segunda-feira, 31 de janeiro de 2022
domingo, 30 de janeiro de 2022
RADICALISMO E GENIALIDADE
Outro gênio de comportamento irrepreensível foi Albert Einstein. Em 1986 encontraram guardados no cofre de um banco em Berkeley vários documentos seus. Dentre eles, uma lista de exigências que Einstein escreveu em 1914 para “salvar” o seu casamento com Mileva Maric. “Coincidência”: o casal se separou em 1914. Olha a suavidade e carinho contidos nessa lista endereçada à esposa:
A. Cabe a você fazer com que minha roupa esteja sempre limpa e em ordem; eu receba minhas três refeições normalmente em meus aposentos; meu quarto e meu escritório estejam sempre bem-arrumados e, principalmente, que minha escrivaninha seja usada apenas por mim.
B. Você se absterá de quaisquer relações pessoais comigo, a menos que sejam absolutamente necessárias por motivos sociais. Sobretudo, você abrirá mão de minha companhia em casa; sair ou viajar comigo.
C. Você observará os seguintes pontos em suas relações comigo: não esperará nenhuma intimidade de minha parte, nem me repreenderá de forma alguma; parará de falar comigo quando eu lhe pedir; sairá de meu quarto ou de meu escritório imediatamente e sem objeções, quando eu lhe pedir.
D. Você se comprometerá a não me depreciar, com palavras ou atos, diante de nossos filhos.”
Impossível não ficar chocado com essas grosserias, para dizer o mínimo. Na minha opinião prova suficiente de que ninguém é genial em tudo o que faz, pensa ou defende.
Mas a lista não para por aqui, pois grandes talentos da música e das artes em geral tiveram comportamentos totalmente condenáveis ou, no mínimo equivocados, comprovando que não existe passe livre para cometer burradas, crimes ou atitudes deploráveis só porque se é gênio em alguma atividade ou profissão. Sem detalhar muito, esse é o caso do deus da guitarra Eric Clapton com seu incompreensível e inaceitável comportamento antivacina ou do fabuloso pintor Caravaggio, que não pode ser dissociado dos crimes que cometeu (assassinato, inclusive).
Bom, se nem os gênios são geniais ou louváveis o tempo todo, o que se dirá das pessoas comuns, aquelas que hoje alimentam e se alimentam do lixo despejado nas redes “sociais”? Pois é, é aí que eu queria chegar.
Eu nunca tenha pensado nisso, jamais imaginaria essa possibilidade, mas ela é plausível e talvez seja mesmo real (esta frase meio enigmática é só para tentar seduzir o provável leitor desta bagaça a não abandonar a leitura deste post).
Estou falando de radicalismo, ou melhor, da minha crença de que uma pessoa com pensamento radical sobre ideologia acaba irradiando esse radicalismo para outras manifestações de sua personalidade.
Graças à experiência muitas vezes assustadora de ler ou tomar conhecimento das sandices e delírios que algumas pessoas publicam nas redes sociais, desconfio poder afirmar que o radicalismo de alguém é como uma planta que se alastra sem controle por todos os lugares, sem controle. Ao contrário da genialidade, que se apresenta de forma localizada, o radicalismo ultra exacerbado se espraia por todos os lugares, em todas as falas, em todos os comportamentos, em todas as crenças e, por que não? em todas as formas de delírios ou má fé.
Cheguei a essa conclusão depois de ler dois “prints de tela" que meus filhos me enviaram via whatsapp. Não sei de quem receberam, mas como são (graças a Deus!) totalmente moderados, equilibrados e gozadores, não tenho dúvida de que receberam esses prints já como piadas prontas, tal o delírio que expressam. Para que ninguém duvide das minhas desconfianças olhai os prints mencionados (mas o assunto não termina aqui):
sexta-feira, 28 de janeiro de 2022
UM SEDUTOR MASCARADO
Meu amigo virtual Marreta publicou em seu excelente blog um ótimo artigo onde nos conta de uma pesquisa sobre o efeito embelezador do rosto masculino com o uso das máscaras contra covid. Pensei até em comentar no próprio blog, mas Jotabê, esta múmia que vos fala, foi citado em algum momento, fato que sempre aciona o comando automático de transformar resposta longa em novo post (mas do Blogson, que eu não sou bobo de perder essa chance).
