Durante muito anos eu ficava
sabendo das notícias do “mundo exterior” através da compra diária do jornal de
maior circulação em BH e do “Jornal Nacional”. O jornal impresso era lido
durante o café da manhã, mas pouco me importava com as manchetes que trazia. Eu
sabia da violência e das mazelas do mundo, da minha cidade, mas isso não me
sensibilizava, pois minha mulher ficava com o primeiro caderno e eu me divertia
com o caderno “cultural”, onde lia sobre cinema, livros, filmes, discos e
shows.
Eu realmente pouco me
importava com as desgraças locais ou mundiais que fossem publicadas no caderno
principal. Claro que isso revela alienação e muito descaso pelo sofrimento e
tragédias do “mundo real”. Na verdade eu vivia dentro de uma bolha confortável,
pois ganhava bem, tinha um emprego estável e era bem visto pelos colegas e
diretores da empresa onde trabalhava.
Um dia a bolha furou e eu
tive de abandonar meu comportamento blasé,
pois a nova realidade mostrava-se áspera e ameaçadora. Acabei passando em um
concurso de empresa pública, cujo ambiente repressor e policialesco me fez
odiar cada um dos pouco mais de 4 mil dias em que ali trabalhei até me
aposentar.
Creio que a saída da bolha começou
a provocar e a cristalizar o medo, a angústia, a tristeza e a depressão. Esses
sentimentos foram se intensificando até o momento da aposentadoria, mas já era
tarde. Eles agora faziam parte da minha natureza, do meu dia a dia. Apesar
disso consegui manter o bom humor e o desejo de fazer rir os filhos e amigos.
Esse conjunto de sentimentos estava presente na criação do blog.
Mas eu não imaginava o que
poderia acontecer a partir daí. Meu filho diz que “a internet nos aproximou de gente que antes estava a uma distância
segura”. Acho que ele estava certo, mas talvez eu mesmo seja uma dessas
pessoas que é bom manter à distância, pois me tornei agressivo, meio paranoico, um “blogadicto”, um viciado em uma droga virtual que é conhecida pelo
nome “Blogson Crusoe” Dito de outra
forma, eu me transformei de patrão em funcionário,
em escravo do blog.
Mas não era disso que queria
falar. O que eu estava pensando em dizer é que minha sensibilidade para as
mazelas e tragédias do cotidiano germinou, aflorou e cresceu muito, fazendo com
que eu cada vez mais perdesse o que restou de bom humor. Hoje eu quase
enlouqueço quando vejo em um dos cinco portais de notícias que acesso
compulsivamente novas notícias de homens estuprando ou assassinando às vezes
com requinte de crueldade suas esposas, companheiras, amantes, namoradas e até
filhas, movidos por um senso irracional e doentio de posse.
A sensação que fica é que esses
criminosos acreditam ter a nota fiscal de compra das mulheres que violam,
espancam ou assassinam. Aí eu penso que a maldade humana, o sadismo e a
crueldade parecem estar atingindo níveis cada vez maiores, tornando o dia a dia
uma sucessão de medos, horror, revolta e dor. Fico me perguntando onde a
evolução errou ao fazer surgir na nossa espécie esse tipo de comportamento
doentio. Eu sei que a evolução é cega e cumulativa pois deixa progredir o que é
funcional para cada espécie, mas que ganho os sapiens tiveram ao ser
capazes de estuprar, assassinar, mutilar ou torturar as mulheres, como se elas fossem
uma coisa, uma boneca inflável, um eletrodoméstico com defeito, um produto
estragado ou uma embalagem que se amassa e se joga no lixo?
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