Tenho andado meio musical ultimamente, ouvindo músicas que me deixam até babando na blusa (talvez algumas pessoas inconvenientes possam dizer isso é coisa de velho senil, mas não é verdade). Por isso, resolvi compartilhar com os milhares de robôs que vivem aparecendo por aqui, outra música linda, a segunda em dois dias! E a sugestão de hoje merece até uma reverência para os músicos envolvidos nessa gravação: os compositores Tavinho Moura e Fernando Brant e Milton Nascimento em um de seus melhores momentos como intérprete. Para explicar porque,
preciso antes contar uma historinha. Vamos lá:
Há muitos anos, ficamos sabendo que
haveria um show do Lô Borges no hoje extinto Mercado Distrital de Santa Tereza e fomos conferir.
Creio que o mercado já estava em fase terminal. Talvez por isso qualquer
programa de índio acontecesse ali. Nesse dia, era justamente um programa
dedicado ao Dia do Índio ou coisa parecida. Não importa. Ficamos por ali
pentelhando, curtindo a excelente música do Lô, até que notei a presença de
mais dois músicos ligados ao Clube da Esquina: Beto Lopes – que está mais para
filho do Clube – e Tavinho Moura, esse sim, legítimo sócio fundador. Não tive dúvida, fui lá puxar conversa com ele.
Perguntei se iria cantar também e se iria rolar a música “Paixão e Fé” (rolou).
O motivo da pergunta era simples: há músicas
tão absurdamente lindas que, para mim, mesmo sendo hoje um católico-ateu, Deus esteve ao lado do autor dando
palpite ("põe este acorde", muda a linha melódica um pouco"), dando dicas durante a composição. É como se Ele fosse um coautor, tal
o êxtase que essas músicas provocam em quem as escuta. “Paixão e Fé” é uma dessas.
Não vou ficar enxugando gelo, mas o Tavinho Moura
é um compositor sofisticadíssimo. Suas melodias são sempre surpreendentes, pois
quando você está esperando um belo “zig”, ele vem com um “zag” inesperado, desconcertante e mais
bonito ainda. Não é à toa que sua obra mereceu um concerto no Palácio das Artes (que eu, infelizmente, perdi),
com a Orquestra Sinfônica regida pelo Wagner Tiso, outro sócio fundador do
Clube.
Eu sei que estou falando demais, mas é
impossível deixar de dizer que essa música não seria o que é sem a letra
arrebatadora do Fernando Brant e "A" interpretação divina do Milton Nascimento. A
propósito do Bituca, a Elis Regina disse uma vez que “se Deus cantasse, ele cantaria com a voz de Milton”. Dez a zero
para ela. Hoje, infelizmente, isso não é mais verdade.
Essa gravação mais que antológica foi
incluída no disco “Clube da Esquina n.° 2” e conta com o auxílio luxuoso do Beto
Guedes no bandolim e uma participação especialíssima dos “Canarinhos de Petrópolis”. Além, é claro, de outras feras.
Não importa se quem ouve essa música é ateu,
budista, islâmico, judeu, católico ou evangélico. O que eu penso é que, depois que
a música termina você está melhor como pessoa, pois esteve muito próximo
do que eu chamaria de "Deus".
A seguir, a letra lindíssima feita pelo
Fernando Brant. Depois, para quem quiser ouvir, segue o link. E fica o aviso:
quem não gostar dessa música é um jumento irrecuperável ou débil mental.
Já bate o sino, bate na catedral
E o som penetra todos os portais
A igreja está chamando seus fiéis
Para rezar por seu Senhor
Para cantar a ressurreição
E sai o povo pelas ruas a cobrir
De areia e flores as pedras do chão
Nas varandas vejo as moças e os lençóis
Enquanto passa a procissão
Louvando as coisas da fé
Velejar, velejei
No mar do Senhor
Lá eu vi a fé e a paixão
Lá eu vi a agonia da barca dos homens
Já bate o sino, bate no coração
E o povo põe de lado a sua dor
Pelas ruas capistranas de toda cor
Esquece a sua paixão
Para viver a do Senhor
Velejar, velejei...
Velejar, velejei...
Muito bonita! Aliás, nada na voz de Milton pode ficar feio. Nos anos 90 comprei uma coleção com várias fases da carreira musical do Milton, incluindo a fase do Clube da Esquina. Tenho até hoje. Um tesouro musical!
ResponderExcluirMilton foi o cara, mas a idade chegou e pegou pesado. Uma coisa que eu acho incrível é a participação espetacular do grupo coral "Canarinhos de Petrópolis", que não existe mais.
Excluirsim, o Milton está bem debilitado. 82 anos. Aí eu fico vendo o Roberto Carlos, com a mesma idade e ainda bem inteiro, apesar também de estar numa marcha mais lenta. Nos próximos anos os grandes remanescentes da nossa música nos deixarão.
ExcluirVocê já viu o Elton John andando atualmente? Fiquei chocado. Mas não só "os grandes remanescentes da nossa música nos deixarão", seus fãs mais antigos também (eu sou um desses).
Excluirvero...
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