quarta-feira, 30 de setembro de 2020

APOTEGMA É A SENHORA SUA MÃE!

Mesmo que seu formato possa ser considerado antiquado e fora de moda, se tem uma coisa que admiro é um soneto daqueles bem tradicionais. Sua estrutura engessada que lembraria esquema tático de futebol (“vamos jogar no esquema 4-4-3-3”), além dos cuidados com métrica e rima me fascinam. Por isso, respeito e invejo os poetas que conseguem trafegar com competência nesse espaço exíguo. Para mim eles são como os neurocirurgiões.

Como disse uma vez, soneto é uma coisa mais ou menos como uma cirurgia feita no cérebro: o que falta em espaço sobra em restrições e cuidados a tomar. O poeta e o médico conseguem o suprassumo da precisão e eficiência, tudo realizado em espaço muito reduzido.

Mas penso que alguns textos em prosa têm um estilo que lembra longe (bem longe!) o gesso do poema. São as frases curtas, precisas e surpreendentes identificadas por aforismos, máximas, provérbios, adágios e até apotegmas - que me recusei a procurar no dicionário. "Apotegma”... Onde já se viu uma coisa dessas? Parece ofensa dirigida a juiz de futebol: "Sua mãe é uma apotegma, seu puto!"

Essas frases também precisam cumprir algumas exigências para atingir o status de supimpa: não devem ser extremamente longas, precisam conter uma ideia completa, devem ser como que flashes ou insights que surpreendem, encantam ou divertem quem as lê. Há pessoas craquérrimas nesse tipo de expressão literária. Como gosto demais dessa visão twitter, já fiz posts com coletâneas de frases do escritor Mark Twain, do comediante Groucho Marx, do jornalista H.L. Mencken, do senador romano Cícero, do economista Roberto Campos e do genial "multitarefa" Millôr Fernandes.

Para passar o tempo, resolvi revisitar esses posts e extrair cinco frases de cada um (TOC, sabe como é, né?). Mas aí me empolguei e fiz algumas visitas a outros autores, reconhecidos por sua inteligência e ironia: Voltaire, Barão de Itararé e Mário Quintana. E a coisa não parou por aí, pois resolvi buscar frases de desconhecidos funcionais que mexeram comigo. Um deles é o filósofo Lao Tizé. O outro, só lendo para descobrir.

Nessa altura do campeonato já não dava mais para atender o TOC das cinco frases (que ficou sendo o limite máximo para cada autor). Por isso, desencanei dessa ideia e fiz uma lista das que mexeram mais comigo no momento de sua leitura. Mas, de sacanagem, não identifiquei seus autores (neste ponto preciso fazer um comentário: originalmente, todas as frases tinham sua autoria identificada. Depois, mesmo tendo ocultado os autores, resolvi manter a referência ao Lao Tizé - que é uma piada). Olhaí.

- A alma humana, como os bolsos da batina de padre, tem mistérios insondáveis.
- A Bíblia nos ensina a amar o próximo e também a amar nossos inimigos provavelmente porque eles em geral são a mesma pessoa.
- A consciência é uma voz interior que nos adverte de que alguém pode estar olhando.
- A filosofia é a ciência que nos ensina a ser infelizes da maneira mais inteligente.
- A forca é o mais desagradável dos instrumentos de corda.
- A humildade é apenas o lado avesso do orgulho.
- A minha consciência tem mais peso pra mim do que a opinião do mundo inteiro.
- A política tem a sua fonte na perversidade e não na grandeza do espírito humano.
- A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.
- A vida ideal consiste em ter bons amigos, bons livros e uma consciência sonolenta.
- Aproximo-me suavemente do momento em que os filósofos e os imbecis têm o mesmo destino.
- Continuamos a ser colônia, um país não de cidadãos, mas de súditos, passivamente submetidos às “autoridades” – a grande diferença, no fundo, é que antigamente a “autoridade” era Lisboa. Hoje, é Brasília.
- Deus é contra as guerras, mas fica do lado de quem atira melhor.
- Devemos julgar um homem mais pelas suas perguntas que pelas respostas.
- Em um mundo de tantas verdades eternas e convicções absolutas, eu me sinto feliz por não ter certeza de nada.
- Eu bebo para tornar as outras pessoas interessantes.
- Eu fui casado por um juiz. Eu deveria ter pedido por um júri.
- Eu não acredito em nada do que escrevo. Mas não escrevo nada que eu não acredite.
- Eu não sou louco pela realidade, mas ainda é o único lugar para conseguir uma refeição decente.
- Eu temo o Poder e admiro o Conhecimento, mas a única coisa que respeito é a Inteligência.
- Fantasia – O que chamamos de memória.
- Há noites que eu não posso dormir de remorso por tudo o que eu deixei de cometer.
- Imoralidade é a moralidade daqueles que se divertem mais do que nós.
- Muita gente que fala o tempo todo contra a corrupção está apenas cuspindo no prato em que não comeu.
- Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar.
- Negociata é um bom negócio para o qual não fomos convidados.
- No fundo de mim, estou eu.
- Nossa Constituição é uma mistura de dicionário de utopias e regulamentação minuciosa do efêmero.
- O bem que o Estado pode fazer é limitado; o mal, infinito. O que ele pode nos dar é sempre menos do que nos pode tirar.
- O desejo de salvar a humanidade é quase sempre um disfarce para o desejo de controlá-la.
- O humor é a razão a enlouquecer.
O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente...
- O pior governo é o mais moral. Um governo composto de cínicos é frequentemente mais tolerante e humano. Mas, quando os fanáticos tomam o poder, não há limite para a opressão.
- O que se pode dizer daqueles para quem "os fins justificam os meios"? Que não têm princípios.
- Os sonhos são como os deuses. Se não se acredita neles, eles deixam de existir.
- Pensar – eis um verbo reflexivo.
- Perdemos o apetite de viver quando nossas paixões são saciadas.
- Pode não preocupar os cientistas mas a mim preocupa muito: será que também há vida imbecil nos outros planetas?
- Pode ser um pecado pensar mal dos outros, mas raramente será um engano.
- Prefiro o paraíso pelo clima, o inferno pela companhia.
- Se você acha seu chefe um pé no saco, se você considera seu trabalho um porre, enfim, se você só sente alegria quando chega Sexta-Feira, você pode estar sofrendo da Síndrome de Robinson Crusoé.
- Segundo Marx, para acabar com os males do mundo, bastava distribuir. Foi fatal. Os socialistas nunca mais entenderam a escassez.
- Tudo é relativo: o tempo que dura um minuto depende de que lado da porta do banheiro você está
- Um clássico é algo que toda a gente queria ter lido, mas que ninguém quer ler.
- Uma consciência limpa é o sinal certo de má memória.
- Uma vez criada a entidade burocrática, ela, como a matéria de Lavoisier, jamais se destrói, apenas se transforma.

