quarta-feira, 20 de maio de 2015

OSTENTAÇÃO PARTE I - BLECAUTE

Como sabem algumas pessoas, estudei engenharia, mas psicologia era uma das minhas opções quando estava perto do vestibular. Talvez por isso, estou sempre tentando me entender, me analisar. Hoje, por exemplo, fiquei pensando porque tento postar alguma coisa todo dia ou quase isso, apesar de já ter dito que novos textos só seriam divulgados uma vez por semana, às sextas-feiras. E a conclusão é sempre a mesma a que já cheguei em outras ocasiões: eu tenho uma carência afetiva quase congênita.

Por isso, mesmo que eu saiba ou pressinta que as pessoas em geral gostam de mim, parece que eu sempre preciso mais. Mais atenção, mais elogios, mais reconhecimento, como se isso fosse uma droga e eu um viciado. 

E o Blogson acaba sendo um instrumento para que eu possa me exibir, para ostentar meus dotes intelectuais, meu humor, minha inteligência, minha ironia. E aí cheguei onde queria: insegurança, carência afetiva podem levar a algum tipo de ação compensatória, à ostentação. Por isso, resolvi me divertir um pouco com essa ideia - que é o tema de hoje. 

Como não sou bobo (pelo menos, não tanto quanto aparento ser), resolvi apresentar este tema em três posts distintos. Não só pelo estilo diferente de cada um, mas para enganar a mim mesmo e postar em três dias sequenciais. E o primeiro é um resgate de lembranças de infância. Som na caixa!


BLECAUTE
Até me casar, morei em uma rua que era o acesso natural daqueles que iam e vinham da área central da cidade aos bairros mais periféricos da região. Quando eu era criança, a rua tinha mão dupla e trilhos para bondes. Era, já naquela época, uma rua bastante movimentada, por onde passava todo tipo de gente. Havia um sujeito, em especial, que me fascinava, pois tinha uma bicicleta tão cheia de acessórios, enfeites, flâmulas, buzinas, faroletes e todo tipo de tranqueira usada à guisa de decoração que era impossível ficar indiferente à sua passagem. Sem brincadeira, imagino que a bicicleta devia ter um peso extra de uns trinta quilos, no barato. O que talvez fosse um problema, já que ele descia montado, mas subia empurrando. Tinha o apelido de Blecaute, talvez por uma semelhança distante com o Blecaute original, cantor que era também conhecido pelo epíteto (pedante!) de "General da Banda". 

A bicicleta era tão chamativa que inspirou o Lé, um dos meninos das redondezas, a fazer alguma coisa parecida. Justamente o mais pobre, o mais humilhado, o mais miserável - e o mais revoltado. Que construiu um patinete de rolimã com formato de lambreta (scooter). 

Com o dinheiro que conseguia vendendo ferro velho, cobre e bronze que ia catando por onde andasse (nunca, jamais roubou nada), estofou o banco, comprou buzinas, faroletes, flâmulas, enfeites e todo tipo de maluquice, exatamente da mesma forma que a bicicleta do Blecaute. Tinha tanta coisa que poderia quebrar ou estragar que nem o dono andava nele, exceto para exibi-lo e se exibir. Tentei achar na internet alguma imagem que lembrasse a bicicleta ou o patinete, mas não encontrei nada tão kitsch, tão esquisito, tão fenomenal. Creio que esses são os exemplos mais antigos de ostentação que conheço.

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