homem e disse: "Com licença, senhor, isso caiu do seu bolso." O homem entendeu o que estava acontecendo. Ele não estava pedindo esmola, mas certamente apreciou a ajuda em uma situação desesperadora, dolorosa e constrangedora.
Ele olhou diretamente nos olhos do meu pai, apertou sua mão com as duas mãos, segurou firmemente a nota de 20 dólares, e com os lábios tremendo e uma lágrima escorrendo pelo rosto, respondeu: “Obrigado, muito obrigado, senhor. Isso realmente significa muito para mim e minha família."
Meu pai e eu voltamos para o carro e fomos para casa. Os 20 dólares que meu pai doou eram o que usaríamos para comprar nossos próprios ingressos. Embora não tenhamos visto o circo naquela noite, ambos sentimos uma alegria interior muito maior do que qualquer espetáculo que o circo poderia nos oferecer.
Naquele dia, aprendi o valor de dar. O doador é maior do que o receptor. Se você quer ser grande, maior do que a vida, aprenda a dar. O amor não tem a ver com o que você espera receber – apenas com o que você espera dar – que é tudo. A importância de dar e abençoar os outros não pode ser subestimada, pois sempre há alegria em doar.
“Aprenda a fazer alguém feliz através de atos de generosidade.”

 

 

 

15 comentários:

  1. A Marreta do Azarão20 de agosto de 2024 às 15:14

    Nada a ver com sua postagem, mas dá só uma olhada em cada doença que o povo inventa. Dessa, eu quero distância :
    https://www.msn.com/pt-br/saude/medicina/s%C3%ADndrome-de-pica-entenda-o-transtorno-e-como-amenizar-os-efeitos/ar-AA1ok1yK?ocid=mailsignout

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  2. De vez em quando, mesmo sem poder, sou um desses homens que jogam a nota de vinte pro outro. Isso é algo muito interno. Não tem nada de compensador, mas traz uma certa paz.

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    1. Você é um cara do bem, melhor do que tavez se considere.

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    2. Essa é a melhor e única definição possível sobre mim. Apesar dos meus defeitos, sou um cara do bem. Só este ano joguei umas notas de vinte algumas vezes, mas só faço quando realmente toca meu coração. Não adianta ter o trucão achando que vai me sensibilizar. Ah, Ah. A gente não pode pensar muito pra fazer essas coisas, senão não faz.

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  3. Nós três somos do bem, ainda que, vez outra, cometamos nossas maldadezinhas.

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    1. Como cantou o Lulu Santos, "a gente se dá bem, não desejamos o mal a quase ninguém".

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    2. Bons tempos esses do Lulu. Essa música mesmo, ela é super alto astral.

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    3. O Lulu é muito bom. O que talvez a maioria das pessoas não saiba é que o autor de boa parte das letras de suas músicas foi escrita pelo jornalista, escritor (biógrafo do Tim Maia), empresário e sempre alto astral Nelson Motta.

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  4. Em Lisboa, Portugal, acontece o mesmo. Cada vez mais existem os mais variados "artistas" nos semáforos.
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    Saudações poéticas e amigas.
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    Poema: “ Lágrimas, Amor e Saudade “
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  5. Parece que esse cenário se repete em todo Brasil, aqui no Rio não é diferente. Também fico matutando se esses adolescentes estudam, se não deveriam estar na escola. Sempre que tenho trocados, também ajudo, afinal de contas, estão ali expressando suas artes circenses certamente sem nunca terem ido a um circo, penso eu. A história citada é comovente.

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  6. Que post e reflexão mais lindos!
    Amei!

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    1. Como diria a Rita Lee, "Orra, meu!" dois comentários de uma só vez! Obrigado pela visita e espero que retorne, mas se quiser virar hóspede eterna será super bem vinda.

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    2. Muito obrigada pelo carinho! :)

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