E agora, a informação que faltava. Como cantou o Roger, do Ultraje a Rigor, “Eu me amo, não posso mais viver sem mim”. Por isso mesmo resolvi me infiltrar nessa festa de bacanas usando o nome Lao Tizé  - que é uma contração da frase “Olha lá o Tio !” (vixe!!!). E o GRF também compareceu (sem saber) nessa festa.

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

BOLSA DE AMORES - MÁRIO REIS


Pensei em mencionar esta música no post que acabei de publicar. Como era mais um texto "sem noção" relacionado a ações, investimentos e Bolsas de Valores, achei melhor fazer novo post dedicado apenas a essa delícia de música. Foi composta pelo Prêmio Nobel de Literatura Chico Buarque. Tudo bem que ele (ainda) não tenha ganhado o prêmio, mas se até o Bob Dylan ganhou, por que nosso Chico não pode ganhar? Merecimento ele tem de sobra.
 
A história é a seguinte: o cantor Mário Reis pediu ao Chico uma música para o disco (o último) que lançaria em 1971, depois de anos e anos afastado da carreira de cantor. Como era de família rica, morou no Copacabana Palace de 1957 até morrer, em 1981. Tinha uma interpretação suave e sincopada, diferente dos cantores de vozeirão que existiam na época em que gravou a maioria de seus discos. Por esse estilo pessoal é considerado um dos precursores (ou influenciadores) da bossa nova (particularmente, acho que não tem nada a ver). Mas vamos à música. A letra do Chico é tão boa que merece ser lida enquanto se ouve a gravação. Olhaí:
 
Comprei na bolsa de amores
As ações melhores
Que encontrei por lá
Ações de uma morena dessas
Que dão lucro à beça
Pra quem pode
E sabe jogar 
 
Mas o mercado entrou em baixa
Estou sem nada em caixa
Já perdi meu lote
Minha morena me esquecendo
Não deu dividendo
Nem deixou filhote
 
E eu que queria
De coração
Ganhar um dia
Alguma bonificação
 
Bem me dizia
Meu corretor
A moça é fria
É ordinária
Ao portador

 




MANUAL DE BOAS AÇÕES


Tenho percebido que alguns de meus novos amigos virtuais são dedicados investidores e estão certíssimos em preocupar-se com isso (parece que o "One" é o paradigma dessa turma). Sinceramente, morro de inveja de quem trafega com desenvoltura nessa área. Sempre quis investir em ações, mas creio que as tentativas aconteceram naquela fase em que alguém definiu como o momento em que a Bolsa de Valores é assunto até para engraxates, significando que naquele momento estaria ocorrendo na população em geral um perigoso otimismo sobre a valorização das ações. Até cheguei a comprar ações de algumas empresas, mas minha carteira era tão insignificante que eu dizia estar aplicando em "pochete de valores", pois "aplicação em bolsa" estava muito além das minhas possibilidades (o nome que eu realmente usava não é "pochete", mas este é um blog que se dá ao respeito). A título de curiosidade, algumas das ações que comprei eram da Sharp brasileira (ótimo investimento, concordam?). 

Segundo o quaquilionário Warren Buffett “a maioria das pessoas se interessa por ações quando todo mundo está interessado. O momento de interessar-se é quando ninguém mais se interessa. Não se ganha dinheiro comprando o que é popular”. O cara é muito foda! Perdão, acho que preciso moderar ainda mais minha linguagem já normalmente moderada, pois há senhôras lendo o blog.

Feito o devido reparo e voltando ao terceiro homem mais rico do mundo, o que sei é que ele é (ou já foi) o maior investidor individual da Coca Cola. Talvez isso nem seja tão digno de nota, pois ele é tão velho (ele consegue ser mais velho que eu!) que deve ter começado a investir quando nem a fórmula do refrigerante havia sido ainda inventada.

Mas o cara é realmente muito bom. Recentemente, pouco antes da pandemia, disse que estava pensando em reduzir os investimentos em companhias aéreas. Mais premonitório, impossível. Mas nem todos seus conselhos e dicas podem ser seguidos à risca. Como este, por exemplo: “Só compre algo que você ficaria perfeitamente feliz em segurar caso o mercado fechasse por 10 anos”. Com a idade em que estou, pensar em cenários a acontecer com prazos de dez anos ou mais é algo incompreensível e até mesmo contraindicado.

Alguém já disse que se devem comprar ações e depois se esquecer delas, pois devem ser pensadas como aplicações de longo prazo. Como assim? Só mesmo um jovem (de sessenta anos para baixo) poderia cometer uma temeridade dessas! Já pensou se um sujeito com a minha idade – que não tem certeza nem da hora em que se alimentou pela última vez – resolve comprar ações como investimento a longo prazo? Provavelmente nunca mais se lembrará do que fez, onde comprou e o que comprou.

Mesmo que não entenda chongas nenhuma disso, imagino que piores ainda são os investimentos com prazo de resgate pré-estabelecido. Já pensou no impacto disso em alguém como eu? Investimento com longo prazo de resgate para alguém com curto prazo de “retorno”? Definitivamente não dá.

Por isso, fico tentado a pedir conselhos a meus amigos doutores na matéria: em que posso ou devo investir cem merréis por mês? Mesmo que o Warren Buffett seja um grande investidor em cerveja, preciso lembrar que a quantia de que disponho não paga nem uma rodada da loura gelada. Além do mais, eu nem gosto de cerveja! O que fazer então?



sexta-feira, 25 de setembro de 2020

A LENDA DO SABUGO

Reza a lenda que um belo dia (embora estivesse frio e chuvoso), há muito tempo, a princesa de um pequeno e distante reino, apaixonou-se por um astrônomo andarilho depois que ele a fez ver estrelas a seu lado. E essa paixão a tornou mais falante, mais corada e eventualmente claudicante (mesmo que o nome do astrônomo não fosse Cláudio). O rei, que não era bobo (não precisava e nem podia, pois a corte já possuía um, sindicalizado), começou a observar a mudança em sua filha. Pai zeloso, chamou-a para uma conversa paternal (até porque se fosse maternal ele seria necessariamente um pãe).
 
