sábado, 10 de outubro de 2020

JUÍZO FINAL

A mediocridade explicada não se torna menor após a explicação dada. Enfim...
 
Há pouco mais de um mês eu estava tristíssimo por acreditar ter magoado alguém, pois não sou do tipo que se compraz com esse tipo de atitude.  E mesmo sem gostar de tripudiar, de chutar cachorro morto e delicadezas do tipo, confesso que sou bom nisso, pois faço e falo sem sentir, imerso que estou em algum mundo criado pelo cérebro naquele momento.  Diria até que vivo boa parte do tempo com o piloto automático ligado. O problema é que esse piloto também é sem noção.
 
Então, voltando à tristeza em que estava mergulhado, senti que devia, que precisava me desculpar. Queria poder dizer à pessoa que acreditava ter magoado para que não se importasse, pois eu sou assim mesmo, inconsequente, distraído, alienado. E comecei a escrever como se minhas ondas cerebrais fossem identificáveis pelo radar de outra mente (demente!). E acabou saindo isso:
 

Eu tentei ser bom, Senhor
Eu juro que tentei!
Eu tentei ser gentil e cordial
Eu juro que tentei
Mas fingi o tempo todo.

Eu tentei ser bom marido e bom pai
Eu juro que tentei!
Eu tentei ser bom filho, bom irmão
Eu juro que tentei, Senhor!
Mas fui ausente, fui cruel.

Eu tentei ser bom colega, bom vizinho
Eu juro que tentei
Eu tentei ser bom amigo, companheiro
Eu juro que tentei, Senhor!
Mas nunca soube o que isso quer dizer.

Eu tentei ser bom, ser perfeito
Correto, confiável, solidário
Bom marido e bom pai
Bom filho e bom amigo
Mas nunca consegui.

Porque ao fim de tudo
Eu fui apenas insensível
Dissimulado, fraco, indiferente,
Desgraçadamente humano
Sempre e tão somente humano

6 comentários:

  1. Sempre e tão somente humano. Todos somos. Ser humano e não errar é como estar na chuva e não querer se molhar.
    Erramos por sermos humanos. Somos humanos por errarmos.

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    1. Essa é uma boa reflexão! Se erramos porque somos humanos isso me leva a concluir que os animais erram menos ou não erram justamente por pensar menos, por divagar menos, por ausência de crises existenciais. Então, se temos um pensamento mais elástico que nossos primos primatas isso também significa que a margem de erro a que estamos sujeitos é bem maior. E que a “programação neurolinguística” de nossos parentes os induz a menor número de erros e equívocos. Que acha disso? (eu, particularmente, acho que esta minha “contribuição” é papo de maconheiro, de hippie velho).

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    2. Pois eu adorei. Justamente isso que penso. Enquanto escrevi meu comentário, perguntei se fazia sentido e minha linha de raciocínio foi exatamente como a tua.
      Meu professor costumava dizer "sorte dos ignorantes" e acho que é uma fala muito válida e que se aplica no contexto da nossa conversa.
      A gente não sabe de nada. Mas com o pouco que sabemos, temos a responsabilidade, o "livre arbítrio" de agir como ou contra o que sabemos e acreditamos.
      Seu post foi por sentir culpa? Necessidade de se explicar (seja pra si mesmo ou pro resto)?

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    3. Sim, imaginava ter deixado isso claro na explicação do texto. Eu tenho o costume de "falar sorrindo" as maiores barbaridades a alguém por "acreditar" que ninguém se ofenderá - ou poderá se ofender - justamente pelo fato de "dizer sorrindo". Só que não! Mesmo assim, continuo a agir do mesmo modo. E às vezes me arrependo muito. Os alvos dessa vez foram minha mulher e meu filho. E eu fiquei muito mal.

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    4. É claro que deixou explícito. É que achei tão pessoal e vulnerável que decidi perguntar.
      Cada um tem sua maneira de agir e lidar com as coisas. Você reconhece e assume que é assim. Algumas pessoas não conseguem se autoanalisar criticamente dessa maneira. Isso já mostra que você pode ser mais gentil consigo mesmo, não se culpar tanto e se for da sua vontade, buscar se redimir.
      (é impossível dizer algo razoável sem saber o contexto da história toda, mas espero que fique bem. E vai ficar)

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    5. O Juca Chaves (a quem muitas pessoas talvez vejam apenas como humorista ou autor de modinhas fora de moda) é autor de uma frase que eu considero perfeita: “querer ser mais do que valem é dos imbecis a praxe”. Penso que eu passei a maior parte da minha vida com essa ilusão, pois queria e fingia ser o que não era. No blog, talvez por uma carência afetiva congênita, por exibicionismo, por gostar de torresmo ou por ter chegado à conclusão que não valia a pena esconder sentimentos, comecei a escrever correndo o mesmo risco do trapezista que se apresenta sem rede de proteção, ou seja, lançando-me nos textos quase completamente sem filtro. Mas, como cantou a Marina Lima, “deve ser da idade”.

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