domingo, 18 de outubro de 2020

AQUELE ABRAÇO (EU QUERO DE NOVO)

 

Em conversa recente com um dos filhos fui aconselhado a ter "Cuidado com o cuidado”, um alerta para nos fazer pensar de que "agora é a hora de abraçar as meninas", referindo-se às suas sobrinhas e, obviamente nossas adoráveis netinhas. Lá no início do blog escrevi os textos “Aquele abraço”(https://blogsoncrusoe.blogspot.com/2015/01/aquele-abraco.html) e “Que abraço aquele!”(https://blogsoncrusoe.blogspot.com/2015/01/que-abraco-aquele.html) sobre o ato de abraçar e suas implicações (recomendo a leitura!). Fiquei com o alerta de meu filho na cabeça até resolver revisitar o tema dos dois posts antigos. Para isso, optei por apresentar minha visão atual como se estivesse respondendo a ele, pois posso divagar e dizer obviedades e platitudes sem que isso lembre aquela arrogância dos ignorantes que se acreditam donos da verdade. Bora lá.
 
Sabe, filho, seu comentário foi meio assustador, como se já soubesse de algo que estamos prestes a saber. Lógico que não se trata disso, mas colocou na pauta um assunto que não pode ser desprezado, que é a duração da vida ou o tempo que nos resta. Eu poderia fazer uma abordagem estatística com base em reportagem publicada há muito tempo na revista Veja ou me basear no histórico familiar. Seguindo a Veja eu estaria fodido, seguindo meus pais eu estaria bem na fita. Entretanto, nada disso importa, pois creio não haver ainda um algoritmo de precisão para resolver esse impasse. Em todo caso, imagino que ainda tenho uns dez anos pela frente, suficientes para amargar o arrependimento por todas as burradas, displicência ou irresponsabilidades cometidas ao longo da vida. Isso também é irrelevante para comentar seu conselho (ou presságio).
 
E sabe por quê? Porque o que eu mais desejo - e não farei isso até ser vacinado - é abraçar meus filhos. Essa é a maior falta, a maior privação que sofro. Abraçar as netinhas é uma consequência lógica  disso. Você não imagina o tanto que eu gostaria de poder abraçá-los, porque o abraço de vocês sempre foi o melhor presente que eu desejei ganhar.
 
Então, falemos das netinhas. As menininhas mais velhas estão na fase mais tchutchuca da infância. As outras duas ainda estão entrando nela. As quatro são adoráveis, lindas, indefesas e a vontade de poder abraçá-las é grande (não tanto quanto a de ganhar um abraço de vocês). Mas eu não me preocupo, pois estou sereno com a ideia de só fazer isso depois de vacinado. E sabe por quê? Assim como não sei quantos anos ainda viverei também não sei o que acontecerá comigo se (infelizmente) me expuser a um contágio  vindo de onde vier. Veja bem, sou idoso, hipertenso, hipotiroideu e tenho uma "alteração não identificada no pulmão". O que seria isso? Consequência ou sequela da pneumonia que me atingiu em 2002 ou 2003? Não sei e, "graças" à pandemia, nem tive tempo de fazer um exame mais aprofundado.
 
Então, pense bem, eu preciso ter a paciência dos marinheiros de submarino, o auto-controle dos astronautas da Estação Espacial, a determinação dos emigrantes, a resignação dos imigrantes. Eu preciso saber e aceitar esperar com calma e em paz. E, se nesse meio tempo eu cair duro ou tiver um AVC, não sentirei remorso em momento algum (bom, se eu cair duro não vou sentir é nada mesmo).
 
Você disse que "agora é a hora de abraçar as meninas". Você poderia dizer isso para quem convive com elas, não para mim, não para nós. Na idade em que estão e com a pouquíssima convivência que temos, uma convivência mascarada, a última coisa que elas desejarão é ser abraçadas por quase desconhecidos. Você certamente se lembra do Seu Amintas (meu pai). Não tenho a menor dúvida de que ele se derretia de felicidade ao vê-los. Você gostava de abraçá-lo? Duvido e nunca me incomodei com isso, pois ele era apenas um registro histórico-familiar em sua cabeça. Os vínculos afetivos entre você e ele não tinham a mesma intensidade de um para o outro. Eu adoro as menininhas, mas sou tão irrelevante para elas quanto os outros avós que também pouco convivem com elas.
 
Vínculos afetivos podem ser construídos, preservados ou desmontados e destruídos. Dependem do maior ou menor contato e da empatia que rola. Alguns poucos abraços não resolverão isso. Talvez você acredite - e se assim pensar não estará muito longe da verdade - que esse isolamento social de longa duração reativou meu lado ogro, antissocial. Mesmo que pareça pouco provável conseguir aumentar ainda mais o que já é gigantesco. Por ser aposentado e recluso ainda antes da pandemia, não poderia dizer que tenho uma vida social efervescente. Na verdade, não tenho nenhuma. Esse é um comportamento que não desejo nem recomendo a ninguém, pois te leva a cortar amizades, networking e todo tipo de relacionamento positivo e benéfico tanto pessoal como profissionalmente, o que é péssimo.
 
Por isso, meu caro filho, não deixe que sua inteligência luminosa te leve a ser impaciente com quem é menos que você. Nunca entre nessa! Não espere das pessoas mais do que elas podem te oferecer. Seja generoso emocionalmente, seja tolerante, não se baste como se fosse um ermitão ou um náufrago em ilha deserta. Jamais se comporte como se você e sua amada fossem o primeiro, o único casal no Paraíso. Não repita o erro que eu cometi, pois se você se fechar em si mesmo acabará acreditando que não existe mais ninguém digno de sua atenção e de sua convivência.

Agora é para acabar. Você me estimulou a pensar no prazer de poder abraçar as menininhas, eu comecei devagar a divagar (horrível!), fui pegando velocidade até chegar ao ponto de fazer uma exortação, uma pregação (que serviu para provar que eu sou mesmo um prego) meio sem sentido, bastante desnecessária, como se estivesse falando sozinho diante de um espelho (a superfície mais cruel que existe). Só posso te pedir que quando se encontrar com seus irmãos e suas sobrinhas, que as abrace por mim e lhes diga baixinho, em segredo, que eu também quero muito abraçá-las e que elas estão lindas demais. Que mais eu posso dizer? Ah, sim! Te amo!!!!!!!!!!!!!!! Beijão.
 

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