Se você leu e não gostou
dos posts recentes dedicados a divagações sobre religião e fé, pode parar por
aqui, porque este é mais um da série “Ateu Católico” (o último). Poderia dizer
brincando com as palavras que este é o terceiro da chatíssima trindade de posts que resolvi publicar. Mas se quiser
continuar, bora lá.
Eu gostava muito de
conversar sobre religião com meu amigo e colega de serviço Pintão, um ateu
convertido ao catolicismo. E ao expor minhas dúvidas e inquietações ele tentava
me acalmar dizendo que a fé vem de dentro de cada pessoa. Uma vez comentou
sobre uma expressão francesa – “la foi du
charbonnier”, a “fé do carvoeiro”, para definir a fé monolítica que algumas
pessoas possuem, uma fé que nada questiona e que tudo aceita.
Fiquei com aquela imagem
na cabeça e sempre me lembro dela quando a mente viaja pelo desconhecido, pelo
ainda não comprovado, misturando ciência e fé. A partir de agora vou registrar
reflexões sobre a Bíblia e sobre as religiões, mostrando por que eu me
considero um pouco ateu e um pouco católico.
Hoje eu sinto inveja das
pessoas quem têm alguma crença religiosa, mas sinto inveja também dos ateus convictos
e até daqueles que não se preocupam com religião. Eu sou cheio de dúvidas e
tenho tendência a misturar ciência com fé. Por exemplo: Deus criou o Universo?
Apesar da quantidade
incalculável de galáxias, estrelas e planetas, minha tendência é dizer que se
Deus (ou deuses) realmente existe, é razoável imaginar que ele criou o universo.
Estou dizendo isto porque estima-se que existam centenas de bilhões de
galáxias, cada uma delas com 200 a 400 bilhões de estrelas. Se você pensar que
cada estrela pode ter uns 10 planetas fica até difícil entender o número total de
planetas existentes. Mas vamos simplificar. Se um “infinitésimo” dessa
quantidade corresponder a planetas com vida inteligente será preciso ter muita boa vontade para imaginar que nós somos os queridinhos de Deus e que fomos
criados à sua imagem e semelhança. Além disso, até já ouço os espíritos dos neandertais, dos
denisovanos e de outros “primos” reclamando também dessa “predileção divina”.
Mas Deus pode estar no
início, na criação do universo. O universo em que vivemos teria surgido a
partir do Big Bang, uma “singularidade”, onde o nada transformou-se em tudo. Talvez
exista o dedo de Deus no Fiat Lux que
se seguiu. Eu gosto muito e acho poética a descrição bíblica para a criação do
mundo:
No
princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as
trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Deus
disse: "Faça-se a luz!" E a luz foi feita.
Outra pergunta: Jesus era
mesmo filho de Deus? Resposta: nunca tive problema com isso, mas nunca achei
necessário que nascesse de uma virgem e que não tivesse mais irmãos. Mulher
virgem é mais pura? Isso significa que sexo é impuro? Besteira pura, isso sim.
Sim, se Deus existir, para mim Jesus pode ter sido mesmo filho de Deus e pode
ter ressuscitado. Mas nunca parei para racionalizar isso. Porque nem tudo é
explicável e talvez nunca seja. Por exemplo: matéria escura do universo.
Existe? Não existe? Até agora é uma construção intelectual não comprovada nem
mensurada. Uma das teorias é esta:
"Cerca
de 95% de toda a matéria que constitui nosso Universo, aparentemente, é feita
de algo que não conhecemos e que não conseguimos observar de forma direta. Além
disso, um terço de toda essa matéria desconhecida, apelidada de matéria escura,
não interage eletromagneticamente, ou seja, não é capaz de emitir ou absorver
qualquer tipo de radiação."
Acabei de misturar fé com ciência, mas assim
é a cabeça de um católico ateu. E vamos mudar de assunto.
Sabe quantas religiões existem
no mundo? Segundo a Wikipédia, umas dez mil. Cá pra nós, você acha justo
imaginar que só o Deus judaico-cristão é verdadeiro? Não precisa responder.
Sabe quais são os
principais grupos religiosos do mundo? Em dados de 2012, são estes:
Cristianismo (28%)
Islamismo (22%)
Hinduísmo (15%)
Irreligião (11,9%)
Budismo (8,5%)
Ateismo (2,3%)
Judaísmo (0,2%)
Outros (12,1%)
Comentários:
- Segundo o dicionário, Irreligião (também referida como
incredulidade, ausência de religião ou pessoas sem religião) é a ausência,
indiferença ou não prática de uma religião.
- Chama atenção o percentual do
judaísmo. Insignificante, mas como tem potencial para atrair rejeição e
confusão!
- As quatro maiores religiões surgiram
há milênios, sendo o islamismo a mais recente. Surgiu no século VII. Mas vamos
mudar de assunto de novo.
