segunda-feira, 30 de outubro de 2017

RHAPSODY IN BLUE - GEORGE GERSHWIN

Achei que já tinha contado essa história no Blogson, mas parece que me enganei. Por isso, vamos lá: nunca tive sofisticação intelectual suficiente para gostar de música erudita (ou “clássica”, como eu dizia antes). Por isso, tirando umas obras mais manjadas, daquelas tocadas em casamentos e assemelhados, nunca me interessei por isso. Ou melhor, até pensei em ouvir, mas sabia que seria uma tarefa árdua demais para o tempo de lazer de que dispunha.

No fim da década de 1970, ainda praticamente recém-casado, lembro-me que a Globo transmitia nas manhãs de sábado um programa dedicado à divulgação da música erudita, com o nome de “Concertos para a Juventude”.  Sempre passei batido, até que um dia, não sei mais por qual motivo, ouvi um som magnífico enquanto girava o seletor de canais. Voltei o seletor e fiquei ouvindo e vendo uma orquestra em que o maestro, sentado ao piano, ora regia, ora “esmerilava” o teclado. E fiquei ouvindo aquele som bonito e diferente, até que, em determinado momento, a orquestra toca uma melodia lindíssima que parecia não se encaixar no restante da música. Fiquei fascinado e ligadíssimo para saber que música divina era aquela.

Para resumir, era “Rhapsody in Blue”, de George Gershwin, interpretado por uma orquestra regida pelo pianista-maestro Leonard Bernstein. Depois disso, procurei e achei um vinil com essa música, interpretada justamente pelo maestro-pianista. Não tive dúvida, comprei na hora. O que posso dizer é que já ouvi essa música algumas dezenas de vezes (mas nunca consigo reproduzi-la na mente).

Recentemente descobri que a tal apresentação da série “Concertos para a Juventude” está no Youtube. Por isso, resolvi compartilhar com meus dois leitores esse som incrível (fica aqui a dica: a melodia lindíssima começa aos dez minutos e quarenta segundos do vídeo). Para dar um pouco mais de diversão, escaneei a contracapa do vinil, onde é contada a história de como essa obra surgiu. É o texto apresentado a seguir. Infelizmente, não sei o autor, mas é muito legal. Olhaí: 


“Whiteman Judges Named" (Nomeados os Juízes do Whiteman), dizia uma pequena nota na página de diversões da Tribune de Nova York de 4 de janeiro de1924. "O Comitê decidirá O que é Música Americana", dizia o subtítulo. A matéria começava: "Entre os membros do comitê de juízes que estarão no What Is American Music? do concerto de Paul Whiteman a ser realizado no Aeolian Hall, terça feira à tarde, 12 de fevereiro, estarão Sergei Rachmaninoff, Jascha Heifetz, Efrem Zimbalist e Alma Gluck... Essa questão do que é precisamente música americana.tem suscitado enorme interesse nos círculos musicais e Mr. Whiteman está recebendo toda espécie de manuscritos, de blues a sinfonias. George Gershwin está trabalhando em um concerto de jazz...”
A nota foi lida para George Gershwin por seu irmão Ira. O compositor estava nos retoques finais do preparo da partitura para o musical da Broadway Sweet Little Devil para seu lançamento em Boston. Ele se lembrou de ter conversado com Paul Whiteman sobre um proposto, eventual concerto de jazz para o qual ele produziria uma peça longa, uma composição séria utilizando fórmulas e ritmos do jazz. Agora, porém, a data de concerto estava subitamente apenas cinco semanas adiante.
Antes de partir para Boston e tratar de Sweet Little Devil, Gershwin procurou Paul Whiteman e este lhe fez ver que produzindo apenas uma peça para piano ele poderia atender em tempo à encomenda. Pois Whiteman tinha à mão, como seu arranjador, o maior profissional nesse campo, Ferde Grofé.
No trem para Boston, com uns poucos temas fixados em sua mente para, possível uso, Gershwin se pôs a organizar a peça. "Foi no trem", disse ele mais tarde, "com seus ritmos de aço, sua orquestra barulhenta... (frequentemente ouço música no próprio coração do ruído) que de repente ouvi – até vi no papel – toda a construção da Rapsódia, do começo ao fim. Não me vieram novos temas, mas trabalhei no material temático que já estava 'na minha mente e tentei conceber a composição como um todo... Quando cheguei a Boston, tinha o plano definido da peça, definido em sua real substância".
A real substância foi reunida e arrumada na sala de trabalho do apartamento de Gershwin em Nova York, na Rua 110,quando ele voltou de Boston. Foi esboçada para dois pianos, deixando grandes espaços vazios para quando o piano solista devesse atuar sem acompanhamento. Grofé estava aí mesmo, pegando o manuscrito à medida que ia sendo completado, uma seção cada vez, e rapidamente fazia a orquestração.
Gershwin fez algumas indicações da instrumentação que tinha em mente, mas não indicava os instrumentos o músico ou músicos de Whiteman para esta ou aquela passagem!
O clarinetista Ross Gorman podia tocar um fabuloso glissando onde outros não poderiam, e as notas iniciais foram concebidas tendo em mente suas especiais habilidades. Embora a obra tenha sido descrita como "para jazz band e piano", a banda de Whiteman era, mais, uma grande orquestra de dança formada de elementos que possuíam fundamentos de jazz e não raro tinham pela frente carreiras de sucesso como músicos de jazz individualmente.
O título final foi dado por Ira. Na tarde do concerto George ainda não tinha acrescentado a parte completa do piano mas, apesar disso, tocou com perfeita calma diante das páginas ainda em branco.
Rapsódia veio depois do último dos vinte e três números do programa. Como Whiteman não tinha a partitura completa, devia esperar que Gershwin lhe desse a deixa para trazer de volta a orquestra depois das passagens de solo. Contudo, tudo saiu bem e animou o público, que começara achando que este concerto experimental teria apenas interesse educativo.
"O concerto", escreveu Carl van Vechten a Gershwin dois dias depois, "em verdade foi o que se poderia dizer um extravagante tumulto; você o coroou com o que sou forçado a considerar como o mais importante esforço sério de um compositor americano. Vá em frente e você deixará toda a Europa atônita."






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