quinta-feira, 27 de janeiro de 2022
quarta-feira, 26 de janeiro de 2022
UMA TRAGÉDIA (TRÊS ANOS DEPOIS) - ROBERTO BOCA
Tenho um amigo de facebook a quem mal conheço. Não sei, por exemplo, seu nome verdadeiro. Sei também que deve ser bem mais novo que eu, justamente por ser amigo de juventude de meus cunhados, adolescentes ainda quando eu já estava casado. Apesar disso, pela afinidade que sinto por ele, acredito que ele é mais meu amigo que muitos “amigos” reais que conheço.
terça-feira, 25 de janeiro de 2022
SOFISMANDO POR AÍ
Clapton is God
So, God is against the vaccine
segunda-feira, 24 de janeiro de 2022
LA ESPERA - MANUEL VILAS
Para fazer uma brincadeira com a “perda de 4 cm” provocada pelo coronavirus e descrita pelo meu amigo virtual Marreta, pedi ao Google para mostrar sites onde eu pudesse encontrar rimas em espanhol com a palavra “covid”, pois queria fazer um jogo de palavras e o máximo que tinha conseguido imaginar era “con viejo” (com velho).
domingo, 23 de janeiro de 2022
CELEBRANDO AS PALAVRAS
Por mais que eu tenha desejado acreditar em outra coisa, sou um sujeito mediano. Ou medíocre, como ironizou meu falecido amigo Pintão. Mediano nos gostos, nas crenças, nos preconceitos, em tudo ou quase tudo igual à maioria alfabetizada deste país. Mas sou egocêntrico e vaidoso. Justamente por isso, pela associação do egocentrismo com a mediocridade, sempre acreditei que ao falar do meu próprio umbigo, dos meus grilos, raivas, medos e temores eu provavelmente estaria falando também dos sentimentos do brasileiro médio.
sábado, 22 de janeiro de 2022
PODE ME CHAMAR DE SIGMUND
Como já disse outras vezes (sou meio repetitivo), o velho Blogson foi aos poucos se transformando em uma espécie de “blogoterapia”, um lugar de desabafos, onde eu exibi todo tipo de preconceitos, erros e burradas que cometi ao longo da vida. Sinceramente, nunca vi problema em (re)admitir meus erros e culpas, pois só os idiotas não aceitam que erram ou que erraram.
E o motivo dessa transformação do blog em instrumento de autoanálise é o fato de ter-me atirado no velho Blogson sem nenhuma rede de proteção, sem filtro quase nenhum. A cada espatifada que eu dava no chão surgiam peças do mosaico que fui montando de mim mesmo. E o que começou como uma brincadeira, um passatempo para um idoso aposentado acabou se transformando em uma terapia gratuita, uma blogoterapia de longa duração que me permitiu ver com bastante nitidez quem eu realmente sou hoje, quem eu fui e o que fiz para chegar até este momento.
Para Mary Yoko Okamoto, professora de Psicologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) no campus de Assis, no caso de processos mais profundos, escrever não significa que aquela questão vai se resolver, mas é um primeiro passo. "A escrita, sim, pode ajudar. Num primeiro momento, como uma fonte de reflexão para perceber algumas questões. A pessoa geralmente faz uma imersão nela mesma e isso vem à tona. Ela pode escrever e depois, relendo o material, se dar conta de algumas coisas que estão lá no conteúdo. Outra coisa é que tipo de modificação vem a partir daí."
A escrita é usada como recurso em terapias, por exemplo, para o tratamento de traumas. Na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), o Projeto Escreva-se é inspirado numa técnica de Yale, universidade americana. São estratégias de intervenção autoguiada, sem mediação, com tarefas de escrita", explica o professor da PUC-RS Angelo Brandelli Costa.
Ele ressalta que os participantes precisam seguir o modelo proposto pelo método. "Não é pegar um diário e escrever. Embora não tenha um profissional de saúde acompanhando, é parecido com a psicoterapia", afirma Costa.
"Não importa se vai ser uma frase ou cinco páginas. Independentemente do volume de texto, existem evidências de que esse processo melhora a saúde mental, apenas com o fato de a pessoa tentar botar de uma forma organizada a situação traumática, endereçado a alguém ou a si mesma", diz.