Foi aí que ficou sabendo do forasteiro que estava entrando na (vida de) sua filha. Por isso, decidiu que precisava conhecê-lo, avaliar o caráter e sondar sobre suas reais intenções. Para tanto, nada melhor que uma boa pescaria de vara.

Na volta, mandou chamar a filha à sala do trono. A princesa notou o olhar preocupado e uma expressão severa no rosto real (se não fosse real, só encenação, teatro, seria uma kabuki máscara). A filha perguntou-lhe o que tinha achado do forasteiro, ao que ele respondeu:
 
 - Minha filha, esse jovem não é para você, é muito desclassificado.
- Mas, Alteza (ela era muito formalista), ele é astrônomo e nós nos amamos!
.- Minha filha, você não sabe de nada! Ele ronca à noite, peida muito e arrota outro tanto.
- Vossa Majestade perdoe minha ponderação, mas isso todo mundo faz!
- E tem mais: além de ficar me chamando de sogrão, quase me matou de susto quando se despiu totalmente e resolveu nadar tal como chegou ao mundo. Ele tem um estojo enorme, onde está caprichosamente tatuada a palavra “Sabugo”! Definitivamente, ele não é um bom partido para você. Aliás, nem partido nem inteiro!
- Ora, Papi (tentativa de chantagem emocional), não há nada de errado nele! E nem é “Sabugo”, é “Sabuco”. Esse nome só aparece quando seu telescópio está no estojo. Quando está instalado para que me mostre todas as estrelas e constelações, a frase é “Saudades do meu querido Pernambuco”(*)
- Valei-me, Beata Paula Tejano! 
 
(*) O forasteiro veio para o Brasil junto com Maurício de Nassau, na função de astrônomo da Companhia das Índias. Por ter-se encantado muito com as índias (Kaeté, com quem passava a maior parte do tempo), foi dispensado de suas funções. Ainda tentou argumentar que estava tentando ouvir os gemidos das estrelas, mas foi assim repreendido pelo conde:
- “Ora, dizeis estar ouvindo estrelas? Certo perdestes o senso! Estais demitido – e com justa causa!  Ponde-vos daqui para fora antes que eu vos mande açoitar!” (o conde era muito severo e bastante exclamativo). Foi assim que ele voltou para a Europa e virou andarilho. Por ser astrônomo, ainda ganhou a título de deboche o jocoso apelido de "mochileiro das galáxias".

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

DUAS PIADAS SEM GRAÇA




Texto incidental (Versos da música “A chuva que cai”):
 
“O mundo está mudando
Sem querer se perdendo
O céu está escurecendo

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

QUERO FICAR NO TEU CORPO

 
Depois do baixíssimo astral da publicação anterior, vamos tentar voltar ao foco original do blog, que é tentar divertir e entreter os raros leitores que inexplicavelmente continuam a acessá-lo. Para isso, nada mais indicado que um “post da trapaça” bastante sem noção.
 
 
Tatuagem é uma coisa que me impressiona muito. Antigamente só se via aquela âncora do Popeye no braço de algum desclassificado. Agora não, algumas são lindíssimas, super bem feitas, coloridas, verdadeiras obras de arte. Mas, assim como existem as ferraris e as latas velhas do programa do Luciano Hulk, às vezes vejo algumas que são dignas de pena – embaçadas, monocromáticas, mal feitas, uma merda. Pior é quando exibem frases bíblicas ilegíveis.
 
E pior, ainda muito pior é a tatuagem de nomes da paixão do momento. E nem precisa ser pobre e anônimo para fazer uma idiotice dessas, pois há atrizes famosas que já fizeram essa merda. Porque se a paixão pode acabar, tatuagem é como aquela propaganda do World Wild Fund sobre extinção de espécies: tatuagem também é para sempre. Ou você vai querer amputar o pé tatuado com o nome do bofe de quem você nem aguenta mais ouvir falar o nome?
 
Mas há alguma coisa de sinistro nos corpos quase 100% tatuados (ou fechados). Fico me perguntando o que leva jovens de corpos bonitos e saudáveis a encobrir, ocultar uma pele nova, hígida e cheia de colágeno. Seria uma versão dermatológica de um personagem? Em lugar de roupa, pele decorada.
 
A propósito do colágeno, preciso contar um caso que achei engraçado. Tenho um sobrinho filho da puta, solteiro, já na casa dos 40 anos, que não dispensa uma balada, uma gandaia (ainda se usa esta gíria?) e está sempre às voltas com meninas 10 a 20 anos mais novas que ele. Um dia perguntei se ele não tinha vergonha na cara de “estar ficando” com menina de 20 anos. Deu um sorriso debochado (os sorrisos dele são sempre debochados) e respondeu:
- “É por causa do colágeno, Tizé”.
Fiquei tão encantado com o cinismo da resposta que tive de procurar no dicionário o significado exato de “colágeno”.
 
Tatuagem pode ter uma finalidade bastante nojenta e repulsiva. Um dia meu filho contou ter lido sobre uma empresa estrangeira que se oferecia para comprar mediante contrato a pele toda tatuada de pessoas mortas - e pagaria adiantado! – para utilizar em abajures, objetos de decoração e coisas do gênero. Sinceramente isso é muuuito doentio!
 
Mas tatuagem também pode ser motivo de piada (muito boa, mas tenho vergonha de contar).Talvez os mais idosos lembrem-se daquela do “sabuco” - que em sua versão estendida seria na verdade saudades do meu querido Pernambuco.
 
O que sei é existem caras e meninas tão tatuados que na hora do rala e rola pode acontecer de não rolar nem ralar nada. O parceiro ou a parceira fica mudo, imóvel, inerte, só examinando as tatuagens. Diante da impaciência e estranhamento pela falta de iniciativa do parceiro ou da parceira, o/a “tatuadx” pode ouvir como resposta algo assim:
- “Calma, deixe-me acabar de ler. Adoro histórias em quadrinhos!”

domingo, 20 de setembro de 2020

BESTA-FERA


Este texto foi escrito em 27/08, em um dia de expiação de culpas antigas (mas não adiantou).

O Blogson sempre foi para mim um lugar de descarte, de descarga, de desabafo, de muro das lamentações. Isso está intimamente vinculado à sua origem, pois os primeiros duzentos posts (algo em torno disso) foram resgates de e-mails que mandava a torto e a direito. Talvez por isso, peguei a mania de falar (mal) de mim mesmo, até quando faço piadinhas e trocadilhos infames. Talvez por excesso de soberba, vaidade e egocentrismo eu acredite que meus strip teases emocionais possam servir de comparação para aqueles que acessam o blog. Em outras palavras, tal como em uma terapia de grupo, o que eu digo de mim pode servir de gatilho para que o leitor reflita sobre si mesmo (e dê graças a Deus por não ser parecido comigo).

Essa goma indigesta serviu para que eu fale de meu pai, de culpa e de arrependimento (estou sentindo que a goma ficará ainda mais indigesta). Quando eu nasci meu pai tinha 39 anos. Quando meu primeiro filho nasceu eu tinha 26 anos (hoje tenho 70). Talvez por ter me tornado pai tão novo sempre conversei com meus filhos de forma bastante livre e relaxada (ao contrário das conversas que tinha com meu pai). Além do mais, sempre gostei de quadrinhos, discos, livros, shows, exposições, cadernos B e todo tipo de coisa que permite ter um panorama geral do que eu chamo de “cultura pop”. Hoje, graças a esse relacionamento que estabeleci com meus filhos, são eles que me alimentam com novidades (ou “velhidades” que eu não conhecia). Há pessoas que são pragmáticas, focadas em suas profissões. Eu nunca fui assim, sempre gostei de cultura inútil. Mas nem todo mundo tem esse interesse difuso e sem utilidade prática. E muitos conhecidos reais não entendem as piadas idiotas que faço, fazendo com que eu me sinta um ET.

Apenas digo que esse comportamento descontraído e pensamentos descolados servem para camuflar o ogro que existe em mim. Porque meu pai, mesmo nascido em uma época inimaginavelmente remota e tendo 39 anos quando eu nasci nunca foi o carrasco sádico em que eu me transformei depois que nossos filhos foram nascendo. Creio já ter falado sobre isso aqui em outra seção de blogoterapia, mas não vejo problema em (re)admitir meus erros e culpas, pois só os idiotas não aceitam que erram ou que erraram.

Quando nosso primeiro filho nasceu eu tinha apenas 26 anos, era tão imaturo que dava até pena.  Talvez essa imaturidade tenha me feito pensar que castigar fisicamente os meninos era um bom método de educação. Afinal, como eu nunca apanhei de meus pais, talvez essa ausência de castigo corporal explicasse minha preguiça, minha indolência, minha ausência de fibra, de dedicação, de maturidade. E por isso eu castiguei com surras e palmadas quatro criancinhas lindas, amorosas, inocentes e indefesas. Eu usei minha mão de adulto para castigar quem estava apenas agindo como as crianças que eram. Para ser sincero, as palmadas eram como que espasmos, motivadas mais pela minha impaciência que pelo "merecimento". Por exemplo, se um brinquedo era jogado para cima e caía em cima de um irmãozinho mais novo, já sabe, palmada. Isso aconteceu com duas criancinhas, quando o "culpado" tinha apenas dois anos! Lembrar isso faz meu coração doer de remorso!!! Quem realmente educou nossos filhos foi minha mulher, eu só atrapalhava. E ela nunca bateu neles.

"A meu favor", para contrabalançar um pouco (como se isso adiantasse alguma coisa), declaro que nunca deixei de explicitar de forma "escandalosa" meu amor por nossos filhos (isso eu aprendi com meu pai). Outra coisa que eu queria comentar é que as palmadas e surras foram diminuindo progressivamente, do mais velho para o mais novo, até cessarem por completo. Mas a dor da injustiça e da crueldade que cometi me devasta até hoje, basta pensar nisso. Dizem que as feridas cancerosas não cicatrizam. Se for assim, o arrependimento é um câncer que me consome, é como o abutre que comia diariamente o fígado de Prometeu.

Por isso, voltando ao princípio do texto, deixo esta mensagem, esta súplica: caro leitor, cara leitora, talvez você já seja pai ou mãe, talvez ainda venha a ser. Em qualquer hipótese nunca aja com seus filhos como a besta-fera que eu fui agiu. Como cantou o Belchior, "na parede da memória esse é o quadro que dói mais". Com o tempo, talvez eles não se lembrem dos gritos ameaçadores, da violência gratuita e das surras imotivadas de que foram vítimas, mas o seu travesseiro, o seu espelho, a sua memória nunca te deixarão esquecer o que você nunca deveria ter sido e feito.

sábado, 19 de setembro de 2020

DESEMBUCHA!

 
Meu amigo virtual e gente boa Scant fez um comentário no post anterior que me estimulou a contar um caso rápido. Creio que quem mais gostará de conhecer esta história é o também gente boa Ozymandias Realista, outro amigo virtual. Bora lá.
 
Em 2001 meu filho mais velho e um amigo de serviço resolveram criar um site que hospedaria blogs de amigos e parentes. Era um projeto pessoal, não lucrativo e, detalhe importantíssimo: foi o primeiro sistema brasileiro de publicação e hospedagem de blogs! Quem desejava publicar alguma coisa, entrava no site, criava um blog e começava a postar. Meu filho comentou que tinha um sujeito que era engraçadíssimo, com textos geniais.
 
O movimento foi aumentando, aumentando, os acessos foram crescendo, pois os blogs estavam se popularizando na época. Esse aumento cada vez mais expressivo começou a inviabilizar a ideia. Encontrei este texto na internet, falando sobre esse site: “O projeto logo tomou proporções maiores, mas devido ao aumento de blogs hospedados, manter o servidor se tornou muito caro para um serviço que era gratuito e não gerava receita”.
 
 “Um projeto que poderia ter dado MUITO certo se tivesse recebido investimento na época, como é feito hoje em dia. Vale lembrar que foi o primeiro serviço brasileiro de hospedagem com sistema próprio. Desenvolvido pelos criadores. Imagina se a parada tivesse dado certo? Quem sabe não teríamos o nosso próprio WordPress brasileiro?”
 
O nome desse site era “Desembucha.com”. Como não tinham nenhum patrocinador e estavam pagando uma grana crescente para manter um site hospedeiro gratuito, acabaram por abandonar a ideia. Algum tempo depois alguém registrou o ótimo nome que tinham bolado.
 
