Já postei no Blogson um texto sobre o uso de palavrões falsamente atribuído ao Millor Fernandes. Disposto a descobrir onde ele renegava essa paternidade, comecei a ler as entrevistas que ele deu para vários meios de comunicação. Achei o que procurava, mas achei também opiniões, críticas e reflexões geniais e sempre espirituosas. Por isso, resolvi compartilhar com os 2,3 leitores do blog esse prazer, pois ele era verdadeiramente genial. Vamos lá.
LULA E POLÍTICA
O Freud ficaria besta com o
Lula: é o ego maior do mundo.
Lula é um autocrata. Esse
negócio da bebedeira dele foi ridículo. Ele disse que decidiu expulsar o
jornalista para servir de exemplo. Para quê? Para que todo o mundo fique com
medo de escrever coisas negativas sobre ele? Amanhã eu não vou poder nem dizer
que ele tomou umas e outras. O lugar-tenente Aldo Rebelo está me processando
porque eu fui contra o projeto dele de proibir termos estrangeiros na língua
portuguesa. É a mesma coisa o papa proibir que as mulheres deem. Sua Santidade
exigiu isso a vida inteira e as mulheres continuaram dando. A língua se
transforma. Senão, estaríamos falando latim ou guarani.
Eu, por exemplo, sou um
fronteiriço topográfico. Se você me deixa numa porta giratória, eu volto pro
mesmo hotel [gargalhada]. Agora, o Lula é total. Uma característica do
fronteiriço é que ele não registra. Ele começa a falar e, na décima frase, já
não sabe o que disse no início.
Como é que ele (Lula) fala no "partido que eu
fiz"? Isso não se diz assim, na primeira pessoa. O uso do "nós"
é um aprendizado cultural que Lula não teve.
Lula não tem consciência da
própria ignorância.
As pessoas não gostam quando
falo isso, mas 95% da humanidade é absolutamente idiota, e os outros 5% são
discutíveis. O Lula veio de baixo, é um homem de origem humilde, mas o partido
dele tem 25 anos. Se não foi no primeiro, segundo ou terceiro ano, em algum
momento ele passou a receber dinheiro, até como forma de salário do PT. Ora,
Lula tem 59 anos. Há 25 anos, tinha 34. Com essa idade ainda se pode ir para o
colégio. Passei mais fome do que ele, a diferença é que eu era carioca. Meu pai
morreu quando eu tinha 1 ano, minha mãe, quando eu tinha 10, nós descemos de
classe média para proletariado e depois para lumpesinato. Não havia
literalmente o que comer, e nem por isso fiquei me queixando, Quando passei de
100 para 300 réis de salário, ia para o curso do Liceu de Artes e Ofícios e
pagava para estudar. Não fiquei esperando o Estado bancar.
Ninguém que ambiciona o poder
deixa de ser um filho da puta! Pode ser um pouco mais ou um pouco menos. Mas o
homem de bem, no sentido genérico e universal da palavra “bem”, não ambiciona o
poder.
Você vê agora esse movimento
por indenizações para quem fez luta armada. O pessoal botou uma pistola na
cintura e foi lutar pra quê? Pra tomar o poder! Pois bem, aí a coisa não deu
certo e eles pedem indenização?! Então eles não estavam fazendo uma rebelião,
estavam fazendo um investimento [gargalhadas].
Você me dá o governo mais
democrático e eu percebo que estou vivendo dentro de uma ditadura. Nunca houve
governo democrático em lugar nenhum. No Brasil, não existe mesmo. O que é
diferente em uma democracia é você combinar que aquele que foi eleito vai ficar
quatro anos no posto.
o Brasil deveria instituir o
voto contra. Não tem voto a favor?
A corrupção é mais natural no
ser humano do que a integridade.
LITERATURA
(O estrangeirismo empobrece a língua portuguesa?) De maneira
nenhuma. Antigamente, tivemos palavras como porta-seios, uma coisa muito feia,
que felizmente foi substituída pelo galicismo "sutiã". Toda língua é invadida
e, como mulher, fecundada.
De vez em quando a nossa leva
na bunda, mas nada que, lavada, não fique novinha. Houve tempo em que o
galicismo era uma aberração. Não se podia escrever "amante", mas
"amásia".
Escrever bem é expressar-se.
Usar sujeito, verbo, predicado e, a partir daí, fazer todas as variações. Não
deixo margem a dúvida quando digo "um homem de terno branco atravessava a
rua num dia de domingo".
(É possível escrever bem sem ler muito?) Não!