A escrita tem uma função instrumental em terapias tradicionais, explica Costa. "Na psicanálise, há várias técnicas projetivas. Quando Freud analisa os sonhos, está analisando as narrativas", explica Costa. Um diário também pode servir para a pessoa lembrar do que acontecia com ela no momento em que se sentiu de determinada maneira. "Algumas pessoas conseguem se expressar muito bem com a fala. Outras desenham, outras escrevem."
A professora pontua que escrever não é para todo mundo. "Tem gente que tem essa maneira de expressão. Para outras pessoas, pode ser mais acessível a música, a pintura ou a fotografia. São as formas de linguagem de cada um."
Tendo criado um blog originalmente destinado a desovar as piadas infames, besteiras e idiotices que mandava para por e-mail para alguns amigos, fico feliz em constatar que – por puro acaso – eu estava correto em utilizá-lo também como “Muro das Lamentações” ou, em outras palavras, um híbrido de terapeuta e terapia, uma “blogoterapia”.
Se o blog fosse uma pessoa, talvez pudesse dizer:
- Meu nome é Blogson Crusoe, mas pode me chamar de Sigmund. Freud, naturalmente.
https://www.terra.com.br/noticias/coronavirus/na-ponta-do-lapis-como-a-escrita-pode-ajudar-no-autoconhecimento,26c270fe4ef7b237415fcd63c07a384dkw3z1h8t.html
sexta-feira, 21 de janeiro de 2022
MOSAICO TOSCANO
Durante uma entrevista no programa do Jô
Soares o apresentador Ratinho contou ter vendido “churrasquinho de gato” no
início de sua vida profissional. Diante
da surpresa do Jô, esclareceu que “carne de gato” era só onda. O que ele vendia
mesmo era churrasquinho de carne de segunda, amaciada com leite de mamão verde.
Lembrei-me dessa história ao comentar com um
jovem que o Tempo é o melhor solvente que existe, pois “dissolve” músculos, tendões,
articulações, lembranças, sonhos e esperança. Ele riu e eu disse que ele ainda demoraria a
entender o significado real disso.
Como sabem algumas pessoas que acessam este
blog, desde a criação do Blogson fui dando spoilers variados sobre
velhice e envelhecimento. Spoilers para quem é jovem, bem entendido. E fiz isso porque entendo muito do assunto,
aprendido na base da aula prática mesmo, pois sou velho pra caramba.
Já disse uma vez
que na velhice tudo que deveria manter-se cai. E tudo o que deveria diminuir, aumenta. E essa transformação é um negócio muito impressionante de se observar.
Diria que é quase tão impactante quanto a visão das cataratas do Iguaçu, porque
na velhice o iguaçu exibe muitas quedas, se consegue me entender.
Creio
que todos ou, pelo menos, a maioria dos leitores desta bagaça são mais novos que
eu. Para ser sincero, isso não é nada difícil, pois, como disse, sou velho pra
caramba, informação diariamente ratificada pelo espelho do banheiro.
Pois é, movido pela inconveniência que a
velhitude me proporcionou, resolvi dar um spoiler meio desagradável. Talvez não seja um spoiler original, pois nem sei mais quantas lágrimas eu tenho derramado por aqui.
Em todo caso, vamos lá.
Preciso repetir, alertar a todos os leitores
de que a velhice é uma merda. E que, muitas vezes, muitas, muitas vezes recebe
a visita indesejada de sua amiga depressão. Este é o spoiler. Depressão e
velhice frequentemente andam de braços dados, como se fosse amigas de infância
ou coleguinhas de ensino fundamental.
Dia desses, por exemplo, bateu uma depressão
um pouco mais pesada que o normal. Usando a imagem criada pelo depressivo
Winston Churchill, era um black dog muito grande, talvez um fila
brasileiro, um mastim italiano, um dog alemão, um rottweiler enfurecido.
Exasperado com a minha vida, exclamei mentalmente: - A Vida não tem sentido!
Meu desejo momentâneo era repetir em voz alta
essa ideia. Para que ninguém pensasse que eu estou enlouquecendo (talvez
esteja), digitei no computador essa frase e a repeti dezenas de vezes, tal como
no filme “O iluminado”. A diferença é que eu apenas copicolei no Excel,
excelente para fazer esse tipo de idiotice.
Ao fazer isso, a depressão foi se acalmando,
o cachorro foi adormecendo e eu comecei a brincar com a frase, mastigando e
remontando mentalmente as palavras, como se fossem cacos de um mosaico quebrado que
alguém apressadamente tentasse colar de novo:
a vida não tem sentido
não tem sentido a vida
sentido a vida não tem
tem a vida sentido não
não tem, não tem, não
tem não, tem não, tem
não, não, não, não.