E esta é a resposta ao comentário de meu amigo Scant. Uma coisa é certa: se um dia decretarem que será cobrada alguma taxa, qualquer taxa, de qualquer valor para que o Blogson continue a navegar sua irrelevância pela internet, esse será o dia do Ragnarok do blog da solidão ampliada. A outra hipótese – várias vezes abordada aqui – será a demência e/ou morte do blogueiro. Mas essa já é outra história.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

RESPEITO É BOM E EU GOSTO

Como sabem alguns blogueiros, há algum tempo o Blogger vinha “ameaçando” migrar todos os blogs para uma nova versão, mais simples, moderna ou o que quer que seja.  Como sou muito formalista em algumas situações, recusei-me a utilizar a nova versão no período de “degustação” e continuei me negando a utilizá-la quando foi definitivamente instalada.  Sempre utilizava a possibilidade de “reverter para a versão doada” ou coisa parecida.

Só que ontem essa mamata acabou, fazendo de mim um órfão da versão original. E eu fiquei putíssimo, pois a “ameaça” é que a mudança definitiva aconteceria “em setembro”. Só não imaginava que aconteceria na metade do mês! Quem está interessado na situação que acabei de relatar? Ninguém, obviamente. E eu que estava pensando em fazer mais um “post da trapaça” acabei ficando chocho, murcho, chateado. A ideia seria brincar com o título do 1950º post, dizendo qualquer bobagem a respeito do “nongentésimo”, que seria trocado para “nojentésimo”. Mas perdi o gás e esqueci o que queria dizer (sai pra lá, Alzheimer!).

Para não publicar apenas este desabafo, resolvi mudar radicalmente de direção, voltando-me para a gente ensolarada e alegre do Nordeste, mais especificamente para um sujeito nascido em Exu, Pernambuco. E o cabra que me fez pensar assim é Luiz Gonzaga.

O velho e bom Gonzagão - além de compositor fabuloso e cridor do baião - era provavelmente um gozador. Pelo menos é o que aparentava ser. Na música “Respeita Januário” há um trecho em que ele ironiza sua “sonfona” de cento e vinte baixos, colocando na boca de alguém de sua cidade natal uma fala muito legal. Talvez a autoria do “speech” seja também de Humberto Teixeira, o “Aldir Blanc” de Luiz Gonzaga, mas foi o Gonzagão com seu sotaque nordestino e jeito debochado que deu sabor especial ao texto falado.

Por tudo isso, pela migração do blog para a nova versão, pelo preço do arroz (agora acabou aquela expressão “arroz de festa”, ok?), pela falta de sono, pela falta de saco, pela abstinência de torresmo, resolvi transcrever a letra dos versos cantados e o comentário falado. Segura aí, juventude!

Quando eu voltei lá no sertão eu quis mangar de Januário com meu fole prateado.
Só de baixo, cento e vinte, botão preto bem juntinho como nêgo empariado
Mas antes de fazer bonito, de passagem por Granito, foram logo me dizendo
"De Taboca à Rancharia, de Salgueiro a Bodocó, Januário é o maior”
E foi aí que me falou meio zangado o véio Jacó:

Lui, respeita Januário, Lui, respeita Januário
Lui, tu pode ser famoso, mas teu pai é mais tinhoso e com ele ninguém vai, Lui,
Lui, respeita os oito baixo do teu pai
Respeita os oito baixo do teu pai

Eita, com seiscentos milhões, mas já se viu? Dispois que esse fio de Jinuário vortô do sul tem sido um arvoroço da peste lá pra banda de Novo Exu.
Todo mundo vai ver o diabo do nego. Eu também fui, mas não gostei.
O nego tá muito mudificado! Nem parece aquele mulequim que saiu daqui em 1930.
Era malero, bochudo, cabeça-de-papagaio, zambeta, feio pá peste.
Qual o quê! O nêgo agora tá gordo que parece um major!
É uma gasimira lascada, um dinheiro danado, enricou! Tá rico.
Pelos cálculos que eu fiz, ele deve possuir pra mais de dez contos de réis.
Sanfonona grande danada, 120 baixos. É muito baixo... Eu nem sei pra que tanto baixo! Porque, arreparando bem, ele só toca em dois.
Jinuário não, o fole de Jinuário tem 8 baixos, mas ele toca em todos oito.
Sabe de uma coisa? Luiz tá com muito cartaz, é um cartaz da peste, mas ele precisa respeitar os oito baixos do pai dele. E é por isso que eu canto assim

Lui, respeita Januário, Lui, respeita Januário
Lui, tu pode ser famoso, mas teu pai é mais tinhoso e com ele ninguém vai, Lui,
Lui, respeita os oito baixo do teu pai
Respeita os oito baixo do teu pai, respeita os oito baixo do teu pai!




quarta-feira, 16 de setembro de 2020

REMAKE (YOU MAKE ME FEEL SO GOOD!)

Lá no início do blog, mas bem lá no início, resolvi dar uma explicação para um leitor inexistente sobre a técnica que utilizo para escrever as tranqueiras que publico aqui no hoje já velho e alquebrado Blogson. Esse post, obviamente, ficou mais inédito que música do Chico Buarque censurada na época da ditadura (perdão, eu quis dizer “na época dos generais presidentes”). Eu o estava relendo hoje por ter recebido um feed back super generoso de um dos leitores desta bagaça, tecendo loas à forma como escrevo (gostaria de entender como certas palavras são inventadas. “Loas”...).

Confesso que fiquei super tentado a mover o texto antigo do limbo onde se encontra para os dias de hoje, mas fui contido por um resquício de vergonha na cara que ainda trago comigo. Por isso, resolvi aproveitar alguma coisa para criar novo post, mais um post da trapaça (os que atendem minha síndrome de abstinência e que são publicados durante o dia). Entretanto se alguém achar este remake uma merda, poderá dirigir-se ao original seguindo este link.

Feita mais uma propaganda subliminar, passemos ao remake (ou remarketing). Até pensei em adotar o título "You (re)make me feel so good", mas achei que já estava passando do ponto. O leitor que ligou a chave para mais um post da trapaça aparenta não ser muito normal, pois é meio estranho. Entretanto, para dar a ele o benefício da dívida, direi que aparenta ter evoluido, que talvez seja hoje um ex-estranho. Seu comentário menciona a leveza dos textos, “mesmo quando é um assunto sem sentido” (fico me perguntando se ele teria detectado em mim sinais discretos de demência senil, mas deixa pra lá, senão esse remake não sai).

Eu já disse antes que os melhores anos de minha vida profissional foram passados dentro de um departamento responsável pela elaboração de propostas apresentadas nas licitações de obras. Como meus colegas eram competentíssimos, mais experientes e mais velhos, eu ficava tentando aprender por osmose (se um desses colegas fosse meu amigo virtual Ozymandias Realista eu ficaria tentado a aprender por ozymose. Uhu!).

