quarta-feira, 31 de agosto de 2022

VITRAIS, JANELAS E ESCOTILHAS

Como sabem os amigos e amigas virtuais deste blog, sou um idoso que se diverte falando idiotices e fazendo trocadilhos infames e piadas de quinta série. Ou melhor, fazia, pois hoje mais pareço um bagaço de cana (inclusive fisicamente) passado e repassado na moenda e de onde não sai mais nenhuma gota de garapa, de caldo de cana.
 
Talvez por isso, por não estar mais imaginando besteiras “engraçadinhas”, fico propenso a dizer besteiras sisudas, como se fossem reflexões e lições de vida de um sábio monge tibetano. Tenho feito isso tantas vezes que todo mundo que acessa o blog já deve estar de saco cheio dessas lamúrias (esse “todo mundo” representa uns três acessos por post). Mas hoje pensei em uma imagem simpática que quis compartilhar com os leitores desta bagaceira.
 
Meu ídolo George Harrison morreu em 2001. O também ídolo Richie Havens em 2013; o velho e bom Joe Cocker em 2014; B. B. King em 2015 e em 2021 foi a vez de Charlie Watts, baterista dos Stones. Sem falar em Janis Joplin e Jimi Hendrix, falecidos em 1970 e John Lennon, assassinado em 1980. Mas há outros, muitos outros artistas e músicos já falecidos, não tão importantes para mim, mas também intérpretes de músicas que fazem parte da trilha sonora da minha vida.
 
O que têm em comum esses astros do rock e do blues além do fato de serem meus ídolos? Este é o pensamento que me ocorreu hoje: os artistas e as músicas que fizeram minha cabeça ao longo dos anos são como escotilhas ou vitrais por onde espreito uma parte de mim e do que já fui; são como janelas por onde eu me conecto sentimentalmente com minha juventude, com algum momento vivido, com algum período da minha vida.

E cada vez que um desses músicos morre (porque a maioria tem a minha idade ou é ainda mais velho) sua janela ou escotilha se fecha ou embaça e eu não posso mais usá-la como antes para espreitar uma parte de meu passado nem voltar a sentir as emoções ligadas à sua música. E assim meu campo de “visão” vai diminuindo, diminuindo também os links e as “sinapses” entre as diferentes épocas.
 
Pode ser um pensamento melancólico, mas não me senti nem mais triste nem deprimido. Na verdade, gostei demais dessa ideia. 
 

 

terça-feira, 30 de agosto de 2022

TUDO É VIAGEM


Em 1973 a hoje esquecida cantora Márcia gravou e lançou a música “Viagem”, com uma letra linda, meio onírica, escrita por Paulo Cesar Pinheiro. Essa música fez um puta sucesso, muita gente gravou e é boa para tocar (mal) no violão (toquei muito). Pois bem, lembrei-me dela depois de ter publicado um texto no blog que teve "imensa" aceitação (UMA visualização).
 
Vou mentir dizendo que fiquei alegre com isso? Claro que não! (eu passo recibo). O desejo de quem escreve alguma bobagem, compõe uma melodia ou pinta um quadro é ser visto, lido, examinado, curtido ou condenado e até execrado ou cuspido. O que vale é a reação, qualquer que seja ela, pois o silêncio é sempre mortal.
 
Por isso, excluí o post, reescrevi, revisei e resolvi republicar. Foi aí que eu me lembrei da música. Nem preciso dizer que comparar um "textículo" de merda escrito por mim com os versos de um dos grandes letristas da MPB é a coisa mais grotesca que eu poderia desejar. E não desejo, pois perder de sete a um só a seleção brasileira de futebol pode. A música é linda, a letra é linda e trata também de uma viagem. Só que enquanto a letra do Paulo Cesar Pinheiro é uma autobahn alemã, meu texto é uma trilhazinha perdida no meio do cerrado. Lê aí.
 
 
Eu sei que muitos gostam de comparar a vida de cada pessoa como se fosse uma viagem ou caminho a ser percorrido pela Terra, um pensamento que permite a construção de várias imagens e cenários; tipos de pavimento, de traçado, largura, relevo e regiões atravessadas são parâmetros que merecem ser utilizados. Pensando nisso, resolvi descrever minha jornada pelo planeta, tal como a vejo agora. Apertem os cintos e boa viagem!
 
Minha infância foi como um caminhar por uma estrada escura e amedrontadora construída dentro de uma floresta sombria, assustadora. O cenário mudou ao atingir a adolescência: minha estrada atravessava um deserto árido e sem fim, sem nenhuma companheira ou namorada para amenizar ou curar a solidão. Dos vinte aos trinta anos me vi andando em uma rua estreita e calçada com paralelepípedos irregulares e mal assentados.
 
Dos quarenta aos cinquenta fui forçado a andar por uma estradinha de terra poeirenta, irregular e cheia de buracos, que me deixava aprensivo, amedrontado por não saber o que encontraria pela frente. Entre os cinquenta e os sessenta anos precisei seguir por um caminho cada vez mais íngreme e com precipícios ameaçadores nas laterais. Hoje, apesar das limitações que tenho para caminhar, vejo-me descendo, escorregando por uma ladeira de forma cada vez mais acelerada e sem controle.
 