Aí o saco encheu e fui assistir o programa da Sonia Abrão que estava passando na TV, uma prova de que a Vida realmente não tem mesmo nenhum sentido.
Creio que todos ou, pelo menos, a maioria dos leitores desta bagaça são mais novos que eu. Para ser sincero, isso não é nada difícil, pois, como disse, sou velho pra caramba, informação diariamente ratificada pelo espelho do banheiro.
Pois é, movido pela inconveniência que a velhitude me proporcionou, resolvi dar um spoiler meio desagradável. Talvez não seja um spoiler original, pois nem sei mais quantas lágrimas eu tenho derramado por aqui. Em todo caso, vamos lá.
Preciso repetir, alertar a todos os leitores de que a velhice é uma merda. E que, muitas vezes, muitas, muitas vezes recebe a visita indesejada de sua amiga depressão. Este é o spoiler. Depressão e velhice frequentemente andam de braços dados, como se fosse amigas de infância ou coleguinhas de ensino fundamental.
Dia desses, por exemplo, bateu uma depressão um pouco mais pesada que o normal. Usando a imagem criada pelo depressivo Winston Churchill, era um black dog muito grande, talvez um fila brasileiro, um mastim italiano, um dog alemão, um rottweiler enfurecido. Exasperado com a minha vida, exclamei mentalmente: - A Vida não tem sentido!
Meu desejo momentâneo era repetir em voz alta essa ideia. Para que ninguém pensasse que eu estou enlouquecendo (talvez esteja), digitei no computador essa frase e a repeti dezenas de vezes, tal como no filme “O iluminado”. A diferença é que eu apenas copicolei no Excel, excelente para fazer esse tipo de idiotice.
Ao fazer isso, a depressão foi se acalmando, o cachorro foi adormecendo e eu comecei a brincar com a frase, mastigando e remontando mentalmente as palavras, como se fossem cacos de um mosaico quebrado que alguém apressadamente tentasse colar de novo:
a vida não tem sentido
não tem sentido a vida
sentido a vida não tem
tem a vida sentido não
não tem, não tem, não
tem não, tem não, tem
não, não, não, não.
Aí o saco encheu e fui assistir o programa da Sonia Abrão que estava passando na TV, uma prova de que a Vida realmente não tem mesmo nenhum sentido.
quinta-feira, 20 de janeiro de 2022
MENSAGEM DO FILHO DO POETA THIAGO DE MELLO:
Este blogueiro que vos fala é um sujeito meio de miolo mole, mas, principalmente, de coração mole, muito mole. Que se emociona com pequenas coisas, pequenos gestos e cujos olhos se enchem de lágrimas quando se vê diante de manifestações intensas de carinho, amor ou dor. E se esses sentimentos vierem embrulhados juntos, não tem como resistir. Recebi de minha mulher o texto abaixo, tão comovente e tão amoroso que não pude deixar de publicá-lo aqui no blog. Olhaí.
terça-feira, 18 de janeiro de 2022
QUEM SAI AOS SEUS...
Alguém disse uma vez que “quem sai aos seus não degenera”. Imagino que tenha algum fundo de verdade nessa frase, pois foi o que pensei quando recebi um trocadilho horroroso de um de meus filhos sobre o tenista Novak Djokovic.
sábado, 15 de janeiro de 2022
AS ENSINANÇAS DA DÚVIDA - THIAGO DE MELLO
Tive um chão (mas já faz tempo)
todo feito de certezas
tão duras como lajedos.
Agora (o tempo é que fez)
tenho um caminho de barro
umedecido de dúvidas.
Mas nele (devagar vou)
me cresce funda a certeza
de que vale a pena o amor
quinta-feira, 13 de janeiro de 2022
quarta-feira, 12 de janeiro de 2022
AGORA QUE JÁ SEI
Agora que já sei o significado de tabuísmo, sinto-me à vontade para explorar um pouco mais esse assunto, mesmo que eu não seja tabuísta ou, melhor, talvez no máximo um “tabuísta” moderado e contido (devo ter criado um neologismo), criado em casa de vó e impedido na infância de usar palavras chulas em família.
