quarta-feira, 26 de novembro de 2014

MONÓLOGO - BARÃO DE ITARARÉ

Um dia, sem nenhum motivo ou data especial, meu amigo “Digão” deu-me de presente o livro “Máximas e Mínimas do Barão de Itararé”, com a seguinte dedicatória:

“Para o amigo Botelho oferece um de seus mais humildes escravos. 07/04/87"

O motivo do presente foi um comentário feito por ele sobre esse falso barão durante uma de nossas conversas, pois eu nunca tinha ouvido falar de Apparício Torelly, “Aporelly” ou “Barão de Itararé”, nomes que identificam um jornalista gaúcho nascido em 1895, que tinha a manha do humor inteligente, feito de frases engraçadíssimas, textos precisos e trocadilhos de fazer inveja ao pessoal do Casseta e Planeta. Aliás, foi realmente dono do jornal “A Manha”, criado em 1926, onde fazia de tudo. Detalhe: o nome era (mais) um trocadilho com o nome do jornal "Correio da Manhã", onde havia trabalhado.

Na apresentação desse livro, Jorge Amado escreveu que “desse senhor Barão de Itararé, de seu riso claro e irresistível, nasceram os atuais humoristas brasileiros, os que escrevem, os que desenham, os que escrevem e desenham. Dele nasceram Stanislaw Ponte Preta e o Analista de Bagé”.

Não quero ficar fazendo pose de quem entende do assunto. Quem quiser saber mais, compre esse livro ou procure no Google. Vou apenas transcrever um texto escolhido ao acaso, que extraí do presente que ganhei. O “barão”, apesar do imenso defeito de ser comunista, era uma fera no humor.


MONÓLOGO

Eu tinha doze garrafas de uísque na minha adega e minha mulher me disse para despejar todas na pia, porque senão...

– Assim seja! Seja feita a vossa vontade – disse eu, humildemente, e comecei a desempenhar, com religiosa obediência, a minha ingrata tarefa.

Tirei a rolha da primeira garrafa e despejei o seu conteúdo na pia, com exceção de um copo que bebi.
Extraí a rolha da segunda garrafa e procedi da mesma maneira, com exceção de um copo que virei.
Arranquei a rolha da terceira garrafa e despejei o uísque na pia, com exceção de um copo que empinei.
Puxei a pia da quarta rolha e despejei o copo na garrafa que bebi.
Apanhei a quinta rolha na pia, despejei o copo no resto e bebi a garrafa, por exceção.
Agarrei o copo da sexta pia, puxei o uísque e bebi a garrafa, com exceção da rolha.
Tirei a rolha seguinte, despejei a pia dentro da garrafa, arrolhei o copo e bebi por exceção.

Quando esvaziei todas as garrafas, menos duas que escondi atrás do banheiro, para lavar a boca amanhã cedo, resolvi conferir o serviço que tinha feito de acordo com as ordens de minha mulher, a quem não gosto de contrariar, pelo mau gênio que tem.

Segurei, então, a casa com uma mão e com a outra contei direitinho as garrafas, rolhas, copos e pias, que eram, ao todo, exatamente 39. Para me certificar de que não havia engano, contei tudo outra vez e quando terminei já encontrei um total de 93, o que dá certo, quando as coisas andam de perna para o ar. Como a casa nesse momento passou mais uma vez pela minha frente, aproveitei para controlar minhas contas e recontei todas as casas, copos, rolhas, pias e garrafas, menos aquelas duas, que escondi no banheiro e que eu acho que não vão chegar até amanhã, porque estou com uma sede louca ... 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

ANIME-SE, JOTABÊ!

  Fiquei muito feliz depois de publicar o primeiro e-book com 60 poesias escritas ao longo de 10 anos de blog, pois tinha passado de bloguei...