sexta-feira, 16 de outubro de 2015

NASCIDOS NA FAZENDA - 01

“Qualquer vida, se tem o narrador certo, merece um livro ou, pelo menos, um capítulo”. O autor desta frase magnífica é o jornalista Diogo Schelp, que a construiu para comentar na revista Veja um livro recém-lançado.

Tomo a liberdade de usá-la para apresentar a série de cincos posts que começam a ser divulgados a partir de hoje. O assunto, claro, são lembranças de pessoas com quem convivi. No caso particular, meus avós maternos. Não creio ser o “narrador certo”, talvez seja apenas o único – e mais errado que certo.

Tal como os posts já divulgados sobre a família de meu pai, este é parte de um texto maior, ainda inacabado, que comecei a escrever em 2013 para deixar para meus filhos (caso eles queiram saber). O tema são as lembranças que tenho sobre a família de minha mãe. Não pensava em divulgá-lo no blog, por uma série de motivos. Primeiro, por estar inacabado, pois não consegui dar continuidade no perfil de metade dos tios. Além disso, está o fato de que a maioria dos tios ainda está viva. E meus comentários e lembranças descritas não se enquadram na cartilha politicamente correta nem na linha chapa branca.

Apesar disso tudo, resolvi divulgar um pouco dessa memória no Blogson. E o culpado é o meu amigo virtual Marreta do Azarão, que disse ser minha "verdadeira veia literária" as memórias. Assim, antes que minha memória acabe de vez, vamos falar um pouco da véia, ou melhor, vamos exercitar a veia. E o assunto começa justamente com a família de minha avó materna. Vamos lá.


Quando eu nasci, em 1950, meus pais e meu irmão já moravam na casa de minha avó materna. Minha avó teve onze filhos, mas um deles morreu ainda pequeno. Minha mãe era a segunda mais velha e foi também a segunda a se casar. Todos os filhos, com exceção de tia Ci, casada com tio Tristano, moravam nessa casa. Como a casa era pequena, barracões (edículas) foram sendo construídos para abrigar esse povo todo e mais meu avô, que, embora separado de minha avó, morava lá também, em um quarto de um dos barracões existentes no fundo do imóvel.

Comparados com meus tios paternos, metade deles nascida antes de 1900, os irmãos de minha mãe eram verdadeiras crianças, pois a tia materna mais velha (tia Ci) é mais jovem que a caçula da família de meu pai (tia Zinha). Por isso, apenas para registro e ordenação, transcrevo os dados fornecidos por minha irmã, tal como fiz com os irmãos de meu pai:

Tia Ci (Araci), minha madrinha de batismo, nasceu em 19/02/1919. Em 19/12/1920 nasceu minha mãe. Meu tio e padrinho Moacir (Cici) nasceu em 25/04/1925. Tio Nem (Manoel) nasceu em 02/07/1926.

Tio Tôto (Walter) nasceu em 28/05/1928. Em 30/07/1929 nasceu tia Dalva. O próximo foi Omir (não “tio Omir”, apenas e tão somente, Omir), nascido em 14/07/1931. Depois dele, veio tia Aidê, nascida em 24/08/1933. A mais nova das mulheres, tia Marisa, nasceu em 15/12/1935. O último tio - Almon (Mon), apenas dez anos mais velho que eu, nasceu em 05/04/1940.

Meu tio José (epa!, de novo) foi o terceiro filho a nascer, ficando entre minha mãe e tio Cici. Segundo tia Aidê, morreu com onze meses, vítima de uma variante mais branda da famosa gripe espanhola. Parece que nessa mesma época suas tias Anita e Domila também perderam bebês, vitimados pela mesma doença. Uma coincidência não muito simpática (para mim, pelo menos) é o fato de os dois tios “José”, um por parte de pai e outro por parte de mãe, terem morrido na infância.