Bolsonarismo
Comunismo
Crendices variadas
Extrema esquerda
Fake news
Fascismo
Fundamentalismo religioso
Ivermectina
Lulismo
Mensalão
PT
Rachadinha.
Terra plana
(Et ad infinitum)
Bolsonaro
Carluxo
Famiglia Bozo
Olavo horóscopo
Osmar enterra
Petralhas
Silas mala
Véio da Havan
Waldemiro
Weintraub
(Et ad infinitum)
segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
VOCÊ SABE O QUE É TABUÍSMO?
Tabuísmo:
Palavra, locução ou acepção tabus, consideradas chulas, grosseiras ou ofensivas demais na maioria dos contextos (São os chamados palavrões e afins, e referem-se geralmente ao metabolismo (cagar, mijar, merda), aos órgãos e funções sexuais (caralho, pica, boceta 'vulva', colhão, cona, foder, crica, pachoucho etc.), incluem ainda disfemismos pesados como puta, veado, cabrão, expressões tabuizadas (puta que pariu) etc.
Pois é, graças às últimas movimentações (intestinais) do presidente, o assunto do momento tem sido uma coisa meio... meio escatológica (o que não deixa de ser uma merda!). Por isso, graças à piadinha dos crevettes (sou chique!) que postei também no blog, recebi um texto muito legal cujo autor é Sérgio Rodrigues, publicado na Folha em 05/01/2022. Apesar do título nada atraente do artigo, vamos ver se com ele consigo encerrar esse assunto meio intoxicante, pois é como ensinam os italianos: mangiare molti gamberetti fa male (sou chique!). Olhaí.
Quando o cardápio inclui fezes
Há 50 anos, o médico mineiro Pedro Nava estreou tardiamente - logo ia completar 70 - como memorialista, lançando o primeiro livro de uma série que se tornaria um ponto alto do gênero no país: "Baú de ossos" (Companhia das Letras).
Mais do que pela data redonda, a obra-prima de Nava me vem à lembrança por incluir um escatológico caso de família que, datado do Segundo Reinado, joga luzes sobre o mar de merda - "merda viva", diria o memorialista - em que Bolsonaro mergulhou o Brasil.
A história tem como protagonista uma megera da família paterna do autor, uma dona Irifila, casada com o comendador Iriclérico Narbal Pamplona. Sim, a graça quase inverossímil do caso começa pelos nomes.
O casal oferecia um contraste marcante. Enquanto Iriclérico era amigo de comes e bebes, jogos de salão e boa conversa, Irifila era o cão. "Era contra os namoros, contra o riso, contra as festas, contra as cantigas, contra as danças, contra o álcool, contra o fumo, contra o jogo", conta Nava.
Um dia, Irifila se encheu das rodinhas de carteado, guloseimas, charutos e prosa que Iriclérico tinha o hábito de promover em casa uma vez por semana. Advertiu o marido de que não queria mais saber daquilo, mas o comendador, com patriarcal distração, não lhe deu ouvidos. E chegou a hora da vingança.
Iriclérico recebia naquele dia ninguém menos que o visconde de Ouro Preto. O mais ilustre e poderoso de seus amigos era também padrinho de um de seus filhos. Irifila caprichou no serviço.
Após se esmerar na enumeração das gostosuras que a dona da casa mandou servir em bandejas de prata recém-polidas, Nava passa então ao prato principal:
"E no meio da maior bandeja, a mais alta compoteira com o doce do dia - aparecendo todo escuro e lustroso, através das facetas do cristal grosso, de um pardo saboroso como o da banana mole, da pasta de caju, do colchão de passas com ameixas-pretas, do cascão de goiaba com rapadura."
Iriclérico estava numa felicidade contagiante. Aí vem o golpe de mestre de Nava, quer dizer, de Irifila. "O comendador resplandecente destampou a compoteira: estava cheia, até as bordas, de merda viva! Nunca ninguém, jamais, ousara coisa igual."
Tomado de um choro convulsivo, "tremendo da cabeça aos pés, lívido da dor esquisita que lhe atravessava o peito, o estômago, e banhado dum suor de agonia", Iriclérico nunca se recuperou da cacetada. Até morrer, em 1896, não recebeu mais ninguém em casa. A vitória de Irifila foi completa.
O poder sinistro da armadilha que a megera montara para o marido tem raízes fundas, imemoriais - as mesmas que tornam tabuísmos, ou seja, palavrões, uma série de termos banais com os quais nos referimos a funções fisiológicas igualmente banais. Mas não em público!
