terça-feira, 2 de agosto de 2022

A BATALHA DOS GÊNEROS - HÉLIO SCHWARTSMAN

 
Como sempre procuro fazer ao transcrever textos de terceiros aqui no blog, entrei na internet para ver se estava tudo OK com o texto da professora Vivian publicado no post anterior.  Graças à essa procura, encontrei outro texto escrito por Hélio Schwartsman sobre o mesmo assunto, e publicado na Folha de São Paulo em 10/01/2021.
 
O que me incomodou nessa história (sempre incomoda!) é ter encontrado esse texto sendo utilizado em um artigo escrito por quem não se preocupou nem mesmo em escrever corretamente o nome do autor. Além disso, mutilou e adulterou ligeiramente o texto, mesmo que colocado entre aspas. Só descobri esse detalhe e a supressão de um pequeno trecho do original após nova auditoria. Acho que não preciso dizer o que penso sobre isso. Vamos ao texto:

 

Publiquei na semana passada a coluna “Parabéns aos argentinos”, em que felicitava nossos vizinhos pela legalização do aborto. Leitores me escreveram recriminando-me por ter usado “argentinos” em vez de “argentinas”, como preferiam.


Já tive mais paciência com a militância linguística. É claro que as assimetrias de poder que há na sociedade aparecem também no idioma, e devemos estar atentos a elas. Mas daí não decorre que a língua seja o melhor campo de batalha para aqueles que querem fazer avançar suas agendas, por mais legítimas que sejam.

 

O que me incomoda nessa batalha dos gêneros gramaticais é que ela imprime um viés emburrecedor, uma vez que estimula o literalismo dos falantes em vez de apostar em sua capacidade de abstração, uma das marcas da inteligência.

 

Mesmo usuários pouco sofisticados dos idiomas que fazem distinções de gênero sabem que o gênero gramatical não precisa coincidir com o natural. Em alemão, “Mädchen”, a palavra para “mulher jovem”, o protótipo mesmo da femilinidade, é do gênero neutro, e ninguém acha que esse incidente linguístico afeta a sexualidade das raparigas teutônicas. Aqui mais perto, no português, o vocábulo “masculinidades” é feminino, o que não basta para tornar menos tóxicas algumas de suas manifestações.

 
Voltando aos “argentinos”, já faz décadas que aprendi o português, mas, da última vez que chequei, no vernáculo, o plural que inclui todos os gêneros tinha forma igual à do masculino; o uso da forma feminina é que implicaria a exclusão de todos os legisladores e apoiadores que participaram do processo –o que me parece injusto.

 

Meu ponto é que devemos escolher melhor nossas batalhas. Policiar a língua funciona melhor para aplacar a mente do militante do que para resolver injustiças e quebrar preconceitos. E, mais do que nunca, precisamos encontrar comunalidades que nos unam, não ressaltar diferenças que nos separam.

(10/01/2021)

 

2 comentários:

  1. O lobby dessa viadagem é muito forte. Dá só uma olhada nisso, notícia fresca, de hoje, aliás, fresquíssima:
    https://pleno.news/mundo/politica-internacional/ministerio-argentino-oficializa-genero-neutro-em-documentos.html
    E, claro, o comentário do nosso ilustríssimo
    https://pleno.news/brasil/politica-nacional/bolsonaro-ironiza-uso-do-genero-neutro-na-argentina-pobreze.html

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    1. Eu sou totalmente a favor da igualdade de gênero e totalmente contra o Bolsonaro, mas, nesse caso, sou obrigado a concordar com ele. Como escreveu o Hélio Schwartsman, "daí não decorre que a língua seja o melhor campo de batalha para aqueles que querem fazer avançar suas agendas, por mais legítimas que sejam".

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