Há muito tempo, li que a revista Forbes tinha feito um
ranking da fortuna dos telepastores mais importantes do Brasil. O espertíssimo dono da
Igreja Universal do Reino de Deus era (e é) o mais rico de todos, com um
patrimônio de R$ 2 bilhões. A partir daí, passei a chamá-lo de “Edir Mais Cedo” (porque Deus ajuda a quem cedo madruga).
Esquecendo o trocadilho idiota, o fato é que
algumas pessoas parecem colocar nas mãos de Deus as providências que só a elas
cabe tomar, esquecidas de que "Deus ajuda a quem cedo madruga". Estava
pensando nisso quando me lembrei de uma historinha, uma fábula contada por um
ex-colega.
O pernambucano Jair era uma espécie de braço
direito do chefe do setor onde trabalhávamos. Mesmo sem ter, aparentemente, nem
curso técnico, ele era o tipo de faz-tudo: esperto, desenrolado, sempre
disposto a mostrar serviço.
Um dia, ao entrar na sala onde trabalhava,
fiquei espantado com a mesa coberta de caixas box que ele diligentemente
arrumava. Perguntei o que estava fazendo ou procurando e ele deu um sorrisinho cínico, dizendo algo parecido com isto:
–
Quando ninguém me passa nada para fazer, eu pego essas caixas do arquivo e
reorganizo a papelada que tem nelas. Assim, se algum chefe entrar na sala, verá
que estou trabalhando. Agindo assim, mostro que sou útil e não dou motivo
para ser demitido.
Achei a maior graça do cinismo e da esperteza
declarada. Um dia, ele me confessou ter proposto ao chefe do setor que comprassem
um equipamento de terraplenagem, talvez uma pá carregadeira ou uma
retroescavadeira. Assim, poderiam fazer pequenos serviços para outras empresas,
alugar o equipamento, desaterrar lotes, coisas assim. O chefe entraria com a
grana, e ele com o trabalho. A proposta foi aceita, e ele se atirou na tarefa
de encontrar o equipamento com o melhor custo-benefício.
Encontrado o equipamento ideal, levou a
proposta ao chefe e futuro sócio, que desconversou e negaceou. A nova
microempresa morreu antes mesmo de nascer. Jair ficou tão decepcionado e
desgostoso que pediu para tirar férias. E disse ao colega que dividia a sala
com ele:
– Quando eu voltar, terei uma empresa, nem
que seja em cima deste armário!
Quem me contou essa história foi o próprio
Jair. Segundo ele, durante as férias, teve a ideia de fabricar calças jeans, réplicas das melhores marcas à venda na época. A primeira providência foi
comprar uma máquina de costura industrial, que instalou na casa da
costureira-sócia que havia encontrado. Creio que comprou também uma máquina de
acabamento (overlock, se não me engano), instalada na casa de outra
funcionária-sócia.
O passo seguinte foi comprar uma calça de
cada numeração da marca Zoomp, top de linha na época. Cuidadosamente, ele e a
esposa desmancharam peça por peça de cada uma das calças, para servirem de molde.
Comprou tecido jeans, botões, linhas, zíperes, tudo de ótima qualidade, e deu
início à produção. Para minimizar o desperdício, a esposa era a responsável por
cortar o tecido. Depois de prontas, as calças eram vendidas em butiques, que
tinham apenas o trabalho de colocar suas etiquetas nas "Zoomp do Paraguai".
Quando me contou isso, ele já tinha comprado mais
uma máquina de costura e tinha trocado o apartamento antigo por um em plena
zona sul de BH. E continuava organizando suas caixas box.
Em determinado momento, a empresa onde
trabalhávamos começou a dar sinais de que “estava
subindo no telhado”: atrasava salários, demitia funcionários, tornando o
ambiente de trabalho inseguro e preocupante.
Foi aí que o Jair me contou a fábula que
inspirou este texto. Ao me dizer que estava deixando a empresa e voltando para
sua cidade natal, contou que seu tempo ali tinha acabado. Estava vendendo o
apartamento, já tinha despachado os equipamentos para Recife, e logo estaria
viajando. Mas não estava preocupado, pois um irmão já havia conseguido uma
encomenda para fabricar fardas para a polícia local (ele não dava ponto sem
nó!).
E esta é a fábula:
“Um
dia, Jesus e seus discípulos iam de Nazaré para Tiberíades, quando começou a
anoitecer. Vendo uma casinha ao longe, resolveram pedir pousada para passar a
noite. O proprietário tratou-os super bem, serviu-lhes queijo, coalhada,
manteiga, tudo o que produzia com o leite da única vaquinha que possuía.
No dia
seguinte, agradeceram a boa acolhida e continuaram a caminhada. Um dos
discípulos disse para Jesus que aquele bom homem merecia ser recompensado de
alguma forma. Jesus, então, respondeu: – Eu já cuidei disso.
Tempos
depois, alguns dos discípulos percorriam o mesmo caminho e assustaram-se com a
magnificência da antiga casinha. Comentaram entre si que o Mestre realmente
tinha ajudado o dono da vaquinha. Pediram pousada novamente e perguntaram o que
tinha acontecido. Um verdadeiro milagre. E o homem explicou: – Depois que vocês
foram embora, a minha vaquinha adoeceu e morreu. Aí, eu tive de trabalhar!”
E a moral que o Jair extraiu dessa fábula foi
esta, ao me dizer:
– Esta
empresa em que trabalhamos é a vaquinha! Nós nunca conseguiremos nada ficando
acomodados!
Hoje, lembrando-me desse cara esperto e safo
(como se dizia antigamente), e da história da vaquinha, vejo que ele “acordou
mais cedo” e não deixou apenas nas mãos de Deus o destino de sua vida. Grande
Jair!
Um verdadeiro Messias, esse Jair.
ResponderExcluirMessias, eu não sei, mas esperto até não mais poder. Um dia ele me disse: "se você vender uma agulha de costura a cada minuto isso é um bom negócio, mas se você vender um carro por mês isso é um péssimo negócio"
ExcluirPuta merda! Estou ficando lesado mesmo! Só agora eu percebi a sacanagem da comparação. Jair Messias... Recuso-me a completar o nome.
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