Não era para aquela montanha de cagalhões estar ali, na mesa do comendador, numa elegante vasilha de cristal. Ao ser destampada com despreocupação, a piscina de barro instaurava violentamente uma dimensão de loucura, de pesadelo. Era evidente que alguém capaz de conceber tal coisa não recuaria diante de nada - nem do mais hediondo dos crimes.
E o Brasil dos últimos três anos com isso? "Dia sim, dia não", entre golden showers e "caguei para a CPI", entre internações espetaculosas por problemas intestinais e o hábito de falar merda, o presidente tornou sua retórica e seus atos um festival de escatologia. O fedor é nauseabundo. Que 2022 seja o ano de dar descarga.
sábado, 8 de janeiro de 2022
URSO BIPOLAR
Meu coração se aperta de tristeza e angústia todas as vezes que leio ou ouço falar sobre espécies ameaçadas de extinção. Pode ser alguma identificação inconsciente, pois li há muito tempo (antes do Jurassic Park) que as pessoas idosas sentiriam uma afinidade maior com espécies extintas, justamente por estarem elas próprias mais perto da extinção. Pode ser, pode ser...
-Vegano? Um urso polar carnívoro, vegano?
-Esquenta não, ele sempre foi meio bipolar.
quinta-feira, 6 de janeiro de 2022
quarta-feira, 5 de janeiro de 2022
TÁ NO SAL(MO)!
Aparentemente a ironia que coloquei no título do post anterior não seduziu ninguém ou, ao contrário, pode até ter afugentado os leitores eventuais desta bagaça. Paciência. Mas recebi pelo whatsapp uma piada tão bem bolada que não pude resistir à tentação de postá-la no facebook, talvez a rede social mais careta (mesmo sem conhecer as demais), pois a maioria de seus usuários é formada por gente idosa, velha em idade e preconceito. Recebi dois comentários que vale a pena transcrever:
- Eu não sou evangélico, mas não concordo em fazer piada com trechos da Bíblia.
terça-feira, 4 de janeiro de 2022
OBRIGADO, PRESIDENTE!
Hoje, por exemplo, refletindo sobre determinados comportamentos de alguém, senti imensa vontade de agradecer a essa pessoa. E estou me referindo a nosso presidente. Minha vontade seria poder ir a Brasília e dizer bem alto “Obrigado, presidente!”
Quem acessa este blog com um pouco de frequência sabe das severas críticas dirigidas ao mandatário de plantão, dos dezénhos que ironizaram seu comportamento, etc. Mas o momento agora é de gratidão, de agradecer, pois o ano de 2022 está apenas engatinhando e meu coração está cheio de paz e esperança.
Por isso, mais uma vez, obrigado, senhor presidente. Preciso agradecer-lhe pela contribuição permanente dada aos desenhistas de humor, aos chargistas que suam diariamente a camisa para produzir desenhos que comentam a situação atual do país. Provavelmente esses profissionais estariam sem trabalhar se o senhor não exibisse seu inacreditável comportamento e não dissesse suas impagáveis frases.
Preciso agradecer também ter aumentado a visibilidade do Brasil na imprensa internacional. Pouco importa se as referências à sua administração ou vida pessoal surjam apenas para criticar ou ridicularizar, pois alguém já disse esta frase lúcida e cheia de sensatez: “falem bem ou mal, mas falem de mim”.
E, claro, agradecer a Vossa Excelência por produzir e fornecer vastíssimo material de pesquisa (aí incluído o cartão de vacinação, sob sigilo por cem anos) para historiadores, estatísticos, sociólogos, psicólogos e outros profissionais do presente e do futuro que analisarão os "anos Bolsonaro" e o impacto de suas atitudes e decisões desmioladas no futuro do país.
Concluindo, não poderia deixar de agradecer sua ajuda e influência na minha decisão de nunca mais votar em Vossa Excelência. Imagino que existam no Brasil muitas pessoas, milhões de pessoas na verdade, com motivos semelhantes aos meus para agradecer-lhe, mas ninguém tem mais motivos para isso que seu rival nas próximas eleições, o ex-presidiário Lula. Eu, se fosse ele, ajoelharia no milho e agradeceria todos os dias por Vossa Excelência existir.
segunda-feira, 3 de janeiro de 2022
AFORISMOS DE SCHOPENHAUER
Bom, esta dispensável introdução serve para apresentar frases e pensamentos de Arthur Schopenhauer, um filósofo alemão que viveu no século XIX. Tudo começou com um “amigo de facebook” me enviando um vídeo em que alguém com sotaque português lia aforismos escritos pelo alemão. Como o velho Blogson é um pet sempre faminto, um tamagotchi que precisa ser alimentado, achei que seria uma boa copiar essas frases e tentar encontrar outras na internet.
