Acabei de ler um texto muito instigante
(aliás, são dois, de autores diferentes). Mas quero comentar apenas o do
Marreta. Eu ia fazer o comentário em seu blog, mas percebi que sairia um
tijolão. E como uma das máximas do Blogson é “Resposta grande vira
post”, aí vai mais um.
Em seu texto o Azarão aborda o assunto da
epidemia paralela de demência provocada pela Covid-19. Perdeu a chance de
tratá-la como pandemência! Mas eu me
pergunto se essa “epidemia” já não está instalada há mais tempo. Aliás, essa é
também a suposição do Marreta. O que sei é que, pelo menos para mim, a prova
viva das nossas suspeitas chama-se “redes sociais”.
Não sou especialista na área, pois tenho perfil apenas no Facebook, coisa muito
chinfrim para algumas pessoas. Conheço um sujeito que tem três perfis
só no Facebook. O que é publicado por um é comentado pelos outros dois. Ou
seja, é o falar sozinho cibernético.
Mas há antídotos já consagrados, terapias que
a OMS se esqueceu de listar. Uma das mais eficientes chama-se “comida”, ou
melhor, a preparação diária e necessária de alimentos por pessoas que estão
hoje no regime de Home Office.
Pensando bem, regime não
é um termo que pode ser aplicado despreocupadamente nos tempos atuais. Eu e –
assim imagino – muitas outras pessoas temos engordado um pouco nestes tempos
pandêmicos, alguns mais, outros menos. Creio que estou na categoria “mais”, pois, graças à pandemia, fiz uma
notável descoberta científica.
Isso seria assunto de outro post, mas fica
por aqui mesmo. A Terra é redonda, já sei disso desde a infância. Mas descobri
que não só a Terra não é plana. Minha barriga também não, está a cada dia que
passa mais redonda!
Deixando a piada idiota de lado, parece que
“comida” é um poderoso antídoto para a piração geral. Não importa se na forma
de tira-gosto, pratos elaborados ou “junk
food”. O efeito calmante é sempre o mesmo.
Minha mulher cozinha muito bem, qualidade e
gosto que passou para nossos filhos. Tem também uma ligação afetiva
extremamente forte e protetora com sua irmã mais nova, justamente quem cuidou
diariamente de minha sogra até seu falecimento e, por isso mesmo, a mais
fragilizada emocionalmente. Todas as vezes que sai um rango mais especial aqui
em casa, já está estabelecida a “jurisprudência”: separa-se um pouco, que é
levado para minha cunhada. Isso serve também para que saiamos de casa, pois,
graças ao nosso pertencimento ao chamado “grupo de risco”, não pisamos nem na
calçada em frente ao nosso portão.
Pois bem, em todas essas vezes (duas ou três
por semana), minha cunhada nos espera com olhos lacrimejantes e, depois de
provar ou acabar com a porção recebida, liga para agradecer. E aí as duas irmãs
amarram um longo papo, falam de tudo o que os amigos e irmãos próximos falam
normalmente.
O que imagino é que esta pandemia acentuará a
instabilidade emocional pré-existente em cada um. Sem saber quantificar, é
claro que existe um grupo de pessoas de idades variadas que tem o chamado
"fogo no rabo", o desejo de sair por aí, "sem lenço e sem documento". Infelizmente são as pessoas
com ânsia incontida de sair que favorecem a contaminação de gente que está
quieta em casa, pacientemente esperando o momento de poder sair para ir ao
salão, à academia de ginástica, ao dentista, etc.
Temos uma amiga que é idosa, viúva e mora
sozinha. Outro dia comentou com minha mulher que foi ao salão "porque
o cabelo estava muito feio". Ela também já disse que quando a pandemia
acabar sairá sem rumo por aí, coisas do tipo. Esse é o tipo de
"vetor" que a mamoninha adora. Ou os jovens que teimam em ir a uma
balada clandestina. Gente assim jamais poderia se candidatar à vaga de
astronauta ou viajar para Marte (mesmo que possa ligar para o companheiro ou
companheira e diga "quero ir amar-te"). Fico curioso por
saber a resposta de um presidiário diante da pergunta "como essa
necessidade de isolamento social para conter o corona vírus está te
afetando?"
Penso também que a maior chance de uma
perturbação mental mais efetiva está presente nas pessoas que viram seus sonhos
e sua fonte de renda ir para o ralo. Uma empresa ou negócio falido é muito mais
impactante que a espera forçada, que o desejo proibido de se esbaldar por aí. O
que percebo é que as pessoas não se dão conta da interação invisível existente
entre todos, quase naquele nível da borboleta que bate a asas aqui e provoca um
tsunami no Oriente. Ou como aquele prato de pedreiro, onde ao atacar o feijão o
arroz cai do outro lado. Sei lá...
Só sei que o alimento - ainda que apenas consumido - funciona como terapia, como medicamento. Basta lembrar a frase de Sancho Pança, escudeiro do popular Dom Quixote (publicado em 1605!): “com pão as dores são menores”. Mesmo que os dígitos da balança aqui de casa estejam maiores.
Aqui em casa, que cozinha sou eu, em 90% das vezes. E gosto muito de ficar sozinho na cozinha fazendo o arroz com feijão de todos os dias, ouvindo uma musiquinha, enquanto o Raul está tendo aula e minha esposa está trabalhando. De fato, cozinhar ajuda bem a passar o tempo. Só não gosto de lavar a louça depois.
ResponderExcluirE sim, pandemência estava bem na minha cara e eu não percebi.
Achei que você comentaria sobre o título. Lembrei-me da letra de "Funeral de um lavrador", do Chico Buarque, onde ele diz "estarás mais ancho que estavas em vida". Ancho rimava com Sancho, o que seria "ancho"? Existiria a forma feminina para rimar com "Pança"? A resposta que descobri no dicionário é que sim, existe a forma feminina e significa (entre outras coisas) "dilatada". E o título ficou perfeito.
ExcluirSim, ancho significa amplo, largo, espaçoso. Mas a letra da canção não é do Chico, acho que nem o Chico sabia o que era ancho. Ele "apenas" musicou o poema do João Cabral de Melo Neto, da obra Morte e Vida Severina.
ExcluirVocê é bom nisso, heim? Vou te nomear para corretor de conteúdo do Blogson. O sentido de ancho dava para captar pelo conjunto da letra, mas precisava descobrir se havia um sentido de gorda, grande ou dilatada, pois pança larga ou espaçosa não daria o sentido que eu buscava.
Excluir"nos espera com olhos lacrimejantes" - e com salivação abundante ;)
ResponderExcluircara, se tivessem implementado algum projeto educacional decente há 200 atrás, o brasil poderia ser diferente.
agora é cada um por si e a maioria é analfabeta funcional: não tem como exigir muita coisa (Complexo do pombo enxadrista):
"Discutir com Fulano é o mesmo que jogar xadrez com um pombo: ele defeca no tabuleiro, derruba as peças e sai voando cantando vitória."
Concordo com você em tudo, meu caro Scant. E essa do pombo, rolei de rir, pois não conhecia.
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