Não entrando no mérito do Verbo ter-se feito carne ou não, eu
penso que os fundadores ou formatadores das grandes religiões eram pessoas com
inteligência emocional muito acima da média e, que depois de muita meditação e
reflexões sobre a essência da vida, estavam interessados apenas em passar
mensagens edificantes e normas para um convívio harmonioso e fraterno entre
aqueles que os seguiam. O problema é que nenhum deles deixou nada escrito. Quem
se encarregou de registrar os ensinamentos recebidos foram seus discípulos.
O Evangelho de São Marcos é
considerado o primeiro a ser escrito, provavelmente entre os anos 60 e 70 d.C,
trinta anos depois da morte de Jesus. O Evangelho de São João foi escrito entre os
anos 90 e 110 d.C., entre 60 e 80 anos após a morte do Messias. Ao ficar
sabendo disso você já começa a ter minhocas na cabeça. Ou não? Pense bem, você
realmente acredita na exatidão das palavras e na descrição precisa dos atos e
milagres praticados por Cristo passado tanto tempo? Não precisa responder.
Jesus era judeu. Os doze apóstolos também eram
judeus. Nada mais natural, portanto que os evangelistas citassem trechos de
profecias para demonstrar aos demais judeus que Jesus era verdadeiramente o filho
de Deus, que tinha origem divina. Talvez, naquela época, eles não percebessem
que o que realmente importava (e sempre importou) eram os ensinamentos que
Jesus tinha deixado.
Eu, pelo menos, sempre achei curiosa e
desnecessária essa “ânsia” pela busca de provas. Sem falar na descrição de
acontecimentos que não presenciaram, como o nascimento de Jesus. Quem contou
para eles? Negócio é o seguinte: se você já leu trechos dos Evangelhos de forma
não mecânica, não automática, já deve ter tido a sensação de que os
evangelistas buscaram provar a origem divina de Jesus citando trechos de
profecias do Antigo Testamento.
Ninguém discute a beleza das parábolas
criadas por Cristo, mesmo que registradas com palavras semelhantes ou com alguma
“licença poética”, mas alguns episódios citados sempre fizeram surgir a dúvida
em minha mente. Por isso, nos meus tempos de católico praticante (e questionador) resolvi
ler toda a Bíblia. Talvez assim eu mudasse minha visão reticente e crítica a
muitas leituras feitas durante as missas. A primeira providência foi comprar
uma Bíblia das Edições Paulinas, impressa em papel de jornal.
Comecei lendo a Apresentação e a Introdução
Geral. Descobri assim que a “Holy Bible” é formada por 46 “livros” do Antigo
Testamento e 27 do Novo Testamento. Descobri depois que a quantidade de livros
do Antigo Testamento pode variar, dependendo da versão consultada (existe uma
porrada). Para o ChatGPT, por exemplo, são apenas 39. De onde saiu isso? Só Deus
sabe! (piada).
No caso do Novo Testamento, a coisa é mais
simples:
Evangelhos: Mateus, Marcos, Lucas, João
Livro Histórico: Atos dos Apóstolos
Epístolas de São Paulo: Romanos, Coríntios
(duas), Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, Tessalonicenses (duas),
Timóteo (duas), Tito, Filêmon, Hebreus
Epístolas Católicas: Tiago, Pedro (duas),
João (três), Judas,
Livro Profético: Apocalipse,
Resolvi começar a leitura pelo Evangelho de
São Mateus. Achei lindo, adorei a leitura das belíssimas parábolas criadas por
Jesus, mas a coisa começou a dar tilt,
pois eu pensava que os quatro evangelhos seriam complementares entre si. Ledo
engano! Mateus, Marcos e Lucas são chamados sinóticos por apresentarem muitas semelhanças, Tantas que levaram os estudiosos a
acreditar que esses evangelhos foram escritos com base em fontes comuns. Em
outras palavras, são quase um copicola
do outro. Isso é ruim? Não necessariamente, mas fiquei um pouco decepcionado.
Tentei também ler o “Apocalipse”, mas não
tive saco. É muita fantasia e alegoria. Dá até para pensar que São João estava
bêbado ou fumado quando o escreveu.
Para concluir a goma iniciada no penúltimo
post, a Bíblia jotabélica seria formada pelo A.T. magrinho citado no post
anterior e por um Novo Testamento sem o livro do Apocalipse. Uma das versões mais antigas da Bíblia é chamada de Septuaginta. A Bíblia jotabélica poderia ser
conhecida como Bíblia Zedapinta (piada ruim!).
E agora é para acabar mesmo: você pode ter
odiado e achado ridículos os argumentos e reflexões apresentados nos três posts do católico ateu, mas se quiser diversão garantida leia o
Gênesis, uma crônica policial por excelência. Fui.
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