Uma das tarefas rotineiras era a descrição dos métodos construtivos a utilizar e coisas do gênero. Mas eu não tinha essa expertise (ficou bonito) e era super travado para escrever. Ao contrário de um colega, que merecidamente foi promovido a chefe do departamento. Além da experiência indiscutível, ele era mega detalhista e possuía uma elegância e fluência enorme em tudo o que escrevia.

Anos depois, já perto de me aposentar, resolvi registrar as hilárias histórias contadas por meu amigo Pintão (mais marketing: foram postadas em 2014 com o título "Histórias do Digão", luxuosamente encadeadas em quinze posts). Talvez tenha sido nessa época que aconteceu a transmutação da água para leite com toddy, pois eu passei a escrever mais ou menos como quem conversa com um amigo, como quem conta um caso pitoresco na mesa de um botequim (neste ponto, preciso lembrar a música do caviar do Zeca Pagodinho: Nunca vi, nem comi, eu só ouço falar, pois mesa de botequim – perdoem-me os leitores – nunca foi a minha praia).

Dito de outra forma, minha forma de escrever passou a ser rigorosamente coloquial (o que facilita muito para esconder a ignorância e o mau português). Foda é quando você encontra alguém que faz justamente o oposto disso. Trabalhei com um sujeito muito culto e muito esquisito (eu só me dou bem com gente esquisita). Esse cara tinha a mania de falar como se estivesse lendo um livro em voz alta. Enquanto eu escrevo como falo, ele falava como se tivesse escrevendo uma tese de mestrado.

Talvez seja esse meu estilo displicente, cheio de pausas para respiração, hesitações, comentários paralelos, uso e abuso de sinônimos encadeados, milhares de vírgulas e alguma ironia é que traga a tal leveza dos textos que escrevo. E como este é um “post da trapaça”, permito-me transcrever o final do post original:

Alguns anos atrás, ao folhear uma apostila de vestibular de um dos meninos, encontrei um trecho de “Macunaíma”, juntamente com uma análise desse livro. Segundo a apostila, o Mário de Andrade, que era um grande conhecedor de música, teria chamado sua obra de “rapsódia”, pela semelhança construtiva com as peças musicais que têm essa designação. Em música, segundo meu amigo Guga (para os íntimos, para os demais é Google mesmo), rapsódia é uma peça “formada a partir de trechos, temas ou processos de composição das canções tradicionais ou populares de uma região ou de um país”.

Ou seja, “rapsódia” é uma colcha de retalhos, uma verdadeira salada de frutas literária (no caso de “Macunaíma”) ou musical. Então, eu também poderia (modestamente!) chamar os textos que escrevo de rapsódicos. O problema é que as saladas que eu faço são do tipo jerimum, jiló, chuchu e cagaita, sendo esse último ingrediente uma referência indireta aos resultados que alcanço. Mas aí já é outra história.

terça-feira, 15 de setembro de 2020

É SOL, É SAL, É SUL!



O título original deste post era “Micos na Capital”. Aí pensei na associação da cor dourada com os surfistas cariocas e seus cabelos descoloridos. Precisava de uma conexão para deixar essa piada mais clara e me lembrei da música “Rio”, do tempo da bossa-nova, de onde tirei o verso que virou título do post.


domingo, 13 de setembro de 2020

MILÉSIMO NONGENTÉSIMO QUINQUAGÉSIMO? TÁ BRINCANDO!


Eu poderia fingir que este texto tem uma simbologia especial, mas não há simbologia, apenas coincidência. Ele é o 1950º post publicado no velho Blogson. Não sei nem estou interessado em saber como se diz esse número ordinal em língua de gente – “milésimo bla bla bla”. Foda-se. Até porque 1.950 são os posts remanescentes, pois excluí uns oito por problemas relacionados a direitos autorais de imagens que achei na internet. Como contei antes, tomei o maior susto ao abrir um post antigo e ele estava totalmente incompreensível, por ter sido criado a partir de uma imagem que tinha sumido. Por isso, fica a dica: seu blog pode até ser autoral, mas há coisas mais autorais que ele. Mas falei, falei e até agora ninguém sabe da “coincidência”. Simples! 1950 é o ano em que nasci (por mais obsceno que isso possa ser. Mais velho que eu só as pinturas rupestres das cavernas de Lascaux - acho que ouvi alguém dizer “agora lascou!”).

É estranho ficar falando e repetindo essas coisas, pois percebo que causo espanto em algumas pessoas quando elas se dão conta de que quem escreve e dezénha um monte de besteiras é um ancião. Talvez seja até um bom momento para mudar de nome. Posso talvez me auto-intitular tal como eu fazia com meu falecido amigo Pintão. Como ele era uns trinta anos mais velho que eu, mais ou menos o que ocorre hoje com meus leitores, passei a chamá-lo de Hans. Agora, em lugar de Jotabê, posso também me chamar de Hans. E se alguém perguntar (tal como meu amigo fez) por que "Hans", eu direi que é abreviatura de "Hanscião"

Mas, mesmo causando perplexidade pela idade provecta associada a algum complexo de Peter Pan, preciso dizer que sou um ogro, um ogro que escreve com luvas de pelica que, além de ocultar minhas impressões digitais, servem para fingir uma certa suavidade no trato. Alguém pode estar já cochilando de tanta chatice, mas duas coisas provocaram o desejo de escrever o 1950º post. O primeiro foi a síndrome causada quando fico sem postar nada. Por estar tentando manter o espaçamento de três dias entre um texto e outro, preciso trapacear um pouco para suportar a abstinência. Como já disse antes, sou um verdadeiro blogadicto.

O segundo motivo, esse sim, é bacanérrimo. Inexplicavelmente, inesperadamente, surpreendentemente (isso não ficou nada bom!) o número de seguidores desta bagaça deu um salto. E, mesmo agradecendo de joelhos, não sei a que ou a quem atribuir isso.

O circunspecto e severíssimo Marreta do Azarão é meu seguidor quase desde o parto do Blogson. Posso dizer sem nenhum grilo que se não fosse por seus frequentes comentários eu já teria acabado com o blog. Aliás, vontade não faltou. Os novos leitores não sabem (“esses moços, pobres moços, ah, se soubessem o que eu sei”), mas o Blogson já morreu duas vezes – e de morte matada! Graças à abstinência provocada pelo “assassinato”, aos incentivos do Marreta e a um/uma leitor(a) inesquecível, o blog sempre ressuscitou (graças a Deus, sem precisar fazer respiração boca a boca, pois além de ser coisa muito nojenta, deixaria minha patroa muito puta com isso).

