quarta-feira, 15 de outubro de 2025

CEGUEIRA AFETIVA – AUTOR DESCONHECIDO

  
Recebi hoje pelo zap de um amigo mega culto este artigo. Na hora, já me lembrei do Lula e do Trump, tão apaixonadas as reações que esses líderes provocam em quem os apoia ou odeia. Não sei o nome do autor nem onde foi publicado, mas espero que gostem.
 
É curioso observar como o julgamento humano se molda menos pela razão do que pelo afeto. Defendemos com unhas e dentes aqueles de quem gostamos, ainda que os fatos se imponham em sentido contrário. Os defeitos são relativizados, os deslizes compreendidos e as virtudes exaltadas. Mas basta uma divergência ou decepção para que o mesmo indivíduo, antes admirável, passe a ser visto como hipócrita, incompetente ou desonesto. De repente, tudo o que fazia de bom se torna “mera obrigação”.
Esse fenômeno não se restringe às relações pessoais. Ele aparece com igual intensidade na política, campo em que paixões substituem ideias e identidades se sobrepõem a argumentos. É impressionante a facilidade com que se ama ou odeia um líder, sem espaço para matizes. Para alguns, ele é um visionário injustiçado; para outros, um oportunista perigoso. Nada do que faça — de bom ou de mau — muda o julgamento prévio.
Trata-se de um mecanismo mental bem conhecido. O chamado viés de confirmação nos leva a aceitar sem esforço tudo o que corrobora nossas crenças e a rejeitar, com igual vigor, o que as contraria. A razão, nesse contexto, atua como serva da emoção: não pesa os fatos, apenas os justifica. Quando uma informação ameaça abalar nossas certezas, entra em cena a dissonância cognitiva, conceito proposto por Leon Festinger. Diante do desconforto de admitir que podemos estar errados, o cérebro prefere reinterpretar a realidade. Se o líder em quem confiamos falha, é culpa dos assessores, da imprensa, do sistema. Se o adversário acerta, foi por sorte ou conveniência. Assim, preservamos nossa coerência interna, mesmo à custa da verdade.
Mas há uma camada ainda mais profunda: a herança de nosso tribalismo ancestral. Durante milhares de anos, viver em pequenos grupos exigia lealdade cega e desconfiança do “outro”. Questionar o chefe ou simpatizar com o inimigo podia significar exclusão — e, portanto, risco de morte. Nosso cérebro, forjado nesse ambiente, ainda reage emocionalmente como se cada discordância fosse uma ameaça existencial. Continuamos defendendo nossa tribo — familiar, ideológica ou partidária — como se a sobrevivência dependesse disso.
As redes sociais apenas ampliaram esse instinto. Elas nos cercam de opiniões semelhantes às nossas e nos protegem de qualquer pensamento dissonante. Os algoritmos oferecem conforto ideológico e reforçam a convicção de que “nós” estamos certos e “eles” estão errados. O resultado é a polarização afetiva: deixamos de discutir ideias e passamos a odiar pessoas. O debate se transforma em guerra moral, onde o adversário deixa de ser um cidadão que pensa diferente para se tornar um inimigo que precisa ser derrotado.
Talvez a única forma de escapar dessa cegueira afetiva seja praticar um tipo de humildade intelectual — a disposição de reconhecer que podemos estar errados, de que nossos afetos e preconceitos distorcem a realidade mais do que gostaríamos de admitir. A razão, afinal, é uma conquista frágil, sempre sob o risco de ser derrubada por uma emoção disfarçada de convicção.
E, enquanto continuarmos julgando os líderes — ou quem quer que seja — pelo que sentimos em relação a eles, e não pelo que fazem, continuaremos a viver como nossos ancestrais das cavernas: cada um com a sua tribo, o seu totem e a sua verdade inabalável.

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