domingo, 3 de agosto de 2014

HISTÓRIAS DO DIGÃO - PARTE VII

ESCATOLOGIA

O Digão era um sujeito curioso, pois sendo um pai severíssimo, ao tratar com os colegas, transmutava-se, tornava-se tão igual aos demais, que ninguém ligava para a diferença de idade existente entre ele e nós outros. Assim, às vezes os assuntos descambavam para a mais pura escatologia, como se dois ou mais pré-adolescentes estivessem conversando.

Um dia comentou conosco que tinha sido operado de hemorroidas, contou alguns detalhes da operação e disse que um procedimento pós-operatório era o “alargamento do ânus”, para que a cicatrização fosse realizada adequadamente, evitando com isso o estreitamento do reto. Mas no caso dele, esclareceu, não foi feito esse “tratamento de choque”:

 O dedo do médico era da grossura do meu punho, pô!!




Depois de ser designado chefe do setor de projetos, mudou-se para o outro extremo do prédio, no mesmo andar, onde ficavam os desenhistas e projetistas, mas ia todo dia conversar fiado na antiga sala. Normalmente, chamava a atenção com a expressão Aqui, vocês já viram...” Na falta momentânea de assunto, saiu um dia esse diálogo:

 Aqui, você já cagou hoje?

 Já.

 Muito ou pouco?

 Normal.

- Qual a cor?

 Marrom...

 Mole ou duro?

 Normal!!!

 Fino ou grosso?

 Vá à puta que pariu!



O caso a seguir é um dos que classifico como fantasioso e de gosto mais que duvidoso, diga-se. Entretanto, o que mais impressiona nele é o fato de ter sido contado sem nenhuma preocupação de parecer ridículo, para um grupo de colegas que riram até a barriga doer, por um senhor de cabelos brancos, educadíssimo, muito culto, um cavalheiro, enfim. Em outras palavras, ele sempre fez questão de se comportar como qualquer um de nós, nunca quis ser tratado com a deferência e respeito a que tinha direito e merecia. E era essa simplicidade e sabedoria que faziam dele o grande sujeito que realmente era e de quem todos gostavam. Mas vamos à história, tão “suja” quanto sanitário de posto de gasolina:

Um dia, quando ainda trabalhava em outra empresa, foi encarregado de levar ao Rio de Janeiro uma proposta para uma licitação de obra. Como iria voltar no mesmo dia, só levou uma pasta com os documentos necessários. Enquanto aguardava o seu voo, ficou no restaurante do aeroporto com um colega, tomando chope – vários, segundo ele – e beliscando tira-gostos. Chegou ao Rio, almoçou e foi direto para o órgão público para a abertura das propostas concorrentes, mas começou a sentir um pouco de cólica. Aguentou firme até o final do processo licitatório (demorado, na maioria das vezes).

Pegou um táxi, mas percebeu que não seria boa ideia ir direto para o aeroporto, distante do local onde estava. Pediu para o motorista seguir para o hotel onde costumava ficar quando ia à cidade.

Chegou à recepção já muito apertado e pediu a chave de um quarto, pois precisava ir ao banheiro urgentemente. Perto dele, um grupo de estudantes preenchia suas fichas, ficando com “risinhos irônicos” ao perceber a afobação do meu amigo.

Recebeu a chave de um quarto em andar mais elevado. O recepcionista disse que alguém iria acompanhá-lo até lá, mas ele dispensou, com o intestino já na mais aberta rebelião. Ao sair do elevador, o quarto ficava no final de um longo corredor:

 Parecia que tinha um quilômetro!

A chave salvadora destrancou a porta e a mão acionou a maçaneta, mas a porta não abriu – a fechadura tinha duas voltas.

Quando a porta não se abriu na primeira volta da chave, todos os controles entraram em colapso e ele se liquefez ali mesmo, na porta do quarto, com a merda descendo pela perna até o sapato e manchando o carpete do corredor. Correu ao banheiro, pegou uma toalha, encharcou-a no lavatório e limpou o carpete, que ficou com uma mancha úmida “suspeitíssima”. Agora, era hora da higiene: tomou um longo banho, lavou a toalha, as calças, a cueca e os sapatos.

Depois que acabou, constatou que não poderia sair do quarto, por não ter trazido nenhuma muda de roupa. Chamou a camareira e perguntou pela lavanderia do hotel e soube que já estava fechada. Sem outra solução, perguntou quanto a funcionária ganhava por semana e ofereceu a ela a mesma quantia, para que fosse à sua casa secar a calça “que havia caído na água, ao tomar banho”.

Duas ou três horas depois, volta a camareira com a calça seca e comenta, se desculpando:

 Não ficou muito bom não, porque a calça estava meio suja na bainha. O senhor deve ter pisado em algum barro...


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