Mesmo que
equivocadamente, eu classifico as famílias de minha mãe e de meu pai da
seguinte maneira: a família de minha mãe é formada por gente simples no trato,
alegre e descontraída; a de meu pai eu enxergo como meio depressiva, um pouco elitista
e muito reservada. Talvez essa classificação seja injusta, até por ter
convivido pouquíssimo com os irmãos de meu pai (mesmo que eu os amasse – como
amo até hoje, embora estejam todos mortos). Um dos motivos para isso é o fato
de ser uma família de gente bem mais velha que os irmãos e irmãs de minha mãe.
A título de exemplo, meu avô materno era mais novo que o irmão mais velho de
meu pai.
Como morei na casa
de minha avó materna até me casar, nada mais natural que eu tenha adquirido um
comportamento mais descontraído e alegre, próprio da família de minha mãe e que
se manifesta na maior parte do tempo. Entretanto, não raras vezes eu exibo as
características herdadas da família de meu pai: introversão, timidez, ironia e
depressão, sem me esquecer de um jeito meio elitista de ser.
Essas
características ficaram mais visíveis à medida que fui envelhecendo. Estados
depressivos começaram a acontecer com mais frequência, o bom humor e a alegria
sendo substituídos pela ironia e pelo sarcasmo; irritabilidade e tendência ao
isolamento completando o quadro.
Essas mudanças e
alterações de humor fizeram com que eu começasse a ter uma visão desencantada
da Vida e, mais especificamente, da minha própria vida. Tentei encontrar um
sentido para essa coisa bizarra que é viver, mas desisti. Hoje isso já nem me
preocupa mais. Mas comecei a ter a necessidade de registrar tudo o que penso –
por mais idiotas e simplórios que sejam esses pensamentos –, talvez para melhor
ordená-los ou (quem sabe?) como forma de me “eternizar”.
Por que estou
dizendo tudo isso? Porque meus textos são sempre confessionais, na medida em
que me mostro em cada bobagem que penso, em cada piada idiota que crio, em cada
coisa que comento. Mas o motivo real de estar dizendo tudo isso é o desejo de
mudar essa situação.
Hoje, não sei
exatamente porque, acordei com a sensação de que preciso mudar minha vida. Não
sei quantos anos mais eu viverei, mas quero vivê-los plenamente feliz e talvez poder
dizer como disse de si mesmo o genial Millor Fernandes, no final da vida: “Sou indecentemente feliz”.
É óbvio que existirão
momentos em que ficarei triste e não terei como mudar isso, mas quero que essa
tristeza não parta de mim mesmo. Que seja como nesta oração atribuída a São
Francisco de Assis:
“Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado,
resignação para aceitar o que não pode ser mudado e sabedoria para distinguir
uma coisa da outra.”
E o
instrumento que encontrei para realizar essa mudança não é terapia do tipo
convencional, mas “programação neurolinguística”, uma espécie de
auto-curandeirismo. Apesar da ironia, eu acredito que isso funciona
razoavelmente bem, desde que me mandaram fazer um curso dessa técnica, quando
estava lotado na gerência comercial da última empresa onde trabalhei.
O que
entendi, dito de forma simplificada é que somos aquilo que pensamos ser.
Exemplificando, tenho dito para todo mundo que sou um velho, que estou velho,
etc. Na prática, sinto-me muito mais novo do que apregoo, mas infinitamente
mais velho do que gostaria de ser. Apesar de sentir-me mais novo do que
realmente sou, de tanto proclamar minha “velhitude” (antônimo de “juventude”),
acabo por adotar comportamentos normalmente associados à galera da “melhor
idade”, ou seja, impaciência, amargura, nervosismo e irritabilidade.
Há outros
exemplos sobre o efeito da auto-sugestão negativa em mim mesmo, mas já me
alonguei demais nesta sopa rala.
O que sei é
que pretendo mudar o enfoque das coisas que penso e digo no dia a dia, ao adotar
um estilo mais assertivo, mais positivo, mas cuidando para não ficar hipócrita
ou alienado. Assim, talvez eu possa um dia dizer como o Vovô Catapreta, bisavô
da Eliany: “eu tenho noventa e seis anos, sete meses e dez dias”. E falava isso
com visível orgulho e satisfação.
Apesar de pertencer a uma linhagem de gente introvertida, atribuo a minha timidez ao fato de ser filho de pais super neuróticos e protetores; minha introspecção, inclusive, foi mais forte durante a adolescência, quando culminou em uma leve reclusão. Meus pais - meu pai, principalmente - insistiam para eu sair de casa, mas eu não tinha, até então, o "treinamento" necessário para encontrar diversão fora de casa.
ResponderExcluirQuando conheci a garota com quem fui me casar, tive um choque de realidade: havia um mundo lá fora e ele era divertido. Hoje, ainda tímido (mas menos), irônico (bem mais) e meio mal humorado, sou o oposto daquele cara que só queria ficar em casa. Tento viver uma vida mais leve ao estar sempre na rua, explorando o mundo fora dos muros da minha casa, mas o que talvez ajude mais seja explorar o mundo fora dos nossos muros internos, erguidos com preconceitos (e pré-conceitos), culpas, medos e coisa e tal.
Suas palavras soam estranhamente familiares, pois eu sou (ou fui) um pai assim. O motivo pode ter sido o fato de toda a minha vida ter sido pautada pelo medo, medo de tudo, medo da perda, medo do sofrimento, da dor. Cheguei a pensar em escrever um texto sobre isso e tinha até um título legal tirado de um filme ótimo: "Sob o domínio do medo". Mas desisti. Mas você está coberto de razão (e parece ser tão jovem! Parabéns!
ResponderExcluirA propósito, se você fosse um dos meus filhos, eu terminaria esta resposta dizendo "que Deus te abençoe", mas, sei lá, vai que você é ateu e poderia até ficar ofendido. Isso, claro, se fosse um de meus filhos. Abração e obrigado pela visita.
Esse medo de pai (e mãe) é fruto de um amor incondicional. Mas amar também é dar as costas e deixar o filho brincar, mesmo que ele corra o risco de arrebentar a cabeça ou coisa parecida.
ExcluirDe qualquer forma, esse não é o foco do texto, que está muito bom, a propósito.
Valeu!
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