domingo, 18 de fevereiro de 2024

UM ATEU CATÓLICO III

 
Se você leu e não gostou dos posts recentes dedicados a divagações sobre religião e fé, pode parar por aqui, porque este é mais um da série “Ateu Católico” (o último). Poderia dizer brincando com as palavras que este é o terceiro da chatíssima trindade de posts que resolvi publicar. Mas se quiser continuar, bora lá.
 
Eu gostava muito de conversar sobre religião com meu amigo e colega de serviço Pintão, um ateu convertido ao catolicismo. E ao expor minhas dúvidas e inquietações ele tentava me acalmar dizendo que a fé vem de dentro de cada pessoa. Uma vez comentou sobre uma expressão francesa – “la foi du charbonnier”, a “fé do carvoeiro”, para definir a fé monolítica que algumas pessoas possuem, uma fé que nada questiona e que tudo aceita.
 
Fiquei com aquela imagem na cabeça e sempre me lembro dela quando a mente viaja pelo desconhecido, pelo ainda não comprovado, misturando ciência e fé. A partir de agora vou registrar reflexões sobre a Bíblia e sobre as religiões, mostrando por que eu me considero um pouco ateu e um pouco católico.
 
Hoje eu sinto inveja das pessoas quem têm alguma crença religiosa, mas sinto inveja também dos ateus convictos e até daqueles que não se preocupam com religião. Eu sou cheio de dúvidas e tenho tendência a misturar ciência com fé. Por exemplo: Deus criou o Universo?
 
Apesar da quantidade incalculável de galáxias, estrelas e planetas, minha tendência é dizer que se Deus (ou deuses) realmente existe, é razoável imaginar que ele criou o universo. Estou dizendo isto porque estima-se que existam centenas de bilhões de galáxias, cada uma delas com 200 a 400 bilhões de estrelas. Se você pensar que cada estrela pode ter uns 10 planetas fica até difícil entender o número total de planetas existentes. Mas vamos simplificar. Se um “infinitésimo” dessa quantidade corresponder a planetas com vida inteligente será preciso ter muita boa vontade para imaginar que nós somos os queridinhos de Deus e que fomos criados à sua imagem e semelhança. Além disso, até já ouço os espíritos dos neandertais, dos denisovanos e de outros “primos” reclamando também dessa “predileção divina”.
 
Mas Deus pode estar no início, na criação do universo. O universo em que vivemos teria surgido a partir do Big Bang, uma “singularidade”, onde o nada transformou-se em tudo. Talvez exista o dedo de Deus no Fiat Lux que se seguiu. Eu gosto muito e acho poética a descrição bíblica para a criação do mundo:
 
No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Deus disse: "Faça-se a luz!" E a luz foi feita.
 
Outra pergunta: Jesus era mesmo filho de Deus? Resposta: nunca tive problema com isso, mas nunca achei necessário que nascesse de uma virgem e que não tivesse mais irmãos. Mulher virgem é mais pura? Isso significa que sexo é impuro? Besteira pura, isso sim. Sim, se Deus existir, para mim Jesus pode ter sido mesmo filho de Deus e pode ter ressuscitado. Mas nunca parei para racionalizar isso. Porque nem tudo é explicável e talvez nunca seja. Por exemplo: matéria escura do universo. Existe? Não existe? Até agora é uma construção intelectual não comprovada nem mensurada. Uma das teorias é esta:
 
"Cerca de 95% de toda a matéria que constitui nosso Universo, aparentemente, é feita de algo que não conhecemos e que não conseguimos observar de forma direta. Além disso, um terço de toda essa matéria desconhecida, apelidada de matéria escura, não interage eletromagneticamente, ou seja, não é capaz de emitir ou absorver qualquer tipo de radiação."
 
Acabei de misturar fé com ciência, mas assim é a cabeça de um católico ateu. E vamos mudar de assunto.
 
 
Sabe quantas religiões existem no mundo? Segundo a Wikipédia, umas dez mil. Cá pra nós, você acha justo imaginar que só o Deus judaico-cristão é verdadeiro? Não precisa responder.
 
Sabe quais são os principais grupos religiosos do mundo? Em dados de 2012, são estes: 
Cristianismo (28%)
Islamismo (22%)
Hinduísmo (15%)
Irreligião (11,9%)
Budismo (8,5%)
Ateismo (2,3%)
Judaísmo (0,2%)
Outros (12,1%)
 
Comentários:
- Segundo o dicionário, Irreligião (também referida como incredulidade, ausência de religião ou pessoas sem religião) é a ausência, indiferença ou não prática de uma religião.
- Chama atenção o percentual do judaísmo. Insignificante, mas como tem potencial para atrair rejeição e confusão!
- As quatro maiores religiões surgiram há milênios, sendo o islamismo a mais recente. Surgiu no século VII. Mas vamos mudar de assunto de novo.
 
