terça-feira, 25 de julho de 2023

A HORA DE CINQUENTA MINUTOS

Desde sua criação, o Blogson foi perdendo progressivamente os leitores que comentavam alguma coisa: minha irmã, minha cunhada, meu filho, uns dois amigos do mundo real e uns quatro do mundo virtual (que ficaram sabendo do blog através do Marreta). Foram todos sumindo, todos saindo, como na música “O sonho”, do Gilberto Gil: “um por um, um por um”, até chegar ao ponto de restar apenas duas pessoas que eu conseguia reconhecer (mesmo não as conhecendo).

Eu credito essa situação à irrelevância cada vez maior dos posts que publico. O mesmo "fenômeno de incomunicabilidade" eu tenho observado no Facebook. Quando meu perfil foi criado, "todo mundo" comentava ou curtia tudo o que eu postava, por mais idiota que fosse o post. E eu comecei postando velharias do Blogson escolhidas a dedo, que provocaram os maiores elogios, etc. De repente, assim do nada, começaram a diminuir as curtidas e comentários. Fiquei cansativo ou repetitivo, mas podem fazer duas apostas. Esse tipo de situação fez (ou tem feito) com que eu me sinta a versão masculina da Shirley Valentine, a dona de casa que conversa com o fogão, com a geladeira, etc.

O mais engraçado é que eu entendo e aceito isso, pois a cada dia que passa o blog vai se tornando uma sessão de terapia para mim, cada post uma “hora de cinquenta minutos”, uma blogoterapia, pois está cada vez mais confessional e ranzinza, cada vez mais voltado para o exame do próprio umbigo. A explicação para isso talvez esteja no fato de não ter mais nada de relevante a dizer, nenhum caso divertido para contar, nenhuma ideia mais criativa a desenvolver, ficando apenas alguma coisa tipo "mais do mesmo".

E só duas pessoas conseguiram continuar resistindo nessa atmosfera tóxica e hostil. Aí, de repente, uma dessas pessoas que eu identificava como meus “2,3 leitores” também se retraiu, o que me fez pensar em uma mudança momentânea ou definitiva de foco, de interesse, falta de tempo, saco cheio, viagens, sei lá qual o motivo (e eu não tenho nada com isso).

Como sou mesmo (olha a blogoterapia!) um sujeito ciclotímico, às vezes penso em dar um tempo no tempo que dedico ao blog, desintoxicar-me, tentar cuidar da saúde física (da mental já desisti), tentar achar graça em alguma coisa na vida, fazer balé, exame diário de próstata, cortar unha com serrote, qualquer coisa. Às vezes penso que seria bom morrer rapidinho, às vezes cago de medo disso acontecer por agora.

Enfim, tenho me tornado mais e mais amargo e, quanto mais eu tento rir de mim mesmo e da vida, do mundo, mais eu percebo que estou ficando com câimbra na boca de tanto fazer esforço. E tudo isso vai se alternando e se juntando e se separando e se dissolvendo e se reagrupando, tendo como resultado final os comentários e posts que tenho feito: sem graça, melancólicos, repetitivos, desagradáveis e até inadequados.

Acho que preciso parar com isso, talvez calçar umas meias velhas furadas no dedão, enfiar os pés em chinelos confortáveis, descolar uma bengala e fazer igual minha sogra: sentar-me em um sofá em frente à televisão (será preciso mudar o layout), esperando a morte chegar. E lembrar-me do tempo em que eu me achava o máximo (mesmo que fosse só eu)  - ou não tão mínimo.

Bom, a sessão chegou ao fim, a hora de cinquenta minutos acabou, meu intestino parou de incomodar e eu preciso (mesmo que não queira) dormir, pois são duas da madruga. Fui.
(Publicação original 02/02/2018)

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