Se você notou que eu não falei da fase dos trinta aos quarenta anos, parabéns, sinal de ter prestado atenção ao que leu. A fase dos trinta ao quarenta anos foi como percorrer uma avenida plana, limpa, asfaltada e bem arborizada. Foi a melhor fase da minha vida. Mas isso foi há muito tempo!
 
Como disse o poeta espanhol Antonio Machado Ruiz, "Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar"
 
 
Imagino que os eventuais e jovens leitores do Blogson talvez não conheçam a música de que falei. Por isso, escolhi a gravação do Emílio Santiago por já trazer a letra e por ser ele uma das vozes mais fantásticas que o Brasil já teve. Escuta aí.



 


segunda-feira, 29 de agosto de 2022

MEU CARO OZY...

 
Meu caro Ozy, gostei muito do seu comentário, gostei mesmo. Acho bacanérrima uma autocrítica serena (contando de sua migração da esquerda radical para a direita), pois nem todos conseguem (ou não querem) verbalizar um pouco do que sentem ou pensam. Por isso, na mesma linha, vou fazer um comentário ao que disse, contando de minha migração da direita para o centro (não confundir com Centrão).
 
Por ter sido criado em uma família conservadora, ultra católica e de direita, desde sempre eu fui anticomunista - mesmo que nem soubesse exatamente o que isso significava. Para mim, “esquerda” era sempre sinônimo de “comunismo”. Apesar disso e graças aos governos militares pós 1964, eu nunca me preocupei em rever esses conceitos, justamente por não me interessar por política, um assunto que me orientaram a nunca discutir com ninguém.
 
Só para registrar, em 31 de março de 1964 eu tinha apenas 13 anos. Aos poucos, muito devagar, fui percebendo que os militares que tinham livrado o país da ditadura do “comunismo ateu” apenas criaram outra forma de ditadura, pois perseguiam, puniam e até torturavam quem se atrevia a manifestar-se contra o governo. 
 
Por conta disso e sem entender nada do que estava acontecendo,  comecei a ver militares ocupando cargos e funções que nunca tinham ocupado antes, senti cheiro de gás lacrimogêneo utilizado para dispersar manifestações, fiquei sabendo da prisão e exílio de músicos, atores, jornalistas e todo tipo de gente que tinha a audácia de escrever, compor músicas ou encenar peças que contivessem críticas aos detentores do poder.
 
E eu lá, sempre anticomunista, mas com o cu na mão. Pessoalmente eu não tinha nenhum motivo para ter medo, mas tinha. Talvez eu tenha começado a perceber que dependendo do nível de radicalismo, a direita pode ser tão cruel e nefasta quanto a esquerda. Isso também significa reconhecer que pode haver moderação tanto na esquerda quanto na direita, esquerda boa e direita boa. Talvez tenha sido a partir daí que eu entendi ser a “pista do meio” o melhor lugar para mim. Daí, bem mais tarde, surgiu minha “teoria do triângulo isósceles”.
 
Justamente por essa descrença nas qualidades dos extremos é que passei a votar sempre tentando imaginar qual candidato poderia ser melhor para o país, pois, pode acreditar, eu nunca votei em ninguém de olho apenas em meu benefício pessoal. Justamente por isso votei no Lula contra o Serra, votei no Alckmin contra o Lula, no Aécio contra a Dilma e no Bolsonaro contra o Haddad.
 
Mas o Bolsonaro conseguiu romper o meu equilíbrio emocional com suas decisões equivocadas durante a pandemia de Covid 19. A partir daí, eu que sempre torci para que ele fizesse um bom governo, passei a odiá-lo por ser o responsável direto pela morte de milhares de pessoas que poderiam ter sido salvas se tivessem sido vacinadas a tempo. A morte de amigos e pessoas próximas fez surgir em mim a certeza de que NUNCA MAIS ele receberá meu voto.
 
Por isso, não consegui assistir sua entrevista ao Jornal Nacional. E pelo ranço antigo de não me interessar por política acabei também deixando de assistir as outras entrevistas. Por isso, quando você diz que o Bonner “afagou” o Lula não tenho como contestar. Apenas lembro o que escrevi no início do post que motivou este comentário gigantesco:
 
A entrevista do Bolsonaro na Rede Globo serviu para mostrar que ‘realidade’ é aquilo em que as pessoas acreditam. Apesar da transmissão ter sido a mesma exibida em todos os televisores de quem teve saco para assistir (eu dormi), para os bolsonaristas o Mito estraçalhou o Bonner e sua colega. Para os não bolsonaristas ele é que foi jantado”.
 
Para finalizar este comentário e só lembrando que eu nunca deixei de ser um sonhador, meu voto (se eu me animar a votar) no primeiro turno será dado para uma candidata que desconhecia e que graças à sua atuação na CPI da Covid passei a admirar . Ela passará para o segundo turno? Respondo usando uma imagem bíblica: será mais fácil fazer “um camelo passar pelo buraco de uma agulha”. Pouco importa, meu voto será o registro eletrônico do meu sonho e do meu desejo. Abraços.

