sexta-feira, 22 de abril de 2016

OS FILHOS DE FRANCISCO (E JULIETA) - 05

O irmão mais novo de minha mãe, Mon (Almon), nasceu em 05/04/1940, o que significa que é apenas dez anos mais velho do que eu. Essa diferença de idade, semelhante à que existe entre nossos filhos mais velho e mais novo, fez com que ele ficasse meio híbrido para mim, metade tio, metade irmão. Não me lembro de muita coisa dele na infância, apenas que às vezes torcia meu braço, de sacanagem.

Na adolescência, foi o responsável involuntário por eu me recusar a chamar nosso segundo filho de “Binho”, como fazem seus irmãos. A história é simples, sem sacanagem: não sei se foram colegas de colégio ou se, por morarem perto, a um quarteirão de distância, o Mon ficou amigo do Weber, um sujeito muito educado e muito, muito delicado. Ninguém lá em casa o chamava de Weber, só de “Binho”. Era engenheiro (!) e, em determinado momento, teria sido expulso de casa pelo pai, sargento do exército, talvez depois de descobrir que o filho era gay. Esse sujeito gostava de conversar com minha mãe e falava de forma meio sibilante. Por conta dessas lembranças, só chamo nosso filho de “Bil”, jamais de “Binho”. Isola!!!

O Mon estudou na Escola Técnica, na av. Amazonas. Para chegar lá, comprou uma bicicleta do tipo que se conhecia como “camelo” ou “camelão”, sem marcha nenhuma, e descia desembestado a Rua Itambacuri, que tem até hoje calçamento poliédrico (ruim para andar de bicicleta) e uma ladeira “legal”. Depois, comprou uma “magrela” própria para corrida, com quatro marchas, selim estreito e guidon recurvado e paralelo ao eixo da bicicleta. Achei bacana pra caramba. Não me lembro o que aconteceu com essa bicicleta depois da queda, só sei que um dia derrapou e caiu em cima da linha férrea, se arregaçando todo.

Pouco tempo depois comprou seu primeiro automóvel, um Fiat da década de 30, estranhamente pequeno. O carro funcionava muito bem nas descidas. Subir já era outra história. Um dia, entrei no carro com Tia Aidê e mais alguém, talvez o Omir. Não sei aonde iríamos. A descida da rua Padre Eustáquio foi uma beleza. Ao tentar voltar, não houve meio do bosta do carro subir a rua. Aquilo me causou certo pânico (como vou voltar para casa?), que depois mudou para vergonha: amarraram um cabo de aço no Fiat, que subiu a rua rebocado. Nunca mais cheguei perto dele, mas não deu nem tempo. Logo depois o Mon comprou um Ford conversível 1936, branco e vermelho, muito legal. Esse andava.

Desde novo, o Mon parecia sentir coceira ao ficar com um carro por muito tempo. Para minha tristeza, vendeu o Ford bonitão e comprou um Chevrolet 1934, preto, muito feio, que foi logo trocado por roupas e malas(!)

A explicação é simples: depois que se formou na Escola Técnica, um de seus professores o convidou para ir trabalhar em Brasília, recém-inaugurada. Convite feito, convite aceito, para grande desespero da mãe e das irmãs. As roupas e malas serviram para isso.

Mesmo não tendo formação universitária, começou dando aula e acabou diretor do MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização, criado na época dos governos militares. Não sei muita coisa sobre sua vida em Brasília, só sei que ficou bem de vida, fez um ou dois loteamentos em Taguatinga, onde morava. Atualmente (2013), mora em Sobradinho ou sei lá onde.

Para fazer a terraplenagem de um desses loteamentos e bem ao seu estilo aventureiro e entusiasmado, comprou um trator que ele mesmo operava. Ainda tem o tal trator e até faz uns bicos com ele (“porque a despesa é muito grande”). Figuraça.

Muito antes disso, quando ainda havia passado pouco tempo de sua mudança para Brasília, uma noite, a campainha da casa de minha avó tocou. Alguém foi ver quem era e foi aquele alvoroço: era o Mon e, com ele, um senhor de 40 anos, aproximadamente, de nome Otto. Era alemão e padrasto de sua namorada. Trabalhava como mecânico de aviões.

Perguntado como tinham vindo, a resposta surpreendeu a todos: de moto, na garupa do “sogro”. Agora, imagina, 700 km na garupa de uma moto. Para voltar, mais 700 km. Haja cu!

Acabou se casando com essa namorada, uma baiana chamada Helena. Tiveram quatro filhos,Mônica, Valéria , Patrícia, e Almonzinho.

Quando meus avós ainda eram vivos, ele vinha pelo menos duas vezes por ano visitar a família. E, a cada vez que vinha, era utilizado um carro diferente. Quando minha mãe ainda estava viva, perguntei quantos carros já tivera. A resposta: “eu tinha tudo anotado em uma caderneta, que perdi. Até onde eu me lembro, já tive mais de duzentos”.

As características mais marcantes do Mon sempre foram um bom humor e uma disposição impressionantes. Parece que ele sempre teve fogo no rabo, como demonstrou no caso das “mudanças”.

Valéria, uma de suas filhas, casou-se com um oficial da Aeronáutica, piloto de jato e foi morar na base de Anápolis. Um dia, o genro foi transferido para o Rio Grande do Norte. A filha perguntou ao Mon se ele não queria levar sua mudança (na época, ele tinha um caminhão, mas não me perguntem por que). Meu tio nem pestanejou. Colocou a tralha no caminhão e se mandou para Natal, distante mais de 2.000 quilômetros de Brasília. Nem bem descarregou a mudança, virou a bunda para trás e voltou.

Passa mais um tempo e olha outra transferência do genro. Destino? Rio Grande do Sul , se não me engano. Outro pedido da filha e olha o louco de novo na estrada. Roteiro: Brasília – Natal, Natal – Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul – Brasília. Distância total percorrida: uns 9.000 km.

Por conta dessa disposição maluca e um permanente bom humor (mais o auxílio luxuoso de algum produto tipo “grecin 2000”, lógico), quem olha para ele não imagina que já tem 73 anos (estamos em 2013).

Minha mãe e seus irmãos sempre disseram que eu me parecia com ele, coisa que me deixava meio irritado, pois eu olhava, olhava e não via nenhuma semelhança. Depois de ficar mais velho, entretanto, comecei a achar que, sim, até que nos parecemos um pouco. O problema todo é que atualmente o filho da puta aparenta ser mais novo que eu!

2 comentários:

  1. Esse negócio de parecer é uma coisa curiosa, mas deixa quieto vai ver que ele que resolveu parecer com você.
    "J"

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    1. Acho que ele se cuidou mais, pois não tem barriga - e um grecin 2000 nunca é demais. (filando o computador da cunhada)

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