Pois é, “acabou
nosso carnaval” e isso sempre me provoca alguma melancolia. Talvez por saber
que terei de esperar um ano para viver emoções e sentimentos exclusivos dessa festa. Dizendo
assim, até parece que eu me esbaldo no carnaval, mas não é verdade.
Quase entrando na
adolescência, a minha diversão era jogar sangue
do diabo nos moleques conhecidos e nas pessoas que passavam. Esse “sangue” é uma mistura de amoníaco e fenolftaleína
que mancha a roupa onde é jogada. Quem não conhece se assusta, mas a mancha desaparece
rapidinho. Por isso, a terça-feira
trazia consigo a certeza de que essa brincadeira só poderia repetir-se no
próximo carnaval.
Um dia, esse desejo de sacanear as pessoas passou.
Eu tinha entrado na adolescência. Meu irmão e mentor falou para irmos à matinê carnavalesca do clube furreca que
havia perto da casa de minha avó. Como era muito tímido (e feio; e magricela; e
bobo) ficava na roda que se formava no salão, observando os casais de jovens que brincavam no
centro, logo substituídos por nova dupla, até que uma menina vestida de índia
americana me puxou para o meio da roda. A experiência durou uns dois minutos,
tempo suficiente para que eu me apaixonasse pela primeira vez. Mas o carnaval
acabou e eu passei quase um ano sonhando com aquela menina misteriosa. Quando,
por acaso, descobri onde morava, percebi também que não era tão linda como
tinha imaginado e que a paixão tinha acabado.
Para mim, a
alegria e descontração do carnaval nunca
surgiram instantaneamente, nunca houve uma chave "liga-desliga". Especialmente naquela fase de “cachorro que caiu do
caminhão de mudança”, iam sendo alimentadas aos poucos, atingindo o ápice
justamente na terça-feira (quando já era tarde demais). E aí batia aquela melancoliazinha
e, claro, a solidão do dia a dia.
.
Hoje é terça-feira, sou casado com a mulher
da minha vida - a menina mais linda que já conheci (e foi no carnaval!), mas
ainda bate aquela melancolia ao pensar que poderia ter aproveitado mais, que
deveria ter despregado meus pés do chão, que deveria ter me despido da timidez congênita, ter vestido uma fantasia
idiota, que deveria ter me permitido mais descontração, enfim. E sobra a certeza de
que agora é tarde, que só no ano que vem.
Há uma música que mesmo não sendo de
carnaval, reproduz perfeitamente essa sensação. Alguns poderão dizer que é uma
música de protesto ou profética; foda-se. Para mim é uma música que evoca as
sensações que sempre senti no final de todos os carnavais. A melodia foi composta pelo Carlos Lyra e a
letra é do velho e bom Vinícius de Moraes. E é para esses dois craques que eu
presto minha reverência. O título é “Marcha
da Quarta-feira de Cinzas”, cuja letra transcrevo a seguir. E quem quiser
ouvir uma música realmente linda pode seguir este link:
MARCHA DA QUARTA-FEIRA DE CINZAS
Acabou nosso carnaval
Ninguém ouve cantar canções
Ninguém passa mais brincando feliz
E nos corações
Saudades e cinzas foi o que restou
Pelas ruas o que se vê
É uma gente que nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se abraça
E sai caminhando
Dançando e cantando cantigas de amor
E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade
A tristeza que a gente tem
Qualquer dia vai se acabar
Todos vão sorrir
Voltou a esperança
É o povo que dança
Contente da vida, feliz a cantar
Porque são tantas coisas azuis
E há tão grandes promessas de luz
Tanto amor para amar de que a gente nem sabe
Quem me dera viver pra ver
E brincar outros carnavais
Com a beleza dos velhos carnavais
Que marchas tão lindas
E o povo cantando seu canto de paz
Seu canto de paz
Ninguém ouve cantar canções
Ninguém passa mais brincando feliz
E nos corações
Saudades e cinzas foi o que restou
Pelas ruas o que se vê
É uma gente que nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se abraça
E sai caminhando
Dançando e cantando cantigas de amor
E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade
A tristeza que a gente tem
Qualquer dia vai se acabar
Todos vão sorrir
Voltou a esperança
É o povo que dança
Contente da vida, feliz a cantar
Porque são tantas coisas azuis
E há tão grandes promessas de luz
Tanto amor para amar de que a gente nem sabe
Quem me dera viver pra ver
E brincar outros carnavais
Com a beleza dos velhos carnavais
Que marchas tão lindas
E o povo cantando seu canto de paz
Seu canto de paz
Caprichou no texto einh, JB?! Gosto de tom descontraído ficou bem legal. Vou esperar vc contar a história do seu amor de carnaval. E a música é bacana mesmo, gostei da parte "Porque são tantas coisas azuis
ResponderExcluirE há tão grandes promessas de luz
Tanto amor para amar de que a gente nem sabe", bonito.
"J"
O Vinicius tinha a manha. E a história já foi contada. O título é "Conhece a história da princesas e do sapo?" e está na seção "Memória"
ExcluirPara facilitar, aí vai o link
Excluirhttp://blogsoncrusoe.blogspot.com.br/2015/02/conhece-historia-da-princesa-e-do-sapo.html