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

TEMPO DE PLANTAR

 
Minha mulher tem um parente tranquilo, casado, bem resolvido financeiramente e que gosta de escrever mensagens longas no Facebook. A mais recente faz alusão às próximas eleições para presidente. Por ser tranquilo e moderado, nunca declarou explicitamente com qual dos dois principais candidatos se identifica, embora eu desconfie quem será merecedor do seu voto.
 
Por isso, ainda embalado pela leitura dinâmica que fiz das notícias sobre a entrevista (que não assisti) do inacreditável mito (ou melhor, do desacreditado mito. Como acreditar em alguém que disse uma mentira a cada três minutos?), fiz um comentário sobre o texto no próprio Facebook. Depois, resolvido a publicar minha resposta no blog (projeto memória, entende?), precisei pinçar algumas frases escritas por ele para dar sentido ao meu comentário.
 
“Há um tempo de plantar e um tempo de colher. A plantação você decide, a colheita é obrigatória”.
“Não importa qual é o candidato de sua preferência, não estou aqui para discutir e muito menos doutrinar”.
“A imprensa mais nos confunde do que elucida, na internet os veículos viraram torcida”. 
“Tanta mentira, tanto Photoshop, tanta edição, que a ética foi pro polo norte e só volta depois do segundo turno. E não há lado melhor que o outro, todos jogam sujo”.
“Um supremo que excede em seu poder e lamentavelmente não é bússola de mais nada”.
“Estamos precisando de alguém, enquanto não temos o futuro líder, que será eleito com gosto, pois de desgosto já estamos cheios”.
 
Depois de ler essas frases serenas e sensatas, resolvi enfiar o pé na jaca e saiu isto:
 
Prezado amigo “Afonsinho” (lembrou uma música do Gilberto Gil),
A “imprensa”, nenhuma imprensa, nunca foi, é ou será totalmente isenta, pois sua linha editorial sempre refletirá a visão de quem a escolheu e definiu. Para ser isenta ela precisaria ser apenas um relatório, uma lista, um check list de fatos e datas. Mesmo assim, os fatos poderiam ser ordenados de acordo com a preferência de quem os publica. Se você retroagir um pouco no tempo verá que o magnata das comunicações Assis Chateaubriand (33 jornais, 18 revistas, 24 emissoras de rádio, 18 emissoras de televisão e 2 agências de notícias  e publicidade) publicava e autorizava a publicação em seus jornais apenas o que ele aprovasse. Um dia chamou um de seus excelentes profissionais e deu aquela “escamada”: Se quiser ter opinião, monta um jornal só para você; na minha revista você defende a minha opinião”.
 
Quanto aos ministros do STF ou de qualquer outro tribunal sua “isenção” só será melhorada (mas nunca totalmente alcançada, pois são humanos) no dia em que o presidente da república não puder mais indicá-los, no dia em que os novos magistrados sejam escolhidos apenas pelo voto de seus pares, sem sabatina no Congresso, sem QI.
 
O escritor e historiador Capistrano de Abreu defendia uma reforma na Constituição, que teria apenas dois artigos:
Artigo 1º – Todo brasileiro deve ter vergonha na cara.
Artigo 2º – Revoguem-se as disposições em contrário.
 
Já Rui Barbosa, o “Cabeção de Haia”, escreveu este manjado e primoroso texto: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”. Impossível contestar.
 
Por isso, precisamos ter esperança, até mesmo para não nos desesperarmos pelo futuro que nossos filhos e netos enfrentarão. Mas, no momento atual, só posso dizer como os italianos: “Siamo tutti fotuti”. Abração.

 

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

ANALISANDO COMPORTAMENTOS

 

A entrevista do Bolsonaro na Rede Globo serviu para mostrar que “realidade” é aquilo em que as pessoas acreditam. Apesar da transmissão ter sido a mesma exibida em todos os televisores de quem teve saco para assistir (eu dormi), para os bolsonaristas o Mito estraçalhou o Bonner e sua colega. Para os não bolsonaristas ele é que foi jantado. Só fiquei sabendo que no frigir dos ovos ele teria dito uma mentira a cada três minutos. Talvez ele tenha aplicado botox no rosto, só para ter sempre a mesma expressão facial.

 

Só duas coisas me preocupam: apesar do presidente ser de ultra extrema direita, vira e mexe seu rosto fica vermelho! Outra coisa que me deixa pensativo é o fato de os adoradores do mito serem tão apaixonados, tão exaltados, tão barulhentos que sem perceber acabam por se comportar como se seu ídolo fosse o “adversário”. “Como assim?”, gritarão os incrédulos. A resposta é simples. Gostam tanto de gritar, de esbravejar que chegam até a uLular.

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

"JAMAIS VOLTAREMOS A ESTAR JUNTOS" - RUBEM BRAGA

 
Promessa feita, promessa paga. Como sabem algumas pessoas, estou relendo um livro de crônicas do meu ídolo máximo Rubem Braga. Muitas delas viraram posts do Blogson pelo puro encantamento que provocaram em mim. Hoje, continuando com a releitura, descobri um trecho que se encaixou como peça de Lego no que penso há muito tempo.

