O título deste post deve-se ao fato de ser um rascunho que desisti de tentar melhorar, pois começou a ser escrito em 11/08, em um de meus momentos "black dog". Já que alguns amigos virtuais parecem incomodar-se com minhas oscilações de humor, apenas lhes direi que experimentem completar setenta anos para ver o que acontece! Hoje, por exemplo, estava de boa, "nem chorando nem sorrindo" (como cantou o Caetano Veloso), apenas matutando comigo mesmo, tentando entender a
lógica de pessoas muito melhores, mais cultas e mais instruídas que eu terem
se tornado seguidoras do Blogson. E essa afirmação em nada se assemelha às palavras de ordem com que os programas de auditório comandam a platéia ("Aplausos!" "Gargalhadas"), pois já vou avisando que não estou à cata de aplausos ou de frases tipo
“deixe de frescura, Jotabê!” Em outras palavras, não estou jogando para a arquibancada. Mas que intriga, ah, isso intriga!
Porque percebo nos nove amigos virtuais
(acho muito pedante dizer “seguidores”) uma cultura humanística que eu não possuo, um
vocabulário sofisticado que está a léguas de distância da minha linguagem coloquial.
Fazer o quê, não é mesmo? Eu acho é bom, mas acabo me sentindo um semi-analfabeto
como o Lula ou um boçal como o Bolsonaro (defeito colateral), pois ambos têm seguidores muito melhores que eles próprios. Esta introdução não tem nada a ver com o texto principal do post (escrito há dois meses), só quis registrar minha perplexidade sincera pelo fato de um idoso (sem noção, mas velho assim mesmo) escrever besteiras que agradam a pessoas muito mais jovens e mais cultas que ele. Isso é verdadeiramente um mistério.
11/08
Às vezes, graças a alguma palavra, expressão
ou uma frase curta que ouço, leio ou vejo, meu cérebro se mobiliza em torno disso, mesmo que
eu ainda não saiba o que quero dizer. Começo a escrever sem rumo, tentando
fazer o cérebro "pegar no tranco", mas orbitando o assunto que
despertou minha atenção. O estímulo de hoje foi provocado por um antigo
personagem de desenho animado, uma hiena que não ria.
Minha irmã é onze anos mais nova que eu. Por
isso, quando eu ainda estava na mais desprogramada adolescência, às vezes ficava
assistindo televisão com ela. Uma das séries que ela adorava era "Perdidos
no Espaço", em que o impagável vilão Dr. Smith e um robô sem noção eram
nossos personagens prediletos. Outra preferência compartillhada eram os
desenhos da Hanna-Barbera.
A título de curiosidade, pesquisei na
internet sobre essa dupla e descobri que de 1957 a 1990 a Hanna-Barbera
Productions, Inc. produziu 183 séries de desenhos animados. Descobri também que
a dupla criou os personagens Tom e Jerry, uma das melhores lembranças do final da minha infância. Mas voltemos ao tempo em que ficava assistindo os desenhos
animados com minha irmã.
Pelo que descobri na internet, os personagens
que mais nos divertiam são justamente alguns dos que foram criados nas décadas
de 1950 e 1960. Creio que a explicação para isso serve para todos os desenhos
animados antigos: nenhum foi criado exclusivamente para o público infantil.
Fazendo um retrospecto do que era exibido
diariamente, percebo que a depressiva hiena Hardy era meu personagem predileto, justamente
por seu bordão cheio de desalento "Oh, vida, oh, dia, oh, azar!" (que repito
até hoje, imitando a voz do personagem). Essa hiena cuja boca doía ao tentar rir,
fazia par com um sempre bem humorado leão, o esfuziante Lippy. E foi justamente
o bordão da hiena que me fez começar este texto.
Os tempos mais recentes (ia escrever "os
últimos tempos", mas sei lá, vai que o Cosmos gosta desse
"últimos"...), repetindo, os tempos mais recentes têm sido muito
pesados para mim, muito tristes e dolorosos (mas dispenso palavras de consolo e
apoio, ok?). Um dos motivos foi provocado por uma sensação de velhice
progressivamente acelerada, cada vez mais rápida, cada vez mais inexorável. Daí
a ironia ao dizer a mim mesmo "Oh, dia, oh, vida, oh, azar!"