Apesar de estar divagando muito, quero dizer que fiquei progressivamente mais feliz à medida que foram surgindo novos seguidores. Se não me engano, o primeiro foi o mestre do xadrez Ozymandias Realista, depois surgiu o gente finíssima Scant, dono de dois blogs, o discretíssimo Rocket, e um poeta estranho que se diz Ex-estranho (apesar de utilizar três identificadores diferentes). Esses jovens (para mim, qualquer um com menos de 60 anos é jovem) surgiram direta ou indiretamente de interações com o blog do Marreta. A partir daí eu perdi a noção de como outros leitores foram se aproximando. Creio que a ordem seria esta: Marina, Larissa, Maju e Fábio. Como surgiram, como ficaram sabendo do blog? Mistério, um mistério super bem vindo, prazeroso e... preocupante.

Por que estou dizendo tudo isso? Porque sou um sujeito mega ansioso, cheio de esquisitices, neuroses, que tem dificuldades reais de se expressar de forma séria e que, por isso mesmo, usa e abusa dos parênteses, ironia de quinta qualidade e utiliza o palavreado que pega por aí (enquanto ainda escuto um pouco). Apesar disso, talvez por isso, sou extremamente agradecido por essa aproximação tão inesperada e tão estimulante. E me pego pensando: De que esse pessoal gosta, o que os atraiu em um blog criado em 2014 com o tema “o blog da solidão ampliada”?

Hoje sairia um post sobre o mico leão dourado, mas resolvi deixar para amanhã, só para dizer que, graças a vocês todos, o Blogson é hoje um “blog da solidão decrescente”. Acho que é isso que gostaria de deixar registrado no 1950º post. Pessoal, muito, muito obrigado, de coração. Se não houvesse a pandemia, uma rodada de leite com Toddy (gelado, por favor!) seria por minha conta.

sábado, 12 de setembro de 2020

TESTE SEUS CONHECIMENTOS

Criado em 28/07
Se quiser testar seus conhecimentos sobre cultura inútil, olhe bem para as imagens abaixo. Elas exibem quatro motociclistas (para alguns, motoqueiro é depreciativo) de épocas e origens diferentes. Para facilitar sua vida, vou identificar um por um:


Imagem 1: O Vigilante Rodoviário, personagem e título de uma série brasileira de televisão que fez muito sucesso no início da década de 1960;
Imagem 2: Integrante do grupo  de motociclistas barra pesada Hell's Angels, surgido nos Estados Unidos em 1948;
Imagem 3: O Motoqueiro Fantasma (Ghost Rider), personagem de HQ da Marvel Comics;
Imagem 4: O "Mito".

Dois brasileiros, dois estrangeiros; três são admirados, um é mal visto; três são personagens de ficção, um é real. Você conseguiria identificá-los pelas características? Vou dar duas dicas para ajudar:

Primeira dica: os brasileiros aparecem na primeira e na quarta imagem. Fácil, não?
Segunda dica: os três motociclistas admirados estão na primeira, terceira e quarta imagens. Agora ficou mamão com açúcar!

E agora, a pergunta: quais são os personagens fictícios? Não é tão simples como parece, pois se disser que os personagens de ficção são apenas dois, errou feio. Eles são três e estão na primeira, na terceira e na quarta imagem. Ou você é daqueles que não acredita que o “Mito" não passa de um mito?




sexta-feira, 11 de setembro de 2020

O FÓRUM E A FURADA

A mídia divulgou ontem que o ministro “Ricardo Salles nega queimadas na Amazônia compartilhando vídeo da Mata Atlântica”. Que mico, Ricardinho! Aliás, um mico “de grife”, pois o vídeo mostrava um mico leão dourado (que não existe na Amazônia, só na Mata Atlântica). Que furada, que vergonha!

Mas parece que nossos “ambientalistas” encontram respaldo para fazer e dizer essas idiotices, como prova uma notícia de que só ontem tomei conhecimento. Só ontem também (10/09) fiquei sabendo de um constrangedor encontro de "notáveis" ocorrido em 2019. Que posso dizer? De novo: que vergonha, meu Deus! Que vergonha!

Em janeiro de 2019, durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, o ambientalista, prêmio Nobel da Paz e ex-vice-presidente dos EUA Al Gore conversou com o presidente de um país ridículo, ou melhor, com o presidente ridículo de um país ridículo. A constrangedora conversa, gravada por documentaristas alemães, faz parte do documentário “O Fórum”. Como essa conversa obedece a lógica sem noção dos “Diálogos de Spamtar”, resolvi transcrevê-la no Blogson. Olhaí

- Hello! Eu sou um grande amigo do Alfredo Sirkis
- (Cara de cachorro que peidou na igreja) Lá atrás, fui inimigo do Sirkis na luta armada (*).
- Oh, eu não sabia disso! Então falei sobre a pessoa errada.
- Eu sou capitão do Exército... (riso amarelo) Não, não, não tem problema. A história recém-passada no Brasil dos militares foi muito mal contada(**). A verdade sempre aparece.
- Sabe, estamos todos profundamente preocupados com a Amazônia. Lamento trazer essa questão numa reunião informal, mas é algo que me toca profundamente.
- A Amazônia não pode ser esquecida. Temos muitas riquezas, gostaria muito de explorá-las junto com os Estados Unidos.
- Eu não entendi muito bem o que o senhor quis dizer.
- Eu gosto muito do povo americano. O Brasil elegeu um presidente que gosta dos Estados Unidos. E a Amazônia pode ser a solução para o mundo. Conheço o senhor, não somos inimigos. Precisamos conversar.
- Estou sempre disposto a conversar. Obrigado.
- De nada!
- Obrigado.

Imagino o que pode ter passado pela cabeça dos protagonistas logo depois desse encontro:
- Dumb-ass politician! Asshole...
- Babaca, comunista!
Mas, claro, ninguém pensou nada disso. Nem eu. Nem eu nem o mico leão dourado do Ricardo Salles.