Quando amigos ou amores se separam, jamais conseguirão continuar como já foram um com o outro; não fazem mais parte do mesmo tronco, cresceram como galhos de uma mesma árvore, cada um apontando para sua própria direção.
 
Esse é o motivo por jamais ter tido vontade de participar de encontros de ex-colegas de faculdade. Para mim, além de lembranças de sacanagens e micos antigos, são encontros transformados apenas em desfiles de egos e exibição de prosperidade e sucesso profissional ou contabilidade dos que já morreram. E o Rubem Braga fala disso com muito mais elegância e sensibilidade. Por isso resolvi transformar em post apenas o trecho com que me identifiquei.
 
 
“Antigamente era fácil pensar que a vida era algo de muito móvel, e oferecia uma perspectiva infinita e nos sentíamos contentes achando que um belo dia estaríamos todos reunidos em volta de uma farta mesa e nos abraçaríamos e muitos se poriam a cantar e a beber e então tudo seria bom. Agora começamos a aprender o que há de irremissível nas separações.
 
Agora sabemos que jamais voltaremos a estar juntos; pois quando estivermos juntos perceberemos que já somos outros e estamos separados pelo tempo perdido na distância. Cada um de nós terá incorporado a si mesmo o tempo da ausência. Poderemos falar, falar, para nos correspondermos por cima dessa muralha dupla; mas não estaremos juntos; seremos duas outras pessoas, talvez por este motivo, melancólicas; talvez nem isso”.

domingo, 21 de agosto de 2022

GEMININIÑAS 09

 
Final de domingo, voltando para o apartamento, o pai começou a programar a rotina para quando chegassem:
 
- Chegando em casa a primeira coisa é guardar os brinquedos; depois, tomar banho, por o pijama, tomar leite e dormir.
 
Reação da Cacá:
- Humm... eu tive uma ideia. Que tal não tomar banho? Cacá quer dormir fedidinha para espantar os mosquitos...
 
(Nessa semana a mãe das menininhas explicou para a Cacá sobre aqueles repelentes de tomada, que soltam um cheirinho ruim para os mosquitos).

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

EU PASSO RECIBO

Acontecimentos estranhos ocorridos comigo nesta semana indicaram a necessidade de fazer alguns “avisos paroquiais” aos desaparecidos leitores do blog. Por isso, vamos por partes.
 
Primeiro aviso: nesta semana tive três assustadores lapsos de memória que me fizeram lembrar de uma frase do Ronald Reagan, ex-presidente dos Estados Unidos. Ao anunciar que tinha sido diagnosticado com Alzheimer, disse assim: Agora começa a jornada para o ocaso da minha vida...” Talvez eu esteja também iniciando minha jornada nessa direção. E estes podem ser os sinais iniciais:
 
Primeiro branco: um de meus cunhados ao me cumprimentar pelo Dia dos Pais perguntou se tinha tido um dia feliz. Respondi que tinha sido ótimo, faltando apenas um dos pais das gêmeas, que estava com a família em um congresso em... E não houve meio de lembrar a porra do nome da cidade! Completei a resposta dizendo “em uma cidade de São Paulo cujo nome não estou lembrando”. A cidade era Campos do Jordão;
 
Segundo branco: resolvi coar um café (como faço rotineiramente) na parte da tarde, por volta das 15h30. Por volta das 19 horas resolvi voltar à cozinha (externa) onde o café foi coado. Encontrei o fogo ainda aceso, apaga não apaga em função do baixo nível de oxigênio do ambiente (hermeticamente fechado). Abri a porta e a janela e vazei dali, pois depois de três horas e meia com o gás queimando o ar do lugar estava “estranhamente” desconfortável;
 
Terceiro branco: fui de carro à padaria pela manhã (como sempre faço, para minimizar contato com eventuais maloqueiros que ficam por perto para pedir algum dinheiro). Paguei a compra e fui para o carro que, embora com o alarme devidamente ligado, estava totalmente solto, sem freio de mão puxado. Minha sorte é ser plano o trecho da rua onde estacionei, pois bastou que eu entrasse no carro para ele se mover suavemente. Esses esquecimentos (que não contei para ninguém) me remetem ao segundo aviso.
 
 
O número de acessos do blog caiu assustadoramente, talvez pela qualidade do que tem sido publicado, qualidade que pode estar sendo afetada por uma mente que parece não estar funcionando muito bem. Talvez os leitores se espantem com esse comentário, mas por ser um idoso com carência afetiva e imaturidade de dimensões quase cósmicas, eu passo recibo, não consigo deixar de comentar o que me incomoda, mesmo que o culpado seja eu mesmo.
 
Tenho tentado – e cada vez com mais dificuldade – encontrar assuntos que interessem ou divirtam meus “amigos virtuais”, mas está difícil (talvez em virtude de um cérebro em eventual processo de erosão). O reflexo dessa dificuldade pode aparecer na qualidade dos posts ou nos temas escolhidos. E um dos temas recorrentes é minha antipatia pelo Bozo (e também por seu bicho papão).
 