A velhice lembra uma historieta divertida que
li, em que o diabo convence um sujeito a trocar o céu pelo inferno, mostrando
um ambiente descoladíssimo, com uma iluminação feérica, cheio de luxo e luxúria,
belas mulheres, com todos os antigos companheiros de esbórnia e putaria ali reunidos, se divertindo horrores. Depois
de assinado o "contrato", a cenografia muda instantaneamente e o inferno se transforma no que realmente "é" - um lugar horroroso e cheio de sofrimento. É uma historieta que fala de
cliente, marketing, etc., mas não consegui me lembrar onde foi lida. E também
não é esse o assunto do dia.
O que sei é que a velhice chega silenciosa,
suave, sorrateira e te conduz delicadamente a um portal de boas vindas onde algum filho da puta pintou "Melhor Idade". Quem entra, logo descobre
que é na verdade um portal da má vida, de uma vida de merda, da vida de
limitações e sofrimentos crescentes. Quando fiz 42 anos deixei minha barba
crescer outra vez e achei graça nos dois pequenos tufos de cabelos brancos nas
laterais do queixo quase inexistente. Minha barba começava a ficar branca, que
engraçado! Talvez também tenha sido nessa época que minha visão outrora
excepcionalmente boa (só a do olho esquerdo) começou a não conseguir mais ler
os pequenos anúncios de jornal nem os nomes e endereços nas finadas listas
telefônicas. Isso também foi muito engraçado!
A partir daí a coisa ficou parecendo um
automóvel estacionado em uma rua descida e que esqueceram de manter com o freio
de mão acionado. O carro começa a se mover devagarinho e vai pegando velocidade
até dar perda total em um poste, muro, tanque de guerra ou nave alienígena, tanto
faz. Comigo foi exatamente assim: os joelhos começaram a doer, os cabelos
e outros adereços começaram a cair, a surdez surgiu e foi aumentando. Com ela vieram a hipertensão e o hipotiroidismo, o humor foi ficando rarefeito, o desejo de
viver foi sendo anestesiado.
Aí, quando eu achava que não poderia piorar
muito mais que isso, surgiu a pandemia, trazendo consigo a pandemência causada pelo
isolamento forçado. Desde março de 2020 não saio de casa, graças a meu
pertencimento ao "Grupo de Risco" (e pensar que nunca risquei nem
grafitei muro nenhum quando era jovem!).
Essa situação restritiva, limitante, que
faz com que eu me solidarize com os marinheiros de submarino e com os
astronautas da Estação Espacial é que tem provocado o sincero desejo de estar
morto (não com sofrimento, bem entendido), pois não mais me sinto capaz de defender, proteger e fazer felizes as pessoas que mais amo. E essa é só a ponta do iceberg, do izéberg. Só posso dizer "Oh, dia, oh,
vida, oh, azar"!, enquanto torço por um infarto fulminante (corona não!).
A hiena Hardy Har Har também é, até hoje, um dos meus personagens preferidos. Também comecei a fraquejar da visão por volta dos 42 anos e lutei contra isso como um idiota que pudesse fazer parar o tempo; aos 45, não teve jeito, passei a usar óculos para "vista cansada", um grau e meio; neste ano, já sentindo dificuldade para ler as letrinhas das palavras cruzadas, voltei ao oftalmologista : lentes de 3 graus. É a podridão, meu velho. Fora os tendões dos joelhos e calcanhares que reclamam a qualquer caminhada um pouco mais longa que eu faça.
ResponderExcluirQuanto à história que contou do capeta convencendo o cara a ir pro inferno, eu tenho uma melhor, de um cara que, depois de ser levado por São Pedro em uma visita pelo Céu, resolve por conta própria optar pelo inferno. Mas essa eu vou contar lá no Marreta, talvez ainda hoje.
Quanto à sua indagação inicial, de se sentir semianalfabeto frente aos seus leitores, esqueça, é besteira. Eu também tenho entre aqueles seguidores que aparecem lá gente muito culta, competente e capacitada que eu. Ali tem jornalista (José Pedrialli, o cara já escreveu pra Folha de São Paulo e atualmente mantém coluna na Folha de Londrina), tem um promotor, um advogado de direitos humanos que já esteve em missão em Timor-Leste, um cara que é tradutor-intérprete de russo, alemão e - parece brincadeira - búlgaro, tem até um padre com doutorado em Ciências Sociais ou coisa parecida. E tem até o Jotabê. Talvez esses caras sejam tão sérios em seus ofícios, levem uma vida tão séria e comprometida, que gostam e se divertem ao ler as besteiras que nós escrevemos. Acho que pode ser um pouco isso, mas sei lá.