 
Não entrando no mérito do Verbo ter-se feito carne ou não, eu penso que os fundadores ou formatadores das grandes religiões eram pessoas com inteligência emocional muito acima da média e, que depois de muita meditação e reflexões sobre a essência da vida, estavam interessados apenas em passar mensagens edificantes e normas para um convívio harmonioso e fraterno entre aqueles que os seguiam. O problema é que nenhum deles deixou nada escrito. Quem se encarregou de registrar os ensinamentos recebidos foram seus discípulos.
 
O Evangelho de São Marcos é considerado o primeiro a ser escrito, provavelmente entre os anos 60 e 70 d.C, trinta anos depois da morte de Jesus. O Evangelho de São João foi escrito entre os anos 90 e 110 d.C., entre 60 e 80 anos após a morte do Messias. Ao ficar sabendo disso você já começa a ter minhocas na cabeça. Ou não? Pense bem, você realmente acredita na exatidão das palavras e na descrição precisa dos atos e milagres praticados por Cristo passado tanto tempo? Não precisa responder.
 
Jesus era judeu. Os doze apóstolos também eram judeus. Nada mais natural, portanto que os evangelistas citassem trechos de profecias para demonstrar aos demais judeus que Jesus era verdadeiramente o filho de Deus, que tinha origem divina. Talvez, naquela época, eles não percebessem que o que realmente importava (e sempre importou) eram os ensinamentos que Jesus tinha deixado.
 
Eu, pelo menos, sempre achei curiosa e desnecessária essa “ânsia” pela busca de provas. Sem falar na descrição de acontecimentos que não presenciaram, como o nascimento de Jesus. Quem contou para eles? Negócio é o seguinte: se você já leu trechos dos Evangelhos de forma não mecânica, não automática, já deve ter tido a sensação de que os evangelistas buscaram provar a origem divina de Jesus citando trechos de profecias do Antigo Testamento.
 
Ninguém discute a beleza das parábolas criadas por Cristo, mesmo que registradas com palavras semelhantes ou com alguma “licença poética”, mas alguns episódios citados sempre fizeram surgir a dúvida em minha mente. Por isso, nos meus tempos de católico praticante (e questionador) resolvi ler toda a Bíblia. Talvez assim eu mudasse minha visão reticente e crítica a muitas leituras feitas durante as missas. A primeira providência foi comprar uma Bíblia das Edições Paulinas, impressa em papel de jornal.
 
Comecei lendo a Apresentação e a Introdução Geral. Descobri assim que a “Holy Bible” é formada por 46 “livros” do Antigo Testamento e 27 do Novo Testamento. Descobri depois que a quantidade de livros do Antigo Testamento pode variar, dependendo da versão consultada (existe uma porrada). Para o ChatGPT, por exemplo, são apenas 39. De onde saiu isso? Só Deus sabe! (piada).
 
No caso do Novo Testamento, a coisa é mais simples:
Evangelhos: Mateus, Marcos, Lucas, João
Livro Histórico: Atos dos Apóstolos
Epístolas de São Paulo: Romanos, Coríntios (duas), Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, Tessalonicenses (duas), Timóteo (duas), Tito, Filêmon, Hebreus
Epístolas Católicas: Tiago, Pedro (duas), João (três), Judas,
Livro Profético: Apocalipse,
 
Resolvi começar a leitura pelo Evangelho de São Mateus. Achei lindo, adorei a leitura das belíssimas parábolas criadas por Jesus, mas a coisa começou a dar tilt, pois eu pensava que os quatro evangelhos seriam complementares entre si. Ledo engano! Mateus, Marcos e Lucas são chamados sinóticos por apresentarem muitas semelhanças, Tantas que levaram os estudiosos a acreditar que esses evangelhos foram escritos com base em fontes comuns. Em outras palavras, são quase um copicola do outro. Isso é ruim? Não necessariamente, mas fiquei um pouco decepcionado.
 
Tentei também ler o “Apocalipse”, mas não tive saco. É muita fantasia e alegoria. Dá até para pensar que São João estava bêbado ou fumado quando o escreveu.
 
Para concluir a goma iniciada no penúltimo post, a Bíblia jotabélica seria formada pelo A.T. magrinho citado no post anterior e por um Novo Testamento sem o livro do Apocalipse. Uma das versões mais antigas da Bíblia é chamada de Septuaginta. A Bíblia jotabélica poderia ser conhecida como Bíblia Zedapinta (piada ruim!).
 
E agora é para acabar mesmo: você pode ter odiado e achado ridículos os argumentos e reflexões apresentados nos três posts do católico ateu, mas se quiser diversão garantida leia o Gênesis, uma crônica policial por excelência. Fui.

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