Mas confesso ter ficado um pouco decepcionado com o Arturzinho, pois li algumas frases bem machistas - ainda que escritas no século XIX (exemplo: “A mulher é um animal de cabelos longos e ideias curtas”). Por não conhecer absolutamente nada do restante de sua obra, pareceu-me também que ele se tinha em altíssima conta e que era meio depressivo e misantropo ("O único homem que não consegue viver sem mulheres é um ginecologista". Ou “Quando nasce um homem como eu, só se pode desejar uma coisa: que consiga ser sempre ele mesmo e viver para seus dons intelectuais”).
A alegria conserva a saúde e a juventude do coração.
A arte é uma flor nascida no caminho da nossa vida, e que se desenvolve
para suavizá-la.
A compaixão pelos animais está intimamente ligada à bondade de
caráter, e pode ser seguramente afirmado que quem é cruel com os animais não
pode ser um bom homem.
A fé é como o amor, não pode ser obtida pela força.
A fé e o saber não se dão bem dentro da mesma cabeça: são como o lobo e
o cordeiro dentro de uma jaula; e o saber é justamente o lobo, que ameaça
devorar seu vizinho. O saber é feito de uma matéria mais dura do que a fé, de
modo que, quando colidem, a última se quebra.
A glória deve ser conquistada; a honra, por sua vez, basta que não seja
perdida.
A honra cavalheiresca é filha da arrogância e da tolice.
A honra é, objetivamente, a opinião dos outros acerca do nosso valor, e,
subjetivamente, o nosso medo dessa opinião.
A ignorância só degrada o homem quando se encontra em companhia da
riqueza.
A inteligência é invisível para quem não tem nenhuma.
A intolerância é intrínseca apenas ao monoteísmo: um deus único é, por
natureza, um deus ciumento, que não tolera nenhum outro além dele mesmo.
A língua é para o espírito de uma nação, o que o estilo é para o
espírito de um indivíduo.
A modéstia é a humildade de um hipócrita que pede perdão por seus
méritos aos que não têm nenhum.
A mulher é um efeito deslumbrante da natureza.
A música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não
compreende.
A nossa felicidade depende mais do que temos nas nossas cabeças, do que
nos nossos bolsos.
A riqueza influencia-nos como a água do mar. Quanto mais bebemos, mais
sede temos. O mesmo vale para a glória.
A serenidade e a vitalidade da nossa juventude baseiam-se em parte no
fato de que nós, ao subirmos a montanha, não vemos a morte, pois ela
encontra-se do outro lado da encosta.
A solidão é o destino de todos os espíritos eminentes.
A vida interior é reprimida e não pode ser conscientizada, porque
conhecer nossa natureza mais profunda (nossa crueldade, medo, inveja, desejo
sexual, agressividade, egoísmo) seria um peso maior do que poderíamos aguentar.
A virtude não se ensina, como tampouco o gênio.
Aquele que quer ser tudo não pode ser nada.
Arquitetura é música congelada.
As causas não determinam o caráter da pessoa, mas apenas a manifestação
desse caráter, ou seja, as ações.
As pessoas comuns pensam apenas como passar o tempo. Uma pessoa
inteligente tenta usar o tempo.
As religiões são como vaga-lumes: para brilhar precisam das trevas.
Casar-se significa duplicar as suas obrigações e reduzir à metade os
seus direitos.
Certamente a vida não existe para ser aproveitada, mas para ser
suportada e despachada... De fato, é um conforto na velhice ter o trabalho da
vida por trás de si.
Como somos obrigados a viver, devemos sofrer o menos possível.
Consigo suportar a ideia de que poucas horas depois que eu morrer os
vermes comerão meu corpo, mas estremeço ao imaginar professores criticando
minha filosofia.
É fácil pregar a moralidade, difícil é justificá-la.
Em geral, chamamos de destino as asneiras que cometemos.