Reconfortante!
Excluir"E tem até o Jotabê". Ou virou um puxa-saco profissional ou estou precisando que alguém levante a placa onde se lê "Sarcasmo!"
ExcluirCompartilho muitos dos seus pensamentos e chego a me sentir aliviada por isso. Acredito que seja normal se comparar dessa maneira, se sentir tão marginalizado diante daquilo que nos rodeia.
ResponderExcluirEu sou só uma garotinha do interior que criou um blog por puro hobby e a maioria dos meus leitores são pessoas com o dobro da minha idade ou mais. Passei a acompanhar elas também e vi quão "grande" a galera é. Agora, por exemplo, estou comentando num post do Jotabê, que apesar de ter muito mais idade que eu, não acha tudo que escrevo uma bobagem como a maioria dos senhores pensam das pessoas mais jovens.
Também sinto uma certa "responsabilidade" em colocar conteúdo bom, em passar uma certa imagem, mas isso passa quando percebo que são bobagens. Minha linha de pensamento é a seguinte: se eles dedicam seu tempo a ler as bobagens pessoais que escrevo é porque realmente se interessam por aquilo, então basta que eu seja eu mesma.
Já fiquei muito bolada por escrever muito sobre coisas tristes, mais puxadas pro lado melancólico, pois eu pensava "a vida de todo mundo já é um porre e eu fico trazendo esse tipo de coisa, ninguém tá interessado em mais tristeza". Mas daí passei a receber comentários de pessoas que diziam refletir, olhar pra si mesmas e até filosofar com o que escrevia. Eu fiquei surpresa, feliz e lisonjeada. E aos poucos parei de ter tanta neura quanto ao meu conteúdo.
Mas confesso que a maioria das vezes escrevo de madrugada, quando estou mais relaxada e as coisas dentro de mim parecem mais em ordem, boto uma música e deixo as feras se libertarem. Escrevo. Publico. Quase sempre quando acordo me sinto envergonhada, fico pensando "agora sim terão a certeza de que sou louca" e me seguro pra não apagar. Kkkkkkk. É bom compartilhar nossas vulnerabilidades.
Não se preocupe. Pega mais leve consigo mesmo (desculpe se isso soar como palavras de consolo e apoio, mas eu digo mesmo assim).
Já quis muito estar aos 30 anos. Tirei essa ideia ansiosa da cabeça quando percebi que isso logo vem, e como vem. Imagino como deve ser difícil envelhecer, mas o que sempre me atraiu na ideia de ter mais anos de vida é o amadurecimento que isso traz. A visão mais apurada. O saber tão maior e mais amplo das coisas.
A vida é difícil. As vezes penso que estar aqui é uma competição pra ver quem sofre mais e mesmo diante de tanto sofrimento consegue brincar no playground fodido. As vezes é necessário se controlar pra se manter vivo. Mas, as vezes, vale a pena; ou a gente tem que fazer (ou arranjar um jeito de) valer.
Aprendo muito contigo, Jotabê.
https://www.youtube.com/watch?v=URXSAlFukg8. A frase que sempre me impactou é esta: "How terribly strange to be seventy". E hoje impacta mais.
ExcluirLinda música. Profunda, tanto em letra quanto em voz e melodia.
ExcluirImagino como se sente. Acho que quanto mais calejados ficamos, mais as indagações e questionamentos se intensificam.
Às vezes eu silencio as indagações fazendo piadas idiotas, rindo como hiena (na verdade eu gosto de fazer piadas idiotas, pois minha boca não doi quando eu rio).Todos os comentários feitos neste post me levaram a (spoiler!) requentar, remendar, alterar um post antigo que sairá amanhã à zero hora e um minuto.
ExcluirObrigado pelo comentário. Sugiro que escute uma música gravada pela dupla Simon & Garfunkel que se chama "Old friends". Se não entender inglês (eu não sei), pegue a letra no Google e traduza. Há um verso que é a minha cara (na verdade,sempre me deixou meio aturdido).
ResponderExcluir"O inverno acompanha os velhos
ResponderExcluirPerdidos em seus sobretudos
Esperando pelo pôr-do-sol"
"Velhos amigos
Movem-se juntos pelos mesmos anos
Compartilhando em silêncio o mesmo medo"
Essa música é do caralho.
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