Aqui em BH existe um programa sobre rock que
termina sempre com o apresentador perguntando: "Gostas do delírio, baby?" E é com a linha do
delírio que o post de hoje será costurado.
Mas não sou historiador, cientista político,
teólogo nem sociólogo. Sou apenas um velho idiota que gosta de rock, tanto mais
idiota quanto mais envelheço. Por isso, cheio de desesperança e incomodado com
a visão de imagens da destruição provocada pela guerra entre o Hamas e Israel –
que me deixaram ainda mais desanimado com a espécie humana – pensei em escrever
uma crônica de realidade alternativa para corrigir esse ódio e a aparentemente
total impossibilidade de convivência pacífica entre dois povos e duas
religiões.
Para não ser apedrejado antes do templo, ou
melhor, do tempo, preciso lembrar ou informar que sou um moderado radicalmente
pacifista. Por isso deixo claro que abomino e condeno todo tipo de violência e intolerância que resultem de crendices, ignorância, fundamentalismo, ideologias radicais ou fanatismo religioso. Assassinato de pessoas
inocentes e limpeza étnica são atos de puro terrorismo, sejam eles praticados
por árabes ou israelenses. Além disso, considero absolutamente inaceitável a
instalação de colônias judaicas em território palestino, mesmo que "justificadas" pela interpretação literal da crença na “terra prometida”.
Como não estou com paciência para raciocínios
mais elaborados nem criatividade para criar cenários e situações
hollywoodianas, deixarei apenas provocações na forma de perguntas vindas
do “País do E se...?” para que os três leitores remanescentes desta
bagaça exercitem (se quiserem, lógico) sua fértil imaginação e criem uma bela crônica
de realismo fantástico ou realidade alternativa. Feitas as devidas
explicações e colocados os cintos, podemos decolar.
Antes, entretanto, preciso fornecer alguns
dados extraídos da internet e de livros que li não faz muito tempo. Bora lá.
- São
Paulo Apóstolo teria nascido no ano 5 e morrido no ano 64. Segundo alguns
estudiosos, São Paulo foi o “inventor” do cristianismo ao universalizar os
ensinamentos de Jesus;
- Em
135, para combater uma revolta dos judeus, o imperador romano Adriano mandou
arrasar a cidade de Jerusalém e expulsar todos que ali viviam. Os judeus foram
proibidos de viver próximo a Jerusalém e cerca de 900 aldeias judaicas na
Judeia foram completamente destruídas e seus moradores mortos, escravizados ou
banidos da região;
- Entre
os anos 249 e 270 a Peste de Cipriano – possivelmente causada por varíola ou
sarampo – atingiu o Império Romano e suas províncias orientais. Em seu auge
teria chegado a matar 5.000 pessoas por dia;
- Em
313, depois de convertido, o imperador romano Constantino reconheceu
oficialmente o cristianismo como religião;
- No
ano 638 a região da Palestina foi conquistada pelos árabes e passou a fazer
parte de um Califado Islâmico, recebendo uma significativa presença de
muçulmanos;
- No
ano de 1095 os judeus começaram a ser perseguidos pelos cristãos, porque a
Igreja Católica os considerou responsáveis pela morte do judeu Jesus Cristo. A partir
daí os seguidores do judaísmo sofreram frequentes ataques nas cidades
europeias, enclausurando-se em guetos para se proteger;
- Em
1492 graças à Santa Inquisição 120.000 judeus foram expulsos da Espanha e foram para Portugal;
- A
partir de 1496 190.000 judeus de Portugal foram obrigados a se converter ao catolicismo para
continuar no país, criando a figura do “cristão novo”;
- Em
1517 a Palestina foi incorporada ao Império Otomano.
Devidamente abastecidos com essas informações
(sujeitas a averiguações), podemos agora formular algumas perguntas. E a
primeira delas é: Gostas do delírio, baby?
E agora, mais provocações. A principal é esta
(já imagino alguém dizendo que “Jotabê
pirou, está babando!”):
E se essa hostilidade inextinguível entre
palestinos e israelenses fosse culpa dos cristãos?
Antes de dar sequência às provocações,
preciso lembrar que após a destruição de Jerusalém em 135 os romanos, sob o comando
do imperador Adriano, fizeram um significativo esforço para eliminar a
identidade judaica na região – que passou a ser habitada por uma mistura de
povos, incluindo romanos, gregos e povos nativos da região. As autoridades
romanas tentaram desencorajar o retorno dos judeus à região e impuseram várias
restrições, incluindo a proibição da prática pública do judaísmo.
Ao ser expulsos da terra onde viviam os
judeus espalharam-se pelo mundo, fazendo com que o “vácuo” deixado por eles
fosse ocupado por romanos, árabes, gregos e outros povos. Por isso, a
pergunta: E se Roma nunca tivesse destruído Jerusalém?
São Paulo criou toda uma teologia divergente
do judaísmo e foi o responsável pela disseminação do cristianismo no Império
Romano, certo? E se o cristianismo nunca tivesse passado de uma crença
messiânica judaica?
A peste de Cipriano dizimou milhares de
pessoas. Alguns cristãos viram essa epidemia como um sinal do fim dos tempos e
acreditaram que deveriam permanecer firmes em sua fé, o que reforçou a coesão
das comunidades cristãs. E se essa epidemia não tivesse acontecido?
Se o cristianismo tivesse permanecido apenas
como uma seita judaica o imperador Constantino a teria reconhecido como
religião?
E sendo o cristianismo apenas mais uma seita
judaica irrelevante, os judeus que se espalharam pelo mundo seriam culpados
pela crucificação de Jesus e proibidos de exercer atividades agropecuárias ou
perseguidos e ameaçados (inquisição, antissemitismo, holocausto,
etc.) por sua fé?
Este é o resumo final, o briefing para os autores que
aceitarem o desafio de escrever suas histórias de realidade alternativa:
E se o cristianismo não tivesse se tornado a
religião de bilhões de pessoas? Teria talvez continuado apenas como uma seita
judaica?
E sendo assim, os cristãos culpariam os
judeus pela crucificação de Jesus? E se não os culpassem, os judeus, além do
comércio, poderiam dedicar-se também à agricultura e criação de animais?
E se pudessem integrar-se mais às comunidades
onde viviam ainda assim seriam tão hostilizados, perseguidos, demonizados e
torturados pelos cristãos?
Por outro lado, se não fossem maltratados e
mal vistos nos países para onde foram depois de expulsos da terra onde
viviam pelos romanos, teriam vontade de retornar à terra de
seus antepassados?
Diante de tudo isso haveria tanto ódio e
intolerância entre árabes e judeus? E o antissemitismo europeu teria atingido
os níveis a que chegou? E o holocausto teria talvez nunca acontecido?
E se o cristianismo tivesse sido apenas uma
seita judaica, talvez a ideia da criação de um estado judeu na Palestina, há
séculos ocupada por árabes e outros povos (em uma espécie de usucapião
primitivo) não tivesse surgido. E nunca haveria conflitos entre árabes e
israelenses, pois talvez nem Israel tivesse sido criado.
E agora, rola de criar uma crônica de
realidade alternativa sobre isso?