Em geral, nove décimos da nossa felicidade baseiam-se exclusivamente na
saúde. Com ela, tudo se transforma em fonte de prazer.
Erra muito menos quem, com olhar sombrio, considera esse mundo uma
espécie de inferno e, portanto, só se preocupa em conseguir um recanto à prova
de fogo.
Estou cansado, no final da estrada. Mesmo assim, vejo com alegria o que
fiz, sem me intimidar com a opinião dos outros.
Gosto da minha solidão, mas você se surpreenderia com o tamanho dela.
Ler quer dizer pensar com uma cabeça alheia, em lugar da própria.
Melhor deixar que os homens sejam como são do que acreditar no que não
são.
Na verdade, só existe prazer no uso e no sentimento das próprias forças,
e a maior dor é a reconhecida falta de forças onde elas seriam necessárias.
Não devemos mostrar a nossa cólera ou o nosso ódio senão por meio de
atos. Os animais de sangue frio são os únicos que têm veneno.
Não diga a um amigo nada que você esconderia de um inimigo.
Não nos deixar cair em tentação, é o mesmo que dizer: não nos deixar ver
quem realmente somos.
Nas pessoas de capacidade limitada, a modéstia não passa de mera
honestidade, mas em quem possui grande talento é hipocrisia.
Nem todos os loucos ou burros são fanáticos, mas todos os fanáticos são
loucos ou burros.
Nenhum homem jamais se sentiu perfeitamente feliz no presente; se
acontecesse, isso o entorpeceria.
O bom humor é a única qualidade divina do homem.
O conhecimento é limitado, só a estupidez é ilimitada.
O destino embaralha as cartas e nós jogamos.
O homem é‚ propriamente falando, um animal que agride.
O maior erro que um homem pode cometer é sacrificar a sua saúde a
qualquer outra vantagem.
O que a história conta não passa do longo sonho, do pesadelo espesso e
confuso da humanidade.
O que é a modéstia senão uma humildade hipócrita pela qual um homem pede
perdão por ter as qualidades e os méritos que os outros não têm!
O que temos dentro de nós é o essencial para a felicidade humana.
O que torna as pessoas sociáveis é a sua incapacidade de suportar a solidão
e, nela, a si mesmos.
Quando a alegria se apresenta, devemos abrir-lhe todas as portas, pois
ela jamais é inoportuna.
Quando partimos num navio, as coisas na praia vão diminuindo e ficando
mais difíceis de distinguir; o mesmo ocorre com todos os fatos e atividades de
nosso passado.
Quanto mais realização pessoal houver, menor será a angústia da morte.
Quanto menos inteligente um homem é, menos misteriosa a existência lhe
parece.
Se for certo que um deus fez este mundo, não queria eu ser esse deus: as
dores do mundo dilacerariam meu coração.
Se você for educado e simpático, as pessoas ficam dóceis e obedientes.
Assim, a polidez faz com a natureza humana o mesmo que o calor faz com a cera.
Sentimos a dor, mas não a sua ausência.
Talento é quando um atirador atinge o alvo que os outros não conseguem.
Gênio é quando um atirador atinge o alvo que os outros não veem.
Toda nação troça das outras e todas têm razão.
Todas as pessoas tomam os limites de seu próprio campo de visão pelos
limites do mundo.
Todo pobre-diabo que não tem nada no mundo do que possa se orgulhar
escolhe a nação a que pertence como último recurso para sentir orgulho; desse
modo, ele se restabelece, sente-se grato e pronto para defender com unhas e
dentes todos os erros e absurdos próprios dessa nação.
Um insulto supera qualquer argumento.
Uma maneira de agradar é deixar que cada um fale de si.
Vista pelos jovens, a vida é um futuro infinitamente longo; vista pelos
velhos, um passado muito breve.
A tarde é a velhice do dia. Cada dia é uma pequena vida, e cada por do
sol é uma pequena morte.
Renunciamos a muito de nós mesmos para sermos como os outros.
Raramente pensamos no que temos, mas sempre no que nos falta.
Quanto mais elevado é o espírito mais ele sofre.
Os primeiros quarenta anos de vida dão-nos o texto; os trinta seguintes
o comentário.
O médico vê o homem em toda a sua fraqueza; o jurista o vê em toda a sua
maldade; o teólogo, em toda a sua imbecilidade.
Ninguém é realmente digno de inveja, e tantos são dignos de lástima!
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