E talvez seja esse um dos motivos de três posts publicados nesta semana, na mesma semana dos esquecimentos relatados terem tido apenas UM acesso. Creio que a explicação para esses números desidratados pode estar no fato de que talvez a maioria do pessoal que já acessou o blog tenha chegado até aqui por identificação com meu amigo virtual Azarão (ou Marreta). E se ele é um provável eleitor do Bozo, eu sou tudo menos isso. E aí rola um conflito semi-ideológico tal como aconteceu comigo no Facebook. Cansado de ler as baboseiras publicadas por amigos bolsonaristas raiz, cancelei a “amizade de facebook” com os mais chatos.
 
Talvez seja isso que está acontecendo com os leitores do blog. Por discordar das críticas que sempre faço ao Bozo, talvez tenham ficado de saco cheio e decidido se afastar do blog.
 
Pode ser neurose minha? Claro que pode, pois me defini como uma pessoa imatura e carente emocionalmente. Por isso, este é o terceiro:
 

O Blogson continua (e continuará) vivo, mas cansadinho e com dificuldade para respirar, significando que só voltarei a publicar alguma coisa no blog se entender que é minimamente interessante. Enquanto não surgir nada que valha a pena, continuarei a republicar nos novos blogs criados os posts escolhidos e revisados do velho Blogson. Pelo menos lá apenas uma visualização já pode ser considerada lucro.

ENROLANDO A LÍNGUA


Se há uma coisa que me deixa alegre é saber que nem todos os compositores e cantores do país vestem e usam apenas o “smoking da seriedade” (ou o chapéu do sertanejo), pois um grupo reduzido (mas seletíssimo) de artistas permitiu-se escrever letras com ironia, humor ou non sense. Nesse grupo estão os geniais Lamartine Babo e Aldir Blanc. Obviamente o humor é apenas uma minúscula parcela de suas letras fantásticas. Mas há duas músicas que merecem destaque por seu absoluto non sensecuja única proposta séria é brincar com a sonoridade de outros idiomas.
 
E são essas letras que eu escolhi para (tentar) divertir os minguadíssimos leitores do velho Blogson. No final do post, os links para ouvir as duas músicas. A título de curiosidade, escolhi a interpretação original de Lamartine Babo (com sua voz de velhinha de programa humorístico) para “Canção para Inglês Ver”. Para a letra de Aldir Blanc escolhi a interpretação de uma jovem da Catalunha (quem poderia imaginar uma coisa assim?). Olhaí.
 
 
Canção Pra Inglês Ver (Lamartine Babo)
 
I love you, forget sclaine Maine Itapiru
Forget five underwood I Shell no bonde Silva Manuel, Manuel, Manuel
I love you too heavy Steven via Catumbay
Independence lá do Paraguai, Studbaker Jaceguai
 
Oh, yes my glass, salada de alface, fly toss my til
Standard Oil, oh, yeah, forget not me
I love you, abacaxi whisky of chuchu
Malacacheta independance day
 
No Streak Flash me estrepei
Elixir de inhame reclame de andaime
Mon Paris je t'aime sorvete de creme
Oh yes my very good night
 
Oh double faith isto parece uma canção do oeste
Coisas horríveis lá do faroeste do Tomas Meiga com manteiga
My sandwich eu nunca fui Paulo Escriche
Meu nome é Lask and Cloud, Johnny Plilippe Canaud
 
Light and Power Companhia Limitada I you
Zé boi scotch avec boi zebu
Laranja e figo com feijão tutu
Trem de cozinha não é trem azul
 
 
Pret-A-Porter De Tafetá (João Bosco & Aldir Blanc)
 
Pagode em Cocotá
Vi a nega rebolar
Num pret-a-porter de tafetá
Beijei meu patuá
Ói, samba, Oi, ulalá
Me carrefour, o rendez vous vai começar
 
Além de me empurrar
Qu'est-ce que c'est, tamanduá?
Pourquoi je suis du Zanzibar
Aí, eu me criei: pas de bafo, meu bombom
Pra que zangar?
Sou primo do Villegagnon
 
Voilá e çavá, patati, patatá
Boulevard, saravá, sou da Praça Mauá
Dendê, matinê, pas de deux, meu petit comité, bambolê
Encaçapo você.
 
Taí, seu Mitterrand
Marcamos pra amanhã em Paquetá
Num flamboyant en fleur
Onde eu vou ter colher
Pompadour? Zulu
Manger toi beaucoup!
 
 https://www.youtube.com/watch?v=lEWG1hZ2EtU
 
https://www.youtube.com/watch?v=GPHC6jna5ow
 

 

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

HISTÓRIAS DA CAROCHINHA

 
Já faz um bom tempo que eu não tenho tido muito saco para ler romance. E o motivo foi ter percebido que a realidade pode ser muito mais louca que a mais delirante ficção. A prova disso foi uma notícia divulgada hoje. Vários jornais, portais e sites noticiaram a existência de um grupo de empresários que defende um golpe caso nosso presidente não seja reeleito.
 
Pode uma coisa dessa? Não, não pode. O que deu para perceber é que empresários respeitados (mas nada respeitáveis) comportam-se como crianças histéricas com medo do bicho papão ou do lobo mau.
 
Pensando bem, acho que vou voltar a ler histórias infantis para tentar entender o atual momento político brasileiro!

quarta-feira, 17 de agosto de 2022

CANTARES - ANTONIO MACHADO RUIZ

 
Há uma frase que já vi utilizada algumas vezes e é muito boa para refletir sobre a vida que se leva (ou que se levou): Caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao caminhar”.
 
