domingo, 12 de janeiro de 2025

CAMINHOS DO TEMPO – JOSÉ LUIZ RICCHETTI


Houve um tempo, quando ainda éramos muito jovens e com pouco tempo de casados, que minha mulher e eu viajávamos com sua irmã e seu então marido para Três Marias, onde ficávamos hospedados em uma casa agradabilíssima e com quintal enorme (10.000 m²). Era um lugar super tranquilo e isolado, ao lado de um bosque de pinheiros e distante da área urbana. Ficávamos lá jogando conversa fora, ouvindo música (ele fã dos Rolling Stones e eu fã dos Beatles), às vezes pescando na beira do Rio São Francisco, outras vezes fazendo churrasco e queimando madeira enquanto conversávamos até tarde da noite.
 
Um dia esse casal se separou e passamos a nos encontrar com esse ex-cunhado/concunhado em raríssimas vezes, mas sempre com o mesmo sentimento de amizade cultivado na época do convívio quase diário.  Hoje, inesperadamente, recebi desse amigo e ex-concunhado um texto muito legal que, segundo ele, fez com que se lembrasse de mim. E é este texto que compartilho agora com os leitores do Blogson.


Há um silêncio que chega com os anos, e ele não é feito apenas da ausência de ruídos, mas da transição suave entre o que éramos e o que nos tornamos. Aos 60, você começa a sentir a sutileza do distanciamento. A sala que antes pulsava com suas ideias agora parece cheia de vozes que não pedem mais sua opinião. Não é uma rejeição, é o ritmo da vida. É quando aprendemos que nossa contribuição não está no presente imediato, mas nos rastros que deixamos nos corações e mentes ao longo do caminho.
 
Aos 65, você percebe que o mundo corporativo, outrora tão vital, é um fluxo incessante. Ele segue, indiferente ao que você fez ou deixou de fazer. Não é uma derrota, é a libertação. Esse é o momento de olhar para si mesmo, despir-se do ego e vestir a serenidade. Não se trata mais de provar, mas de ensinar, de compartilhar, de ser mentor. A verdadeira realização não é a que se exibe, mas a que inspira.
 
Aos 70, a sociedade parece lhe esquecer, mas será mesmo? Talvez seja apenas um convite para reavaliar o que realmente importa. Os jovens não o reconhecerão pelo que você foi, e isso é uma bênção disfarçada: você pode agora ser apenas quem você é. Sem máscaras, sem títulos, apenas a essência. Os velhos amigos, aqueles que não perguntam “quem você era”, mas “como você está”, tornam-se joias preciosas, diamantes que brilham no crepúsculo da vida.
 
E então, aos 80 ou 90, é a família que, na sua correria, se afasta um pouco mais. Mas é aí que a sabedoria nos abraça com força. Entendemos que amor não é posse; é liberdade. Seus filhos, seus netos, seguem suas vidas, como você seguiu a sua. A distância física não diminui o afeto, mas ensina que o amor verdadeiro é generoso, não exigente.
 
Quando a Terra finalmente chamar por você, não há motivo para medo. É a última dança de um ciclo natural, o encerramento de um capítulo escrito com suor, lágrimas, risos e memórias. Mas o que fica, o que realmente nunca será eliminado, são as marcas que deixamos nas almas que tocamos. Portanto, enquanto há fôlego, energia, enquanto o coração bate firme, viva intensamente. Abrace os encontros, ria alto, desfrute os prazeres simples e complexos da vida. Cultive suas amizades como quem cuida de um jardim. Porque, no final, o que resta não são as conquistas, nem os títulos, nem os aplausos. O que resta são os laços, os momentos partilhados, a luz que espalhamos. Seja luz, seja presença, e você será eterno.
 
Dedico a todos que entendem que o tempo não apaga, mas apenas transforma.
(11/12/24)
 

Um comentário:

  1. Poxa, até fiquei um pouco emocionado com esse texto. É um texto bem sábio. Li certa vez que o nosso grande problema é que demoramos muito para alcançar um pouco de sabedoria, e quando ela chega, tá na hora de irmos embora.
    Eu não sei bem mas me parece que antigamente a velhice era mais valorizada no Brasil. As imagens das nossas avós e avôs eram figuras marcantes e adoradas.
    Lá pelos anos 90 parece que a extrema valorização da juventude deixou os velhos de lado. Começou a corrida insana pela juventude eterna...plásticas, cremes, ginásticas.
    O velho na cultura oriental sempre foi mais valorizado.
    Devo dizer que nada tenho contra plásticas, cremes e ginásticas. eu mesmo uso hidratantes e faço ginástica. E ainda assim uma coisinha ali e aqui teima em aparecer no corpo.
    A vida é movimento. Precisamos nos mexer, coisa que há cada década ficou tão comprometida com nossos carros, controles remotos e excesso de trabalho.
    Eu sempre gostei de me movimentar, desde a adolescência. Mas isso era típico dos jovens dos anos 70. Entrei para a Marinha onde o exercício físico é componente da carreira.
    Enfim, vamos ficar velhos, vamos ficar mais sábios e vamos nos movimentar até o último dia.

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