Fuçando backups antigos, encontrei alguns
textos escritos há mais de dez anos, quando ainda trabalhava. Um dos
significados disso é constatar que eu nem trabalhava tanto assim. Ah, claro!
significa também que, aparentemente, eu me achava O
cara. Postá-los no blog serve apenas para registro das mudanças de estilo e
de mentalidade por que passei desde então.
RAIVA (16/09/2003)
Conheço pessoas que são naturalmente
raivosas, enraivecidas. Pensando nisso, fiquei imaginando o que seria a raiva.
Seria ela algo como expectativa não realizada, desejo não concretizado, medo
não vivenciado? Seria talvez a expressão do contraste entre o imaginado e o
encontrado, entre a expectativa e a decepção? Fica o registro de minha
perplexidade, mas não sei se há fundamento nisso que pensei.
JUVENTUDE (08/10/2003)
Acredito que novidades, especialmente as
tecnológicas, são sempre bem-vindas para os jovens, em qualquer época. Penso
ser o fascínio pelo novo uma de suas características mais destacadas. (De nós
mesmos, em nossas juventudes). Esse fascínio em nada os inibe. Um dia, ao
chegar em casa, deparo-me com meu filho mais velho mexendo dentro do computador.
Perguntei se sabia o que estava fazendo e a resposta foi um -“Claro!” alegre e
despreocupado. Confirmei depois que ele estava certo.
Os mais velhos – e, quanto mais idosos, mais
isso se acentua – têm medo da tecnologia (estou referindo-me à maioria,
naturalmente). As traquitanas que vão sendo sucessivamente lançadas no mercado
(nos) assustam ou inibem. Os manuais extensos, caudalosos, herméticos são como
textos sagrados, precisam de alguém para traduzi-los ou explicar. Os jovens nem
usam os manuais, às vezes. Displicentemente, vão na base da tentativa e erro,
decifrando a parafernália tecnológica à sua frente. Agora, se você resolve
contar algo do seu passado, verá provavelmente um sorriso de ironia ou um ar de
desinteresse e impaciência contida surgir. A eles não atrai muito o passado.
Especialmente o mais recente e doméstico. Mas penso que isso acontece desde que
o mundo é mundo.
ROLHA NA CORRENTEZA (28/10/2003)
Sempre fui movido por uma constante
inquietação que me persegue, que nunca dá trégua: como sou visto pelos outros?
O problema dessa inquietação talvez resida na crença (ou certeza) de que somos
seres mutantes, maleáveis e adaptáveis.
Assim, somos um no seio da família, outro com
os amigos e um terceiro no local de trabalho, apenas para simplificar (na
realidade, somos um universo). Algumas pessoas acreditam ser as mesmas em
qualquer situação. Se, efetivamente, conseguissem isso, penso que seria um
desastre.
Na minha modesta opinião, essa equivocada
rigidez contraria a capacidade de adaptação que fez o homem – partindo de sua
caverna ou árvore – chegar até os dias de hoje. Algumas pessoas dizem – peito
estufado de orgulho – que são sempre da mesma forma, íntegras, que nunca mudam. Eu
apenas sinto pena disso. Penso que as pessoas integram em si vários
comportamentos, de acordo com as circunstâncias. Podem até, eventualmente (ou,
na maioria dos casos, quem sabe?), não se dar conta disso. Mas são múltiplas.
Hoje sei que sou assim. E alegro-me de ser assim. Daí a imagem de “rolha na
correnteza” que criei para mim (vou para onde as águas me levam). Estaria essa
visão equivocada? Não sei. Apenas digo que a linha que costura esses
"pedaços" é a ética, aqui vista também como o respeito pelo universo
do outro, do próximo. Acho que é por aí.
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