Lembrando-me dela, resolvi descobrir quem seria seu autor e descobri tratar-se de Antonio Machado, poeta espanhol nascido em 1875 e tratado na intimidade por Antonio Cipriano José María y Francisco de Santa Ana Machado Ruiz. Descobri também que a frase famosa é um verso de um poema. Aí resolvi publicar a tradução desses versos feita por Maria Teresa Pina.
 
Tentei encontrar o texto original tal como foi escrito pelo poeta, mas não tenho certeza do tamanho dos versos ou se foram assim dispostos originalmente. Em todo caso, se alguém não gostar, vá reclamar com o bispo. Olhaí:
 

Tudo passa e tudo fica,
Porém o nosso é passar,
Passar fazendo caminhos,
Caminhos sobre o mar.
 
Nunca persegui a glória,
nem deixar na memória
dos homens minha canção.
Eu amo os mundos sutis
Leves e gentis
Como bolhas de sabão.
 
Gosto de vê-los pintar-se de sol e grená
Voar debaixo do céu azul,
Tremer subitamente e quebrar-se
Nunca persegui a glória.
Caminhante, são tuas pegadas o caminho e nada mais;
Caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar
 
Ao andar faz-se caminho,
E ao voltar a vista atrás,
vê-se a senda que nunca
se voltará a pisar.
Caminhantes não há caminho, simplesmente marcas no mar
 
Faz algum tempo neste lugar
Onde hoje os bosques se vestem de espinhos
Se ouviu a voz de um poeta a gritar
Caminhante não há caminho, faz-se caminho ao andar
 
Golpe a golpe, verso a verso...
 
Morreu o poeta longe do lar
Cobre-lhe o pó de um país vizinho.
Ao afastar-se lhe viram chorar
“Caminhante não há caminho, faz-se caminho ao andar
 
Golpe a golpe, verso a verso...
 
Quando o pintassilgo não pode cantar.
Quando o poeta é um peregrino.
Quando de nada nos serve rezar.
Caminhante não há caminho, faz-se caminho ao andar
 
Golpe a golpe, verso a verso.
 
 
 
Todo pasa y todo queda
Pero lo nuestro es pasar
Pasar haciendo caminos
Caminos sobre la mar
 
Nunca perseguí la gloria
Ni dejar en la memoria
De los hombres mi canción
Yo amo los mundos sutiles
Ingrávidos y gentiles
Como pompas de jabón
 
Me gusta verlos pintarse de sol y grana
Volar bajo el cielo azul
Temblar súbitamente y quebrarse
Nunca perseguí la gloria
Caminante, son tus huellas el camino y nada más
Caminante, no hay camino, se hace camino al andar
 
Al andar se hace camino
Y al volver la vista atrás
Se ve la senda que nunca
Se ha de volver a pisar
Caminante no hay camino sino estelas en la mar
 
Hace algún tiempo en ese lugar
Donde hoy los bosques se visten de espinos
Se oyó la voz de un poeta gritar
Caminante no hay camino, se hace camino al andar
 
Golpe a golpe, verso a verso
 
Murió el poeta lejos del hogar
Le cubre el polvo de un país vecino
Al alejarse, le vieron llorar
“Caminante, no hay camino, se hace camino al andar”
 
Golpe a golpe, verso a verso
 
Cuando el jilguero no puede cantar
Cuando el poeta es un peregrino
Cuando de nada nos sirve rezar
Caminante, no hay camino, se hace camino al andar
 
Golpe a golpe, verso a verso

terça-feira, 16 de agosto de 2022

PRIMITIVISMO

Eu sempre me espanto com as atitudes e reações infantis – mesmo sem ser inofensivas ou menos preocupantes – de amigos e conhecidos que se comportam como ou se declaram abertamente apoiadores irrestritos de nosso atual presidente. Vestem-se de verde e amarelo em manifestações públicas, são agressivos nas redes sociais, compartilham notícias e informações falsas sem nenhum pudor, etc.

 

Essas reações apaixonadas sempre me surpreendem – como já me surpreenderam também as atitudes de apaixonados pelo ex-presidente Lula, capazes até de acampar perto do lugar onde esteve preso um tempo. Sinceramente, não consigo entender que alguém mereça essa devoção, esse “amor”. Por isso, de vez em quando me pego perguntando o que leva algumas pessoas a esse tipo de comportamento. Dias atrás, o site da BBC News publicou dois artigos (longos) muito interessantes sobre o que é bolsonarismo e lulismo ou petismo.

