sábado, 25 de junho de 2022

RUA VAZIA


Perto de onde eu moro há uma rua pequena, uma ruazinha de apenas uma quadra ou quarteirão, confinada, espremida entre duas outras de muito movimento de automóveis e pessoas. Tem passeios estreitos e seu pavimento é de calçamento poliédrico, antigamente chamado de "pé de moleque".
 
É uma rua deserta, uma rua vazia. Do lado direito existe um pequeno edifício de apartamentos, um lote vago, um prédio comercial desocupado, os fundos do almoxarifado de uma empresa de construção e a lateral de uma residência. E só.
 
No lado oposto não há muita diferença: uma quadra de esportes abandonada, lembrança de um colégio que não existe mais, um pequeno ginásio poliesportivo do mesmo colégio (alugado apenas uma vez por semana por quem quer jogar futsal), um lote vago, um prédio de apartamentos construído não faz muito tempo, os fundos de um conjunto de blocos de apartamentos cujo acesso de moradores e veículos é feito por outra rua e a lateral de uma casa construída na esquina.
 
Com esse tipo de ocupação, não fosse o fato de ser utilizada para retorno de carros, seria uma rua quase deserta, pois quase nunca alguém caminha em suas calçadas estreitas e maltratadas. Talvez por isso tenha atraído no passado a atenção de alguns jovens, que a utilizavam para fumar maconha sentados no meio fio, sem ninguém para importuná-los ou constranger. Hoje, depois da construção do prédio do lado esquerdo, nem isso acontece mais.
 
Por ser uma rua sem movimento de pessoas andando a pé, às vezes, especialmente em tempo de chuva, algum morador de rua abriga-se sob a marquise do ginásio para dormir, com a quase certeza de que não será incomodado.
 
Recentemente, durante o dia, ao passar de carro por essa ruazinha vi um morador de rua sentado em frente a esse ginásio. Apesar de sua aparência maltrapilha - roupas sujas e rasgadas, pés descalços e cabelo desgrenhado -, o que chamou minha atenção foi a forma como estava  acomodado. As costas apoiadas na parede, as pernas esticadas e cruzadas, ali estava ele, como se estivesse sentado em uma espreguiçadeira.
 
Tudo indicava não ter família, amigos ou parentes. Pelo menos, não agora, não próximos. Mas havia alguma coisa de serenidade, de calma, enfado ou resignação em sua postura, que contrastava com sua aparência andrajosa, fazendo-me pensar no que estaria passando em sua cabeça. Algum tipo de arrependimento? Saudade de alguém, algum lugar ou época? Ou, ao contrário, algum sonho a acalentar?
 
Nada disso combinava com a imagem que tinha guardado na memória. Talvez - deve ser essa a explicação real - estivesse apenas vivenciando a falta de sentido da Vida, da sua própria sua vida. Nada esperar, nada sonhar, nada com que se preocupar, nada a desejar, a não ser a próxima refeição, uma marquise e um cobertor para proteger-se do frio da noite. Nenhuma expectativa, apenas a resignação de viver até onde der.

Tenho pensado assim nos últimos tempos, uma época em que nada parece ter sentido ou esperança. Justamente por isso fiquei com vontade de voltar à ruazinha deserta, aproximar-me do morador de rua e perguntar:
- Posso sentar aí ao seu lado, irmão?

4 comentários:

  1. Salve, Jotabê, ouvi que quer dar uma repaginada no blog. Eu usei esse site aqui onde tem vários templates, é só me mandar o link de qual você achou melhor, que eu faço uma adaptação aqui pro seu. Para isso tem que me mandar um e-mail para eu ser colaborador, e me colocar como administrador, para eu poder fazer essas substituições. Aí como fiz com o Marreta, faço logo um back-up de tudo antes de começar a mexer e você me diz se aprovou como ficou. Me mande o seu e-mail, que conversamos por lá.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Ozy, obrigado pela disposição em me ajudar. Mas depois que te mandei a mensagem resolvi investir na minha nova (antiga) maluquice, que é a filtragem das coisas mínimamente razoáveis que já publiquei E a solução (idiota, talvez) é a criação do "Blogson Gourmet", onde pretendo republicar todos os posts que não tiverem data de validade, não forem de outros autores e cuja releitura me agradar um pouco. Aproveitarei para revisar e excluir partes desnecessárias desses posts antes de republicar (vou fazer uma "harmonização facial" neles). Pelas minhas contas isso gastará de dois a quatro anos para ser realizado. Até lá terei diversão "à beça". Outra maluquice a que estou me dedicando é a confecção de zines das histórias em quadrinhos, ou melhor, das séries de dezénhos que fiz. Fiz uma, deu um trabalho do cacete, me diverti bastante e dei esse protótipo para meu filho mais velho. Talvez imprima quatro "números" de cada, para dar para meus filhos. Por isso, pedindo desculpas por ter te importunado, vou deixar o velho Blogson como está, pois sua baixa visualização tem a ver com a atual baixa qualidade do que publico. Minha esperança é que os prováveis raríssimos visitantes do "Gourmet" apreciem o passado resgatado do velho blog da solidão ampliada. Abraços.

      Excluir
  2. Acabei esquecendo, esse é o site que eu falei: https://www.way2themes.com/

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sou uma anta tecnológica e monoglota. Não entendi nada ao acessar esse site e nem tentei de novo, Mas a resposta está no comentário anterior. Abraços.

      Excluir

TEM ROBOI NA LINHA!

  Você já ouviu alguém usar a expressão “tem boi na linha” ? Embora pareça uma exclamação advinda do nosso pujante agronegócio, está mais pa...