Lá no início
do blog, mas bem lá no início, resolvi dar uma explicação para um leitor
inexistente sobre a técnica que utilizo para escrever as tranqueiras que
publico aqui no hoje já velho e alquebrado Blogson. Esse post, obviamente, ficou mais
inédito que música do Chico Buarque censurada na época da ditadura (perdão, eu quis dizer
“na época dos generais presidentes”). Eu o estava relendo hoje por ter recebido
um feed back super generoso de um dos
leitores desta bagaça, tecendo loas à forma como escrevo (gostaria de entender
como certas palavras são inventadas. “Loas”...).
Confesso que
fiquei super tentado a mover o texto antigo do limbo onde se encontra para os dias de hoje,
mas fui contido por um resquício de vergonha na cara que ainda trago comigo.
Por isso, resolvi aproveitar alguma coisa para criar novo post, mais um post da trapaça (os que atendem minha
síndrome de abstinência e que são publicados durante o dia). Entretanto se
alguém achar este remake uma merda, poderá dirigir-se ao original seguindo este
link.
Feita mais
uma propaganda subliminar, passemos ao remake (ou remarketing). Até pensei em adotar o título "You (re)make me feel so good", mas achei que já estava passando do ponto. O leitor que
ligou a chave para mais um post da trapaça aparenta não ser muito normal, pois
é meio estranho. Entretanto, para dar a ele o benefício da dívida, direi que aparenta ter evoluido, que talvez seja hoje um ex-estranho. Seu comentário menciona a leveza
dos textos, “mesmo quando é um assunto
sem sentido” (fico me perguntando se ele teria detectado em mim sinais
discretos de demência senil, mas deixa pra lá, senão esse remake não sai).
Eu já disse
antes que os melhores anos de minha vida profissional foram passados dentro de
um departamento responsável pela elaboração de propostas apresentadas nas
licitações de obras. Como meus colegas eram competentíssimos, mais experientes
e mais velhos, eu ficava tentando aprender por osmose (se um desses
colegas fosse meu amigo virtual Ozymandias
Realista eu ficaria tentado a aprender por ozymose. Uhu!).
Uma das
tarefas rotineiras era a descrição dos métodos construtivos a utilizar e coisas do gênero.
Mas eu não tinha essa expertise
(ficou bonito) e era super travado para escrever. Ao contrário de um colega,
que merecidamente foi promovido a chefe do departamento. Além da experiência
indiscutível, ele era mega detalhista e possuía uma elegância e fluência enorme
em tudo o que escrevia.
Anos depois,
já perto de me aposentar, resolvi registrar as hilárias histórias contadas por
meu amigo Pintão (mais marketing: foram postadas em 2014 com o título "Histórias do Digão", luxuosamente encadeadas em quinze posts). Talvez tenha sido nessa época que aconteceu a transmutação da água para leite com toddy,
pois eu passei a escrever mais ou menos como quem conversa com um amigo, como quem
conta um caso pitoresco na mesa de um botequim (neste ponto, preciso lembrar a
música do caviar do Zeca Pagodinho: “Nunca vi, nem comi, eu só
ouço falar”, pois mesa de botequim – perdoem-me os
leitores – nunca foi a minha praia).
Dito de outra
forma, minha forma de escrever passou a ser rigorosamente coloquial (o que
facilita muito para esconder a ignorância e o mau português). Foda é quando você encontra alguém
que faz justamente o oposto disso. Trabalhei com um sujeito muito culto e muito
esquisito (eu só me dou bem com gente esquisita). Esse cara tinha a mania de falar
como se estivesse lendo um livro em voz alta. Enquanto eu escrevo como falo, ele falava
como se tivesse escrevendo uma tese de mestrado.
Talvez seja esse
meu estilo displicente, cheio de pausas para respiração, hesitações, comentários
paralelos, uso e abuso de sinônimos encadeados, milhares de vírgulas e alguma
ironia é que traga a tal leveza dos textos que escrevo. E como este é um “post
da trapaça”, permito-me transcrever o final do post original:
Alguns
anos atrás, ao folhear uma apostila de vestibular de um dos meninos, encontrei
um trecho de “Macunaíma”, juntamente com uma análise desse livro. Segundo a
apostila, o Mário de Andrade, que era um grande conhecedor de música, teria
chamado sua obra de “rapsódia”, pela semelhança construtiva com as peças
musicais que têm essa designação. Em música, segundo meu amigo Guga (para os
íntimos, para os demais é Google mesmo), rapsódia é uma peça “formada
a partir de trechos, temas ou processos de composição das canções tradicionais
ou populares de uma região ou de um país”.
Ou
seja, “rapsódia” é uma colcha de retalhos, uma verdadeira salada de frutas
literária (no caso de “Macunaíma”) ou musical. Então, eu também poderia
(modestamente!) chamar os textos que escrevo de rapsódicos. O problema é que as
saladas que eu faço são do tipo jerimum, jiló, chuchu e cagaita, sendo
esse último ingrediente uma referência indireta aos resultados que alcanço. Mas
aí já é outra história.
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