Normalmente nunca leio nada dos jornaizinhos
de bairro que jogam aqui em casa. Dou uma olhada rápida e descarto, pois
basicamente só trazem anúncios de pizzas, sanduiches, etc.
Ontem, achei na caixa de correio um desses
jornalecos. Dei uma olhada rápida e fui atraído pelo título de um texto na
folha interna (tinha duas): “Eu, eu mesmo e a depressão”. Comecei a ler e fui
me identificando com o autor e seu sofrimento. Seu nome é Marcos Tadeu e é, entre outras coisas, editor do Jornal da Inconfidência FM. Só no final saí desse caminho,
pois há uma leve insinuação de desejo de suicídio, o que definitivamente não passa
pela minha cabeça. Mesmo assim, resolvi transcrever o texto no blog, pois não é uma
narrativa de psicólogo, mas o depoimento de quem aparenta sofrer de depressão pesada. Para
isso, escaneei com OCR, corrigi os erros que normalmente ocorrem nesse procedimento e aí está.
"O único sentimento que resta nesse estado
despido de amor é a insignificância". Acho que esse trecho do
best-seller "Demônio do Meio Dia -
Uma anatomia da Depressão" explica tudo sobre a doença. Eu lhe devo
explicações, caro leitor (a), ou até mesmo uma espécie de manual de instruções
que facilite ou tome compreensível para você o que tenho passado. Pois,
realmente, ninguém é obrigado a conviver com deprimidos. Nem mesmo o deprimido
aguenta conviver consigo próprio. E, ademais, desde muito cedo fui exposto a um
ambiente propício ao desenvolvimento dessa moléstia moderna, como gostam de
chamá-Ia, a fim de glamourizar a depressão.
Pois é.
A sensação é de vazio, inutilidade, insignificância. De que nada mais tem
graça. Os outros, principalmente; se tomam ainda mais incomodativos, na direta
proporção em que se demonstram felizes. É insuportável. É uma dor intermitente que
se equipara a uma faca pontuda te espetando ao longo do dia, até o momento em
que você estoura. A raiva é uma constante, daí que os poucos amigos que
emprestam os ouvidos ou os olhos se transformam em válvula de escape – e, eventualmente,
sacos de pancada - para desabafos como esse.
A
incapacidade de conviver se torna maior, uma vez que, se você já não se sente
amado, se sente uma merda por dentro e não vê graça mais no outro, não há porque
sofrer ao lado dele em rodinhas de conversa superficial sobre consumismo e
futilidades. Você se toma mais egoísta. Um vampiro sedento por atenção e carinho.
Só o que passa a importar é o seu bem, quer dizer, mal-estar. Até chegar a hora
em que todos torcem o nariz para você, pois não há ninguém que queira mais
escutar do que ser escutado.
A
rejeição se toma real, eu posso tocá-la, e. Você se sente como um estranho até
a sua família. Passa a contabilizar os gestos mais fúteis, e a paranoia segue a
passos largos. A cabeça cansa e pede arrego na forma de cama, escuridão e
música que remeta ao passado. Quanto menos movimento, barulho e questionamentos,
melhor. O meu hino? “Two Shots of
Happy, One Shot of Sad”, Frank Sinatra, na voz de Bono.
A gente
vê as pessoas sofrerem porque não conseguem ajudar. Vê as pessoas se irritarem.
Xingarem. Mandarem ao inferno. Irem embora. Darem conselhos como se
estivéssemos no quarto ano primário - "Valorize
as coisas que tem, você podia estar passando fome!". Não. A doença não
degenera o nosso caráter e isso tudo só faz com que o fardo da culpa nos cause
mais sofrimento. Ao mesmo tempo, percebemos o quão inconvenientes nos tornamos,
e quanto esforço esse e aquele indivíduo fazem para simplesmente nos suportar.
E aí pensamos também em quão covardes somos por não conseguir pôr um fim em
tudo e interromper todo o sofrimento.
Marcos
Tadeu editor do Jornal da Inconfidência FM
(publicação original: 27/11/2016)
Nenhum comentário:
Postar um comentário