segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

COMPRANDO UM TERRENO

O "causo" de hoje começa assim: minha avó materna nasceu no interior, provavelmente na fazenda de seu pai. Essa origem rural deve ter determinado seu desejo de, sempre que possível, tentar recriar o ambiente onde cresceu. O significado disso era a criação de galinhas, plantio de legumes, hortaliças e cultivo de árvores frutíferas onde fosse possível.
 
Sua casa, onde morei até me casar, possuía um quintal minúsculo, ridiculamente minúsculo. Apesar disso, lembro-me de ter ali existido um galinheiro, bananeira, mamoeiro, limoeiro e sei lá que mais. Quando os filhos começaram a se casar, todos os espaços disponíveis iam progressivamente sendo ocupados por edículas destinadas à moradia dos novos casais. Que não demoravam a se mudar dali, graças à convivência pouco amistosa de minha avó com as noras. Eu era ainda adolescente quando me dei conta de morar em um ninho de cobra, pois para ela todas as suas filhas eram "muito bem casadas", já os filhos...
 
Deixando de lado as quizilas familiares, o que sei é que minha avó resolveu um dia comprar um terreno de um de seus sobrinhos. Aparentemente, a experiência de ter sido espoliada por seus irmãos na partilha da herança de meu bisavô não deixou maiores sequelas em sua mente. Iniciadas as negociações, foi-lhe oferecida a compra de (creio) um alqueire, uma minúscula parte da fazenda de seu sobrinho. Quando foi lavrada a escritura (ou depois dela ter pagado a importância acertada), descobriu-se que o sobrinho filho da puta tinha vendido para sua tia não um "alqueire mineiro", mas um "alqueire paulista" (apesar de o terreno estar localizado em Minas Gerais). Para quem não sabe a diferença, um alqueire mineiro corresponde a 48.400 m² de terra. Já o alqueire paulista equivale a apenas 24.200 m² de terreno, metade do mineiro, Eu mesmo não sabia, só me lembro do bate-boca tempestuoso entre vendedor e compradora e a consequente crise nervosa (mais uma) que derrubou minha avó em uma cama.
 
Depois, com "Inês já morta", minha avó resolveu ocupar o terreno que adquirira (imagino que deveria ter 80m de largura por 300m de comprimento, mas isso é apenas uma suposição). Creio que a primeira providência foi cercar com uns três fios de arame farpado os 80m que faziam divisa com a estrada encascalhada que dava acesso ao lugar e que continuava por um bom trecho até chegar à porteira da fazenda do sobrinho buona gente. De nada adiantou a cerca, pois não demorou muito para que o arame e os postes fossem roubados. E assim começava a história do Purgatório.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

ESTRELA DE BELÉM, ESTRELA DE BELÉM!

  Na música “Ouro de Tolo” o Raul Seixas cantou estes versos: “Ah! Mas que sujeito chato sou eu que não acha nada engraçado. Macaco, praia, ...