Uma coisa que eu nunca entendi é o bailado dos sobrenomes de minha avó e de meu avô, que se alternavam na composição dos nomes dos filhos. Meu avô chamava-se Francisco José Botelho. Minha avó, Julieta Alvarenga Costa. E os filhos ficaram assim:
Tia Ci (Alvarenga Botelho); minha mãe, Lia (Alvarenga Botelho); tio Cici (Botelho Alvarenga); tio Ném (Botelho Alvarenga); tio Tôto (Botelho Alvarenga); tia Aidê (Botelho Alvarenga); tia Dalva (Alvarenga Botelho); Omir (Botelho Alvarenga); tia Marisa (Alvarenga Botelho) e Mon (Botelho Alvarenga). Parece que essa ideia maluca teria sido de meu avô. Sei não, mas ele deve ter fumado algum tipo de cipó ou fumo de rolo jamaicano, na época. Também nunca entendi porque foi usado o “Alvarenga” de minha avó em vez do sobrenome “Costa”.

Como vivi nessa casa durante 24 anos, até me casar, as lembranças vão se justapondo e se embaralhando muito. Por isso, recorri algumas vezes à minha irmã, que me forneceu datas, nomes e casos que eu já tinha esquecido ou, mesmo, que desconhecia. As transcrições literais do que ela me enviou estão entre aspas e em itálico. E, para tentar ordenar um pouco essa bagunça, preciso falar de cada uma dessas pessoas isoladamente. E vou começar por minha avó.


Seu apelido era Lêta. Não sei onde nasceu, mas tinha uma penca de irmãos, como era costume naquele tempo (e depois tem gente que critica a televisão!). Esses irmãos iam visitá-la de vez em quando. Colocados na ordem de idade, lembro-me do tio Juquinha (José), tia Chana (Emerenciana) e tia Anita (Ana), uma senhora gorda e metida, por quem nunca tive simpatia. Era casada com tio Olímpio.

Depois, vinha tia Domila (Laldomila), casada com tio Custódio ou Custodinho, para diferenciar de outro irmão de minha avó, ele também Custódio. Além do nome alucinógeno, tia Domila seria fácil, fácil uma personagem de história em quadrinhos, mais precisamente irmã da bruxa Alcéia, das histórias da Luluzinha. Sinceramente, ela era feia pra caramba, com seu nariz mega adunco e aqueles olhos... bem, os olhos eram parecidos com os meus, arregalados e com bolsa e tudo. Uma bosta.

O mais engraçado é que o marido, tio Custódio (Custodinho) morria de ciúmes dela. Uma de suas filhas, Alda, sempre honrou com muito mérito a feiura da mãe. De tão magra, usava (ou usa) duas calças compridas, “para engrossar a perna”. Separada do marido (porque será?) e aparentemente meio ninfomaníaca, quando era mais jovem ia para a Avenida Paraná (coisa muito fina!) para descolar algum motorista ou trocador. Não é invenção minha! Quando eu namorava a minha mulher e o ponto final do meu ônibus era na Paraná, cansei de vê-la por ali, nos sábados à noite. Morria de vergonha.

Continuando com os tios-avós, vinham o Oscar e o Neca (Manoel). Minha avó era a segunda mais nova. Esse pessoal todo morava no bairro Floresta.


Alguns anos atrás, minha tia Aidê mostrou-me uma fotografia sensacional, que, contada de hoje (estamos em 2013), deve ter de noventa a cem anos. Nesse retrato, com aquelas caras de foto posada de antigamente, estão meu bisavô, minha bisavó – que era sua segunda esposa – e todos os filhos do primeiro e do segundo casamento. Minha avó aparece como uma jovem de, no máximo, vinte anos. Essa fotografia e a informação de que meu bisavô foi casado duas vezes esclareceram uma das coisas que mais me intrigavam, relacionadas à Tia Chana.

2 comentários:

  1. Muito legal, me perdi umas trocentas vezes na árvore da família e tive que começar tudo de novo, mas gostei muito. A série promete.
    "J"

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    1. Como disse no início, este texto começou a ser escrito para ser lido pelos meus filhos. A minha obsessão por informações, datas e nomes fez o resto. Mas eu mesmo só consigo me lembrar dos tios avós que conheci pessoalmente, na infância. O resto é apenas transcrição de dados fornecidos por uma de minhas tias. O segundo post tem umas coisas bem legais, mas vai ter de esperar até a próxima sexta-feira.

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