(*) Quando o Alfredo Sirkis deixou o Brasil em 1971, o presidente tinha apenas 16 anos, e só entrou para o exército aos 18 anos. Então, só foi inimigo no campo ideológico, só na teoria.
(**) O jornalista Elio Gaspari escreveu cinco livros, verdadeiros calhamaços sobre todo o período dos generais presidentes. Fartamente documentado e com relatos obtidos dos atores principais daquela época,. Um deles, Heitor Ferreira, secretário particular do presidente Geisel (e, antes dele, do general Golbery)


quarta-feira, 9 de setembro de 2020

REFLEXOS

O espelho da sala me olha assustado
Carrancudo é o reflexo na janela
O espelho do banheiro manda um recado
É melhor comportar-me como se espera
De um senhor que tem a minha idade
Minha mente nem se toca e pondera
Que desdenha de normas tão austeras
Que circunspecta senioridade
Exibir é a mais vã das vaidades
É tentar ser o que não se é
E que é inútil ocultar o que se é
Isso sim, um gasto de energia pueril
Pois não há mal em fingir-se infantil.

terça-feira, 8 de setembro de 2020

UM FORMATO MUITO DISCO-TÍVEL


Li hoje uma notícia tão engraçada e bizarra que não pude resistir à tentação de transformá-la em mais um "diálogo de spamtar" envolvendo dois amigos, dois jovens adultos, às vezes irritadiços, às vezes sem noção. Olhaí.

- A  que ponto chegamos! Não se pode mais confiar em nada!

- Que é que está pegando?

- Agora, até os grandes jornais estão publicando fake news!

- Por que você diz isso?

- Olha só esta notícia: “Casal de terraplanistas é resgatado no mar após partir em busca do fim do mundo. Os dois partiram do porto de Lampedusa, na Itália, para provar que a Terra tem um 'fim' e que vivemos em um mundo em forma de disco, mas acabaram se perdendo”.

- Mas isso não é fake news!

- Claro que é! O jornal diz que eles “acabaram se perdendo”, o que é a mais pura mentira. Pense bem, quando acreditaram nessa idiotice eles já estavam completamente perdidos, concorda?

- Caraca!


domingo, 6 de setembro de 2020

PORQUE HOJE É DOMINGO


Estava dando uma limpa no meu velho e bom computador e encontrei este texto, escrito em abril de 2020. Obviamente foi escrito para ser publicado no bom e velho Blogson. Tentei encontrá-lo nos posts publicados em datas próximas, mas não tive muita paciência para ficar cavoucando o que é da minha lavra, pois uma coisa que o Blogson nunca foi é lavra de pedras preciosas (esta brincadeirinha ficou mais ou menos – mais ou menos idiota, mais ou menos imbecil).

E é um texto sobre esse fóssil conhecido como Facebook, tão sem graça atualmente que me atrevo a dizer que baile da terceira idade é mais atraente (deixo claro que nunca fui a uma merda dessas!) e que quando o acesso, logo dou às de Vila Diogo (esta é uma das expressões mais estranhas e idiotas que conheço e só utilizei para passar a imagem de erúdito). Mas, voltemos ao texto que já apaguei do meu velho e bom computador (hoje está difícil!). Só resolvi publicá-lo por entender que as observações talvez se apliquem também a outras redes sociais (que desconheço). E porque hoje é domingo!

Há tempos venho observando as postagens de meus “amigos de facebook”. Isso, naturalmente, dos que postam alguma coisa, pois a maioria só “curte” ou fica mais muda que a corujinha da piada (“falar, não fala nada, mas presta uma atenção!!!”). E o que vejo ou leio deixa-me surpreso, comovido ou decepcionado, alegre ou triste, consternado ou irritado, pois o Facebook é uma espécie de holofote ou amplificador das crenças, dos valores, da ingenuidade, das preferências, da repulsa, do radicalismo e até mesmo da má fé de cada um que posta ou compartilha alguma coisa na rede.

Assim, procuro tirar alguma reflexão sobre o que vejo ou leio enquanto tento traçar mentalmente o verdadeiro perfil de cada amigo (ou o que imagino que seja seu verdadeiro perfil, pois não tenho nenhuma formação em psicologia). Matutando sobre isso da forma mais isenta e menos ideológica possível, cheguei às seguintes constatações ou conclusões (algumas bastante óbvias):

- é mais difícil influenciar alguém que ser influenciado pelas postagens recebidas. Imagino que isso aconteça pelo fato de o facebook lembrar um rio caudaloso, uma correnteza que nunca para de passar, tal a quantidade de postagens que circulam nessa rede. Dependendo do assunto e da quantidade de amigos, é comum receber três ou mais postagens iguais, repetição que parece reforçar ou dar mais credibilidade ao tema postado;
- só se lê e se compartilha o que está em sintonia com os valores, gostos e a maneira de pensar de cada um. Se você gosta de mensagens bonitinhas, de imagens de bichinhos fofinhos ou se é adepto do Lula ou do Bolsonaro você lerá ou verá com prazer e atenção todos os posts com essas características;
- no sentido inverso, se você receber mensagens e posts que contestem ou afrontem seus valores ou desmintam suas crenças e certezas você os irá ignorar ou reagirá com comentários discordando do que leu, mesmo que só tenha visto as imagens, lido o titulo ou as primeiras linhas da matéria;
- quando suas convicções são muito arraigadas pode acontecer de compartilhar notícias falsas ou maliciosas apenas pelo fato de estarem de acordo com sua visão de mundo, mesmo sabendo que se trata de fake news ou parcialmente distorcidas;
- quando um post está em sintonia com suas crenças ou preconceitos, poucas pessoas se dão ao trabalho de verificar a veracidade do que está sendo afirmado nesse post;
- quando se tem uma visão radical sobre determinado assunto ou personagem, há uma tendência a valorizar assuntos irrelevantes com comentários do tipo “isso a mídia não mostra”. O mesmo raciocínio se aplica quando se pretende depreciar esta ou aquela instituição ou personalidade pública;
- quando se pretende atacar ou defender esta ou aquela personalidade pública ou instituição, a melhor técnica é fazer afirmações genéricas que deem trabalho para se averiguar, pois a maioria das pessoas está pouco disposta a ficar pesquisando na internet se essa ou aquela notícia ou declaração é ou não verdadeira;
- notícias parcialmente verdadeiras ou editadas de forma maliciosa são uma ótima técnica para defender ou atacar qualquer coisa, pelo simples fato de criar em quem lê a sensação de estar diante de reportagem ou fato real e incontestável;
- quanto mais engessadas forem suas convicções e certezas, mais chance terá de compartilhar postagens infantis, risíveis ou condenáveis.

Depois de (re)ler esta gororoba, percebo que minha autocrítica está mais desgovernada que carro sem motorista e fico arrependido por não ter deletado o texto sem ler. Você acredita que eu pensei isso mesmo? Hum, sei não, há controvérsias...


MARCADORES DE UMA ÉPOCA - 4