 

Desses artigos eu extraí um texto que foi publicado no Estadão em 2014 e escrito pelo jurista e professor da USP Conrado Hübner. Esse texto seria a introdução de um artigo intitulado “Reféns do Bolsonarismo” e começa assim:

 

O Brasil tem assistido a surtos agudos de primitivismo político. O fenômeno não é de direita nem de esquerda, não é de oposição nem de situação, não é conservador nem progressista. Merece outro adjetivo porque não aceita, por princípio, a política democrática e as regras do jogo constitucional. Esforça-se em corroê-las o tanto quanto pode. Não está disposto a discutir ideias e propostas à luz de fatos e evidências, mas a desqualificar sumariamente a integridade do seu adversário (e, assim, escapar do ônus de discutir propostas e fatos). Cheio de convicções, é surdo a outros pontos de vista e alérgico ao debate. Não argumenta, agride. Dúvidas seriam sinais de fraqueza, e o primitivo quer ser tudo menos um fraco. Suas incertezas ficam enrustidas no fundo da alma.

 

Bom, como só conheço essa parte do artigo, a conclusão a que cheguei (e que pode não ser a opinião do autor) é que bolsonaristas e petistas raiz ou, em outras palavras, radicais de qualquer ideologia, são politicamente primitivos, “cheios de convicções” e avessos a repensar ou discutir sua visão de mundo. Minha conclusão serve para alguma coisa? Não, mas gostei de ter chegado a ela.


domingo, 14 de agosto de 2022

VOCÊ DECIDE

 
Se eu morasse em um prédio cuja fachada lateral fosse utilizada por um babaca qualquer para exibir sua visão limitada e seu radicalismo primitivo eu ficaria puto demais. Estou dizendo isso por uma notícia que vi na televisão e o site da Folha trouxe.
 
Em Porto Alegre uma faixa com quinze a vinte metros de comprimento (lembrando os antigos volantes da Loteria Esportiva sem a coluna do meio) foi instalada na lateral de um prédio residencial, para convocar a população para participar de atos públicos no próximo sete de setembro (a favor de quem mesmo?).
 
Nem preciso lembrar quem é o obcecadão por esse tipo de idiotice. Pior é tomar conhecimento do conteúdo do painel. Dividido em duas colunas, a primeira é “adequadamente” colorida de verde e amarelo, enquanto a segunda traz a previsível cor vermelha.
 
Também nem precisaria dizer que há um antagonismo total nos dizeres de cada coluna. A merda toda é que há um primitivismo tosco e equivocado nas opções disponíveis. Talvez o “equívoco” seja apenas má fé. Para começar, só mesmo os bolsonaristas mais idiotas identificam “esquerda” com “comunismo”, representado pelo símbolo démodé da foice e martelo e comparado com a coitada da bandeira do Brasil. E digo “coitada” porque ela não merecia ter sido sequestrada pelo que há de pior na Direita, que é a extrema direita.
 
Bom, a imagem deste post é exatamente a bendita faixa (que eu descolori e virei de cabeça para baixo). O que eu quero mesmo é dar minha visão sobre as “escolhas” de cada campo. Bora lá.
 
Nas opções opostas entre “Vida” e “Aborto” eu prefiro “Vida para quem faz aborto”, ou seja, sou a favor do aborto discutido, legalizado e feito nas unidades de saúde existentes em um país laico, pois, mesmo que pareça cada vez menos, o Brasil continua sendo um país laico.
 
Na opção Bandido Preso ou Bandido Solto obviamente só um louco desejaria que bandidos ficassem soltos e livres para cometer seus crimes. Mas bandido não é só o pé de chinelo, o favelado. Bandidos também são os que exploram garimpos ilegais, que fazem “rachadinhas”. Como dizem os advogados, bandidos são aqueles que praticam atos delituosos ao arrepio da lei.
 
"Povo Armado" ou "Povo Desarmado"? Nem preciso comentar. Povo desarmado, lógico.

“Valores Cristãos” versus “Ideologia De Gênero”. Essa escolha me dá até azia. Para começar, tem uma visão muito limitada quem só consegue pensar em valores "cristãos". Como é que ficam as outras religiões nessa história? E os ateus? Além disso, talvez precisássemos aprender com os bonobos algumas lições sobre sexualidade e tolerância. A favor da ideologia de gênero.
 
Liberdade ou Censura. Obviamente, a escolha será sempre “liberdade”, mas isso não é sinônimo de “direito de mentir”. Além disso, não deixa de ser engraçado pensar que quem é contra a censura também é contra a ideologia de gênero.
 
“Agro Forte”, “Menos Impostos”, “A Favor Polícia” E “Ordem E Progresso” são opções que têm minha simpatia – desde que tudo aconteça em total obediência à legislação vigente. Um “agro forte” que promove desmatamentos gigantescos na Amazônia está fora do que aceito e acredito. Sempre tive pela polícia do meu estado o maior respeito e simpatia, mas quando vejo notícias de espancamentos e execuções fico pensando que alguma coisa está errada, precisando de revisão de normas de conduta e treinamento. E quem defende “ordem e progresso” não pode ficar afrontando a Constituição nem ameaçando a democracia ou os poderes da República. Além disso, insinuar que a Esquerda é a favpr do PCC e do narcotráfico é de uma má fé inaceitável e canalhice absurda
 
Feitos esses comentários, eu decido: imagino que quem mandou colocar a tal faixa é alguém muito idiota, um babaca preconceituoso e de visão de mundo super limitada.



quinta-feira, 11 de agosto de 2022

QUANDO O ASSUNTO É MÚSICA

 
Uma das coisas mais irritantes é perder um texto inteiro graças à distração diante da mensagem “Deseja salvar as alterações do Documento 2?” O clique distraído que fiz no “Não” provocou exatamente isso, perda total do que iria postar no blog. Repetindo a piada de um antigo colega, “até Jesus salva, só o Botelho que não”. Foda!!!!!!!!!!!
 