(Mas é possível desenvolver um instinto natural para escrever bem?) O instinto pode levar a
escrever, mas uma pessoa simplória tende a ter um discurso
simplório. Quando escrever, fará um texto simplório. Quanto mais formas de
escrita você conhecer, mais habilidade terá em sua própria escrita.
O Sarney não sofreu como
presidente, mas como escritor. Terminei a série perguntando: “Afinal de contas,
Sir Ney escreveu ou não escreveu um livro? Escreveu, porque segundo a Unesco
livro é uma publicação não periódica de mais de 49 páginas. E quando Sir Ney
chegou, depois de muito esforço, à quinquagésima página, fechou a máquina e
gritou lá para dentro: ‘Mãe, acabei!’”.
O Proust eu li em português,
francês, inglês e espanhol: é toda uma dimensão literária. Mas o Machado não me
diz nada, como o Joyce, que eu nunca consegui ler. Não acredito em ler com
esforço.
(Sobre Machado de Assis) o que eu tenho é um certo desdém. Quem é
Machado de Assis? É um mulato, filho de uma lavadeira, com todo um temperamento
de querer ficar bem na sociedade. E que eu saiba – pode até ser ignorância
minha, admito – mas que eu saiba, não tem mulher alguma na vida dele. Ele não
comeu ninguém! E eu tenho um certo desconforto com homem que não come ninguém.
Eu acho que o homem tem que comer alguém.
Com a internet, cada um tem
seu blog, e, quando há um volume muito grande de gente praticando, tudo se
abastarda. Quando se deliberou que não haveria mais métrica e rima na poesia,
toda senhora de 50 anos começou a fazer poesia.
Hoje, todo mundo que tem
talento ou alguma pretensão tem acesso a algum outro meio de divulgação além do
blog. E, paradoxalmente, você pode até achar que o cara que tá fazendo um blog
medíocre vai ter mais público do que outro que seja melhor. Existe o Paulo
Coelho também na internet.
Outro dia ele (Paulo Coelho) disse que não liga para o
que os tradutores fazem com seus livros. Pô, o tradutor só pode melhorar
aquilo!
HUMOR
Dizem que o trocadilho é a
mais baixa forma de humor, mas, se você tirar o trocadilho de Shakespeare, ele
desaparece.
se você pegar a maior parte do
meu humor, ele é aleatório, sobre coisas maiores, sobre coisas menores, sobre a
vida, sobre o mal, sobre o bem.
Ecmnésia. É aquele passado
edulcorado. Tudo parece bonito no passado, mas volta lá para você ver.
Eu chamo o humorismo de
quintessência da seriedade. Mas não é só pra fazer uma frase, não. No momento
em que você raciocina sobre tudo, você consegue resumir aquela coisa toda que
os caras pomposamente disseram. Então você é humorista porque você modificou
aquilo, resumiu aquilo, destruiu aquilo. E você, no ato de modificar, também
sabe que a sua opinião não é definitiva. Você tem sempre essa ressalva de
autocrítica, você entende? Isso é humor.
O Pasquim funcionava porque,
embora não se levasse a sério, ninguém ali queria ser engraçadinho. Queria ser
iconoclasta. Por exemplo, a Benedita da Silva se lança candidata ao governo
como “mulher, preta e favelada”. A gente diria assim: “Três bons motivos pra
não votar nela” [gargalhadas]. Eles vêm com a demagogia e você vai em cima, né?
PENSAMENTO CRÍTICO
Não estou de olho na
posteridade, nem no passado, a anterioridade. Vou indo. Aliás, vou indo bem.
Não tenho de que me queixar. Me queixo de vez em quando, apenas pra que os
deuses, lá em cima, não fiquem com inveja.
tenho dificuldade de pensar
ideologicamente. Eu acho a ideologia um bitolamento da inteligência. Se você é
católico, tá f(*), você é católico, pronto! Você pensa naquela linha católica.
Quem não pensa católico é um filho da p(*). É a mesma coisa com o
presbiteriano. Você me diz assim: “Aquele cara é um grande pensador marxista”.
Então ele não é pensador, é um propagandista do marxismo. O Tristão de Atahyde
era conhecido como grande pensador católico. Isso não é nada pensador… Pensador
é o cara que vai pensando numa linha até o momento em que esbarra numa coisa e
muda a maneira de pensar.
Chamar viado de
"veado" é coisa de viado.
Sou indecentemente feliz.
Quem se interessar em ler as entrevistas na íntegra, siga os links abaixo: