terça-feira, 1 de junho de 2021

CAÇA AO TESOURO

 
Já falei sobre isso aqui no Blogson, mas ninguém precisa se esforçar para lembrar da história, pois vou repetir: morei na casa de minha avó materna até me casar. Durante esses vinte quatro anos tive oportunidade de conviver com os tios que também moravam lá, com genros e noras de meus avós maternos e com os primos e tios de minha mãe, tanto do lado paterno quanto do materno. De alguns desses parentes consigo me lembrar da fisionomia, do ar de superioridade dos mais ricos (tudo filho da puta!).
 
Quando era criança nenhum deles se importava muito comigo; na adolescência era eu que não ligava para aqueles que ainda iam visitar meu avô, minha mãe ou minha tia. Lembro-me de algumas fisionomias mas não consigo conectar as imagens com seus nomes e apelidos,  alguns bastante sonoros ou pré-históricos, caso de Laldomila e Emerenciana (apelidada de "Chana"), irmãs de minha avó e de Odorêncio ("Tidorenço") e Onésio, irmãos de meu avô.
 
Mas não vou recontar o que já escrevi nos posts da série “Nascidos na Fazenda”. O que realmente quero registrar é a alegria quase infantil de reencontrar vestígios dessas pessoas, algumas nascidas no final do século 19(!!!). E isso está sendo possível pelo acesso frequente que tenho feito ao site de genealogia criado pelos mórmons.
 
Cronologicamente falando (e só cronologicamente), deixei de ser criança há 60 anos e deixamos de ter crianças aqui em casa há 30 anos. Então, não entendo de crianças que vivem cercadas por jogos eletrônicos fantásticos, cada vez mais realistas em termos de imagem e que talvez cacem tesouros com uso de consoles e mouses.
 
No meu caso, essa alegria que sinto se assemelha à que sentia uma criança que sonhava com histórias de pirata e tesouros escondidos, que lia livros do tipo “As Aventuras de Tom Sawier”, “A ilha do Tesouro” ou “Robinson Suíço” e costumava brincar de procurar um tesouro perdido e se deparava com um baú esquecido em um quarto de despejo da casa onde morava, cheio de tranqueiras antigas – canetas tinteiro, mata-borrão, apontador de lápis todo em metal e em forma de caminhão, revólver de brinquedo feito em alumínio, etc. (esses objetos eu via jogados em gavetas na casa de minha avó). Ou então, já no início da adolescência, com os hormônios esguichando, ao encontrar uma revista antiga sobre fotografia, onde apareciam alguns nus femininos tremendamente inspiradores, se me entendem (também achei isso na casa de minha avó).
 
Pois bem, ultimamente minha diversão tem sido “brincar de detetive”, ao tentar garimpar os dados das pessoas que mencionei no início do post, mas sem nenhuma gota de saudosismo, só mesmo interesse arqueológico. E o mais legal é que aos poucos estou encontrando, apesar do trabalho de paciência filhadaputa que está dando. Descobri, por exemplo, a data de casamento de dois tios-avós, protagonistas de um dos casos mais bizarros que ouvi na minha infância, pois um sobrinho se casou com sua tia! A explicação estava no fato da noiva ser meia-irmã da mãe do noivo (o que não atenua em quase nada a esquisitice da união). Aparentemente, naquele tempo, naquele cu de mundo, casamento entre parentes próximos era visto com alguma naturalidade e nem chegava a escandalizar, apesar das penas impostas pela consanguinidade.
 
Essa caça ao tesouro tem me permitido “exumar” pessoas há muito falecidas, uma exumação apenas de lembranças, fazendo com que eu entre em contato com alguns dados dos irmãos filhos da puta de minha avó materna (que através de artifícios de compra e venda de fazendas foram transferindo o patrimônio familiar deixado por meu bisavô apenas para eles, nada restando da parte da herança a que ela teria direito. Como já contei aqui no blog, eles continuaram ricos, mas só eles).
 
Foi esse trabalho de detetive que permitiu que eu me lembrasse do arrogante e imperial Oscar, do caipiríssimo Neca, do escrotíssimo Juquinha e de suas conversas sobre vacas e fazendas. Mesmo que eu não acredite mais em inferno, é divertido imaginá-los sendo gratinados em fornos da marca “Hell’s”.
 
E essa diversão está sendo conseguida com o acesso obsessivo ao site de genealogia dos mórmons. Já fiz até uma lista de oito árvores genealógicas que pretendo pesquisar, eventualmente corrigir e até mesmo acrescentar novos ramos e folhagens (ou “filhagens”). Como diriam meus parentes, “Ê trem bão!”



 

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