Não era um grande texto, era até bastante sofrível, mas já estava pronto! Como “eu sou brasileiro e não desisto nunca” (de mentir, naturalmente), tentarei refazer o texto original. Pensando bem, vou manter a ideia central e reescrever o resto.
 
O lance é o seguinte: nós, brasileiros, sempre fomos consumidores de música estrangeira. Diria mesmo ávidos consumidores. Nada contra isso, pois música boa teoricamente não tem nacionalidade. Mas não levemos esta observação às últimas consequências, pois pelo menos eu teria dificuldade de ouvir música chinesa, japonesa ou cantada em alguma outra língua cuja sonoridade seja totalmente estranha para mim.
 
Eu sempre gostei de ouvir músicas em inglês. Pode ser complexo de vira-lata ou porque gosto de rock desde quando ouvi esse ritmo pela primeira vez. Ouvir músicas brasileiras mais sofisticadas e elaboradas foi uma espécie de upgrade musical. Milton Nascimento, por exemplo, eu precisei primeiro desejar ouvir suas melodias e letras “estranhas” para só depois conseguir gostar delas.
 
Hoje eu continuo tentando me manter atualizado em relação à música que é produzida no Brasil, tarefa difícil, pois sertanejo, funk e pagode são os estilos predominantes atualmente. Por isso, o Youtube é para mim a porta de entrada para canções e intérpretes desconhecidos.
 
Estou falando muito sem conseguir me aproximar do que realmente desejo dizer. Como havia dito, somos consumidores de música estrangeira, majoritariamente cantada em inglês. Por isso, quando vejo o inverso disso acontecer a primeira reação é de espanto, perplexidade. Talvez o motivo disso seja explicado pela frase do Millôr Fernandes: “Ser brasileiro me deixa sempre um pouco subdesenvolvido”.
 
E essa é a questão: esse sentimento de inferioridade balança quando descubro que são os gringos – mais até que os brasileiros – que amam e valorizam a boa música composta nesta Terra de Santa Cruz. E nem estou falando dos medalhões que têm ou tiveram público nas estranjas, tipo Tom Jobim, Milton Nascimento, Ivan Lins, Roberto Carlos e outros.
 
O que me deixou chapado foi descobrir um grupo de jovens na faixa etária onde imagino que estão onze dos doze amigos e amigas virtuais do blog, gente na faixa dos vinte a trinta e cinco anos, por aí. Esse pessoal curte música brasileira antiga! Curte, toca e canta músicas que eu duvido que a maioria dos jovens brasileiros conheça.
 
Que você pensaria se eu dissesse que alguns desse grupo de jovens músicos da Catalunha já gravaram “Feitiço da Vila”, de Noel Rosa? Já ouviu falar de Noel Rosa? Parabéns! E “Carinhoso”, de Pixinguinha, conhece também? Não? Eles conhecem.
 
Que você diria ao saber que uma jovem cantora e instrumentista (trombone) de vinte e poucos anos apresentou-se na França cantando e tocando “Doce de Coco”, um choro maravilhoso de Jacob do Bandolim e Hermínio Bello de Carvalho? Não conhece a música? Nem mesmo os compositores? Tudo bem, pois o caso mais bizarro eu conto agora:
 
Quatro jovens, quatro meninas apresentaram-se em algum festival da Espanha cantando “Baião de Quatro Toques”, de José Miguel Wisnik e Luiz Tatit. Eu nunca tinha ouvido falar nessa música! E as quatro lá, cantando em português! Muita humilhação para mim.
 
Então é este o recado: somos um pouco subdesenvolvidos em relação à nossa própria música, pois o que desconhecemos ou deixamos de apreciar é filé para músicos estrangeiros. E com o agravante de às vezes serem jovens, muito jovens.
 
Para encerrar este texto que ficou totalmente diferente do que foi deletado, transcrevo a letra da música “Doce de Coco” lindamente interpretada pela jovem catalã Rita Payés
 
Venho implorar
Pra você repensar em nós dois,
Não demolir o que ainda restou pra depois.
Sabes que a língua do povo
É contumaz traiçoeira
Quer incendiar desordeira, atear fogo ao fogo.
Tu sabes bem quantas portas tem meu coração
E dos punhais cravados pela ingratidão;
Sabes também quanto é passageira essa desavença.
Não destrates o amor!
 
Se o problema é pedir, implorar
Vem aqui, fica aqui!
Pisa aqui neste meu coração
Que é só teu, todinho teu!
O escorraça e faz dele de gato e sapato
E o inferniza e o ameaça
 Pisando, ofendendo, desconsiderando
Descomposturando com todo vigor.
 
Mas se tal não bastar
O remédio é tocar
 Esse barco do jeito que está
Sem duas vezes se cogitar.
Doce de coco, meu bom-bocado,
 Meu mau pedaço
De fato és um esparadrapo
Que não desgrudou de mim.
 
 

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