domingo, 13 de fevereiro de 2022

O TEMPO PASSA, O TEMPO VOA

Eu iniciei esta série de lembranças melancólicas de infância dizendo estar começando a escrever "sem a mínima inspiração, movido apenas por um fato só conhecido recentemente sobre um terreno que deixou algumas marcas no final da minha infância". Disse ainda não saber o que dizer nem onde pretendia chegar. E realmente não sabia.
 
Para quem estava sem a mínima inspiração, acho que escrevi demais, talvez até bem mais do que devia. E o detonador dessa catarse foi um comentário que uma das irmãs de minha mãe fez há algum tempo. Alguém teria dito a ela que o terreno que eu chamei de "Purgatório" teria se transformado em um condomínio de luxo. Fiquei pasmo com a notícia. Aquele capim pegando fogo transformado em condomínio? De luxo? Há quem diga que "quem compra terra não erra". Mas, como imaginar que aquele lugar no meio do "pasto", do nada, se transformaria tanto?
 
Um investidor americano disse uma vez que gostava de comprar terras, "pois há muito tempo pararam de fabricar". Então deve ter lógica esse tipo de investimento, algo como comprar ações para só vendê-las trinta anos depois. Claro, se a empresa ainda existir.
 
Com o auxílio do bisbilhoteiro Google Maps, resolvi dar uma conferida no tal condomínio (bem ao estilo “O mundo visto de cima”), usando como ponto de partida a lagoinha dos Calaboca. Como eu confio mais no Google que no "ouvi dizer" de minha tia, cheguei à conclusão de que esse condomínio não existe. Pelo menos no lugar onde imagino estar localizado o “Purgatório”.
 
O que consegui ver foi uma região totalmente urbanizada e bem diferente do deserto da minha infância, mas ocupada por construções simples, nada luxuosas.  Uma rua que tem o nome de minha tia-avó, mãe do sobrinho buona gente que passou a perna em minha avó parece confirmar que eu não estou (muito) enganado. Mas isso agora deixou de ter importância para mim.
 
Eu realmente não sabia aonde chegar nem o que dizer, mas depois de garimpar e revolver todas essas lembranças, o que realmente ficou claro para mim foi nunca ter retribuído adequadamente a meu pai todo o carinho e amor por ele demonstrado. 

Obrigado, Pai, pelas histórias de sua infância contadas para nós à noite; obrigado por ter fumado todo tipo de cigarro vagabundo só para melhorar nossa coleção sem que precisássemos pegar os maços colecionáveis do chão; obrigado pela disposição, energia e tempo gasto para construir uma piscina-que-não-tinha-cara-de-piscina; obrigado pelo fabuloso carrinho de rodas de madeira.

Obrigado também pela tentativa de nos fazer sentir orgulho por ser donos de uma propriedade rural; obrigado por tudo o que fez e tentou fazer por nós. Mas, sobretudo, obrigado por todo o amor que nos dedicou ao longo da vida. Sabe, Seu Amynthas?, você foi um pai nota dez!


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